O Rapto

Romeu esticara-se atento na poltrona do escritório de seu pai, que ele jamais conhecera. Pela sexta vez queria assistir, de forma original, aquele clássico de mais de três mil anos. O escritório de seu pai era o orgulho da família. Era impressionante como eles conseguiram manter os móveis, a arrumação, os objetos, quase tudo funcionando como há três milênios. Na verdade este era uma dos hobbies prediletos dos intelectuais que estimavam a cultura antiga. A palavra “pai” era a forma fácil de referir-se ao antepassado do qual o sêmen congelado fecundara a sua mãe. No seu caso, um antepassado de mil e oitocentos anos, “se não me falha a memória”, como sempre dizia a sua mãe.

Romeu sabia do risco que corria ao assistir aquele filme. Pensara em convidar os amigos mais próximos, contudo ainda não tivera coragem para tal. A sua mãe recomendava rigidamente que não fizesse isto, pois caso descobrissem que eles tinham aquele filme certamente seriam deportados "sabe-se lá para aonde", como já acontecera com diversas famílias, conforme comentava-se “por aí à fora”, como ela falava.

Infelizmente estavam vivendo um momento obscuro aonde a “Inteligência Mestra” sinalizava que iria banir todos os documentos sobre aquela lenda que ainda nutria os resíduos de fé de algumas pessoas. As histórias seriam ultrapassadas e cientificamente provadas serem lendas, senão truques, que só faziam mal para a sociedade.

Romeu agarrou o controle remoto e arrancava nervoso os resíduos de gel que protegia aquele objeto. Apontou para o monitor pressionando com as duas mãos o botão para iniciar o filme.

Lá estava, irrefutável, as pessoas sumindo, evaporando-se. No céu havia aquele movimento estranho, que ele não conseguia entender muito bem. Diversas plataformas transparentes sugando as pessoas como imãs. Pena que o som se perdera com o tempo, restava somente as imagens.

Quem filmara aquilo, se perguntava sempre que assistia aquela gravação. De fato, este era o maior furo da história recente. Por diversos séculos tentaram banir de vez este filme. Ele podia ver as pessoas desesperadas correndo de um lado para o outro, gritando e agarrando-se umas às outras, e as “plataformas raptoras” repletas de gente. Quem filmara tentava apontar a câmera para aquelas plataformas, mas conseguia capturar somente os pés das pessoas. Infelizmente ele não tinha a filmagem de quem comandava tudo aquilo, mas dizia-se que este filme também existia.

Quem seriam aqueles seres que vieram à Terra para raptar aquelas pessoas, e quem seriam as pessoas que foram raptadas por eles? Nunca souberam mais sobre elas. Em algum momento da história os parentes que ficaram foram assassinados para não relatar nada sobre o evento. Os que conseguiram escapar preferiram trocar de identidades para não serem reconhecidos e mortos, isto há mais de dois mil anos.

Para que planeta aquelas pessoas haviam sido levadas? Romeu estava resolvido a investigar esta história. E ele começaria pela sua mãe que sempre fazia cara de sonsa e preocupada quando ele queria conversar sobre o assunto.

O marido de sua mãe, o seu padrasto, que ele conhecera até os 8 aos de idade, dizia que iria passar para as suas mãos um livro muito importe que explicava tudo sobre aquele filme. No entanto, o seu padrasto fora embora e jamais lhe passara o tal livro. Ele tinha certeza de que a sua mãe ficara com o livro, mas todas as vezes em que tentara conversar sobre o assunto, ela fechava a cara e se negava a continuar a conversa.

Ele sabia que a chave deste mistério estava naquele livro que chamavam de Bíblia.

Gideon
Enviado por Gideon em 10/12/2011
Reeditado em 03/09/2018
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