2111 - Introdução: A Praia

Levantou com dificuldade, as pernas tremiam tanto que pareciam que iriam se quebrar, não aguentando o peso, sentou-se na areia dura e fria tentando lembrar o que tinha acontecido. Sentia uma dor incomoda por todo o corpo, como se tivesse sido puxado e dobrado como uma sanfona. Fez um esforço tremendo para se levantar novamente e respirou fundo. O ar, altamente tóxico, fez seus pulmões protestarem com uma violenta tosse que quase o derrubou, mas seu cérebro mandou uma ordem bem clara para que suas pernas não fossem fracas e não cedessem. Concentrou-se, olhou em volta.

Nada.

Não conseguia ver nada a mais de um palmo, estava no meio de uma neblina cinzenta. Ainda tossindo fez um esforço para dar um passo, suas pernas sofriam com uma dormência terrível. Conseguiu na segunda tentativa. Foi caminhando lentamente em alguma direção, um passo de cada vez, tentando ouvir e ver alguma coisa. Nada. De repente pisou em alguma coisa dura, que se quebrou com um estalo. Num primeiro momento deteve-se, mas depois gemendo de dor, conseguiu se arquear um pouco e ver no que tinha acabado de pisar, era um crânio.

Um crânio humano.

Um vento gélido, que o fez se arrepiar, soprou e espalhou um pouco a neblina e clareou sua visão.

E ele viu.

Dezenas, se não centenas de ossos humanos espalhados a frente e aos lados. Virou-se e com horror viu que a cena se repetia. O lugar que ele estava era o único espaço vazio na areia. Estava cercado de ossos.

Amedrontado, pôs-se a correr em direção a local nenhum, pisando, chutando os restos mortais no caminho. "Estou no inferno" pensou "Morri e estou no inferno" De repente tropeçou em alguma coisa, e caiu de cara na areia.

Vermes rastejavam na areia.

Com um grito de nojo e terror , se levantou e continuou a correr às cegas, queria gritar, "Mas" pensou ''Assim os demônios me acharão".

Estava assustado demais, só então percebeu que estava correndo. Como, se antes mal conseguia se levantar?

Parou subitamente, precisava manter a calma, quando ouviu alguma coisa que parecia ser o som de hélices. Olhou em volta, inutilmente, não conseguia ver nada. Como se lendo seus pensamentos o vento gélido soprou novamente, e ele conseguiu ver, eram mesmo hélices. Era um helicóptero, ao longe, baixo, e estava vindo na sua direção. Concluiu então que estava vivo, não estava no inferno afinal.

Levantou os braços para fazer sinal ao helicóptero, o vento que as hélices produziam espalhava mais a neblina, e ele pôde ver o mar. A água era escura, havia muito lixo e ossadas boiando. Estava numa praia, uma praia de morte.

Ele continuava a fazer sinal para a aeronave, enquanto se perguntava onde estava e porque havia pessoas mortas aqui. A aeronave, como que para responde-lo, de repente, começou a atirar, fazendo enormes buracos na areia e despedaçando os ossos a pouco mais de dois metros dele. O som dos tiros parecia o de um trovão cem vezes ampliado, gaivotas, ou abutres, em algum lugar alçaram voo, assustadas. Antes que pudesse se perguntar porque diabos haviam atirado, ele correu. Na próxima não iriam errar.

Mas erraram, a névoa deve ter atrapalhado quem estava atirando. Ele continuou correndo, enquanto a chuva de balas o seguia, podia ouvir os ossos explodindo bem perto dele, alguns estilhaços açoitavam suas pernas. Se tropeçasse novamente e caísse, estaria morto. Logo pode avistar a alguma distância o final da areia da praia, e lá havia um pequeno canal que cortava a praia em direção ao oceano que saía de um tunel, correu até la. Antes que entrasse no túnel, o helicóptero havia cessado os disparos, provavelmente o havia perdido de vista, ja que a névoa era escura e muito densa.

Ficou algum tempo escondido dentro do túnel, ja não ouvia nenhum barulho do lado de fora, embora fosse apertado ao ponto de ter que se manter agachado, não se atrevia a sair. Pensava no que iria fazer em seguida, reparou, espantado, que ja não sentia nenhuma dor no corpo e que havia se recuperado totalmente. Estranhou, não fazia ideia de onde estava e como tinha chegado ali, mas ja não estava mais ferido. Decidiu ver até onde ia o túnel, e o seguiu na escuridão.

Depois de alguns metros viu alguma claridade à sua frente, era o final, lá o espaço era mais amplo, e ja podia ficar de pé, viu que a luz vinha de uma abertura acima, de um buraco gradeado. Na parede a sua frente havia uma escada, concluiu então que era um túnel que levava a água da chuva até o canal la fora, e que ali em cima ficava a entrada da água. Não tinha outra escolha, a não ser subir e averiguar, torcendo pra que não encontrasse novamente seus opositores.

Retirou a grade e cautelosamente pôs se a espiar, a névoa escura havia diminuído, mas mesmo assim não conseguia ver muito além, só via até a altura do chão de asfalto. Saiu inteiramente do buraco, concentrado em qualquer coisa que pudesse ouvir, mas o silencio era total, somente se ouvia o vento soprando levemente aqui e ali. Caminhou um pouco, quando de repente ouviu alguma coisa. Concentrou -se, e tornou a ouvir, abafado, o mesmo som aterrorizante de antes.

Eles estavam em seu encalço, o estavam procurando. Uma forte ventania bateu de repente, e um clarão, como o de mil holofotes, abateu-se sobre seu rosto. Protegendo os olhos viu o que era, eram seus opositores, estavam planando a sua frente, o helicóptero parado como um beija-flor, notou espantado que ja estava praticamente sobre ele. Sem pensar muito saiu correndo, a forte ventania que as hélices produziam clareavam sua visão, e ele pôde ver que estava numa rua deserta, e nas margens da rua havia casas totalmente destruídas.

A alguns metros havia um cruzamento, e no meio pedaços grandes de metal retorcido, pareciam carros, ou aviões, ou mesmo barcos, não importa. Decidiu virar a esquerda e continuou a correr a toda velocidade, o suor escorrendo pelo rosto, os batimentos acelerados, e aquela coisa barulhenta atras dele, quando começaram a atirar viu, de canto de olho, pedaços de asfalto explodindo a pouca distancia, se aquela coisa o acertasse com certeza faria um tremendo estrago, agradeceu a Deus pelo sujeito que disparava ser péssimo de mira

.

Ja havia percorrido loucamente uns 300 metros, com aquela coisa atirando nele e errando, naquela rua deserta e sem fim quando viu algo que no primeiro momento parecia uma miragem. A sua frente uns 150 metros, parado como estatua havia alguém, apertando os olhos viu que eram duas pessoas, e uma delas, a maior, segurava um imenso cilindro por cima dos ombros, parecia ser um estranho lançador de granadas.

Quando percebeu o que era e mudou de direção rumo aos escombros, ja era tarde, a pessoa ja havia disparado, mas não era ele o alvo, e sim o helicóptero. Atônito, acompanhou a trajetória do míssil até o alvo, houve um clarão, seguido de um som ensurdecedor e uma gigantesca onda de choque, seja do que fosse feito aquele míssil, parecia que poderia destruir um 747 inteiro, tamanha era a violência da explosão. Enquanto se jogava sobre os escombros para se proteger, viu a maquina se despedaçar em bilhões de pedaços, e um pequeno cogumelo de fumaça se formar, enquanto os pedaços eram lançados a uma distancia absurda.

Ainda tomado pela injeção de adrenalina, não ficou muito tempo contemplando aquela magnifica destruição e pôs se a correr, agora na outra direção a fim de evitar quem quer que portasse aquela arma, mesmo que houvesse-lhe salvado, quando uma mão o agarrou pelo braço, virou-se e de imediato ficou surpreso, pôs quem lhe segurava era uma mulher a sorrir, com a mortífera arma nas costas.

A sua surpresa não era só pelo fato de ser a mulher de uma beleza magnifica e de semblante tão acolhedor, mas também pelo fato de ter sido ela quem disparou aquela arma de projetil tão mortal, que estava a uma boa distancia de onde ele estava, e ja havia alcançando-o. A força do braço que o havia puxado era vigorosa, e quando se virou esperava encontrar algum algoz de tamanho considerável. Viu que o braço que o segurava era em parte robótico, estava tão surpreso que de inicio não teve reação, mas quando voltou a si e ameaçou uma, um rifle imenso foi apontado pra sua cabeça. Pertencia a outra pessoa que vira, que surgiu de repente atrás da mulher. Estava rendido.

Poucos metros atras, os destroços do que outrora fora uma aeronave ardiam sem cessar, a mulher continuava a sorrir lhe e segurar seu braço com força, o outro, que parecia ter acabado de chegar a juventude, continuava a apontar-lhe a arma, enquanto o suor escorria de ambas as testas. Subitamente a mulher, sem parar de sorrir, soltou seu braço e falou alguma coisa em espanhol, que ele não conseguiu entender. Ele se virou pro que lhe apontava a arma e lentamente levantou as mãos, para sinalizar que estava desarmado. O jovem continuou-lhe apontando o rifle e lançou um olhar desafiador, então a mulher falou algo com ele em inglês, e ele, contrariado abaixou a arma, mas continuou com o mesmo olhar de desafio.

A mulher tornou a virar-se para o homem que eles tinham impedido de fugir e novamente falou em espanhol, notou que o homem não entendia então tentou ser mais específica: Perguntou-lhe em vários idiomas, até que o homem respondeu-lhe quando ela chegou ao francês.

- Sim, eu falo francês - ele respondeu.

-Ótimo - ela respondeu, sem desfazer o sorriso - Então venha conosco, eles quase te mataram aqui fora, foi por pouco, foi uma tremenda sorte sua que nós estávamos por perto.

Ela virou para o jovem com a arma, estendeu a mão, e este tirou do bolso da calça uma pulseira metálica azul brilhante.

-Tome, use-a - falou, e o jovem, ainda com cara de poucos amigos entregou a pulseira para o homem, que a examinou e vestiu. - Ela vai fazer com que eles não te detectem pelos radares.

Antes que ele pudesse abrir a boca para perguntar quem eram eles, ela o puxou novamente pelo braço e começou a correr.

- Vamos - disse ela - esse lugar vai estar cheio deles em um minuto!

Quando ela terminou a frase, ele ouviu, quando o jovem ja estava correndo a frente e ela sacando a bazuca, ele se virou e viu. Havia uns 20 ou 30 helicópteros de guerra vindo em sua direção, todos eles com os holofotes acesos, procurando, e logo acima, uma aeronave gigantesca, algo tão grande e descomunal que fazia o maior avião do mundo parecer de brinquedo. O pesadelo iria recomeçar, e pior.

Mal ele sabia que era só o começo.

Daniel Santos MontSerraint
Enviado por Daniel Santos MontSerraint em 01/02/2013
Reeditado em 09/11/2014
Código do texto: T4118175
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