ABRINDO O JOGO
Inge e seu filho dormiam após o almoço quando Inge foi acordada por Ruddah.
-Use a caixa mágica, Rainha! Avise seus amigos do que está acontecendo!
–E o quê está acontecendo?
–Os legionários ocuparam a aldeia.
Inge pegou seu comunicador.
–Inge para Boris! Temos um problema...
–Sim, já sei. Fica quieta como estás. Ninguém desconfiará de uma mãe com seu filho, a menos que alguém fale o que não deve.
–Está bem. Souberam alguma coisa de Aldo?
–Saberemos ainda hoje. Fica à escuta. Antes do anoitecer terei noticias.
–Espero que os pilotos descubram alguma coisa.
–Sim, mas não queremos que desçam aí. Já estamos metendo os vurians até o pescoço em nossos problemas. Quero que os deixem em paz.
–Até agora está tudo tranqüilo. Os soldados estão se comportando bem.
–Se vamos embora, talvez deixem os vurians em paz.
–É uma possibilidade. Chamarei depois. Inge desliga.
*******.
Abrindo o Jogo.
–Aceite minhas condições, Karis, ou morra junto com seus homens! – tinha dito o capitão Regert, enquanto as torres de fogo da Wodan procuravam alvos entre as tropas da Legião.
Karis ficou desnorteado, estudando a nova situação. Não esperava essa reação e desconhecia o poder de fogo das armas alienígenas. Lian-Ee interveio:
–Você não é cordial com meus hóspedes, Karis. Por quê os ofende? Eles não fizeram mal aos vurians. Não entendo suas intenções, mas não me parecem honradas.
Karis não teve tempo de responder. Regert tomou a palavra:
–É evidente que você precisa de uma demonstração de poder, Karis. Vocês, legionários, com todas suas armas, acham-se poderosos, mas nós somos muito mais poderosos – disse ele fazendo um gesto.
Um canhão disparou sobre um asgoth de carga. O infortunado animal de mais de duas toneladas terrestres nem sentiu o que lhe acontecera. Seu corpo ardeu instantaneamente numa luz incandescente e desapareceu numa nuvem de fumaça.
Restou apenas um repugnante cheiro de carne carbonizada, perante o pavor de todos.
–Karis! Já viu meu poder. Aceita minhas condições?
–Aceito. Virá a Taônia comigo?
–Correção: irei a Taônia e você virá comigo – disse Regert – Desculpe pelo asgoth, Lian-Ee. Pagaremos por ele.
–Não se preocupe.
*******.
Ives chamou a Hércules que estava no lago com quase toda a tripulação.
–Recomendo permanecer escondidos por um tempo, comandante. Um grupo de legionários acampou na beira do lago.
–De acordo, Ives – disse Boris – Não há problema em preparar a nave aqui mesmo. Já temos tudo. Mas não estamos todos. Ingeborg e seu filho estão na aldeia.
–Vou dar uma olhada, comandante.
–Faça isso. Se precisar tomar alguma providencia...
–Pode deixar – disse Ives elevando-se.
–A aldeia está ocupada pela Legião, comandante!
–Não se preocupe, Ives. Penso que Inge não corre perigo.
*******.
A Wodan fez uma travessia no espaço para impressionar Karis, e agora perdia altura vertiginosamente sobre Taônia. Por coincidência os xawareks decidiram atacar de novo. Regert viu que as naves não eram amistosas após cair a primeira bomba.
–Parece que estão atacando sua capital, Karis.
–São mais de quinze naves – disse Schultz.
–São os xawareks! Estão atacando meu país!
–Calma! – disse Regert – daremos conta deles. Alerta de combate!
A destruição das frágeis navezinhas inimigas foi um passeio para o caça CH-3 e a patrulheira AR-1, que as dizimaram. Não conseguiram soltar mais do que duas bombas, com o que os danos foram mínimos. Três inimigos sobreviventes fugiram para o espaço bem antes que a força aérea local pudesse decolar.
–Destrua-las! – disse Karis.
–Calma. Vamos atrás deles para ver de onde vieram.
*******.
–Os asgoths devem descansar, Al-Do.
–De acordo. Vamos procurar um local resguardado para acampar.
–Logo adiante há um bosque de phyndhos. Deve haver água, também.
Chegaram ao bosque de pinheiros. Seus corpos estavam doloridos após galopar horas intermináveis pela tundra gelada. Os asgoths que roubaram dos rebeldes corriam uniformemente, mas o esforço para segurar-se nas selas era cansativo.
–Onde estamos, Gamal?
–Perto do país dos Xarn. Daqui pode-se ver o início da vegetação ao sul.
–Isso é bom?
–Nem bom nem mau. Não simpatizam muito com caçadores como nós.
Apenas negociam e mais nada.
–Suponho que não haverá problema se passarmos a noite aqui.
–Não. Eles não saem à noite. Além do mais estamos longe das aldeias.
–Então vamos dormir. Faço a segunda guarda.
Aldo embrulhou-se nas peles e deitou no meio das rochas, caindo no sono.
*******.
As AR-1 encontraram-se a pouca distância do quartel geral dos rebeldes. O carro destruído ainda fumegava na saída da caverna. Os rebeldes acharam que era a Legião e atacaram com mísseis, que explodiram nos escudos sem ocasionar danos.
–Estes devem ser os rebeldes, doutor.
–Parece que sim. Aldo e Gamal estarão aí?
–Será difícil saber.
Do outro AR-1, Lobsang disse:
–Não consigo enxergar suas auras. Não estão aí; doutor.
–Não tenhamos tanta certe... – começou a dizer Ives.
–Se o rapaz disse que não estão aí, não estão! – interrompeu Adolphe.
–De acordo – disse Valerión.
Lobsang indicou uma direção:
–Para o sul! Conseguiram asgoths e armas e partiram a todo galope!
*******.
A Wodan e sua escolta alcançaram os xawareks, que foram refugiar-se numa nave-mãe de mais de duzentos metros de comprimento, orbitando à grande altura.
–Essa deve ser a base dos xawareks, Karis – disse Regert.
–É grande como uma montanha – disse o taoniano atônito.
–Nos descobriram – disse Schultz.
–Alerta de combate! Carreguem os tubos! Artilheiros a postos!
Karis admirava-se cada vez mais do poder ostensivo dos alienígenas.
–Ainda bem que estão do nosso lado – sussurrou Karis a um dos seus
decuriões – se tivéssemos que enfrentá-los...
Regert ouviu e disse:
–Depende de você que sigamos do seu lado, Karis. Do que pretende dizer sobre nós a seu imperador.
Karis não teve tempo de responder, porque a batalha estava começando.
As naves triangulares do inimigo, não eram rivais para o caça tripulado por Petersen, que já tinha se adaptado perfeitamente ao avião antártico e muito menos para Ives, a bordo da poderosa patrulheira AR-1.
Os pilotos deram conta do inimigo e a Wodan atacou à nave-mãe com lasers, abrindo buracos por onde o ar escapou. A nave, sem dúvida com armamento inferior, virou em redondo para se afastar, acelerando e abandonando os caças, mas não foi longe. Os disparos da Wodan acertaram nos motores, deixando-a à deriva.
–A nave não está armada – disse Regert – não esperavam ataque no espaço.
–São assassinos covardes. Atacam cidades e fábricas.
–Sei disso, Karis – Já são nossos.
A breve batalha estava no fim. Não restavam mais caças inimigos inteiros e Karis assistia à operação na ponte da Wodan com os olhos arregalados.
–Poderíamos abordá-los e fazer prisioneiros? – perguntou Karis – Precisamos de toda a informação possível.
–Não tenho homens suficientes para lutar e dominar a quantidade de inimigos que deve haver nessa nave. Tenho vinte e oito tripulantes a bordo e necessito de todos.
–Pena. Precisamos pelo menos um prisioneiro para arrancar as informações que precisamos – disse Karis.
Estavam chegando a pouca distância da nave-mãe, quando esta começou a lançar caças por uma das portas de hangar.
–Vamos tentar pegar um piloto. Regert para Petersen!
–Prossiga.
–Deixe um caça fora de combate. Quero um prisioneiro.
Petersen atirou nos motores de várias naves inimigas, que ficaram à deriva, enquanto Ives destruía o resto.
–Cinco prisioneiros são suficientes?
–Ótimo capitão. E a nave-mãe? Fica à deriva?
–Não tem condições de operar – disse Schultz olhando os sensores – estão no maior desespero, tentando reparar os danos. Sem ajuda, não saem dessa.
–Pode ser que tenham pedido ajuda à base deles em Japeto, onde eles têm sua base principal, segundo consta – disse Regert.
–Poderão atacar de novo, matar, destruir moradias, hospitais, fábricas...
–Tem razão, Karis – disse Regert – Armar torpedos!
–Torpedos armados; senhor.
–Fogo o número um!
Perante o assombro de Karis, uma esteira luminosa partiu da nave. Produziu-se um clarão à frente e a nave inimiga desapareceu.
–Grandes lagartos! – exclamaram os taonianos.
–Agora, Karis; vamos a Taônia para conhecer seu Imperador.
*******.
Aldo e Gamal acordaram ao raiar o dia com o barulho das patrulheiras.
–Estamos salvos, Gamal. Nossos camaradas nos encontraram.
Valerión foi o primeiro em desembarcar:
–Estás horrível; rapaz. Um asgoth mastigou tua cara e depois a cuspiu?
–Mais ou menos, Valerión.
–Jacques e Adolphe estão aqui. E Lobsang...
–Foi ele que encontrou vocês – disse Adolphe.
–Alan foi feliz em trazê-lo à Hércules – disse Aldo – o moço é especial.
–Vamos, Aldo. Tiramos as naves do gelo. Chega de passividade.
–Quero uma patrulheira, Valerión. Você e os outros cabem na outra.
–De acordo.
–Lobsang vai comigo, tenho coisas a fazer. Inge e Alvin estão na Hércules?
–Na aldeia. Foi ocupada, mas Inge não foi percebida; os vurians a protegem.
–Está bem. Ocupar-me-ei disso depois.
Gamal tirou as selas e rédeas dos asgoths, que soltou livres. Recolheram seus ralos pertences e levantaram o acampamento, embarcando em seguida.
*******.
A Wodan pousou no aeroporto de Taônia, escoltada pelas naves de Petersen e Ives. Regert e os taonianos desceram. As naves ficaram em alerta para o caso de ocorrer outro ataque inimigo. Karis disse:
–Vamos encontrar o general Byzar. Ele é o chefe da Guarda Imperial.
Subiram num veículo, que os levou pelas ruas da cidade até o Palácio Imperial, onde estava o gabinete do general.
Regert admirou a arquitetura e a grandeza do local. Ele nunca vira uma cidade que não fosse Germânia III. Em Enéas-1172 moravam no subsolo, em cavernas transformadas em arremedos de cidades.
*******.
–Suponho, capitão Regert, que conhece um senhor chamado Al-Do que possui uma arma poderosa como as suas. Ele é um subordinado seu?
–Não é. Consta-me que morreu.
–Receamos que não – disse o general Byzar – abrindo seu armário, e retirando uma garrafa e dois copos – beba comigo, capitão. Este vinho é de excelente safra.
–Não bebo. Disse que Al-Do ainda está vivo?
–É uma pena que não beba. Este vinho das Terras Cálidas é uma delícia. Sim, acreditamos que seu amigo está vivo. Seu corpo não foi encontrado no local do ataque e já enviamos uma expedição no encalço dos rebeldes.
–Um só dos meus caças pode dar conta desse serviço, general.
–Seus caças valem muito para desperdiçá-los caçando bandidos, capitão. A Legião pode dar conta disso. Suas naves serão para a defesa nacional, uma missão mais importante. Você viu o problema que enfrentamos. Karis passou-me o relatório do que você fez no espaço. Saiba que o Império está agradecido.
–Karis convenceu-me a ajudar. Agradeça a ele.
A expressão grave de Byzar suavizou-se.
–Karis terá a promoção que tanto merece.
–É um bom guerreiro – disse Regert – e muito sensato.
–Sim. Isto tudo leva-nos ao ponto principal.
–E este é?
–Contamos com você?
–Sim. Não permitirei que haja mais ataques.
Byzar suspirou aliviado. Bebeu o conteúdo do copo e encheu-o de novo.
–Repito que é uma pena que não beba, capitão. Vou chamar minha sobrinha, a última pessoa a falar com Al-Do antes de nos deixar.
Inclinou-se no comunicador:
–Mande a doutora Zhara entrar, por favor.
*******.
Regert ouviu a história de Zhara por meia hora no gabinete do general Byzar, que ouvia com atenção, apesar de já saber parte dela.
–Então, capitão Regert, o que eu disse é a prova que Al-Do queria nos ajudar contra os inimigos. Disse-me claramente que assim que descobrisse de onde eles vêm e quem eles são, encontraria uma forma de parar seus ataques.
–Sabemos de onde eles vêm, doutora; e já ganhamos uma batalha.
–Al-Do disse que combateria e eu sugeri a ele que nos ensinasse a construir naves como as de vocês, para atacar o inimigo onde ele estivesse.
–A idéia é boa, mas não funcionaria. Vocês carecem de alguns elementos que não podemos fabricar aqui, longe de nossas bases.
–Temos fábricas, cientistas... – interveio Byzar.
–Sei disso. Mas há tecnologias que vocês ainda não desenvolveram e outras que nem sabem que existem.
–Então... – a desilusão do general era comovedora.
–Algo pode ser feito – disse Regert com pena do homem – gostaria de marcar uma reunião com seus cientistas e meu engenheiro. Talvez possamos melhorar o que vocês já possuem.
–Imediatamente! – disse Byzar alvoroçado.
*******.
Em minutos, Aldo e Lobsang refizeram o caminho que no lombo dos asgoths, ele e Gamal demoraram um dia e uma noite para percorrer.
–Devíamos ter trazido Gamal conosco – disse Aldo – ele merece ver o que vai acontecer agora.
–E o que vai acontecer?
–A destruição do maldito covil dos rebeldes. Espero acabar com Suer Dut, devo-lhe estas cicatrizes.
–Foi açoitado?
–Sim. Escapei porque nasci num planeta pesado. O material daqui é fraco para nós, arrebentei as correntes. Podemos dobrar metais e pular dez metros. Temos cinco vezes mais força do que na Terra, Lobsang.
–Então era por isso que me sinto tão leve...
–Chegamos. Procure sondar suas mentes podres, quero saber se Suer Dut está.
Minutos depois, enquanto pairavam no ar sobre a entrada da caverna, de onde os bandidos já tinham retirado o carro destruído.
–O chamado Suer Dut não está. Foi à capital.
–Uma pena. Deve ter ido disfarçado para continuar seu trabalho subterrâneo. Bem, aqui não se aproveita nada, Lobsang.
Em seguida Aldo elevou-se numa ampla manobra e de longe soltou um míssil de cobalto na boca da caverna, gritando:
–Pelos mortos do trem; pelas crianças, as mulheres, e os que mataram antes!
“E o pássaro deixou cair seu mortal ovo, elevando-se ao céu. E na terra, o fogo os consumiu”.
*******.
–Não é possível copiar um caça CH-3 ou uma patrulheira AR-1 – disse Ives na reunião com cientistas taonianos e os troianos Regert e Píer Van der Grunn.
–Por quê? – perguntou o general Byzar, que fez questão de participar da reunião do alto da sua autoridade como representante do Imperador.
–A protofissão subatômica é uma técnica difícil de ser reproduzida aqui.
–Saiba senhor que aqui podemos fazer tudo. Tudo! – pulou o professor Wert.
–Muito bem, cavaleiro. Então me explique o que é um gaseificador de urânio e o que é um acelerador de elétrons; ou tenha a bem me dizer o que é a protofissão subatômica da antimatéria que move estas naves e qual é seu princípio científico.
Setenta doutores em todas as áreas do conhecimento olharam-se um a outro.
–E então, professor Wert? Sabe dar cor à TV? Sabe reduzir um computador ao tamanho de um livro? Pode ver e ouvir o que se fala aqui desde um avião em vôo?
Ives puxou seu computador de mão de dentro da sua armadura.
–Meu computador pessoal – disse – mais veloz do que os melhores daqui.
Byzar interveio, do alto da sua autoridade, para evitar maiores danos:
–Acho, senhores doutores, que devemos ouvir em silêncio o que nossos novos amigos têm para nos ensinar e só depois começar a fazer perguntas.
Um dos cientistas da área de história interveio:
–Antes de prosseguir quero saber porquê os terrestres estão mais avançados do que nós. Temos a mesma origem no cataclismo de Ran, deveríamos estar à par.
–Porque terrestres e troianos tivemos alguma ajuda externa, enquanto vocês não tiveram mais que a hostilidade dos xawareks – disse Ives.
–Vamos consertar isso – disse Regert, conciliador – e será a partir de hoje, se vocês tiverem a humildade de aceitar a nossa ajuda. Ao final somos todos humanos!
Após um silêncio prolongado, alguém começou a aplaudir, e em um segundo o clima transformou-se. Quando se fez o silêncio, Ives disse:
–Senhores, vamos à teoria. A protofissão subatômica se faz num gaseificador de urânio que dilui um preparado químico altamente ativo em peróxido de hidrogênio, aproveitando a reação em cadeia implosiva, controlada com mínima radiação com gerador de campo. Através de válvulas injetoras, passa à câmara de combustão onde deflagra, bombardeada por antiprótons. O simples contato entre matéria e antimatéria, faz com que a massa de ambas vire energia. Um grama libera 50 quilotons. Não sei como expressar esses valores no seu idioma.
–Ainda experimentamos a energia atômica – disse um cientista.
–O engenheiro Van der Grunn poderá atualizá-los. Ao que me consta, vocês estão bastante adiantados.
–Essa... Antimatéria... Não é muito perigosa? – disse um físico – sabemos que existe, mas não como conseguí-la, e muito menos contê-la.
–É contida com geradores de campo. Temos diagramas e vocês podem
construir um protótipo com o que têm.
–Há outro problema – interveio Regert – os materiais deste mundo são mais fracos que os da Terra, por causa da gravitação menor.
–Pode-se solucionar o problema, capitão Regert; – disse Ives – se usamos a técnica Hiperbórea. A Wodan é um exemplo.
–Tem razão, tenente. A Terra está mais adiantada do que nós nesse campo. Construiremos réplicas da Wodan e dos Horten. Será mais indicado para este planeta.
–De acordo, capitão – disse Ives – sua tecnologia é um pouco mais simples, e está de acordo com os materiais que podemos conseguir aqui.
–Contem com a indústria de Taônia, senhores – disse o general Byzar – agora vamos trabalhar!
*******.
–Leio na sua áurea que você sentiu prazer em matar.
Aldo pilotava a patrulheira em direção à aldeia vurians.
–Talvez, alferes, mas eles mereciam. Já matei muita gente melhor do que eles e agora não posso mais parar.
–Minha religião preza a vida.
–Talvez seus deuses me perdoem. Os meus não me perdoariam se não agisse.
–Se a justiça a ser cumprida fosse o perdão, assim será.
Lobsang tinha um dilema moral. Como budista não admitia tirar a vida de um ser vivente, fosse do planeta que fosse. Agora colaborara com seus dons para que Aldo tomasse providências contra os assassinos Yord. Além disso, meses atrás; achara o gerador de energia milkaro, que ajudou a desativar e com isso provocou a morte no espaço de inúmeros piratas, também assassinos. Apesar de ajudar a fazer justiça, não era isso que aprendera desde o berço. Não se justificava a privação da vida de um ser vivente, por malvado que fosse. Aldo estudara as religiões quando menino, junto com a sua mãe, uma médica e intelectual em várias áreas e percebeu o drama do jovem.
–Pense em quantas vidas se salvaram com a morte desses vermes.
–Tenho pensado.
–Chegamos – disse Aldo, empurrando os controles para frente.
*******.
De volta ao espaço.
–Sim, Aldo, alto e claro. Estamos na Hércules, no fundo do lago. Regert levou a Wodan para Taônia. Ives foi junto.
–Vou pegar Inge e Alvin, Regina. Decolem e me encontrem em órbita.
–Cuidado, querido, a aldeia está ocupada pela Legião.
Inge recolheu seus pertences e com ajuda de Ruddah e sua criada Nagol, se dispôs a abandonar a aldeia que tinha sido seu aconchegante lar por tanto tempo.
–Não podem nos deixar, Rainha. Nos deram sorte, nunca tivemos tanta caça, tanta comida... – disse Lian-Ee.
–Temos que ir – respondeu Inge com tristeza – nossa presença já não é secreta e pode prejudicá-los se souberem que nos ocultaram. A Legião é uma prova disso.
–Eles não incomodam, Rainha. São educados, sempre nos protegeram...
–Por enquanto. Melhor ir embora, e com isso a Legião também irá.
–Mas para onde vocês levarão nosso príncipe?
–Não longe. Para cima, para o céu. Ficaremos de olho em vocês – disse Inge.
Um estrondo no céu cortou a resposta de Lian-Ee. Aldo e Lobsang pousaram nas proximidades das cabanas novas; perante a surpresa de legionários e aldeões.
–Chegou meu marido! – disse Inge, pegando seu filho.
A patrulheira pousou, derretendo a neve. Os terrestres pularam ao chão com armaduras. Aldo tinha a pistola no coldre e Lobsang um fuzil marciano, convencido a duras penas de que estava fazendo a coisa certa. Encaminharam-se à cabana de Aldo e os legionários tentaram detê-los. Aldo e Lobsang pularam por cima. Os soldados atiraram e as frágeis balas taonianas espatifaram-se nas armaduras. Aldo entrou e
Lobsang ficou na porta.
–Vamos, Inge. Rápido! Recolheram tudo?
–Sim. Ruddah e Nagol vão conosco.
Com Aldo na frente e Lobsang na retaguarda, correram para a nave rodeada de legionários. O decurião ordenou atirar neles.
–Atira nas armas deles, Lobsang.
Lobsang obedeceu e as armas dos legionários explodiram. Aldo puxou sua pistola e abriu dois buracos no chão gelado, provocando a debandada dos soldados.
–Subam, rápido – disse Aldo, desligando o campo de força.
Em seguida estavam todos a bordo. Aldo sentou na cadeira de pilotagem e a graciosa nave elevou-se em meio de nuvens de vapor de neve derretida.
*******.
Os legionários acampados na beira do lago esquentavam-se com uma fogueira, quando superfície congelada começou a rachar-se e levantar-se. Depois pareceu ferver e uma nuvem de vapor escapou a grande pressão, fazendo um buraco no gelo. Eles nunca esqueceriam aquele dia. Como um monstro pré-histórico, a Hércules surgiu dentre o gelo, rachando-o num barulho ensurdecedor e elevou-se num pandemônio de água fervente e vapor.
Assim que a Hércules esteve a boa altura, ligou os motores e lançou-se á frente. Então quatro formas negras surgiram do buraco do gelo e aceleraram em pôs da sua nave-mãe.
Tom Cikutovitch, Ivan Kowalsky, Alan Claude Sarrazin e Nebenka Marusitch pilotavam os caças CH-3, atrás da Hércules, que já se encontrava com a patrulheira de Valerión, Jacques, Adolphe e Gamal. Todos subiram para a órbita onde a patrulheira de Aldo e sua família esperava.
*******.
–Bem-vindo a bordo, Alvin de Titã! – disse o comandante Boris.
Alvin era pequeno demais para perceber diferenças, mas a bruxa, a menina e o caçador, estavam perante deuses. Após embarcarem, reiniciou-se a atividade a bordo.
–Aldo para Marnes! Providencie roupas adequadas para nossos convidados e ensine a eles como funcionam os chuveiros e os escusados. Aldo para Regina! Chama as naves que faltam, quero que venham para cá imediatamente. Boris! Estamos numa órbita muito baixa, vamos subir a dois raios do planeta.
Lídia maximova apareceu no corredor:
–Capitão! O quê lhe aconteceu?
–Tive problemas. Vou ao banho e logo quero uma plástica. Veja como estou!
–Está feio, capitão. Foi torturado?
–Sim. Acho que tenho uma costela quebrada. Estou com dor no peito.
–Vou preparar tudo. Venha à enfermaria após o banho.
–Aldo para Mudo! Prepare uma comida, estou morto de fome. Qualquer coisa com carne, para depois que sair da enfermaria.
–Muito bem, senhor.
Inge já amamentara e acomodara o bebê no beliche superior do camarote do capitão, que Dreisen adaptara para a segurança do pequeno. Agora tirava suas quentes roupas nativas, quando Aldo entrou, sem armadura.
–Não sabes que te deram por morto? – disse ela.
–Não achei que isso se saberia nas Terras Frias. Onde está meu filho?
–Aqui encima. Já mamou e está dormido.
–Pequeno príncipe!
–Nosso novo grumete.
–Sim. Será que cabemos nós dois nessa ducha?
*******.
Continua em: OS TIGRES
*******
O conto ABRINDO O JOGO forma parte integrante da saga inédita
Mundos Paralelos ® – Fase 1, Volume 3, Capítulo 22, Páginas 70 a 78, cujo inicio pode ser encontrado no Blog Sarracênico - Ficção Científica e Relacionados, sarracena.blogspot.com
O volume 1 da saga pode ser comprado em:
clubedeautores.com.br/book/127206--Mundos_Paralelos_volume_1