Parte da família
Amanda acordou no segundo toque do telefone. Puxou a máscara de dormir do rosto e viu que já era dia claro. O telefone tocou pela terceira vez.
- Mamãe? - Perguntou, colando o fone ao ouvido.
- Oh! Bom dia, minha filha! - Respondeu a voz distante do outro lado da linha. - Você não estava dormindo, estava?
- Não estou mais, mamãe.
Olhou para o relógio: dez da manhã. Ainda bem que era domingo...
- Você disse que me ligaria às nove - prosseguiu a voz distante. - Como não ligou, esperei mais uma hora.
- Claro, mamãe - respondeu Amanda, afastando os lençóis de cima de si. - Desculpe. Eu fui dormir tarde essa noite. Muitas coisas para checar antes da viagem...
- Eu não queria te atrapalhar, - disse a mãe - mas preciso ter notícias suas. Você quase não liga e raramente escreve. Vai vir me ver antes de viajar?
- Sim, mamãe. Claro. Eu irei. Acho que já tinha dito que o faria...
- E vai trazer o Benjamin?
Amanda hesitou um momento antes de responder:
- O que tem o Benjamin, mamãe?
- Você vai trazê-lo? Ele vai viajar com você, suponho?
- Sim, mamãe. Somos uma equipe, ele é meu auxiliar. Mas...
- "Mas..."?
- Por que eu deveria levar o Benjamin? Ele não é...
Hesitou novamente.
- "Ele não é parte da família"? É isso o que ia dizer?
Era impressão ou detectara um ligeiro tom de reprovação na voz da mãe?
- Ah, mãe. De novo essa conversa. Por que todos que eu conheço... e os que não conheço também... querem que eu tome uma decisão?
- Talvez seja porque você esteja demorando muito para tomá-la, Amanda.
- Mamãe, por favor! A minha vida não tem estado fácil de uns meses para cá. O meu dia a dia é estressante, mesmo não fazendo trabalho de campo - e agora fui designada também para trabalho de campo!
- Que era tudo que você sempre sonhou - atalhou a mãe.
- Verdade. Eu sempre quis fazer trabalho de campo - respondeu Amanda, olhando para o teto pintado de branco.
Ficou alguns momentos em silêncio, sentindo o corpo relaxar e uma certeza invadir-lhe a mente.
- Mãe?
- Estou aqui - respondeu a voz.
- Creio que já tomei uma decisão - disse ela.
E depois, mais devagar:
- Vou levar o Benjamin para conhecê-la.
- Que ótimo, minha filha! - Exultou a voz distante.
- Por enquanto, essa é a minha única decisão, mãe.
A voz distante não se deu por vencida:
- É um primeiro passo!
[20-10-2013]