Um Salomão Químico.

Chamava a si mesmo Salomão!

Era orgulhoso e despendia toda energia em esforços que lhe aprimorassem a sabedoria e conhecimento com todo aparato neurolinguístico, leitura dinâmica, yoga...

Como o tempo se encurtava, e seu biótipo já se estriava em seus limites plásticos, experimentou alterar através de psicotrópicos sua consciência.

Como químico hábil, desenvolveu, teoricamente; um acelerador neurológico, descobriu fórmulas para multiplicação de seus neurotransmissores e drogas que expandiam a concentração à níveis sobre-humanos.

Tentou contratar um experimentador, mas como despendera todas suas finanças na aquisição de clássicos da literatura grega; e os efeitos sugeridos hoje em dia interessavam à bem poucos, sua oferta não seduziu ninguém!

Sem opções, se resignou à atar o garrote no braço fino, e tremeu, sem estabilidade a agulha até que a mesma tocou a pele arrepiada.

Forçou-a; dentes segurando firmes os lábios, também tremulantes.

Desmaiou quando o êmbolo havia expulsado o último miligrama do preparado!

Acordou sob a desconfortável viscosidade de seu vômito, e notou, através das escoriações ardentes, que havia se debatido em convulsões violentas!

Vira a morte sentada ali, no canto da sala, fumando tabaco de rolo embrulhado zelosamente numa palha caipira; se despediu desta, e a viu tristonha abandonando o recinto.

"-Depois dos oitenta lhe mando um convite; caso já me esteja faltando vigor!"- Sorriu de seu delírio psicodélico.

Quando despertou uma última vez, notou que sua mente hiper-acelerada tinha seu corpo como empecilho; e os micro-segundos em que ordenou ao seu braço que firmasse sua postura para alçar o restante de si foram intervalos infinitos, nos quais solveu todos os problemas existenciais dos quais padecia, pensou, e repensou todos conceitos filosóficos, princípios econômicos, teorias ecológicas, cogitações metafísicas, peripécias matemáticas e até devaneios poéticos que lhe eram pertinentes...

E eis que tudo se tornou enfado, antes que a imediata primeira palavra após o desmaio viesse à boca!

E como dizer algo se a primeira intenção já havia sido dissipada por milhões de outras idéias, e a boca pesada ainda nem intencionara a primeira sílaba!

A mente era mais veloz que a luz; mas o corpo persistia em sua lenta fragilidade.

Anderson Dias Cardoso.