Expresso Transcroniano - Parte 4
*** Mrs. Mallowan e Sir Arthur Conan Doyle ***
Ele segurava a valise com cuidado, tentando afastá-la de curiosos. Aparentando ter entre 50 e 55 anos, se vestia com elegância, apesar de usar uma roupa que deveria estar na última moda... do final do século passado! Felizmente a estação 19-60 estava vazia naquela hora, e o Expresso deveria chegar a qualquer momento. Ela, uma bonita mulher com seus 35 anos, quase o reconheceu à distância, ainda mais porque a plataforma estava bem vazia. Mas quando ele enfim levou o cachimbo à boca, tomou coragem e se aproximou:
- Ora ora! Quem vejo aqui? Nada mais nada menos que o grande Sherlock Holmes em pessoa!
Arthur abre um sorriso sincero para a simpática amiga.
- Quanta coincidência, Mrs. Mallowan! E parece que insiste em me chamar pelo nome do meu personagem, não é? Apesar de eu já ter tentado matá-lo uma dúzia de vezes...
- Ele tem vida própria, Sir! Toda vez que tentar, ele vai acabar ressucitando! Eu é que nunca vou tentar matar o querido Hercule Poirot na minha vida! Isso não!
- Hehehe, sei... - Conan Doyle deu um risinho sarcástico, como quem já soubesse de algo que Agatha ainda não sabia. - E pra onde vai a nobre dama?
- Para a estação 19-26... - havia ressentimento em seus olhos.
- Tem algum problema que a incomoda? Deduzo, a partir de seu penteado, da pouca bagagem, e do colar que usa desalinhado no pescoço, que talvez...
Parou logo. Deduziu com exatidão que ela planejava dar continuidade àquela vingança que mencionara na última conversa. A propósito, o último encontro não se dera na estação 19-30, com ele desembarcando e ela embarcando no sentido oposto, indo para o futuro? O que ela fazia regressando 4 anos antes?
- Você e suas deduções... Ah, mas aquele coronel não perde por esperar, Mr Doyle, ou eu não me chamo Agatha Mary Clarissa Mallowan! Mas.. vamos deixar estas coisas de lado, né? Parece que agora podemos conversar com mais calma até este trem chegar. - vê a valise que ele tenta esconder sem sucesso nas costas. - Algum segredo aí dentro? - e cochicha baixinho: - Por acaso não está contrabandeando informações do futuro, está?
- Francamente, senhora!!! - ele ficou indignado, de verdade.
- Brincadeira! Brincadeira! Se prefere continuar mantendo segredo, tudo bem...
- E Mrs. Mallowan certamente não planeja tomar este trem para planejar um assassinato, assim espero... - Arthur entra na brincadeira.
- Quem sabe, Mr. Doyle! Quem sabe! - mas a idéia ficaria em sua cabeça por muito tempo, até ela finalmente escrevê-la sete anos depois? Ou seria antes? Bom, 7 anos do ponto de vista de Agatha, que deixara sua linha temporal normal em 1930. Ou 9 anos, considerando que ela estava voltando para o fim de 1926. Ou então, do ponto de vista da estação 19-60, onde agora estavam, isto deveria ser equivalente a 23 anos atrás... Ah, estas viagens transtemporais às vezes nos dão nó na cabeça!!
- Ah, não consigo mais esconder este segredo...
Abre a valize. Lá dentro Agatha vê uma mandíbula de símio mal conectada a um crânio humano, uma falsificação tão grosseira de um fóssil que até parecia ser verdadeira.
- Te apresento o Eoantropus Dawsoni, Mrs. Mallowan! - dá uma piscadela, e vê-se que ri sem parar por dentro. - Não conta pra ninguém, quero pregar uma peça em certos... doutores metidos a sabidos lá de 1912.
- Você não toma jeito mesmo, Mr Doyle! - também ri, imaginando a cara dos cientistas diante daquele "elo perdido". - Bom, então estamos ambos voltando no tempo para pregar peças, não é mesmo?
Você desce na estação 19-12, se entendi bem. Eu desço antes, na 19-26...
- Não seria mais correto dizer DEPOIS, Mrs Mallowan? - e riem sem parar enquanto vêem a locomotiva do Expresso Transcroniano se aproximando ao longe da estação.
*** CONTINUA ***