Uma Carta do Futuro

Carta Ao Presidente Americano

A Sua Excelência o Senhor

Barack Obama

Presidente dos Estados Unidos da América

Caro Presidente,

Inicialmente, devo humildemente me apresentar. Pode me chamar pelo meu codinome, Homem do Futuro. Lamento ir contra as suas expectativas, mas a mensagem que venho por meio desta trazer não é de um mundo que acabou através de uma das suas guerras. O mundo acabou sim, mas por causa de um asteroide que se chocou com a Terra no ano de 2062. Embora, as guerras, o aquecimento global, o desmatamento da Amazônia, entre outros fatores, tenham contribuído para um extermínio em massa de um terço da população do planeta, o asteroide sozinho matou os outros dois terços. Restando apenas centenas de sobreviventes aos quais eu me incluo.

Presidente, dirijo essa mensagem a vossa excelência, pois é de meu conhecimento sua notoriedade em sua era. Se essa máquina do tempo dos anos trinta ainda estiver funcionando corretamente, essa carta vai chegar à caixa postal da Casa Branca, exatamente às onze horas da manhã do dia 20 de abril de 2014. Minha intenção é que o Presidente ao ler tome as devidas ações juntamente com a NASA para daí quarenta e oito anos poderem destruir o asteroide e salvar o mundo. Pois, nós sobreviventes, não teremos força para nos multiplicar e continuar a historia, uma nova historia da humanidade.

Vou contar em detalhes como tudo aconteceu. Dessa forma, pretendo comovê-lo a pensar, ao menos, em seus descendentes se é que quer que eles existam em algum momento no que para Vossa Excelência é futuro e para mim é um tenebroso presente.

...

Da catástrofe não me lembro de muita coisa. Só me lembro de que algumas horas antes a mídia estava em absoluto pasmo com a notícia que ela transmitia. Nossos inúmeros satélites, toda aquela tecnologia, nada detectou a chegada de um asteroide tão grande na orbita da Terra. Quando conseguiu já era tarde e só restava a todos, sem distinção, aqueles que tinham fé pedir remissão de seus pecados e os que não tinham experimentarem todos os pecados que não tiveram tempo de consumir antes.

De repente, o sol ficou pequeno diante da bola de fogo que invadia nossa atmosfera e daí em diante não me lembro de mais nada.

Todas as minhas outras lembranças começam depois que o mundo acabou. Naquele dia levantei-me, ainda atordoado com a explosão e todo sujo. Olhei para tudo a minha frente como um pescador que olha o horizonte em pleno alto mar e não vê nada além de si mesmo refletido na água e a sua frente, mar e apenas mar. A única diferença é que ao invés da água me vi refletido no sangue e não havia mais nada a frente, além de escombros e corpos.

Presidente, andei dezenas de quilômetros até encontrar uma pessoa. Era uma senhora de muita idade chamada Esther que com certeza viveu em seu tempo e te viu pela televisão. Ela estava muito machucada. Tinha feito uma fogueira para preparar alguns alimentos. Como toda floresta a que tenho notícia estava destruída e também quase todos os animais da fauna mortos, a opção era comer cadáveres seja de humano, de cachorro, de cavalo, o que tivesse. Fiz companhia para ela durante uma noite, jantamos e depois de saciados dormimos até o sol brilhar no céu. Pela manhã me despedi da boa senhora e segui meu caminho.

Durante a longa estrada pensei sobre a historia do homem e comecei a questionar coisas simples, porém fundamentais. Porque dêmos tanto valor a coisas materiais? Foi passando por cima de um capô de uma Ferrari que pensei nisso. E porque nos preocupamos tanto com beleza? Essa reflexão foi ao tropeçar na cabeça de uma moça muito bela. Pensei também ao ver um colar de diamantes em seu pescoço. Porque nos corrompemos até por simples pedras? No entanto, não resistir e pus o colar no bolso.

Enquanto andava não era do meu carro, da minha casa, de quanto dinheiro eu tinha na carteira que me lembrava, nem que eu tentasse não conseguiria me prender a esse tipo de recordação. Era da minha família, do amor que tínhamos um pelo outro, era dos momentos felizes que vivemos e até mesmo dos difíceis, mas que superamos. Quando eu cruzava uma fronteira, (por que cruzei muitas fronteiras a procura de uma civilização sobrevivente, de algum lugar que o asteroide não tenha atingido com tanta força destrutiva), quando eu cruzava essas fronteiras não pensava que poderia encontrar argentinos ou uruguaios, e sim irmãos, homens a quem eu pudesse me unir e com eles começar um mundo novo. Foi quando caí na real, que as divisões territoriais eram um erro.

Caro Presidente, senti-me como um homem das cavernas. E foi assim, na condição de um homem sem comida, sem nenhum bem, que entendi o que eles sentiam há tantos milhares de anos atrás. Não era desejo de expandir terras, nem conflitos religiosos e nem intrigas entre países. Sentiam necessidade de encontrar alimento, depois procuravam algum lugar livre de perigos, e eram muitos perigos. E por último, mas principalmente o desejo de encontrar alguém de sua própria espécie e quando isso ocorre, o que geralmente acontece com alguém em minhas condições é criar laços fortes, de família, amigo ou homem e mulher.

Foi isso que aconteceu quando cheguei ao Chile, conheci Maria da Glória, que por sua vez, já havia encontrado mais umas cinquenta pessoas dentro de uma caverna e formando ali ao redor uma pequena comunidade. Com Maria tive um filho e lutamos diariamente pela nossa sobrevivência com os poucos recursos que nos restou.

Ontem, ao procurar comida dentro de uma gruta encontrei uma caixa do tempo muito antiga, uma máquina inventada nos anos trinta, 2033 para ser mais exato. Com ela podemos deslocar pequenos objetos em qualquer lugar no tempo-espaço desde que esse objeto seja constituído por átomos, ou seja, como qualquer coisa que conhecemos. Não posso te explicar tecnicamente como ela funciona, por que não tenho esse conhecimento, não fui físico, fui escritor antes da catástrofe. Mas se a Vossa Excelência estiver lendo essa carta essa é a prova de que a máquina funciona.

Presidente, pelos seus bisnetos salve o mundo. Mande construir um grande lança míssil ou um airbag gigante, para destruir o asteroide. Por outro lado, ainda mais importante que destruí-lo, busque pessoas influentes como o senhor e com eles construa um mundo novo, sem guerras, sem preconceitos, sem muros, sem distinções e com muito mais amor. Caso contrário, deixe que o asteroide destrua a Terra. É melhor morrer sem esperança do que sem amor.

Respeitosamente,

Homem do Futuro.

Guilherme Sodré
Enviado por Guilherme Sodré em 26/04/2014
Reeditado em 16/06/2014
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