Simulações - final

ANINHA... este era seu nome! Diminutivo de Ana? Sim, era inquestionável. Mas ANA nada lhe dizia. Não era seu nome! Não sabia explicar... Era só uma palavra, algo que tentava explicar a origem de seu nome. E ANINHA com todas as letras maiúsculas! "Aninha" não era ela, tanto quanto "Ana", ou "ANA"... Vagamente se lembrava de que era o nome de sua médica. Explicação? Não existia! Era uma verdade, uma tautologia. Ela não sabia explicar de onde vinha. Só sabia que ela era a ANINHA, com todas as letras em maiúsculo! Era seu nome.

Quem ela era? Não se lembrava de nada! Parecia nunca ter existido! Apesar de despertar aparentemente num organismo funcional adulto, bem desenvolvido, independente... Não se lembrava de nada! Parecia acabar de existir! Em seu cérebro nenhum registro sináptico existia de experiências anteriores... Era uma sensação bem estranha mesmo!

E que profusão de conexões! Quantos neurônios! Quanta informação!! Quem estaria preparado para isso? Cadê o manual de instruções para o "supercérebro"?

— Pedro, me ajuda aqui!

Ela entendeu que sua benfeitora procurava ajuda, sem conseguir identificar sua origem!

— Se complicou, é?

— Ah... A pressão está baixa!

— Lógico!!! Com uma cabeça deste tamanho!! Precisa aumentar a pressão!

— Sem essa de adrenalina, tá??? Isso você já viu que não deu certo...

Pedrinho se aproximou sarcástico...

— Certo, doutora! — olhou o nome da enfermeira. — Muda isso! Eu não sou Ana!!

Ela concordou:

>>> Alterar enfermeiro(a)

O computador respondeu com:

*** Digite o nome do(a) novo(a) enfermeiro(a):

Ela digitou, rendida: "PEDRO". Ele provocou:

— Não!! "PEDRO MASTERLORD"!!!

Ela aceitou furiosa: "PEDRO MASTERLORD".

— Certo. Coloque aí, e destaque: "ENFERMEIRO SUGERE: segundo coração!"

— Ah, tá loco!

— Não estou não! Vai funcionar!

Tudo que ela queria é vencer o jogo. Apertou um segundo coração no lado direito do peito da paciente.

ANINHA começou a se sentir regularizada. O implante de um segundo coração realmente havia suprido a necessidade de circulação de um cérebro hipertrofiado! Ela finalmente se sentia bem! Ah, divinos cirurgiões! Ela daria a vida para agradecê-los, mas como?

— Ficou chato, né? — Pedrinho deu a sugestão. — A paciente estabilizou, nada mais acontece... Que graça tem? Acabou o jogo...

— O que você quer dizer?

— Ah, vamos "causar", provocar algum distúrbio.

Ana não queria perder sua ANINHA estável.

— Espera! Deixa eu salvar esta que deu certo!

— Vai lá! Vamos experimentar...

Ela salvou no pendrive a ANINHA cabeçuda estabilizada com dois corações. Indescritível era sua sensação de ter ganho uma vez o jogo, mesmo que tenha precisado pedir ajuda ao irmão. Ela gostava dele! Talvez até poderiam formar uma boa equipe...

— Já salvou o jogo? Então põe adrenalina agora pra ver o que acontece!

— Você e esta sua fixação por adrenalina... Pra que isso, hein?

— Sei lá, deixa as simulações doidas. Ah, você já salvou. né? Põe aí pra gente ver!!

A mãe chegava com o lanche neste instante. Ouviu parte da conversa, entendendo parcialmente o que significava. Já ouvira falar sobre isto, de jogadores fazendo seu paciente virtual sofrer sem razão, num sadismo virtual. Só para ver a reação das simulações. Ela não podia crer que existia isto num jogo tão instrutivo! Recomendado por um prêmio nobel em medicina!

— Crianças? — ela chegava com o lanche. — Está tudo bem por aqui?

O boneco na projeção holográfica, agitado, implorando por misericórdia realmente parecia bastante real! Absurdo? Aquela moça cabeçuda, cansada de implorar atenção daquelas duas crianças lhe afligindo experiências sádicas, estaria olhando fundo em seus olhos, esperando que ela fosse uma figura de autoridade capaz de parar com aquele tormento?

"Ah, que besteira!!! Lógico que não!!! Pode parecer bem realista, mas é só mais um joguinho de computador, sua boba!!"

Entregou a bandeja com bolachas e chocolate quente para os filhos, tentando ignorar a figura holográfica no centro da mesa que parecia implorar (que perfeição de software!!!) por sua piedade...