Famosas últimas palavras

A evacuação possível foi feita de maneira surpreendentemente rápida e organizada, considerando-se que não haviam assim tantas naves de grande porte disponíveis e que apenas 1% da população planetária - se tanto - conseguiu vaga para fugir antes que os primeiros torpedos de fusão entrassem na atmosfera. Quanto aos 99% restantes, restou-lhes apenas sentar-se e aguardar pacientemente o fim; algo que, misericordiosamente, não demorou muito.

O presidente de Abahria foi um dos primeiros a deixar o planeta com sua família. Num vídeo gravado, prometeu que iria organizar a resistência aos invasores - bem longe dali, naturalmente.

- Eu voltarei! - Declarou enfaticamente ao final da mensagem.

Escusado dizer que nenhum dos seus eleitores acreditou nele.

Entrevistado por uma rede noticiosa, o reitor da principal universidade do planeta negou que houvesse qualquer profecia vinculada ao apocalipse iminente:

- Não há melhor prova de que profecias sobre o fim do mundo são tolice, do que o fato de que o mundo - o nosso mundo - vai mesmo acabar, e não havia nenhuma profecia prevendo isso!

Questionado se esta vitória final da razão lhe dava algum conforto, o reitor respondeu que a trocaria facilmente por uma passagem só de ida para outro sistema solar.

- É bom estar certo. Mas é melhor ainda estar vivo.

Numa mesa redonda transmitida da capital planetária para meia Galáxia, um dos debatedores declarou a sua indignação com a perspectiva do fim próximo:

- Imaginem: bilhões de anos de evolução de vida biológica, milhares de anos de progresso tecnológico, um patrimônio artístico e cultural insubstituível, e agora tudo isso vai virar fumaça!

Outro debatedor aparteou, filosoficamente:

- Fumaça, não: poeira! Poeira de estrelas.

Todos concordaram que havia uma certa beleza poética naquela horrível perspectiva de destruição absoluta.

[20-12-12]