ILITH

ILITH

Miguel Carqueija


A reunião na sala anfiteátrica começara há poucos minutos, presidida por um indivíduo alto, magro e pálido, de antenas longas e muito nervosas. Nem todos os membros do Conselho de Sábios, ali presentes, portavam antenas, já que nem todos eram da raça velka. A maior parte, porém, pertencia á raça de Ifenio.
No centro do anfiteatro, sob os olhos de todos os presentes, o gigantesco holograma simulava todo o problema que estava sendo enfrentado.
— A frota Sbug pretende tomar posse deste mundo futuro, por ser ele um nó nas linhas cósmicas de espaço-tempo-energia. Já sabemos disso há tempos. Como podem ver na simulação, dezenas de naves-mãe em forma de charuto irão se reunir por trás do satélite da Terra, preparando o ataque final. Nossa sondagem chega a esse ponto e não vai além.
— É claro — observou um homem mais velho e atarracado, de antenas amareladas e gastas. — Nossos inimigos calcularam a deslocação para uma época fora do alcance da sondagem, ou melhor, no limite extremo; e mais além não foram porque a limitação também atinge a eles.
O homem de longas orelhas elficas deu o seu palpite:
— O planeta em questão não pode ser avisado?
— Um mundo sem acesso à tecnologia de espaço profundo? Não estão preparados para isso.
— Não temos condições no momento para equipar uma frota que possa ir de encontro aos sbugs, pela linha de deslocamento espaço-temporal. Eles fizeram isso no maior segredo.
Uma jovem de cor achocolatada, sem dúvida a pessoa mais nova do grupo e uma das poucas mulheres, tocou o botão pedindo a palavra e, uma vez concedida, ergueu-se em sua pouca estatura e falou:
— Uma câmara de estase pode dete-los, amigos. Não há necessidade de uma frota.
— Pensamos nisso — disse o presidente da sessão — mas implica um grande risco de sacrifício pessoal para a pessoa que for na estase ao futuro. Estases podem ser destruídas, como sabem.
— E eu refleti maduramente nesse assunto, meu pai — respondeu a garota. — E ainda me parece a melhor solução, que põe em risco direto apenas uma pessoa, e não muitas. E com maior chance de êxito, pois batalhas espaciais podem ser facilmente perdidas. E, naturalmente, eu irei.
— Ilith... você é jovem demais — replicou o pai da jovem.
— Isso não importa, pai. Eu irei. Reivindico a minha prioridade por ter feito a sugestão. Como membro do Conselho de Sábios estou em pé de igualdade com todos, não esqueçam, independente de ser mais jovem que todos. E os cálculos que fiz me dão ampla possibilidade de êxito, já que a Federação Sbug, até onde nós sabemos, não domina a tecnologia de estases.
— Eu me oponho a isso — disse o orelhudo do planeta aliado Celem. — Podemos enviar robôs, não havendo a necessidade de arriscar pessoas.
— Não — disse Ilith com firmeza. — Haverá uma série de providências a tomar que robôs não seriam capazes ou confiáveis. Além disso, a estase é a minha especialidade. Todos sabem das muitas sondagens que efetuei no Tempo, e as monografias que produzi sobre este assunto é que me garantiram o ingresso no Conselho.
Alguns sorriram. Era a pura verdade. Não existia favoritismo no Conselho, ninguém poderia entrar nele sem reais aptidões científicas, pois não conseguiria produzir nada de útil. Somente grandes cientistas ali se encontravam, e a precocidade de Ilith fôra definitivamente reconhecida.
Ela já era conhecida como “a princesa que viaja pelo tempo”.
O Conselho aprovou a missão. Ilith cumprimentou a todos e, acompanhada pelo pai e por alguns técnicos especializados, dirigiu-se ao laboratório para orientar as primeiras providencias em relação à cápsula de deslocamento espaço-temporal.
A sorte da Federação Cosmos, da qual fazia parte a raça Velka de Ifenio, estava lançada.



Nota: este conto é a prequela (sequência anterior) de "O moinho e o tempo", conto publicado nesta escrivaninha em 27 de maio de 2013.