Cidade de Céu Cinza; Cartas para o Futuro 01

Cidade de céu cinza.

Pessoas são esmagas nesse lugar, esmagas como migalhas de biscoito. Aquilo que nasce e cresce enviesado não pode ser endireitado. Cresceu assim, e nunca vai mudar. Meu nome é Aiden -- o apocalipse foi vislumbrado com todo ardor. Nuvens cinza, agora, permanecem lá em cima até que um dia tudo seja reconstruído. Eu perdi tudo para as bombas -- nós perdemos tudo para as bombas.

Todos que eu conhecia estão mortos ou morrendo. Agora o que me resta é minha companheira, Pan, amada cadela vira-lata. Sem comida, em breve morreremos também. Quem sabe eu morra primeiro e ela consiga comer minha carne. Poderia muito bem ter feito dela meu almoço -- Eu admito que nesse ponto, isso me havia passado pela cabeça -- mas não conseguiria comer a única coisa que ainda fica feliz em me ver. A única coisa que consegue me reconhecer. Pan é uma boa amiga, e já me salvou dezenas de vezes. Um ser mais nobre que todos nós. Como poderia fazer? Nunca imaginaria que essa pequena criatura portaria tanta força de vontade. Pobre animal, condenado ao sofrimento por algo que desconhece. Penso o pecado que cometemos ao infligir toda essa desgraça a absolutamente todos os seres vivos desse planeta. É completamente injusto como morrem desconhecendo o motivo... Que Deus nos perdoe.

Pan às vezes me lembra de Ellie. Sempre alegre e energética, mesmo quando não parecia haver sentido. Minha querida filha tirada de mim pela radiação. A besta moderna que levou minha ultima bala do revolver cravada na alma de Ellie, deixando somente seu corpo sem vida. O ultimo presente sádico.

Espero que a pessoa que desenterre essa carta olhe para o céu azul, e não cinza. Para o chão verde, não cinza e vermelho. Que possa respirar e não encher seus pulmões de cinza. Que essas futuras gerações possam, com raiva e amor parcial, reconstruir o que destruímos com tanta devoção. Que nos vejam como uma multidão pútrida que semeia o solo para que algo melhor -- e dessa vez correto -- possa crescer. Podem se pegar com uma simpatia crescente, mas não devem me perdoar ou gostar de mim, pois o que fizemos é completamente injustificável.

Hoje me dei conta de que é meu aniversário. Parabéns para mim – –

Que os demônios se tornem anjos.

Aiden Lee

__Documento de propriedade da Biblioteca Comunitária da Enclave, Cidade-fortaleza. __

Descoberta: Lucy Gustav. Localização: Antiga escola primária, Nova Iorque; Terra; Ano 27 d.W.W.3.

Cartas para o futuro; “Aiden; cidade de céu cinza”.