2111 - Cap I - MH
"Nos anos 100 A.C, escritos antigos relatam que houveram "tempestades de luzes" que foram vistas tanto pelos chineses, tanto pelos romanos, ou seja, uma Aurora Boreal que pode ser observada de muito longe do Polo Norte, o que sugere que uma tempestade solar intensa atingiu a Terra. É dito que os "MH" foram anomalias criadas depois dessa tempestade, elas estão presentes em varias culturas da História, muitas civilizações antigas às cultuavam como sinais dos deuses, portais pro paraíso, entre outras coisas. No final do sec XIX, físicos teóricos afirmaram que eram fenômenos causados pela própria atmosfera, anos depois Einstein concluiu com a Teoria da Relatividade Geral, que os MH eram falhas no tecido espaço-temporal, no seu estudo ele introduziu ao mundo os conceitos de espaço-tempo e descreveu tais fenômenos como "linhas de costura" nesse tecido e que essas "linhas" seriam naturais, embora os registros de tais eventos só acontecessem depois da "tempestade de luzes". Anos mais tarde, as teorias da mecânica quântica puderam desvendar mais segredos do fenômeno, embora ele ainda não seja compreendido na sua totalidade. Os físicos modernos teorizaram que seriam causados por rompimento nas cordas dimensionais¹, que eram geradas por tensões nas forças Magnética e Fraca dos átomos², cujos elementos subatômicos seriam desfragmentados em razão disso, até só sobrarem os quarks³ das partículas, que irão interagir com os átomos em volta, iniciando um processo em cadeia, que só cessaria quando encontrasse átomos mais pesados que o boro, no caso, do carbono em diante, e por isso só aconteciam em altitudes elevadas, onde a concentração de gases leves é maior. Mas há relatos de eventos desse tipo ocorrendo em atitudes baixas ou mesmo no oceano, o que seria teoricamente impossível, como esses casos foram mal documentados, nenhum deles foi aceito como fato. Visualmente os MH aparecem como formas coloridas no céu, eles surgem de repente e somem tão de repente quanto, são luminosos e bonitos, mas perigosos, pois fazem o ar a sua volta ficar menos denso, e prejudica a navegação de aeronaves e balões, alem de poder provocar sua queda, ou algo mais.."
Cristian Bernard de Lorient, Ciência na Ficção - MH, formação e perigos.
Rio de Janeiro, 30 de Julho de 2015
Rio de Janeiro, 23 de Março de 2010
– Então você é fluente? – Perguntou o Entrevistador.
– Sim – respondeu enquanto se remexia na cadeira, já entediado. – Eu nasci na França.
– E o que faz aqui? – o Entrevistador perguntou enquanto fazia anotações no papel.
– Eu faço faculdade de Letras, estou no 2º período, mas tranquei...
– Não – interrompeu o Entrevistador olhando fixamente para ele – Estou perguntando o que voce faz aqui no Brasil, o que te trouxe até aqui?
Cristian olhou pro relógio na parede, 16 horas. Tinha marcado com os amigos as 16:30, era visível sua irritação com as perguntas irrelevantes daquele cara.
– O que isso tem a ver com o trabalho? Eu só nasci lá, mas minha familia é toda brasileira, eu vim pra cá com 8 anos.
O Entrevistador continuava olhando fixamente para ele, então continuou:
– Você não tem nenhuma referencia, nem nenhum diploma que comprove sua fluência, mesmo sendo bom conversador, como podemos...
– Você quer ver minha identidade? – Cristian interrompeu irritado – e o teste oral? Não foi suficiente?
– Eu só quis dizer – disse o Entrevistador enquanto fazia novas anotações – que você não é profissional, quer dizer, não é professor, mesmo que saiba bastante de francês, você não tem a qualificação necessária para...
– Ora, o cara é francês, como não tem a qualificação necessária? – O homem tinha acabado de entrar na sala, sem bater nem pedir permissão, e tinha ouvido o final da conversa – Só porque ele não tem um diploma? Porra, quem poderia ensinar melhor do que ele? Contrate logo, ele é o ultimo de hoje e já vamos fechar, amanhã contrataremos o outro.
– Bem, senhor... – começou o Entrevistador.
– Esse é o seu problema, você é um bom funcionário, sempre acerta a mão nas contratações, mas deixe de ser pragmático um pouquinho, hoje é meu aniversário e eu quero ir logo para casa.
– Parabéns senhor. – Cristian levantou e se dirigiu até o homem para cumprimenta-lo. Oportunista como sempre, não poderia perder essa chance, esperava que ele não reagisse mal a essa "puxação prematura de saco".
– Muito bem filho, obrigado. – o homem o cumprimentou. Tinha um rosto forte, como sua personalidade, era de meia-idade, cabelos um pouco grisalhos, e parecia ter uma energia juvenil. – Meu nome é William, seja bem-vindo, espero que possa desempenhar um bom trabalho.
– Com toda certeza, senhor. Darei o meu melhor. – respondeu Cristian, enquanto o velho saía. Voltou-se ao Entrevistador, com um risinho e olhar triunfante, voltou a se sentar. Olhou para o relógio, 16:07, precisava correr.
– Bem, – disse o Entrevistador, dando de ombros. – você começa amanhã às 13 horas. Espere aqui enquanto eu pego as planilhas das turmas que irá lecionar. – Ele se levantou e saiu da sala.
Cerca de 10 minutos depois, enquanto o Entrevistador voltava ao seu escritório, se deparou com Cristian no corredor.
– Eu ja falei com seu chefe, ja ta tudo certo, eu to atrasado, preciso ir. – Cristian pegou o envelope da mão dele e saiu em disparada pelo corredor. o Entrevistador, claro, ficou puto, não tinha ido com a cara daquele sujeito.
Cristian saiu igual um louco do prédio, ja eram 16:29, e demoraria bons 20 minutos até chegar ao local que haviam marcado. Aquilo era importante, sua quase-ex namorada havia ficado furiosa com ele por ter furado todas as outras trocentas vezes que tinham marcado. Seus "amigos" ja não o chamavam muito pra sair pela sua fama de descompromisso. Atravessou a rua correndo, mas um carro vinha rápido demais, ou ele calculou mal, e quase o atropelou, ele conseguiu dar um passo grande pra evitar o carro, mas não conseguiu evitar a bicicleta, que vinha atrás.
Uma hora depois, Cristian decidiu pegar um táxi até o apartamento que dividia com o irmão. Tinha se machucado um pouco, mas a mulher da bicicleta havia se machucado mais, (pasmem!). Teve de acompanha-la até um posto de saúde, depois de medicados e de um pedido de desculpas, ambos puderam prosseguir, mas pra ele ja estava tarde.
Quando chegou em casa, ligou o computador, haviam dezenas de mensagens para ele, dela é claro, ignorou-as. Ele era assim, não ligava pros outros, por mais que se esforçasse, não conseguia, depois dessa, acabou desistindo.
– Que se foda – falou em voz alta.
– O que? – seu irmão perguntou de outro cômodo.
– Nada. – respondeu. Havia conseguido o emprego, "aquele filho da puta daquele Entrevistador ia me dispensar, mas consegui, agora é só me manter por pelo menos 6 meses e.. e o que?" Pensou, enquanto navegava sem rumo pela internet. "Eu não continuo nada, não termino nada, vivo a 3 anos no apartamento do meu irmão, e?" Antes que continuasse a pensar na sua crise de vida, uma noticia num site o chamou atenção, dizia:
"ENCONTRADO TRANSATLÂNTICO DESAPARECIDO, CERCA DE 200 PESSOAS DESAPARECIDAS, 50 MORTAS"
Por algum motivo, clicou na noticia e abriu a pagina com o restante da noticia:
"Foi encontrado, nessa terça-feira, perto de uma ilha no pacifico sul, o Transatlântico da companhia de cruzeiros americana Work at Sea que havia desaparecido dos radares no ultimo dia 19 perto da Nova Zelândia, ele havia saído de São Francisco com destino à Sidney, cerca de 250 passageiros haviam embarcado. Depois de 5 dias desaparecido, o navio foi detectado pelos radares perto de uma ilha desabitada da Indonésia, onde só existe uma estação de antenas de transmissão. Antes mesmo de ser re-detectado pelos radares, funcionários que iam para a manutenção semanal da estação, viram do helicóptero um navio que parecia bastante danificado, com buracos imensos nas laterais. Depois de cerca de 3 horas da confirmação por radar, a Marinha da Indonésia localizou o navio e confirmou que era o que havia sumido. O capitão da operação da Marinha tentou, mas não conseguiu fazer contato com a tripulação. Depois de mais algumas horas sem conseguir fazer contato, nem avistar ninguém no convés do navio, os marinheiros decidiram embarcar-lo usando um helicóptero. Eles relataram que o navio estava bastante danificado, com partes do casco faltando e aberturas no convés, o interior estava parcialmente destruído e as paredes com centenas de buracos a abertos por balas, tanto os salões quanto a cabine, haviam corpos espalhados pelo navio, inclusive de membros da tripulação.
Depois da inspeção, o navio foi rebocado até o porto de Yogyakarta, onde permanecerá para inspeção completa, cerca de 50 corpos foram encontrados. A companhia Work at Sea mandou representantes à Indonésia e espera recuperar o navio assim que os trabalhos da Marinha estiverem concluídos. Parentes dos que estavam à bordo aguardam noticias oficiais. Não se sabe ainda como o navio chegou à costa indonésia, nem os motivos do desaparecimento por radar, nem a causa da morte dos embarcados."
Cristian achou intrigante aquele fato e lembrou vagamente do trabalho que seu pai desempenhara na França, ele tinha trabalhado no CERN e tinha participado dos primeiros anos de construção do LHC. Certa vez, a muitos anos, conversaram sobre os riscos e sobre alguns acidentes que aconteceram mas foram "encobertos", seu pai acreditava que tinham relações com o fenômeno que ele via agora pela janela. Foi ele que lhe contou sobre a história daquilo. O MH.
"Mas o que os MHs tem a ver com os acidentes?" perguntara uma vez a seu pai.
"Filho, o que eles estão fazendo lá é muito complexo, mais complexo do que se imagina, brincar com átomos, e com partículas subatômicas não é legal, não conhecemos todas as forças envolvidas, algumas coisas podem dar errado, e deram."
Seu pai nunca falou muito mais sobre isso, vivia agitado e ja não mais frequentava o meio academico, se limitando a dar aulas de física em cursinhos.
"E pensar que ele ja foi um físico teórico que trabalhou pro governo francês". Cristian sempre se interessou por teorias físicas, quânticas e astronômicas, tentou fazer Física, mas depois de não conseguir duas vezes, seu irmão o aconselhou a fazer Letras e dar aulas de francês, bem, era o mais fácil.
Zapeando por links de noticias à sites de teorias religiosas, encontrou uma pagina que falava sobre o tema, e falava sobre o que ele queria. Era um blog daqueles "das trevas" como ele costumava chamar, e continha um texto com varias teorias e "provas" que embora absurdas, linkavam as teorias cientificas aos fatos.
A pagina relatava que cerca de 20 embarcações haviam desaparecido misteriosamente pelo globo nos ultimos meses, à la Triangulo das Bermudas, e que destas cerca de 5 ou 6 haviam sido encontradas todas da mesma forma, sem tripulantes ou com os tripulantes mortos por tiros, alem da embarcação remexida e destruída por balas, como se houvessem atravessado uma zona de guerra, ou se aproximado de um porto militar sem autorização. Sem contar as aeronaves e balões desaparecidos.
"Claro que o cara que escreveu isso ignorou qualquer tipo de acidente que possa ter acontecido." Pensou. O texto continuava afirmando que os MH eram responsáveis por esses sumiços, mas ele explicava o porque de forma rasa e sem sentido, algo como "pontes" que ligavam uma parte do tempo à outra, e que essas embarcações haviam sido transportadas para a época da Segunda Guerra Mundial, e voltado, pura bobagem. Cristian ja estava fechando a pagina, quando um link o chamou atenção, era da Wikileaks, e dizia que os governos ocidentais estavam fazendo testes atômicos na atmosfera superior, uma coisa bem estilo Zeigeist, mas a curiosidade falou mais alto, então ele clicou. Uma pagina escura apareceu, com as letras brancas. "Tipicamente sensacionalista" riu, e começou a ler:
"DOCUMENTOS MOSTRAM QUE A OTAN FAZ EXPERIMENTOS ATÔMICOS NA MESOSFERA"
"Documentos sigilosos vazaram anteontem, acredita-se que foram hackers do grupo chamado "Nova Terra", esses documentos mostram indícios de que a OTAN com consentimento da ONU faz experiencias proibidas na camada da mesosfera da atmosfera terrestre, com o intuito cientifico e militar. Eles sugerem que cientistas a mando dos países dessa aliança militar, fazem estudo sobre as propriedades dos núcleos atômicos e de quarks avulsos que são coletados na mesosfera terrestre, eles tentam entender como eles se relacionam, e como se manisfestam próximo a MHs, lembrando que é nessa zona que eles se formam. Há também documentos sigilosos da NASA que afirmam..."
Nesse momento da leitura faltou de energia e o computador desligou, o que deixou Cristian tão irritado, que ele deu um tapa violento na maquina, que balançou sobre a mesa. Alguns momentos depois seu irmão apareceu procurando uma lanterna.
– Tem uma lanterna aí Cris?
Ele abriu uma gaveta da mesa e tateou em busca da lanterna, entregou ao seu irmão.
– Jean – Disse levantando da cadeira – depois me lembra de comprar um notebook.
Jean riu dizendo:
– Eu tava com frag 45/0 cara, Quarenta e Cinco - Zero! Nunca mais vou conseguir de novo.
– E eu tava conversando com uma garota la de Paris, tava quase conseguindo. – Cristian disse divertidamente. – Ela ja tava me dando o endereço dela!
Os dois ficaram ali rindo por um tempo, o dia ja estava dando lugar a noite, decididos a não ficar ali esperando, resolveram ir pra algum lugar se divertir, eles gostavam da companhia um do outro, e ja fazia um tempo que não saiam pra beber juntos.
Mas a noite toda Cristian ficou pensando naquilo, de tempo em tempo olhava para o céu e lá estavam elas, fazendo sua dança a quilômetros de altura, ora aparecendo, ora sumindo de repente. Sabia que aquilo tinha levado seu pai ao ostracismo na comunidade cientifica por achar que aquelas coisas eram ruins, aquela pequena pesquisa de web tinha reacendido seu interesse por a aqueles assuntos, prometeu a si que voltaria a pesquisar, talvez fosse a alguma biblioteca procurar livros, quem sabe até mostrar seus resultados a seu pai, ja que não o via a muito tempo, talvez isso os reaproximasse.
Não era uma má ideia, tinha muito tempo livre e aquilo era um passatempo divertido, que o fazia se sentir moleque de novo, a "fome pelo saber".
Mais tarde, Cristian teve um sonho estranho, que o fez acordar ensopado de suor. No sonho ele estava perdido, em algum lugar que ele sabia ao qual não pertencia, estava ensanguentado, e uma mulher estava ferida ao seu lado, ele gostava daquela mulher e tentava ajudar ela a se levantar, quando um clarão iluminou a noite e uma imensa bola de fogo surgiu no céu, então uma onda de choque violenta os jogou para tras e um calor irradiou pelo seu corpo, um calor que vinha de dentro, ele viu um cogumelo de fumaça ao longe e pensou: "Outra bomba, só que dessa vez perto demais pra nós conseguirmos escapar" e tristemente reconheceu que era o fim, enquanto observava resignado uma imensa coluna de fogo vindo velozmente em sua direção.