A FÓRMULA DO CAOS - CAPÍTULO XVIII
Acordei péssimo! Ressaca? Não, eu mal havia começado a beber! Era consequência do maldito sonífero que tomara por acidente, o mesmo que estava destinado a John. Para impedi-lo de... não!!! O Trem Atômico!!! Acordei tarde demais para evitar? Bem, pelo fato de eu ainda estar vivo a lógica assegurava que não, que ainda não havia se passado as 7 horas da manhão do Dia do Apocalipse. Que horas eram? Talvez ainda houvesse tempo para corrigir a fatalidade. Escuridão completa, cortinas cerradas. Onde eu estava? Bati três palmas breves (era este o sistema que eu implementara para controlar as luzes). Ah, eu estava na sala, dormindo no desconfortável sofá. Estiquei o braço até uma mesinha do lado, procurando meu relógio de pulso. O achei, e eram quatro horas e 15 minutos, o que indicavam os ponteiros do relógio. Afinal nem domira tanto, o sonífero não era assim tão forte como imaginara. E o melhor: ainda dava tempo de tentar fazer alguma coisa! Havia um bilhete também, debaixo do relógio. Com muita dificuldade consegui decifrar o quase incompreensível garrancho de meu amigo John:
"E aí, cara?? Acordou bem? Espero que sim...
Realmente me espantei contigo! Geralmente você costuma ser forte pra caramba com a bebida! Mas quando te vi capotando daquele jeito logo nos primeiros goles, pensei: 'não é mais o mesmo cara que conheci na faculdade!' Cara, me desculpe, mas sozinho não consegui te levar pra sua cama, onde dormiria bem mais confortável!!! Você engordou, né? Está pesado demais... Com muita dificuldade te estiquei aí neste sofá mesmo! O que mais me espantou foi que... a gente mal tinha começado a beber! Meu, você está fraco, hein! Costumava ser mais forte!
De qualquer forma, obrigado pelo excelente uísque! Precisei continuar a bebedeira sem companhia mesmo. Hehe, melhor, sobrou mais!"
Ergui a garrafa ao lado do sofá. Caramba, ele havia virado mais da metade da garrafa do meu melhor uísque sozinho! Eu vou matar o John! Bom, mas para poder faz isso, preciso antes impedir que eu, ele e todo o resto das pessoas morram primeiro...
Continuei lendo. Havia mais uma anotação no verso da folha:
"Você errou, cara! Nada vai acontecer! Bom, você terá uma grande surpresa, mas... nada CATASTRÓFICO vai acontecer! Preciso sair agora, preparar a grande surpresa. Os caras do trem, maquinista, prefeito, etc... estão me esperando lá!"
A letra ruim, por incrível que possa parecer, piorava neste trecho. Ele estava mais bêbado que uma vaca quando escreveu estas últimas linhas. Bêbado o suficiente para fazer uma besteira, tipo... explodir sem querer um trêm atômico! Será então que era isto? Plenamente lúcido, ele nunca cometeria um erro tão idiota. Mas bêbado... E por minha culpa, pois eu desmaiara com o sonífero e deixara meu amigo sozinho para beber quase uma garrafa inteira de uísque! Que situação! A conclusão a que chego é que a própria tentativa de evitar uma tragédia prevista fôra na verdade a causa da mesma tragédia! Um beco sem saída? Uma tautologia recursiva? A tentativa de evitar uma previsão seria sempre a causadora da ocorrência do fato previsto? Minha cabeça girava sem parar, eu precisava urgente de um café bem forte!
Me levantei com dificuldade, tonto, fui até a pequena cozinha e coloquei uma caneca de água para ferver. Tinha pouco mais de 2 horas e meia, poderia tentar ainda localizar John. E se eu o INCENTIVASSE a explodir o trem? Parece uma lógica absurda, mas... se tentar evitar uma previsão faz com que ela aconteça, será que INCENTIVÁ-LA não a evitaria? Ainda dava tempo para localizar John, ir até a cidade vizinha de onde o trem partiria (era cerca de meia hora de carro), talvez mesmo sabotar o trem para tentar fazê-lo explodir mesmo! Era minha última carta na manga: FAZER com que a previsão ocorra, provocar a explosão do trem na tentativa de EVITAR que ela acontecesse. Era o que faria! Depois do café...
Olhei o termômetro na parede da cozinha, acima do fogão. A temperatura subia? Não!!! Nada acontecia!!! Até começar a tremedeira, tudo balançando! "Terremoto? Aqui?" De qualquer forma, era ainda muito cedo para o fim do mundo! Não acabaria certamente em terremoto. Olhei mais uma vez meu relógio de pulso, e li: 4 horas e quinze minutos!!! O maldito relógio havia parado! Podia ser tarde demais agora! Olhei para o relógio de parede da cozinha, tremento sem parar com aquela agitação: 6 horas e 59 minutos!!! Faltava menos de 1 minuto para o fim do mundo! Corri desembestado para fora de casa, berrando:
- É o trem atômico!!!! É o trem atômico!!!!
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Corri feito doido em direção à estação, agora reformada. Daria tempo de chegar? Mas, de qualquer forma, de que adiantantaria ficar trancado em casa esperando o mundo acabar? Pode ser até meio macabro pensar assim, mas se eu e todo mundo fosse morrer daqui a alguns segundos, não poderia de jeito algum perder um dos últimosa espetáculos pirotécnicos que veria em minha breve vida humana!
"Vem surgindo detrás das montanhas azuis, olha o trem!!!"
De fato uma locomotiva chegava do lado direito da linha que saída da estação. Mas era uma novíssima, prateada, de design moderníssimo, diferente daquela locomotiva reformada que eu já estava acostumado a ver. Via-se claramente um logotipo vermelho representando um átomo rodeado de elétrons em todos os vagões. A criação de John, o arauto do apocalipse!
"É o trem das sete horas...", a música do Raul martelava em minha cabeça. "É o último do sertão!". Bom, o trem do Raul era o das 7 da noite, e não o das 7 da manhã. Mas uma coisa ele acertou: de uma forma ou outra ele era mesmo o último! A tremedeira infernal parou, seguida de um silêncio sobrenatural. Pronto, havia começado! Desabei ajoelhado no chão, a uns 100 metros das estação. Olhei para cima, esperando ter ao menos breves milissegundos de vida para contemplar o cogumelo atômico.
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NOTA DO AUTOR:
fiquei tentado a escrever um *FIM* aqui, hehehehe!! mas fiquem tranquilos, não vou cometer um ato tão cruel com meus leitores! :-D