Sobre o fim do universo (e o que vem depois)

O Alto Conselho reuniu-se no Grande Anfiteatro para ouvir a leitura do relatório final da Academia de Ciências. Entre os conselheiros de togas brancas que lotavam as arquibancadas, a opinião generalizada é que a conclusão dos trabalhos se estendera em demasia, mesmo com o recurso de computadores quânticos capazes de dar respostas para perguntas que nem haviam sido feitas.

- Chegamos a um consenso - disse o chefe dos pesquisadores, posicionado-se em frente a tribuna do presidente do conselho.

- Ótimo! E então, como será o fim do universo?

- Por morte térmica - afirmou categoricamente o chefe dos pesquisadores. - Em cerca de 100 trilhões de anos a formação de novas estrelas chegará ao fim. E daqui a 1 quatrilhão de anos, a própria matéria entrará em decadência. O futuro longínquo será escuro e gelado - para todo o sempre.

Os membros do Alto Conselho entreolharam-se.

- Cem trilhões de anos? - Indagou o decano dos conselheiros.

- Sim, Vossa Grandiosidade - respondeu o chefe dos pesquisadores, esticando o pescoço para ver melhor.

- Precisamos começar logo - ponderou o decano. - Sabe como as pessoas daqui tem o mau hábito de procrastinar.

Os conselheiros assentiram gravemente.

- Temos condições técnicas de sobreviver ao processo de morte térmica? - Indagou o presidente.

- Sim, Superlativa Grandiosidade - disse o chefe dos pesquisadores. - A nossa proposta é criar um novo universo, onde possamos reconstruir nossa civilização. Ou mais de um, já que isso melhora as probabilidades de sobrevivência.

- Estes novos universos seriam independentes? - Quis saber o decano.

- Totalmente independentes - assegurou o pesquisador.

Os conselheiros entreolharam-se.

- Poderíamos ser demiurgos - ponderou o presidente do conselho, olhando para o teto do anfiteatro.

- Tirou as palavras da minha boca - retrucou o decano.

- Então, - prosseguiu o presidente - do que precisamos para começar?

- Temos um projeto para drenar o Subverso - informou o pesquisador. - Ele pode nos fornecer toda a energia de que precisamos para os processos de criação de novos universos.

- Permitem-me um aparte? - Disse um conselheiro, erguendo-se de uma das fileiras superiores do anfiteatro.

- Pois não, conselheiro Juvenal? - O presidente não pareceu ficar muito satisfeito com a interrupção.

- Sei que esse assunto é polêmico, - disse Juvenal, elevando a voz - mas o Subverso não é habitado? Por criaturas sencientes? E vamos queimá-lo como combustível para resolver o nosso problema de continuidade?

- Conselheiro Juvenal, - retrucou o presidente - nossas escalas de tempo em relação ao Subverso são tão díspares que seus habitantes talvez levem centenas de bilhões de anos para perceber o que está acontecendo.

- Sem contar que, graças a nossa intervenção, eles não vão correr o risco da morte térmica - ponderou o decano.

- Exatamente, Vossa Luminosidade - corroborou o chefe dos pesquisadores. - O Subverso atingirá um ponto máximo de expansão e depois começará a se contrair. Toda a sua matéria se concentrará num ponto infinitesimal e depois começará a se expandir novamente, criando um novo ciclo de existência.

- Viu, conselheiro Juvenal? - Ponderou o presidente do conselho. - Não há que lamentar a sorte dos habitantes do Subverso; de um modo ou de outro, eles já estão condenados. E se isso contribuir para a nossa sobrevivência, que mal pode haver?

Juvenal olhou ao seu redor. Nos rostos da maioria, reinava a indiferença; alguns pareciam até hostis. Era fácil constatar que estava isolado em sua posição.

- Muito bem - disse ele. - Que fique registrado que considerei um erro lamentável o uso do Subverso como fonte de energia.

- A sua objeção foi computada, - respondeu o presidente - mas é preciso seguir adiante.

Ergueu-se na tribuna, dando as costas para a arena e encarando as arquibancadas repletas de conselheiros.

- Todos de acordo com o uso do Subverso como fonte de energia para a criação de novos universos?

Um a um, os conselheiros foram erguendo-se em seus lugares. O único a permanecer sentado foi Juvenal.

- A moção foi aprovada - sentenciou o presidente.

[12-09-2013]