Mercúrio

“Enviem o primeiro...”.

Num futuro não tão distante, ano 2130, em uma bela manhã de Janeiro, o piloto e co-piloto do boeing 787 que seguia do Recife para o Rio de Janeiro; tinha decolado fazia algumas horas e faltava pouco mais de vinte minutos para pousar no aeroporto doméstico Santos Dumont. Avistaram, contrariando tudo o que podiam entender de suas vidas; pela janela da aeronave, à distância, algo que parecia ser um homem parado em pleno ar, açoitado pelos altos ventos entre as nuvens.

_ Meu Deus do céu!_ disse o piloto da forma mais espantada possível.

Seguido por seu co-piloto.

_Mas o que é aquilo!? Um homem?!

Em pouco tempo toda a tripulação de comissários, comissárias e aeromoças estava em polvorosa de um lado para o outro, tentando verificar se realmente havia um homem parado em pleno céu ou se tudo não passava de um grande engano coletivo. Os passageiros logo notaram a correria fora do comum e alguém que estava em alerta acabou por escutar os sussurros de uma das comissárias de bordo.

Ela dizia para outra:

_É inacreditável; há um homem parado em pleno vôo em uma distância considerável no lado esquerdo da aeronave.

Foi apenas o que precisava para que o boato surgisse dentro do avião, mas quando as pessoas que estavam do lado esquerdo, próximo das janelas prestaram a atenção logo viram com seus próprios olhos que não se tratava de boatos. Ele realmente estava parado lá sobre as nuvens.

Nenhuma das pessoas que o avistaram podia ver direito, mas o homem estava de braços cruzados, queixo junto ao peito e olhos fechados como se em transe.

O avião ia se distanciando dele numa velocidade considerável e em poucos minutos todos já estavam fora do raio de visão necessário para contemplar aquela cena insólita ao sol da manhã.

O piloto lançando mão do rádio entrou rapidamente em contato com a torre de comando em solo no aeroporto; porém não sabia o que dizer. No momento em que relatava o acontecido à transmissão caiu e apenas estática permanecia em seu lugar. No minuto seguinte um estrondo sônico se abateu sobre o avião e interrompeu o funcionamento de vários instrumentos, enquanto os pilotos usavam de toda a sua experiência para tentar conter o enorme pássaro de metal, uma das aeromoças gritou novamente apontando pela janela da cabine de controle, pois o “homem” agora voava como um jato e acabara de passar por eles; a julgar pelo estrondo, em uma velocidade supersônica.

Luzes se ascenderam nos painéis, máscaras de oxigênio pularam de seus compartimentos e o boeing mergulhou para o solo violentamente quando todos os seus equipamentos falharam.

Felizmente pela experiência de vôo de sua equipe de pilotos o controle foi parcialmente restabelecido em tempo e tiveram apenas de fazer um pouso forçado onde ninguém se feriu com gravidade, mas o susto foi grande e o pior ainda estava por vir.

***

Centro do Rio de Janeiro. Avenida Rio Branco no entroncamento com Avenida Presidente Vargas; centro nervoso e financeiro do Estado; milhares de pessoas passando de um lado para o outro, uns indo para a Praça Mauá, outros indo para a praça quinze; alguns seguiriam a pé até o aterro do flamengo, mas a maioria ficaria mesmo nas ruas próximas; um verdadeiro formigueiro humano se movimentando em todas as direções. Pessoas, carros, motos e ônibus num balé caótico que se estendia por todos os dias e naquela manhã não era diferente. Não muito distante, o aeroporto de onde mais e mais pessoas embarcavam e desembarcavam nos vôos domésticos para São Paulo, Brasília, Recife, e tantos outros destinos; embora alguns estivessem com um pequeno atraso, mas nenhum foi cancelado.

O homem aterrissou sobre o exato cruzamento entre as avenidas Rio Branco e Presidente Vargas, muito próximo da igreja da Candelária, de modo que parecia o chocar-se ao solo de um cometa; quando seus pés tocaram o chão, este se fendeu em todas as direções, abrindo grandes feridas no asfalto; tamanha a força do impacto, e um barulho ensurdecedor se fez ouvir em todas as imediações. A multidão de pessoas que passava no momento ainda sem saber ao certo o que estava ocorrendo arremessou-se ao solo, uns pensando que se tratava de ataque terrorista bem no centro de Rio de Janeiro, outros imaginavam que fosse algum acidente de proporções titânicas.

Muitas das pessoas que estavam no lugar exato onde aquele homem chocou-se foram arremessadas a metros de distância para todos os lados e até mesmo os carros e ônibus que passavam naquele momento tiveram o mesmo fim. Em pouco mais de um minuto o centro da cidade tornara-se um verdadeiro caos e ninguém sabia ao certo o que estava ocorrendo; muitos fugiam desnorteados, pessoas gritavam, outros choravam e outros ainda tentavam perceber algo em meio ao pandemônio, mas era totalmente inútil.

Uma nuvem de poeira se ergueu da rua sabe-se lá como; muitos alarmes dos carros dispararam simultaneamente, e como se não bastasse, o som parecido com o estrondo de trovão ainda não tinha passado totalmente, ele ribombava ecoando nos mais altos prédios e parecia estar subindo aos céus. Várias janelas envidraçadas se estilhaçaram naquele momento.

Um vento poderoso soprou a poeira para longe em direção ao mar e as pessoas que ainda estavam por perto tiveram que se segurar para não serem arremessadas longe. O homem desconhecido ficou um tempo parado e com os olhos fechados, como que em transe; seus braços cruzados junto ao peito e seu queixo também apoiado contra a parte superior do seu peitoral.

A visão daquele sujeito parado na cratera aberta na rua destruída era algo que nunca ninguém pensava ver na vida, e ao redor dele um murmurinho se levantou, todos queriam saber o que ou quem era aquele homem, a polícia foi avisada, assim como os bombeiros e em pouco tempo muitas viaturas de ambas as corporações chegaram no lugar. Naquela hora havia um número muito maior de curiosos incautos formando um círculo por fora do cordão de isolamento colocado pela polícia num raio de dez metros do estranho. E pessoas nas janelas de muitos prédios olhavam atônitas a toda aquela movimentação cinematográfica; muitos pensavam realmente se tratar de uma gravação de cinema.

Durante algum tempo os curiosos fotografaram e filmaram o estranho parado com seus aparelhos celulares, mas o homem não moveu um músculo até que todo aquele circo fosse completamente montado ao seu redor; várias emissoras de TV transmitiam ao vivo para todo o mundo, com seus repórteres entrevistando pessoas que viram o momento exato da aparição.

“Ele veio do céu” _ disse uma senhora;

“Como? Voando?” _ rebateu a repórter;

“Sim, como um raio”.

As notícias do estranho voador dividiam a atenção com flashs ao vivo, onde outros repórteres entrevistavam passageiros e tripulação de um avião que teve de fazer um pouso forçado na Baía da Guanabara momentos antes.

“Todos na aeronave viram ele” _ falava uma comissária, em prantos pelo susto; pois acabara de ser resgatada por lanchas da marinha, assim como todos os outros que estavam no boeing.

“Sim estava parado em pleno ar, sobre as nuvens como se estivesse meditando” _ afirmou um dos passageiros.

Em pouco tempo a atenção não só de todo o Estado do Rio de Janeiro, assim como de todo o Brasil e outras nações estavam voltadas para aquele lugar aonde um homem vindo aparentemente do céu permanecia parado já há quase uma hora sem fazer o menor ruído ou movimento e onde ninguém se atrevia a chegar perto.

As hipóteses do que seria aquilo se amontoavam rapidamente nas mentes de toda nação;

Alguns diziam terrorismo; outros diziam apocalipse; e alguns outros diziam que era mais uma trama dos bandidos cariocas, muitos culpavam o presidente e havia também o grupo dos que tinham certeza de que se tratava de uma invasão extraterrestre; segundo essa última teoria aquele homem seria uma espécie de batedor alienígena.

Todas estas teorias estavam ganhando igual espaço na TV e nas outras mídias; cada um que podia defendia sua tese ferrenhamente, mas a verdade ainda estava por vir.

Após quase duas horas, o estranho se abaixou e com as palmas das mãos tocou o chão fendido em que estava, a multidão acompanhava aquilo que parecia ser um ritual, e uma multidão muito maior acompanhava o desenrolar da história nos cinco continentes da terra. Todos queriam saber o que seria aquilo; seria realmente o fim do mundo? Um ataque terrorista? Invasão alienígena? Ou seria apenas um delírio de toda a humanidade?

Um dos responsáveis por conter toda aquela situação; um oficial da polícia, tomou um megafone e pediu para que as pessoas se afastassem ainda mais do círculo de isolamento, em seguida voltando-se para o estranho pediu em vão que ele se identificasse.

Após mais algum tempo de silêncio, finalmente o estranho levantou-se e falou:

_“Cidadãos; hoje é um dia do qual vocês jamais vão se esquecer” _ A voz daquele estranho aterrorizou a toda a população que acompanhava de perto, ao redor do círculo, pois quando ele falava, parecia que cem homens falavam com ele. Era algo nunca antes visto.

Ele prosseguiu:

_“Eu venho de muito longe para lhes anunciar as coisas que estão por acontecer e decretar o primeiro julgamento sobre suas cabeças. Se minha missão será pacífica ou não, dependerá da reação que demonstrarem”.

O homem que estava com o megafone retornou a ouvir o estrondo causado pela “voz de cem homens” do estranho e empunhando o equipamento falou:

_Quem é você? Diga seu nome e deite-se no chão devagar com as mãos onde possamos ver.

Ao que o estranho respondeu:

_“Aqueles cujos olhos e ouvidos estão voltados para o deus da guerra, ainda hoje vão vê-lo, acorrentado em sua prisão atemporal”.

Ninguém entendeu o que ele tinha acabado de dizer, mas muitas pessoas que ali estavam começaram a sentir dores de cabeça por causa da retumbante voz do estranho. O policial do megafone já ia repetir a ordem dada anteriormente quando foi interrompido.

_“Meu nome não é importante_ falou novamente, e concluiu_ Mas se querem realmente saber, vocês mesmos me chamam há muitos milênios por... Hermes”.

***

A verdade era que poucas pessoas entenderam; algumas nem mesmo conheciam este nome, porém umas poucas relutantemente tentavam ligar uma coisa à outra, pois o único Hermes que conheciam era o mesmo chamado de Mercúrio pelos Romanos, mas isso era totalmente impossível pelo simples fato de que se tratava de mitologia e não realidade.

Repórteres de uma emissora de TV deram a seguinte manchete ao vivo para vários países:

_Estamos ao vivo aqui do centro do Rio de Janeiro onde um homem diz ser Hermes o mensageiro dos deuses mitológicos e muitas testemunhas dizem tê-lo visto descer do céu esta manhã.

Outra emissora reportava o seguinte:

_ Ainda não se sabe quem é este homem que destruiu parte da rua onde está; especialistas estão sendo chamados para tentar sanar este problema e um contingente maior de policiais já foi deslocado para compor uma força de contenção. Há rumores de que um destacamento de fuzileiros que estão baseados na Praça Mauá também foi colocado à disposição do governador para o caso de ser necessário mais ajuda e força extra.

O mundo estava vendo o que se passava naquele dia, mas como se não bastasse toda aquela loucura; emissoras Norte-Americanas começaram a exibir algumas imagens capturadas pela N.A.S.A com um de seus satélites artificiais colocados sobre o planeta vermelho; Marte, no ano de 2125, o nome do satélite que captou as imagens era “Ligth Gate”; ou portão de luz. As imagens foram geradas e transmitidas por uma das sondas que faziam exploração fotográfica e vídeo-documentada naquele planeta e enviadas ao portão de luz que as retransmitiu à Terra, ao centro espacial Kennedy em Cabo Canaveral, dois anos antes do aparecimento do estranho Hermes no Rio de Janeiro. Aquelas imagens já estavam programadas para irem ao ar exatamente naquele dia, mas com o aparecimento de Hermes, as autoridades Americanas liberaram imediatamente as imagens para que a população do mundo julgasse por si mesmo.

O ancora de um dos jornais mais conceituados do Brasil que apresentava uma edição extraordinária naquela manhã, acompanhando simultaneamente as declarações do governo Americano, do governo Brasileiro e ainda o desenrolar dos fatos no centro do Rio, transmitia a seguinte mensagem:

“As imagens cedidas pela Agência Espacial Norte-Americana são tão impressionantes quanto os relatos dos passageiros do avião que dizem ter visto o estranho Hermes parado em pleno ar logo pela manhã”.

E realmente eram imagens sem precedente na história da humanidade, porque mostravam no solo vermelho de Marte algo como duas colunas erguidas do chão feitas com o mesmo material rochoso do qual o solo marciano era constituído, porém, lembravam realmente os pilares da Roma antiga, destas colunas pendiam como que grilhões e preso a estes grilhões a figura de uma pessoa; um homem, de joelhos no chão e com a cabeça baixa, cabelos desgrenhados e muito longos sobre a face, estava nu.

Aquilo simplesmente não era possível. como uma pessoa poderia sobreviver às condições de um outro planeta? As imagens haviam sido feitas numa gigantesca cratera localizada em uma parte de Marte conhecida como Monte Olimpo, que é o maior vulcão do sistema solar. Nenhuma agência de notícias do mundo levou a sério realmente aquelas imagens, embora tivessem que concordar que a N.A.S.A não tinha motivos para mentir sobre aquele acontecimento; e a situação se agravou ainda mais quando o porta-voz da Casa Branca, Hal Fitreringam, veio a público para comentar as imagens e o aparecimento do estranho Hermes no Rio de Janeiro.

Sob os “flash” de fotógrafos, sendo transmitido em tempo real para todo o globo e em virtua-conferência para as equipes ministeriais e presidenciais de diversas nações do planeta o porta-voz iniciou seu discurso:

_ Cidadãos dos Estados Unidos da América e de todas as nações livres da terra, a cerca de dois anos nossa agência espacial vem monitorando essa imagem recebida de uma de suas sondas no solo de Marte; já enviamos tais imagens para todos os tipos de perícias possíveis de serem realizadas com profissionais em todas as partes do planeta terra, mas todos atestam que são legítimas. _parou, para respirar enquanto era bombardeado por luzes intermitentes_ Não sabíamos ao certo do que se tratava até que fomos notificados da aparição de um homem que diz se chamar Hermes e que em solo Brasileiro pronunciou uma frase que nos despertou para o que realmente pode ser o indivíduo documentado nas imagens da sonda. Ele disse: “Aqueles cujos olhos estão voltados para o deus da guerra, ainda hoje vão vê-lo, acorrentado em sua prisão atemporal”.

O secretário parou novamente e virou uma página colocada no púlpito à sua frente de onde estava lendo cada palavra de seu discurso; e continuou:

_ Esta frase foi muito clara para nós, visto que o planeta Marte durante séculos foi considerado mitologicamente como o deus da guerra, o equivalente romano ao grego, Ares. Portanto temos provas suficientes para crer que estamos lhe dando com entidades mitológicas; e pedimos que os países aliados aos Estados Unidos em todos os continentes preparem suas tropas porque não sabemos o que nos reserva o futuro. Obrigado.

Desta forma o secretário se retirou sem responder pergunta alguma e o clima de desconfiança tornou-se ainda mais pesado nos quatro cantos da terra. Assim que terminou o pronunciamento norte americano o governo Brasileiro na pessoa do ministro das situações extraordinárias; ministério criado no ano de 2120 em caráter de urgência quando para manter a integridade da economia brasileira frente a uma crise forte nos países considerados líderes financeiros no mundo, a China e os Estados Unidos que passavam por fortes oscilações em diversos setores da economia e acabaram perdendo parte do poder de barganha com outras potências.

Neste momento o Brasil surgiu no cenário mundial como sendo a mais nova potência articuladora de políticas internacionais e à frente também de um bloco de combate ao eminente aquecimento do planeta e de todas as devastações climáticas provocadas pela ação do homem no decorrer dos últimos dois séculos; entre os anos de 1900 a 2000 e 2001 a 2100. A partir de 2050 o país passou a estar na vanguarda das políticas ante-aquecimento global, desenvolvendo e implantando em âmbito nacional, programas que serviram de referência e acabou por ganhar a simpatia e colaboração incondicional de superpotências como a Inglaterra, Japão, Alemanha e Israel; no ano de 2110 foi eleito na Organização das Nações Unidas o primeiro secretário geral vindo do continente Sul-Americano; o Brasileiro Cláudio Paulino Silva, sob o título de chanceler das nações unidas.

O Brasil ganhou destaque mundial quando no Rio de Janeiro foi inaugurado um escritório avançado da organização, localizado na Av. Rio Branco, escritório este voltado a coordenar todas as ações da entidade não só no país como também mais de perto em toda a América Latina e que reenviava para a sede de Nova Iorque e conseqüentemente às mãos do novo chanceler tudo o que era processado e realizado.

O ministro das situações extraordinárias subiu ao ponto mais alto do salão de entrevistas do Palácio do Planalto para dar seu pronunciamento; e a exemplo do que ocorreu com o colega americano, muitos repórteres de várias mídias se aglomeravam para fotografar e captar o som num ritmo frenético, quase se engalfinhando.

Ele estava calmo e suas palavras comedidas, como sempre, ele iniciou saudando a todos que lá estavam.

_Olá; obrigado por terem comparecido; estamos diante de uma situação sem precedentes na história do homem. Eu penso que tudo isso não passa de um teste que vai ou nos levar a um patamar acima em nossa percepção de aldeia global e fé ou vai nos empurrar para um abismo do qual não sairemos jamais.

As luzes explodiam em sua face e ele piscava lentamente. Continuou:

_Não há causas para que eu não traga a público o que agora pouco fui informado pelo departamento de exploração aeronáutico espacial brasileiro, na pessoa do Tenente-Brigadeiro Eraldo Vilela. Creio que todos vocês acompanharam o pronunciamento de nosso colega americano e fui informado agora que na mesma época reportada por ele, nossos observadores espaciais; as antenas de rádio que varrem a imensidão do cosmos na esperança de captar algo, ou algum vestígio de vida inteligente recebeu um código que se repetiu durante dois anos, parando no fim deste período; este código tratava-se de uma intrincada sequência matemática que apontava, segundo o que parecia, para uma coordenada. _ ele parou mais uma vez e tomou um pequeno gole d’água mineral antes de recomeçar_ Colocamos físicos e matemáticos em conjunto com nossos supercomputadores trabalhando para decifrar o código e terminada a tarefa descobrimos que se tratava de duas frases; a primeira dizia: “Hermes sabe onde os outros estão” e a segunda repetia “Eles já se aproximam”. Na época elas não significavam absolutamente nada, portanto nenhuma providencia foi tomada; pensava-se que tudo não passava de algum tipo de interferência captada pelas antenas de rádio.

_O presidente já está a par destas informações e outras que só revelaremos se for necessário e em tempo oportuno, mas de antemão estamos declarando que, até que seja resolvido o problema Hermes, o Estado do Rio de Janeiro está em regime de guerra.

A multidão de repórteres e correspondentes internacionais não podia acreditar; o estado de guerra constituía um poder de tomada de decisão emergencial, que era na verdade um conselho formado pelo governador do Estado, o próprio ministro das situações extraordinárias, e um supremo magistrado do local em questão; esses três teriam o poder da vida e morte em suas mãos, leis poderiam ser criadas e implantadas imediatamente e toda força bélica do Estado do Rio de Janeiro, não importando a quem pertencesse, entrava debaixo da autoridade do conselho da guerra. Este conselho podia ser invocado somente pelo ministro especial a mando do presidente da república e poderia ser utilizado nas três esferas, municipal, estadual; como era o caso, e ou federal, que abrangeria todo o Brasil; era uma medida criada para manter unificadas as ações bélicas do país para o caso de guerra no mundo ou para o confrontamento contra o crime organizado nas grandes capitais do país. O Rio de janeiro já tinha passado pelo estado de guerra duas vezes, ambas para combater a violência que tentava tomar o controle do Estado, mas já fazia mais de dez anos que esse mecanismo não era acionado.

Este poder temporário constituído só estava abaixo do Presidente da República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e do Supremo Tribunal Federal, que tinham plenos poderes para o desfazer quando achasse conveniente e ou necessário, fora isso, havia um tempo previsto na lei que criava o mecanismo da guerra, dizendo que a partir do momento em que fosse invocado o direito do estado de guerra, este permaneceria por seis meses se convocado na esfera municipal, um ano se na esfera estadual e um ano e seis meses na esfera federal; podendo ser prorrogado somente por iniciativa popular via plebiscito. Somente o povo tinha nas mãos o poder de prorrogar o estado de guerra.

As pessoas munidas de seu cartão virtual de eleitor e através da rede global de computadores; a nova geração da Internet; votariam a favor ou contra a manutenção do conselho da guerra; sendo que no caso do Rio de Janeiro, só os moradores deste Estado poderiam votar, se fosse em um município, só os moradores locais votariam e no caso do Brasil, todo o país seria mobilizado; esta emenda da constituição ficou conhecida como “O escudo do povo” e mais tarde foi copiada por outras nações da América do sul, América central e África.

***

Hermes havia ficado um bom tempo de olhos fechados como se estivesse em transe, sem se importar com a multidão cada vez maior de espectadores que se aglomeravam ao seu redor, transeuntes, repórteres, enviados internacionais, curiosos, policiais, bombeiros e uma guarnição dos fuzileiros que acabara de chegar com caminhões e armamentos. Seus braços permaneciam cruzados junto ao peito e a cabeça baixa.

Logo que o pronunciamento sobre o estado de guerra foi terminado as forças de contenção se organizaram; atiradores foram colocados nos altos dos prédios vizinhos de onde tinham total visibilidade do alvo e estavam preparados para disparar se a ordem viesse.

Por telefone o governador do Rio estava em contato com o líder provisório da operação no local e exigia uma solução rápida para aquela situação; os repórteres cinematográficos das emissoras de TV também procuraram lugares privilegiados nos prédios aos arredores, de onde nas janelas podiam documentar a provável ação que seria desencadeada lá em baixo na rua. A informação já havia vazado, estavam apenas esperando o momento que as tropas com maior poder de fogo chegasse para retirarem o invasor à força.

Hermes se moveu, e a multidão se assustou, alguns correram; mas ele apenas queria falar, porquanto já sabia o que se passava.

_“Vejo que minha missão tornar-se-á em batalha”. _disse.

Com um gesto rápido das mãos, algo ocorreu, nenhuma pessoa percebeu até que um relâmpago chicoteou o solo próximo aos pés de Hermes deixando ali um artefato fincado no chão; as pessoas atônitas procuravam explicação, mas não encontravam.

O artefato cravado no asfalto derretido era um Caduceu; um bastão de metal com cerca de um metro que reproduzia uma vara de oliveira enlaçado por duas serpentes, também de metal, e em cuja extremidade superior estava um pequeno globo adornado por duas asas abertas. Hermes o recolheu do chão cuidadosamente, mas aquele ato estava sendo entendido como hostil pelas autoridades presentes no local.

_ Não se mova!_ gritava constantemente o líder provisório da operação. E dizia mais: _ Solte este bastão! Seremos obrigados a atirar!

Hermes, já de posse do caduceu não dava muita atenção aos berros amplificados pelo megafone e retribuindo com sua voz de cem homens começou a falar:

_“Eu vim aqui apenas para trazer a mensagem, caso vocês não mudem seus atos, cairá sobre suas cabeças o julgamento. Seu futuro depende do presente.”

Mais tropas começaram a chegar; estavam muito próximos do Comando militar do leste, que é o quartel General do exercito brasileiro na região. Dois caminhões com soldados bem armados chegaram de ambos os lados das quatro pistas da grande avenida, rapidamente os homens se prepararam para um ataque forte e coordenado. Ao que parecia todas as forças de defesa estavam concatenando seus esforços para uma ação unificada.

Hermes ergueu o caduceu como se levanta um troféu, com uma das mãos, e do globo metálico e reluzente surgiu uma luz forte, momentaneamente todo o som foi retirado do lugar, ninguém soube explicar o que foi aquilo. A luz foi rápida e passou por todas as pessoas presentes.

Quando finalmente desapareceu a luz; como se algum mecanismo desconhecido tivesse se desligado, as pessoas sem saber o que ocorrera foram pegas desprevenidas com os disparos coordenados das tropas militares.

O grupamento de soldados havia recebido, no momento em que a luz ganhou volume a partir do instrumento empunhado por Hermes, a ordem para abrir fogo; logicamente o comando da operação julgou que se tratava de uma ação hostil. Os atiradores alocados no alto dos prédios também tinham uma visão privilegiada do alvo em questão e dispararam quase que simultaneamente.

A população que acompanhava ao longe, fora da zona de perigo estabelecida pelas autoridades não puderam ver muito do que verdadeiramente aconteceu, mas as câmeras de TV focalizavam o estranho Hermes transmitiram em rede nacional o exato momento que ele com um simples tapa desviou o primeiro projétil que chegou ao seu encontro; porém a saraivada de balas de diversos calibres chocou-se contra o “homem que veio do céu” e ele não foi capaz de evitá-la. O som estranho se propagou no ar sem que Hermes produzisse um único grito, as balas lhe perfuravam praticamente todo o corpo, nenhuma gota de sangue brotou pelos orifícios, ao contrário; era um som de metal contra metal. O estranho visitante caiu de joelho e cravou com força o seu caduceu contra o solo novamente, as pequenas asas se estenderam e o globo rebrilhava intermitentemente; Hermes se levantou no momento que a primeira bateria de disparos cessou e antes que a segunda fosse deflagrada levantou vôo da mesma forma como chegou, tão velozmente que assustou a praticamente todos que estavam ali.

Um estrondo sônico foi ouvido assim que ele saiu do raio de visão das pessoas num vôo vertical que parecia ser rumo ao céu novamente ou ao espaço. Hermes desapareceu.

***

O caduceu ficou cravado no solo até que uma equipe especializada em recolhimento de artefatos desconhecido foi trazida de Brasília para o Rio de Janeiro, o que aconteceu no fim dia seguinte, o lugar permaneceu isolado e passou por todo tipo de testes e perícias visando descobrir com exatidão de que lugar Hermes teria vindo; nenhuma radiação foi encontrada assim como nenhuma bactéria conhecida pelo homem, a rua estava exatamente como se nada tivesse acontecido ali, mas uma coisa passou a intrigar pesquisadores cariocas, brasileiros e de todas as partes do globo. O artefato recolhido, o caduceu, não era um simples apetrecho confeccionado com metal e sim um complexo artefato cuja tecnologia jamais foi vista por pessoa alguma sobre a face da terra; ele foi estudado exaustivamente por autoridades das mais conceituadas instituições de pesquisas nacionais e seguidamente por algumas internacionais também.

O caduceu trazia uma intrincada rede informatizada, tão perfeitamente montada que só poderia ser comparada ao próprio cérebro humano.

O que seria aquilo? O que significaria aquela visita de Hermes? E quanto às imagens em Marte?

No limiar de um novo tempo muitas perguntas surgiram e permaneceriam sem resposta até a segunda visita, mas toda a população já sabia que uma sombra pairava sobre suas cabeças; uma inteligência superior havia visitado a raça humana naquele dia trazendo consigo uma tecnologia que estava fora dos padrões de entendimento das pessoas e assim permaneceria por muito tempo. O primeiro visitante foi pacífico, mas o segundo seria devastador.

***

“Libertem o segundo...”.

Luiz Cézar da Silva
Enviado por Luiz Cézar da Silva em 04/04/2013
Código do texto: T4222637
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