Buraco Negro
_ O exame antidoping confirmou que Nickolson havia mesmo ingerido testosterona sintética. Por isso mesmo, ele teve o melhor resultado nas últimas provas ciclistas _ anuncia a TV brasileira.
_ Não pode ser! _ diz Nickolson pasmo com a notícia.
E não podia ser mesmo porque a única coisa que havia ingerido antes daquele evento fora analgésico, já que estava com uma baita dor-de-cabeça.
_ Estou limpo nisso, mãe. Como isso aconteceu não tenho a mínima idéia _ Nickoslson super-chateado confabulava com a dona Juliana.
_ Meu filho, me explica o que está acontecendo _ sua mãe aflita com aquela notícia.
_ A senhora não sabe, eu menos ainda.
_ Você não venceu a prova, filho?
_ É, mas essa agora!...
Passado algumas semanas, a TV volta a falar no assunto que abalou a todos: “o maior ciclista do mundo, realmente estava fora do páreo, por usar de um expediente anti-ético para ser favorecido”. Ratifica-se a polêmica perante os telespectadores pasmos, sem entender o porquê daquilo tudo. “Como um atleta faz uma trapaça dessas? O que ele tem na cabeça prá pensar que sairia ileso numa situação como essa?” _ Buraco Negro na cabeça de seus admiradores.
Mas, o buraco negro era maior na cabeça de Nickolson. Ele pira totalmente com o fato de ser proibido de atuar naquilo que fora o seu forte desde os sete anos de idade. Fora uma longa estrada até ali. Não superaria aquele incidente. Era muito forte prá ele. Sua mãe não sabia o que fazer por Nickolson. Ele definhava a cada dia. Não queria se alimentar. Não estava pra nada. Nem banho tomava mais. Ficava deitado sem ânimo, sem querer falar com ninguém. Até a Monique, a sua namorada, não conseguia vê-lo. A partir do funesto acontecimento, ele não era mais o mesmo.
_ Nickolson, é a Monique. Ela quer falar com você _ sua mãe com o telefone na mão, ansiosa prá aquilo acabar. Mas não, era perda de tempo. Nada o tirava daquele desânimo.
_ Nã..o...! _ Respondia a sua mãe.
_ Mas filho, você não pode continuar desse jeito. Anime-se. Fale com a Monique.
_ Não. _ taxativo.
_ Tá bem, filho. _ diz a mãe sem forças.
Dona Juliana se afastava como uma sonâmbula. Meio lesa de tanto sofrimento. Porque o que estava acontecendo, mexia demais com seus sentimentos. Mãe é mãe. E ver o filho naquele estado era mesmo que a morte prá ela.
_ E então, querida, como vai ele? _ o Sr. Juan queria saber sobre o filho, que até ali não conseguia compreender aquela aflição toda.
_ Na mesma, querido.
_ Posso vê-lo, quem sabe poderei ajudá-lo _ Sr. Juan todo solícito.
_ Não, paizinho. Quem sabe outra hora. _ dona Juliana acha melhor ele deixar a poeira baixar um pouco.
_ Quem sabe?! _Sr. Juan calmo como sempre era costume. Nada o tirava do sério. Era muito tranqüilo nas suas atitudes. Tudo o que fazia era feito depois de muita análise.
Os dias iam passando. A situação só piorava. Dona Juliana mais e mais aflita.
_ Meu querido, vem cá. Precisamos ter um pé de orelha.
_ O que houve, mulher? Prá que tanta cerimônia? _ Sr. Juan já curioso.
_ Meu velho, creio que o caso do nosso filho é grave, precisamos ver um médico prá ele. _ Dona Juliana preocupada.
_ Sim, meu bem. Se você está dizendo, acredito. Então pode deixar comigo, providenciarei imediatamente uma consulta para Nickolson. _ Sr. Juan pega a caderneta telefônica e contata o Dr. Rogério, médico da família.
_ Consultório do Dr. Rogério? _ a voz do outro lado do fio.
Gostaria de marcar uma consulta para meu filho. É urgente. É da parte da família Martins.
No outro dia bem cedo, Sr. Juan e Dona Juliana levam Nickolson ao médico.
_ Papai, estou bem. Mamãe está impressionada à toa. Porém não há nada errado comigo. _ diz Nickolson.
_ Mas filho, não custa nada. _ retruca dona Juliana.
Nickolson segue seus pais até o consultório médico sem o menor ânimo. Chegando lá, Dr. Rogério Bonifácio já os esperava.
_ Mas, a que devo esta honra? A família Martins me visitar assim tão cedo do dia? _ o médico brincando.
_ Nada não, doutor Rogério. Minha mãe que é inculcada. _ responde Nickolson.
_ Nada, é? _ dona Juliana meio tensa.
_ Doutor, o senhor já sabe dos últimos acontecimentos, não? Meu filho Nickolson está muito triste. Fica a maior parte do dia trancado em seu quarto. _ Sr. Juan confidencia.
_ É, já estou sabendo. As más notícias chegam rápido. Compreendo o Nickolson. Vou passar uns tranqüilizantes e pronto. Está tudo resolvido. _ diz o médico muito à vontade.
_ Oh, doutor! Não precisa não. Estou bem e o senhor não precisa se preocupar. _diz Nickolson.
_ Preciso sim, meu filho! Confie em mim. _diz o médico.
A consulta acaba, e aquela família volta prá casa até um tanto satisfeita com a visita ao médico.
Depois disso, Nickolson se fecha mais ainda em si mesmo. Não fala mais nem com a sua mãe. Os dias, a partir daí, tornam-se um martírio. O casal, inclusive, fizera de tudo para curar o filho, e nada. Fora a quase todos especialistas. Fizera todo tipo de exame e médico nenhum chega a um diagnóstico satisfatório. Chega-se ao ápice do estresse. Nickolson definhava a olhos vistos: era só pele e osso. Sua vida estava por um fio. Não havia muito o que fazer. Os pais apelaram até para os santos, fizeram uma promessa que se o filho tornasse ao que era, iriam subir as escadas da igreja da Penha de joelhos, mas nada. Sr. Juan e Dona Juliana, por tabela, eram uma penúria só.
Foi quando na tarde do dia vinte e quatro de maio de dois mil e cinco, às dezoito horas, Nickolson veio a falecer.
Dona Juliana não tivera nem lágrimas para chorar. Sr. Juan, coitado, também perplexo, mudo.
Nickolson fora cremado e as suas cinzas enterradas embaixo de uma frondosa árvore no Parque Fernando Gutierrez, local onde costumava realizar, há uns quinze anos, as suas maratonas diárias. Assim fora seu desejo final.