O MISTÉRIO DAS SEXTAS FEIRAS

Meu Deus do céu! Faz quase quatro horas que estamos sem luz. As lâmpadas de emergência já terminaram sua carga e eu aqui assim, sem saber o que fazer. Acho que vou pegar o carro e vou pra Capão da Canoa, pelo menos lá tem a praia e posso dar umas voltas para espairecer. Foi o que pensou “Ju”.

Pegou o carro e ficou horrorizada com o estrago que a tempestade fizera na região. Árvores arrancadas, postes caídos, a casa sem telhado... tudo era um caos, como estava sendo sua vida depois da partida de Romeu.

Quando chegou em Capão da Canoa Julieta tratou logo de se recolher em seu apto sito à Beira Mar. Era uma herança de família que seus pais haviam deixado “gravado” com algumas cláusulas de não venda. Seria sempre repassado aos filhos, netos, bisnetos, herdeiros legítimos. Julieta sabia que Romeu não ficara com ela porque tudo estava limitado a estas cláusulas testamentais que seus pais haviam deixado com a empresa que administrava os bens. E Julieta como não tinha filhos não podia aumentar sua retirada e usufruir de outras vantagens que a situação proporcionaria.

No início o amor dos dois fora de novela. Daqueles em que até filmes se faz. Quando tentaram filhos, os médicos alegaram que um dos dois era estéril. As brigas começaram e Romeu não quis nem saber. Dizia que o problema era com ela. Machista como ele, pensava que esterilidade era falta de masculinidade (macheza como dizia). Julieta estava realmente se tornando muito chata na sua concepção. Iria distribuir seu “cheiro” por outros lados. Por isto precisava do estoque de perfumes franceses...

Não havia dito nada a ninguém, mas durante sua vida em comum com Julieta, Romeu juntara algum dinheiro que colocara numa conta no exterior. Não era muito, mas daria para viver bem até que arrumasse outra que lhe sustentasse. Ele não era bobo. Pensou em Capão posso encontrar uma viúva rica, uma aposentada que tenha heranças e que não fique chorando por “quatro caraminguás”, como fazia Julieta, na sua concepção.

Romeu é um homem muito bonito, mas daqueles que o caráter passou longe. Pensou em Capão ela não me encontrará. Sempre reclamou da cidade e de que ali não tem nada para fazer, fora do verão.

Comprou um pequeno apartamento com três quartos, vista para o mar, piscina, elevador, garagem para dois carros. Ele nunca pensou pequeno e isto era pequeno pra ele. Valia à pena investir. Se não morasse bem como criar uma “arapuca”? E em Capão o que mais existe é “quero-quero” e “coruja”... Ele fazia uma associação dos animais à beira-mar com as mulheres a quem pretendia dirigir os seus encantos.

Encontrou não uma “coruja”, mas muitos “quero-quero”. Com lábia e sedução foi envolvendo Dulcemar, Maria Tereza e Rosângela. Começou a investigar as que mais vantagens poderiam lhe oferecer. No início não dizia onde morava. Queria conhecer os espaços delas e as vantagens que poderiam oferecer. As que não fossem vantajosas seriam descartadas.

Para manter uma fachada arrumou um emprego como corretor. Imóvel é uma boa pista, pensou.

Julieta no outro dia resolveu caminhar pela praia. Estava um belo dia de sol, mesmo sendo outono. Não tinha vento e nem fazia frio. Olhava tudo e via o quanto a cidade havia crescido, desde que herdara aquela linda cobertura em Capão da Canoa e que pouco usava. Geralmente alugava para a mesma família de amigos que ali passava o veraneio. Por isto quase não vinha à cidade.

Começou a pensar que poderia pelo menos passar mais tempo por ali, ou então alugar para o ano inteiro. Tudo era apenas reflexão na cabeça dela.

Resolveu ligar para Zoldinha e a convidara para passar com ela, ali, uns dias na praia. A amiga relutante aceitou seu pedido. Dois dias depois estavam as duas juntas dando uma geral e modernizada na cara do apartamento. Precisavam de coisas para fazer, e esta foi uma forma de passar o tempo, entre as fofocas do dia a dia, a depressão de Julieta e sua falta de perspectivas para o futuro. Afinal já estava com 35 anos.

Certa noite, sexta feira, resolveram ir no ArteCafé, visto que o local estava se tornando “point” na cidade, pós-veraneio. Ficaram num canto, o mais discreto possível, para que pudessem papear, beber um vinho e escutar uma boa música.

De repente chega Romeu com uma “fulana” como pensou Julieta (era Dulcemar). Quase caiu da cadeira. Depois quase saltou em cima dos dois, no entanto foi contida pela amiga e tentaram disfarçar e só observar. Romeu ficara no local não mais que uma hora. Foi embora logo em seguida.

Passada uma meia hora voltou ele com outra. Era Maria Tereza, na concepção de Julieta, outra “galinha”. A cena se repetiu e novamente ela foi contida pela amiga que a fez pensar na possibilidade de observar e juntar dados sobre a situação... Ele também ficara pouco tempo desta vez.

Já passava da meia noite quando as duas pensavam em ir embora, visto que o local estava a mil, mas Julieta estava arrasada. Quando novamente entra Romeu, agora com Rosângela. Desta vez Julieta nem cogitou em se levantar ficou observando a cena romântica entre o casal que ficou no local até quase duas horas da manhã. Só quando eles foram embora é que as duas também puderam sair.

Zoldinha teve a seguinte ideia, seguir os dois. E foi o que fizeram.

Romeu sem perceber que era espionado levou Rosângela para o seu apartamento. Agora Julieta sabia onde ele morava. Começou a arquitetar um plano para descobrir as falcatruas do vigarista... Agora sim, ela iria se vingar do canalha.

E tudo iria começar com a inclusão de Alfredo em sua vida, um surfista lindo que mora em seu prédio. Ela o tinha visto ontem, mas esquecera desta informação que agora vinha à tona como valiosa, aliado ao fato de que sabia que ela não era estéril...

MÁRIO FEIJÓ
Enviado por MÁRIO FEIJÓ em 27/05/2013
Reeditado em 19/11/2019
Código do texto: T4311819
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