Universo Rugoso - final

Maxwell tinha uma admiração secreta por Marta. Ninguém sabia (ou pouca gente sabia), mas ele era encantado por aquela tentativa dela de fazer desmonronar a física quântica, de fazê-la deslizar na lama das teorias absurdas. Quando ele ouviu uma breve descrição explicando aquele resultado da simulação, quase que se esqueceu da próprias idéia que pretendia provar.

- Então você afirma, Marta, que esta dualidade onda-partícula é sempre fictícia? Que só interpretamos sua trajetória como propagação de onda por uma falsa interpretação do fenômeno?

- Isso mesmo, Max! Elétron sempre é partícula. Afinal, o que um é uma onda?

- Uma entidade que varia sua manifestação como tempo, que EXISTE e DEIXA DE EXISTIR várias vezes por segundo, milisegundo, ou... bom, como você mesmo disse: sei lá!

- Quando percebi a vibração do carro aumentar em frequência e diminuir em aplitude com o aumento da velocidade, tudo ficou claro para mim!! Embora não exatamente da mesma forma, o fato do elétron passar a se comportar como onda não representa uma metamorfose concreta de onda virando partícula. O elétron sempre é partícula! A baixa velocidade, (se é que é possível colocar um elétron a baixas velocidades!) ele se comporta como todas as outras partículas convencionais, acompanhando as rugosidades do Universo. Ma se ele começa a ser deslocado em velocidades maiores, ele passa a “saltar” por inércia as imperfeições do nosso plano espacial, atropelando sua rugosidade. Começa a, vários milhões de vezes por segundo, existir e não existir, cruzar e “descruzar" nosso “plano rugoso” detectável, e interpretamos isto como manifestação de onda. Conclusão muito precipitada!

Não dava para negar a genialidade de Marta! Mas a idéia de Maxwell ainda era mais excitante, e tinha uma correlação absurda com a dela.

- Você deve saber o que é a “Matéria escura”, não é Marta? Aquela que eu sempre a tentei localizar. Pois agora, se você me permitir, vou te mostrar onde foi que achei este excesso. Você vai concordar quando conhecer minha explicação. Caramba!!! Esta sua idéia de espaço multidimensional aplicada à mecânica clássica caiu como uma luva, garota!!!

A admiração, mais ainda, a paixão deveria continuar sendo platônica. Maxwell acreditava que qualquer tentativa de ir além disso acabaria desastrosa...

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Marta também admirava Maxwell! Também sendo uma paixão secreta, ela não queria que isto ficasse evidente para ninguém! Esconder a matéria não-observável do Universo em meio às rugosidades do espaço-tempo convencional? Era simplesmente um toque de gênio!

- Você diz então que as coisas são maiores do que aparentam! Que a galáxia tem mais de mil vezes a massa que observamos, só que ela está... como você disse mesmo?

- Ela está “amassada” nestas dimensões espaciais adicionais! Como se fosse uma enorme folha de papel reduzida a uma bolinha minúsculas.

- Que, inclusive, seria a tendência natural das coisas. A natureza é econômica, sempre tenta ocupar seu lugar da melhor maneira possível...

Ela praticamente havia dado uma rasteira nas bases da física quântica. Mas aquilo que Maxwell pretentia demostrar parecia tão bom quanto!!!

- Chega aí, Maxwell! Eu posso te ajudar a parametrizar esta sua simulação! Você conseguiu me convencer da importancia dela, Oh Grande Mestre do Universo!!!

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Ficava claro para Marta a satisfação de Maxwell a cada novo número rolando pela tela, resultado de sua simulação.

- Fantástico, Marta! Eis aí a “Matéria Escura”. Exatamente onde está toda a matéria observável! Só não tínhamos ainda procurado direito!

- Maxwell, mais incrível ainda é nós dois termos a mesma idéia, mas cada um usando-a para explicar uma coisa diferente! O espaço rugoso é uma explicação boa tanto para você, pois mostra onde se esconde a matérias “excedente” do universo, quando para mim, ao explicar por quer corpos a alta velocidade começam a se comportar como onda, existindo e deixando de existir vária vezes por segundo.

- Você ainda não se deu conta de que sua idéia destrói a atual mecânica quântica, não é, Marta?

Ela olha fundo nos olhos de Maxwell. Seria paixão aquilo que ela estava observando? “Não viaja, Marta!!” Ela e Maxwell apaixonados? Era inconcebível esta idéia..

- Max, e você não percebe que acaba de resolver um dos maiores problemas da Cosmologia? Se eu dei uma rasteira nas bases da física quântica com minha idéia, esta sua idéia tapou um dos maiores buracos da Cosmologia, que era localizar a matéria faltante do Universo!

- Não sejamos precipitados! O simulador nos mostrou que existe uma evidência forte de estarmos no caminho certo. Mas nada descarta o experimento real, as provas concretas.

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Marta voltou com Carlos, ao final do dia. Ela até que gostava daquele técnico em computação, sempre apaixonado naqueles assuntos sobre inteligência artificial, aprendizado automático, reconhecimento de padrões... Mas ela nunca entendeu como aquilo poderia ser conscientemente pesquisado por seres inteligentes. Que espécime particular era o ser humano, né? Conscientemente tentando criar um rival evolutivo com o qual ele próprio, seu criador, não teria a mínima chance de competir. Olhou com ternura para Carlos, apaixonantemente pesquisando tais assuntos por pesquisar, sem entender as reais consequências daquilo tudo.

- Carlinho...

- Sim, Marta! Que foi??

Ela deveria ser ousada a tal ponto?? Bom, se não arriscasse, ela nunca saberia.

- Será que a gente poderia fazer um caminho diferente hoje? Hein, gato?

Demorou um pouco para cair a ficha de Carlos. Bom, ele não era de negar fogo! Ficaria até chato ele recusar, tomar uma decisão diferente. Ele tomou a primeira bifurcação à esquerda da via principal resoluto, plenamente consciente do que estava fazendo!

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Maxwell estava radiante! Era simples questão de melhor elaborar os detalhes, mas a idéia toda já havia se mostrado válida! Quem diria... a matéria oculta sempre esteve lá onde a observávamos, só que amarrotada em dimensões extras. E, coincidentemente, a idéia servia até para explicar a teoria de Marta. Chegando a seu apartamento, pensou: onde Marta estaria agora? Imaginou ter percebido um olhar diferente lá no laboratório do simulador. Pensou em ligar para ela. Mas para falar o quê?? “Não, Max, não!!! Você está viajando de novo!! Você acha mesmo que ela quer alguma coisa de você?? Como você é besta, hein!!!”

Maxwell disca então para aquele número já bem conhecido

- Alô? Serviço de acompanhantes???

**** FIM ****