A FÓRMULA DO CAOS - CAPÍTULO XV

Seu Bosco continuava anotando assíduo todas as partidas e chegadas do trem, desde que ele voltara a funcionar. De meu lado, havia influenciado diretamente na sequência, e queria comprovar se a previsão dos dados mais recentes de fato acusavam esta interferência.

- Meus registros novos? - ele parecia aflito.

- Seu Bosco, eles nem precisam sair daqui! Vou obtê-los na sua presença mesmo.

Isto o convenceu a aceitar sem obstáculos meu scaner portátil vasculhando suas anotações mais recentes no dia sequinte.

- Você quer mesmo preservar isto, não é filho?

- Para registro, Seu Bosco, para registro!

- Você garante que este... registro digital dura mesmo cem anos?

- É uma das melhores previsões...

- Mas... temos papiros antigos duraram mais de mil anos, não é? Alguns 5 mil anos...Não são melhores que este seu... registro digital?

Fiquei sem palavras. Engasguei ao responder...

- De fato, se Bosco... Mas... hã... tem a questão da integridade...

- Como assim?

- Os registros milenares que chegaram até nós é pequena parte do todo! A maior parte se perdeu!

- E 100 anos integrais é melhor que uma parte de 5 mil anos... esta é a idéia?

- De certa forma...

Vi que ele não se convenceu. E, agora que havia pensado nisto, também comecei a ter minhas dúvidas...

- O meio físico é limitado, Seu Bosco. Mas que dizer de informações gravadas "nas nuvens"? Podendo ser replicadas fielmente sempre que necessário. E cada réplica dura MAIS 100 anos! Pode ser repetido Ad Infinitum! Ninguém fez ainda um estudo sério do tempo que ela poderia ser preservada...

Ele se convenceu, e me entregou o caderno com pouco mais de um mês de anotações...

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Apliquei com cuidado os dados novos ao meu algoritmo. Havia, conscientemente, influenciado na sequência, gerado uma bifurcação na cadeia temporal dos fatos. Desejava ver as consequências disso na sequência numéria posterior à entrega dos convites para John. A sequência nova era pequena, mas deveria ser suficiente. "Calcular Gerador Pseudo-randômico", cliquei aquele botão com uma esperança indescritível no meu coração! Gerei sequências até as sete horas do dia 21 de fevereiro: ZERO!!! Sem medições! A última medida era, novamente, da noite de 20 de feveiro... Minha vã esperança desmonronou muito mais rápido ainda do que tinha nascido...

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Me estiquei no chão imóvel por mais de uma hora. Reação ridícula? Nem me importava, morava sozinho, ninguém a via... Foi quando o vi! Debaixo da escrivaninha, um objeto branco de formato cúbico.

Não tive coragem de pegá-lo. Corri rápido ao histórico de meu programa, àquela sequencia falha que havia despertado em mim tantas esperanças da validade do livre arbítrio. Qual era mesmo o próximo número previsto? Ah, era quatro! Pequei o dado que me havia "comprovado" que o algoritmo poderia falhar. Onde estava a falha no vértice entre as faces 1, 2 e 3? Ela não existia! Não era o mesmo dado! "Que está se passando aqui?", pensei desesperado.

Me abaixei, senti o dado sob a escrivaninha. Ainda não tinha coragem de colocá-lo à vista. Procurei pelo vértice quebrado. Ah, lá estava! Este era o dado da experiência original! A previsão não valia então para QUALQUER dado, e sim apenas para aquele dado específico, medidor da experiência? Tudo indicava que sim...

Fui trazendo com cuidado para a luz aquele dado perdido, cuidadoso para não alterar a face atualmente no topo. pedi, PRATICAMENTE IMPLOREI ao Cosmo: "Que não seja o quatro! Que não seja o quatro! Que não seja o quatro!".

Um pontinho preto em cada vértice da face quadrada, e nada mais. Era o QUATRO... A previsão, de novo, havia sido certeira.