Alguém vela por mim

- Vai sair, Dima?

Dmitry Alekseev parou no meio do hall de entrada da casa da família, em Moscou. Lá fora chovia. Olhou ao redor, mas não viu sinal de Olga Borodina. Talvez estivesse na cozinha.

- Vou, mãe.

- Então leve o guarda-chuva - ouviu-a dizer.

O Pioneiro ia estender a mão para pegar um guarda-chuva quando uma campainha tocou. E novamente.

Dmitry Alekseev acordou em sua poltrona de pilotagem. O zumbido vinha do painel à sua frente: uma lâmpada vermelha piscava insistentemente. Apertou um botão e o barulho cessou. Na sequência, a tela do vidicom acendeu-se, exibindo um relatório técnico.

- "Eco fantasma"? - Leu ele intrigado.

Dizia o relatório que o Posto Avançado Novaya Zemlya 4, o mais próximo dele, havia detectado uma duplicação no sinal emitido pelo transponder da nave e sugeriam alguns procedimentos para verificar se havia algum mau funcionamento no sistema.

- Rodar o autoteste, tudo bem... mas desligar o transponder? Essa é nova! - Resmungou ele.

Ajustou o transmissor para a frequência do Posto Avançado, verificou que o retardo seria de pelo menos uma hora e disse:

- "Mensageiro das Estrelas" para Posto Avançado Novaya Zemlya 4, fala o Pioneiro Dmitry Alekseev. Recebi seu relatório prioridade Zero Alfa. Peço confirmação do procedimento indicado. Desligar o transponder exige atividade extraveicular. Câmbio.

Como teria muito tempo até que chegasse uma resposta, deixou o autoteste do transponder rodando e saiu da cabine de voo, para tomar uma ducha e comer alguma coisa.

* * *

- Não gosto da ideia - disse a coronel Larissa Yevgenievna, à cabeceira da mesa de reuniões. Sentado à sua direita, Osip Yegorovich, supervisor de sensoriamento, apenas balançou a cabeça em concordância. Do lado oposto da mesa, o major Spiridon Vladimirovich, chefe da Inteligência de Novaya Zemlya 4, rabiscou algo nos papéis que tinha à sua frente.

- Não há outra alternativa, camarada coronel - disse o oficial. - Para determinar a natureza do que temos pela frente, é necessário que o "Mensageiro das Estrelas" saia da detecção. E isso só pode ser obtido com o desligamento do transponder.

Larissa Yevgenievna apoiou os cotovelos na mesa e entrelaçou as mãos.

- Estamos falando de um período mínimo de quatro a seis horas em que a nave do Pioneiro ficará fora do alcance. E se surgir um problema nesse ínterim?

- A possibilidade de que algum problema possa ocorrer em pleno hiperespaço durante esse tempo é reduzida, para não dizer desprezível, camarada coronel. Os sistemas da nave estão sob monitoração constante, apesar do retardo provocado pela distância. Nada indica que possa ocorrer uma falha crítica justamente agora - asseverou Spiridon Vladimirovich.

- Mas, se bem me lembro, ele terá que sair da nave para realizar o procedimento - ponderou a comandante de Novaya Zemlya 4, encarando seu subordinado.

- Verdade, camarada coronel - respondeu o oficial. - Por medida de segurança, não há como desligar o transponder de dentro da nave. Todavia, o Pioneiro Dmitry Alekseev é um veterano e já realizou atividades extraveiculares no hiperespaço em outras duas ocasiões. Não podemos dizer que será uma novidade para ele.

- Mas nunca fez isso com o transponder desligado - insistiu Larissa Yevgenievna.

- Verdade - concordou o major. - Mas se algum problema houvesse ocorrido então, nada poderíamos ter feito para ajudar. A informação serviria apenas para fins estatísticos.

- É fato - disse a comandante, dando-se por vencida. E voltando-se para o supervisor que ouvira a conversa sem pronunciar palavra, determinou:

- Osip Yegorovich, você irá informar ao Pioneiro que faça o procedimento indicado pelo camarada major. Todavia, não é preciso explicar o que pretendemos fazer enquanto o transponder estiver desligado.

- Mas, camarada comandante... essa ordem é bastante incomum. Certamente ele vai querer saber a razão de ter que executá-la - disse o supervisor.

Larissa Yevgenievna espalmou as mãos sobre a mesa.

- Diga-lhe apenas que estamos recebendo um eco fantasma. É o suficiente.

[30-03-2014]