2111: World War 3 - VII - Grande Exército, Marche para a Vitória!

Antes de postar o texto, queria compartilhar com vcs o blog em que originalmente eu posto a história, aqui no recanto eu fico limitado as opções de formatação, no blog tenho varias opções de formatação e imagem que deixam o texto, e a história mais organizada e bonita, segue o link das séries que são publicadas na Guilda: só copiar e colar, não da pra redirecionar links ;D

http://guildacop.blogspot.com.br/2012/11/series.html

Lá vcs podem ler 2111 e outras séries de nossos autores, a Guilda é uma parceria de autores, caso se interesse e queira entrar também, é só participar do recrutamento, clicando no botão da página, aproveito para divulgar aqui a Guilda: http://guildacop.blogspot.com.

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Cap anterior:VI - Europeus e Americanos: Parte III (Ver Contos>Ficção Científica)

Saída Leste de Córdoba, 16 de Abril de 2110

2:30 am

Kojak corria cegamente no escuro, em dado momento tropeçou e caiu, soltando os envelopes que carregava e despejando todo seu conteúdo no chão, papéis esvoaçavam enquanto ele se recompunha, juntou-os de qualquer jeito, enfiou de volta no envelope e voltou a correr o mais depressa que pôde. Respirava com dificuldade devido a tamanho esforço físico, vez ou outra desviava de um escombro ou de um carro velho no meio da rua deserta, que parecia não ter fim, de canto de olho, via vultos se mexendo, correndo, passando ao lado dele, aparecendo e desaparecendo, se escondendo por trás dos carros ou de latas de lixo. Pouco se importava com aquela gente, que provavelmente dentro de algumas horas não iria mais existir, o apocalipse que se aproximava iria ceifar suas vidas e por fim acabar com seu eterno sofrimento. Corria não só porque estava atrasado, mas porque cada passo que dava era um passo para a liberdade.

Ao longe avistou-a, ela estava em pé ao lado do imenso carro blindado, imóvel, ereta. Acelerou inadvertidamente, por um momento esqueceu que era velho, na verdade se sentia como um garoto, como nas vezes que brincava com seu irmão, correndo através das pradarias no sopé dos Urais, sentimento esse, tardio, que lhe rendeu uma lagrima solitária. Quando chegou perto da moça ali parada, como uma estátua de bronze, tratou de se recompor, fez uma mesura e de cabeça baixa apresentou-se.

– Aleksandr Kojak, às suas ordens Der Højbårne frue.

Dänika observava com certa repulsa aquele velho que mal conseguia se manter de pé, aproximou-se dele e pegou os envelopes que ele trazia.

– Entre ali atrás velhote – Ela respondeu – monte na guarda e não dê um pio sem ser solicitado, e quando o for, atenda sem demora, se não quiser que só a sua cabeça volte pra Russia, entendeu?

Ainda de cabeça baixa, Kojak respondeu:

– Sim Der Højbårne frue.

Kojak subiu no grande carro blindado, montou numa pequena metralhadora giratória que saia do teto e respirou fundo, era a ultima missão, a ultima jornada, depois de ter feito coisas horríveis para se manter vivo, não via a hora de voltar a sua terra e para sua família para morrer em paz, esse era o ultimo teste.

Dänika subiu no carro e pôs se a dirigir pela rua deserta e sombria, aquele automóvel era furtivo, camuflava-se naquele breu pois não tinha rodas, ele planava e por isso não fazia barulho, era de uma cor escura e também não possuía faróis, o condutor enxergava pois o para-brisa internamente era uma tela, o carro possuía sensores infra-vermelho e os transformava em formas visíveis que apareciam na tela para o condutor, por isso Dänika via, mais ninguém poderia vê-la graças a escuridão mórbida que a escondia.

Através da tela podia observar os vultos em forma de pessoas aqui e ali, correndo e se escondendo, mas os vultos não podiam enxerga-la e vez ou outra Kojak pulava no assento, como se passassem sobre uma lombada, mas ele sabia que aquilo era só mais um infeliz de mente arruinada que deixava o mundo, porque se pôs na frente daquela mulher, e ela não perdoa quem se põe à sua frente.

Córdoba , 16 de Abril de 2110

2:45 am

A pequena Olívia chorava sobre o irmão morto.

Depois que o exército de Stella e Juan achou Leon, recolheram o corpo de Enrique e o levaram consigo, Maria esperava-os com os guerrilheiros já em prontidão, ficou em choque quando soube o que aconteceu, teve que ser amparada pela sua gêmea muda. Os soldados puseram o corpo do guerrilheiro no meio da rua e fizeram um pequeno ritual religioso, pedindo para que o seu nobre combatente pudesse descansar em paz, após isso enterraram-no num pequeno terreno não muito longe dali, que lhe serviria de tumulo eterno.

Quando Maria voltou, já estava recomposta, com um sorriso zombeteiro e um brilho nos olhos, o velho Ernesto, seu pai, conhecia aquele olhar e aquele sorriso, significava que o jogo acabou, agora era tudo ou nada.

Trataram agora de planejar o que seria feito, assim foi decidido que Leon ficaria com o pessoal da inteligência que permaneceria na base sob as ordens de Ernesto, ou Che, como era chamado, em homenagem ao herói de outros tempos. Leon ficou furioso, queria ir para a batalha, queria encontra Nadine, queria mata-la, queria faze-la pagar, odiava traidores, achava que eram piores que os inimigos declarados, porque enganam e apunhalam pelas costas, mas não teve jeito, enquanto o resto se aprontava para a incursão, ele foi obrigado a ficar no prédio com algumas crianças e idosos.

– Não fique emburrado, garoto – disse o velho, estava debruçado sobre a grande mesa redonda abarrotada de papéis e computadores, outros três o ajudavam, duas garotas de não mais de 20 anos, sendo uma delas a pequena Olívia, e um jovem pequeno de olhos bem puxados, diziam que era do extremo oriente – Eu também queria sair e cortar algumas gargantas, mas eu na minha idade, e você no seu estado, seremos mais uteis aqui.

Leon, esparramado no sofá, compreendia o velho, blasfemava e praguejava toda vez que a perna lançava uma rajada de informação para o cérebro, que devolvia em forma de uma dor aguda, choramingava mais pelo fato de ficar inutilizável do que pela dor em si. Pensava em alguma forma de sair dali, ir la para fora mesmo com a perna ruim, no mínimo para se infiltrar no lado inimigo, dando a volta pela cidade, seria perigoso e um descumprimento de uma ordem direta de um superior, mas estava pronto em assumir o risco, só precisava de um jeito para distrair o velho. Enquanto tentava bolar um plano, fitava o céu pela pequena janela ao seu lado, estava escuro e as nuvens muito espessas a ponto de não se avistarem mais as coloridas, mas relampejava, aqui e ali um raio cortava o céu, enquanto observava o céu piscar ele sorriu, ja sabia como iria dar o fora dali.

Stella fitava o céu preocupada, não só porque os trovões a deixavam nervosa, mas também porque odiava guerrear na chuva, lembrava com tristeza como escapou da morte numa batalha no deserto do Novo México, cinco anos atrás, enlameada e encharcada da cabeça aos pés teve que andar penosamente e sozinha até o Texas, fora a única que sobrara numa malsucedida incursão e agora toda vez que chovia e estava em campo associava as condições àquele episódio, embora o ato fosse irracional, relação alguma tivera o mal tempo com o fracasso da missão e o sufoco que ela passara naquele episódio, mas agora aquilo já fazia parte dela, além disso outra coisa mexia com seus nervos e afetava a concentração, Maria havia contado-lhes que Hernán havia ido ao centro da cidade com um velho russo e que nenhum dos dois havia feito nenhum tipo de contato desde então, ambas temiam que o pior, Stella agora observava Maria enquanto esta inspecionava os fuzis de seus soldados.

– Sabe, ta aí uma mulher de fibra, nervos de aço! – Juan surgiu de lugar nenhum e agora acompanhava Stella a observar a notável líder da resistência de Córdoba – Consegue manter a frieza e o foco no objetivo, ao contrário de alguém que eu conheço.

Stella se virou pra ele sem mudar a expressão.

– Aí esta! É essa expressão que eu gosto de ver em você! – Ele continuou – Nenhuma! Quando não tens nenhuma expressão é porque ligou o foda-se e está pronta pro trabalho.

– Eu liguei o foda-se pra você – ela respondeu, sem ainda alterar a expressão – Hernán essa hora pode estar morto e você de brinca...

– Morto o caralho! – Juan interrompeu – Morto estarei eu se você não se concentrar na porra que nós temos que fazer, e ele também, aí sim estará morto.

– Com licença, señora – um homem negro, alto, com um quepe preto e uma farda azul aproximou-se dos dois, segurava um antigo fuzil AR-7 com uma das mãos, com a outra prestou continência, era o comandante de la Muerte Ambulant, capitán Sanchéz, conhecido pela acunha de La Besta, por uma história que merece ser contada um dia – Estamos prontos, às suas ordens.

– Certo – Stella devolveu a continência, enquanto Juan ignorou – Provavelmente, capitão, irá chover, isso talvez afete a comunicação, então vamos utilizar a tática de locomoção caso os rádios comecem a falhar, assim que lhe dermos as coordenadas, somente dispare, entendido?

– Compreendido – prestou nova continência e deu meia volta.

– Locomoção? És bem ousada, não se usa esse método à meio-século – Maria ja se juntava à conversa, usava outro vestido, desta vez totalmente vermelho, uma bandoleira que segurava uma escopeta cruzava seu peito, que vestia um colete, também vermelho – As táticas de combate hoje em dia são tão dependentes dos recursos tecnológicos, que qualquer problema externo pode arruinar toda uma campanha.

– Que porra é locomoção? – Juan perguntou, arrancando risos das mulheres.

– Tu não sabes o que é? E ainda se diz soldado? – Maria respondeu debochadamente, o que deixou Juan vermelho de raiva, e de vergonha, antes dele abrir a boca, ela continuou – Seu burro, se a comunicação falhar, a gente sai da frente e deixa o monstrinho ali mandar tudo pelos ares, mas ele não vai esperar que a gente saia, então quando ela der a ordem, corra, e rápido, se não quiser ter seus membros espalhados por ai.

Juan, aborrecido por o terem feito de palhaço na frente dela, saiu dali resmungando.

– Esse cara tem alguma coisa contigo, chica? – Maria lançou.

Stella riu, Maria também, ambas relaxaram.

– Não – Apontou para a tropa – Tudo ok com eles?

– Sim

– Então...

Cerca de 900 homens e mulheres, jovens e adultos, estavam perfilados no escuro, uma ou outra gota de chuva ja começava a cair sobre as fardas velhas e sujas, cada um carregava consigo uma arma, seja um fuzil moderno de alta precisão ou uma velha pistola, no caso dos guerrilheiros a precariedade das armas era notável, poucos eram os que possuíam algo novo, mas mesmo o armamento antigo possuía pesado poder de fogo.

Chegara a hora do enfrentamento. Sem discurso, sem exclamações nacionalistas, somente uma frieza típica daqueles tempos de guerra, que pareciam intermináveis.

O que se seguiu naquela madrugada chuvosa foi o que todos já previam, uma torrente interminável de sangue, gritos, membros amputados, explosões, torturas, assassinatos, fuzilamentos...

Do outro lado da cidade, já desde o começo da manhã, foi dado toque de recolher e montaram-se as barricadas, o largo central, com sua águia sem cabeça, foi entulhado de minas e explosivos cronometrados, snipers foram postos no topo dos prédios, outros se escondiam em seus interiores, protegidos pela escuridão, vez ou outra espiando pelas janelas. Todo homem, mulher e até crianças que pra sua infelicidade ali viviam foram armados e ordenados que ficassem à postos e que se preciso entrassem em combate, qualquer ato de traição, sabotagem ou covardia seria penalizado com o fuzilamento. Diante desse cenário, enquanto a chuva caía cada vez mais forte, o centro da cidade de Córdoba foi tomado pelo silêncio, somente quebrado pelo eco dos trovões que descia dos céus e ricocheteava em cada porta trancada.

Agora era só esperar.

A Toca, 16 de Abril de 2110

2:30 am

Na Toca, o velho comandante se encontrava na sua sala, ouvindo atentamente o que aquela jovem nativa de pele bronzeada tinha a dizer. Nadine tentava não gaguejar, para que o general não pensasse que ela estava mentido e que fora enviada ali para tentar engana-lo, não sabia se estava conseguindo o que queria, porque o velho não tinha nenhuma expressão, a não ser a de puro tédio ou de estar no meio de devaneios.

– Certo, certo – o velho a interrompeu – Não quero saber da sua história triste. O que me garante que eles não lhe mandaram até aqui?

– Nada – ela respondeu sem vacilar

– Então porque diabos eu estou perdendo meu tempo aqui? – o velho começou a se levantar.

Foi ai que Nadine resolveu mostrar seu trunfo, devagar retirou uma pulseira azul-brilhante de dentro da camisa, quando olhou em volta, já haviam cinco soldados apontando-lhe as armas, enquanto o velho parava e a fitava, curioso.

– Essa pulseira é o que eu acho que é? – o velho perguntou.

– Eu não sei o que o senhor acha que ela é general, mas ela é importante.

O velho tornou a se sentar e fez menção para que os soldados abaixassem as armas, vasculhou alguns papéis até achar o que queria e se demorou um tempo analisando-o, por fim levantou-se novamente e foi em direção a jovem, ela lhe entregou o objeto que ele analisou por um longo momento.

– Isso aqui é uma coisa notável! – ele exclamou, ainda admirando a pequena peça – Consegue não só faze-los indetectáveis, como é desativado quando eles morrem, que tipo de tecnologia absurda existe e faz isso possível?

O general sentou-se na mesa e ficou ali, uns dez minutos fitando o nada, absorto em pensamentos, Nadine estava desconfortável, olhava pra um lado e pro outro tentando absorver e memorizar tudo que havia naquela sala, reparou que num canto afastado havia uma pequeno cofre meio escondido atrás de algumas plantas de plastico...

– Ah! – o velho exclamou de repente – Você disse que eles iriam atacar de madrugada, não é?

– Sim senhor.

– Você conhece aquele velho russo? O informante?

– Não sei de quem o senhor fala. – Ela se lembrou do velho que havia visto quando entrou na zona européia mais cedo, e pediu em pensamento, para qualquer Deus por acaso existisse, não ter que dar de cara com ele por ali e a acusarem de mentirosa. Mas no final nem precisou disso para ela se encrencar.

– E o jovem mexicano que veio com ele?

Essa menção fez Nadine, subconscientemente, se encolher, coisa que o velho general percebeu imediatamente e o fez soltar um sorriso traveso. Ordenou então, que trouxessem o jovem mexicano moribundo, pedido que foi prontamente atendido, assim trouxeram Hernán, e a visão daquele trapo humano deixou a chocada.

Lhe trouxeram mais arrastado do que carregado, seu rosto estava roxo e inchado como nunca, com um trapo sujo por sob a orelha ferida. Ele viu Nadine e se assustou, arregalou os olhos inchados e ofegou, ela quando o viu, virou o rosto.

O velho general, inadvertidamente, pegou Nadine pelo braço e encostou uma pistola na sua têmpora, que ele tirou sabe-se lá de onde.

– Tu conhece essa garota, não? – ele perguntou pro homem do rosto inchado, que não respondeu, imediatamente um dos soldados lhe deu um soco no estomago, o mundo girou enquanto arqueava-se e caia no chão, outro soldado pisou na sua cabeça e berrou no seu ouvido, para que respondesse o general, então ergueu-o e gritou-lhe novamente no ouvido, naquele que ainda existia, obviamente.

– Tu conhece ele de onde? – dessa vez o general falou com Nadine, que de olhos arregalados contou-lhe que Hernán era um dos comandantes – E quem são os outros? Quais os nomes?

– Eu não sei

A essa resposta, o general, mesmo velho, com agilidade virou-a e desferiu um soco bem no seu diafragma, o murro a fez se curvar, tal qual o homem do rosto inchado, e ajoelhar-se. Nadine ficou tão surpresa com o golpe que nem mesmo esboçou uma reação, então o general puxou-lhe de volta pra si, pelos cabelos.

– Não sei não é resposta

Ele a empurrou de encontro a um soldado, que prontamente a agarrou e a bolinou, o general ordenou que a trancafiassem e tirassem dela toda e qualquer informação, do jeito que eles bem entendessem.

Hernán, com o pouco que ainda conseguia, observava aquela cena sem entender enquanto a garota lhe fitava com um olhar de puro terror.

Tirando forças sabe-se lá de onde, Hernán conseguiu se desvencilhar do soldado e com uma agilidade que seria absurda mesmo para um homem em bom estado, desarmou-o e antes que pudesse ser novamente capturado se jogou sobre o general, que imediatamente apontou e atirou com a pistola que carregava, mas ela falhou, Hernán arregalou os olhos devido a constatação surpreendente de que sua investida suicida não seria de fato suícida, por um centésimo de segundo, lembrou do ocorrido mais cedo, ao encontrar a mulher do vestido manchado de sangue, pelo visto, a sorte estava ao seu lado.

Os dois caíram no chão e rolaram um sobre o outro, enquanto mais dois soldados corriam até eles, nesse meio tempo, com agilidade igualmente absurda, Nadine se soltou e desferiu um golpe marcial no militar que a segurava, derrubando-o, quando outros soldados tentaram pular sobre ela, pois não teriam como atirar sem acertar o companheiro, já era tarde demais, ainda agachada pegou rapidamente o fuzil do sujeito e fuzilou-os, metralhou sem dó para todos os lados. Por um momento esqueceu-se do outro que tinha derrubado, ela agarrou sua perna e a jogou no chão, mas ela levantou, tão rápido, com uma agilidade de ginasta, que parecia nem ter caído, e partiu pra cima utilizando novo golpe marcial, agarrou e torceu o pescoço do homem com um estalo. No mesmo instante ouviu um zunido e sentiu um vento passar perto de sua cabeça, era Hernán do outro lado da sala, caído e escorado na parede fuzilando os soldados enquanto o general corria para alcançar a pistola em baixo da mesa, Nadine não permitiu que ele o fizesse, apanhou o fuzil caído perto de si e fuzilou-o.

August, o general, foi ao solo, sua ultima expressão era a de descrença misturada com uma certa decepção, sua ultima visão delirante foi o rosto fino e belo de sua filha, que agora ja estava longe, enquanto tudo à sua volta imergia na escuridão eterna.

Hernán se deixou estender no chão, enquanto tentava recuperar o fôlego, seu corpo doía tanto que parecia que iria desintegrar-se e sua cabeça latejava como se um martelo gigante a golpeasse a cada pulsação sanguínea. Com um esforço tremendo, sobre-humano, motivado unicamente pelo instinto primitivo da sobrevivência, tentou se sentar, mas nem isso conseguia, então ficou ali esparramado no chão, olhando para o teto.

Provavelmente atraído pelo som dos disparos, um soldado inadvertidamente abriu a porta e espiou, Nadine correu até la e a chutou para que se fechasse, fazendo o soldado cair do lado de fora, rapidamente ela a trancou. Agora estavam trancados ali e dentro de alguns minutos teriam dezenas de soldados do lado de fora tentando entrar.

Deixou-se imergir em pensamentos, quando se deu conta, o machucado Hernán já estava à seu lado.

– Que porra faz aqui? – ele perguntou, com a voz falha, enquanto se escorava na parede para se manter de pé – Onda está Leon?

– Não sei – ela respondeu mentirosamente sem virar-lhe o rosto – nós fomos pegos, ele levou um tiro, mataram Enrique e me trouxeram pra cá.

Batidas na porta, cada vez mais fortes

– Mierda, como vamos nos safar dessa agora? – Hernán falava com dificuldade enquanto sentava-se no chão – Acho que ja deu pra mim, ja chega.

– Já chega o que?

– Vou morrer logo, não aguento mais – E se levantou, iria até a porta e a abriria, num gesto irracional, mas...

Nadine o deteve, surpresa pelo comportamento melodramático repentino dele, algo que não condizia com sua personalidade firme.

– Está louco? Quer me matar? Eu salvei sua vida!

Hernán riu, já estava mais pra lá do que pra cá, se desvencilhou dela e cambaleante deu alguns passos, até sentar-se novamente no chão.

– Vamos esperar então, ou eles arrombarão, o que é mais fácil, ou os mexicanos malditos varrerão eles do mapa – Ele disse, delirante – ou então vão varrer essa porra toda do mapa, com a gente junto, se é que eles realmente estão vindo pra varrer alguma coisa, como lixeiros do futuro. – começou a rir histéricamente, parecia estar em estado de choque

Nadine lembrou do cofre, por alguma razão, tinha certeza que ele continha algo para momentos de emergência, e aquele era um momento de emergência.

Mais batidas violenta na porta, seguidas de alguns disparos contra a mesma.

Nadine pegou um dos fuzis do chão, foi até o cofre, retirou as plantas que o escondiam e metralhou-o.

Inutilmente, aquilo possuía mais blindagem do que a porta que alguém do lado de fora tentava arrombar. Ela voltou-se e vasculhou a mesa, sob os olhares atentos e febris de Hernán, que fazia uma ou outra exclamação sem sentido, ou então tagarelava algo sob a vida antes da guerra, que ele pouco se lembrava. Estava mesmo em estado de choque.

Enquanto as batidas continuavam, cada vez mais fortes, Nadine viu algo no meio daquela bagunça de papéis que lhe chamou atenção, era um pequeno envelope rosado, daqueles semi-invisíveis, quase transparentes, cuja escrita brilhava sob certos ângulos de luz, ela o pegou e abriu, dentro havia, solitária, uma pequena e antiga chave de dentes serrilhados, um tipo de coisa que não era usada talvez há uns 100 anos, tal era a antiguidade de uma chave dessa que ela mesmo nunca tinha visto uma e ficou surpresa por se encontrar de posse de objeto tão notável e primitivo.

Rapidamente foi até o cofre e notou que ele possuía uma fechadura antiga na lateral, torceu para que a chave entrasse, entrou, girou-a, torceu agora para que não precisasse de uma combinação numérica para abri-lo, não precisou, aquele sistema de fechadura era tão antigo, que ele próprio tinha mecanismos anti-arrombo sofisticadíssimos, embora pra ela isso fosse algo paradoxal. Ela moveu a pesada portinhola devagar, sob o olhar atento e curioso de Hernán, ambos arregalaram os olhos quando viram o que havia la dentro, era justamente o que ela achava que teria e de que iriam precisar, na verdade até melhor, sim, bem melhor.

Ainda havia esperança.

Enquanto isso, bem longe dali...

Lykketoft, O Numerador de Cadáveres, O Homem Alto, O Filho do Trovão, O...

Tantas nomenclaturas...

O fato é que Ele caminhava devagar e calmamente pelo deserto com as botas, salpicadas de vermelho, levantando areia, cujo grau radioativo não era natural. O vento espalhava a poeira pelo ar, poeira nociva de uma terra estéril, pequenos redemoinhos brotavam aqui e ali para logo desaparecer. O Sol era quente como mil fornos, brilhante como mil holofotes, assassino como mil lunáticos. Ele caminhava, e um exército imenso o seguia, exército esse que a cada minuto perdia um homem ou mulher, seja pelos ferimentos, consequência das batalhas anteriores, ou por não mais suportar o ambiente inóspito. De fato seus corpos eram levados ao limite mesmo utilizando trajes de tecnologia jamais vista anteriormente, o habitat era tão brutal que mesmo isso para alguns era insuficiente, o resultado? Trilhas de cadáveres pelo caminho. Mas mesmo assim aquele bando parecia que não diminuía de tamanho, as filas e filas marchando sobre a areia esbranquiçada eram intermináveis, se perdiam de vista, os carros monstruosos, os tanques poderosos, eram igualmente incontáveis.

Vez ou outra um enorme jato passava zunindo por sobre suas cabeças, tão rápido que quando a erguiam para admira-lo já o tinham perdido de vista, um som de uma amplitude tão alta, que as viseiras dos seus capacetes, feitas de fibras, tremiam como se fossem de vidro. Essa máquina de guerra monstruosa e altamente treinada, acompanhada de aparatos tecnológicos moderníssimos, marchava e marchava, indefinidamente sobre aquela terra devastada.

Por onde passaram deixaram trilhas de destruição e morte, onde punham os pés causavam terror ao mais valente dos soldados inimigos, as cidades que tiveram o azar de te-los em seu caminho hoje não passam de pilhas de cinzas e escombros.

– E de corpos.

Devastaram o pouco que sobrara daquele país, que em um tempo há muito esquecido se denominava o mais poderoso e se orgulhava das suas estrelas e listras, megalópoles imensas convertidas em ruínas, populações inteiras sub-julgadas, famílias inteiras destruídas, milhões de vidas massacradas.

– Bombas Termonucleares.

A frente dessa besta do velho continente estava Ele. E Ele vinha. Das montanhas geladas da Groelândia aos planaltos brancos do Canadá, das imensas florestas estadunidenses, muitas delas já inexistentes, às praias californianas, de Nova York à Florida, logo estariam no México, depois em Cuba, controlariam o Caribe, arrasariam o pouco que restava do pequeno Panamá e esmagariam a insurgência na Venezuela, atravessariam os Andes e sub-julgariam o Chile, a Argentina e o Peru, adentrariam na Amazônia, tomariam posse dela e declarariam o Brasil como sendo deles, fulminariam o Uruguai e marchariam vitoriosos até a Terra do Fogo, instalariam bases até na Antártida e mais uma vez o Novo Mundo pertenceria aos seus legítimos donos, os povos do Berço da Humanidade.

Qualquer resistência seria esmagada impiedosamente, fileiras e mais fileiras de novos exércitos chegariam ininterruptamente vindos do outro lado do Atlântico. Esse era o movimento final, decisivo, depois de mais de 20 anos de conflito, agora era pra valer, sairiam vitoriosos e se afirmariam como potência soberana perante os orientais e sua patética ONU que insistia em tentar combate-los. O fracasso na invasão do Oriente só os deixavam mais sedentos.

A União, indivisível, inquebrável, indissolúvel, poderosa e magistral, com sua bandeira, azul e de estrelas douradas em circulo, ao topo dos mastros agitando-se em glória.

Lykketoft, enquanto marchava, sorria.

Um soldado caia morto de exaustão.

Lykketoft e seu imenso fuzil atômico.

Uma oficial caia cansada e era pisoteada pelos que vinham atrás.

Já avistava as crateras.

– Bombas Termonucleares.

A radiação aumentava, uma luz no visor piscava acompanhado de um zumbido no ouvido.

– Foda-se.

Somos imensos, superiores.

– Semi-Deuses.