Gato Preto

Passou tão rápido, mas não a tempo de desviar os olhos, ela viu, acidentalmente desde as sombras ao próprio gato preto. Tentou não crer em sorte ou azar naquele momento, mas era vã, a maldita crença estava no sangue, na mente e em todos os lugares que agora ela olhava. Chegou a concordar com a calçada que acordar hoje foi inútil. Milhares de imagem surgiram repentinamente, os batimentos cardíacos foram intensos e o único querer, era que enfim, transbordasse meia noite para tudo que continuava igual, voltar à normalidade. Um calafrio em cada esquina, para cada lembrança vaga daquele mesmo dia, antes de fenômeno acontecer. Entrou ainda mais na superstição, crendo que a partir do momento que se deitara na noite de ontem, já estava condenada a ver o animal, qual, fizera com que perdesse vinte quatro horas de vida sortida e útil. Quais as coisas que perdera por ver aquilo? Podia ser que hoje, fosse promovida no emprego, pode ser que hoje encontrasse dinheiro na rua, ou ganhasse algum sorteio, pode ser que hoje fosse viajar para algum lugar legal, ou ganhasse algum presente. Nada, nada aconteceria. Como nos outros dias, coisas como estas não costumavam acontecer.

Pode ser que fosse diferente. Talvez invés de azar, tivesse uma terrível sorte! Não, era difícil acreditar numa melhoria, Antonieta, era já uma mulher sem esperanças, vivente sem objetivo, mas ainda com sonhos que tinha certeza que jamais virariam realidade.

Tinha tudo isso por pura incompetência, tinha muitas vezes, preguiça de ser feliz, vivia contente com o tédio e quase sempre não tinha pensares diferentes das mesmas lembranças e traumas. E agora, surgira quase a morte em sua frente, olhando para coisas boas que não aconteceriam, começou a pensar nas coisas ruins que podiam acontecer, mas se distraiu demais, o que a levou trombar com o primeiro poste da rua. Surgiram os efeitos do gato preto? Com a batida, sentindo a forte dor, quis desmaiar, mas continuou de pé, estava tonta, tinha um pouco de sono e quase não sentia a dor, mas foi bom, porque assim parou de pensar nas desgraças.

Antonieta parou e sem motivos começou a rir. Se diziam que rir era o melhor remédio, de certo, assim, alguma coisa aconteceria de bom. Riu alto, riu para os que passavam e riu também para os cachorros, para os carros e ônibus, riu para o asfalto, riu para ela, riu, e continuava rindo, tinha uma forma tão gozada de rir, que um senhor gordinho, a ver tal desalento, começou a rir também. Antonieta se sentiu uma heroína, talvez, se pudesse passar seu humor para todas as pessoas, pudesse salvar o mundo. Esquecera já as superstições, esquecera tudo que até agora vivera e começara a imaginar métodos para por em pratica seu plano, talvez mais tarde, estaria dando uma entrevista, estaria nas revistas, seria fotografada, milhares de coisas que pessoas normais sonham. Mas pessoas normais não eram como essa senhora. Parou com os planos por certo tempo e lembrou que quando se bocejava, outras pessoas bocejam também. E lembrou que se estivesse conversando em grande concentração com uma pessoa, olhos a olhos, e Antonieta repentinamente olhasse para cima e fizesse uma cara de assustada, o receptor ia olhar também, se ainda fizesse uma cara de susto ou tremesse, entre dez, oito perguntariam “o que foi?” Ela lembrou que se soltasse um pitbull na rua, ele correria atrás das pessoas e as pessoas iriam correr. Pensando em tudo isso, concluiu que talvez, ela ou só mais dois nesse mundo tinham isso em mente e se eles não fizessem alguma coisa, era ela quem tinha que fazer!

Resolveu que não ia trabalhar na mesma contabilidade de sempre, mas que a partir de hoje, viraria uma heroína. Voltou para casa, onde pôs capa, blusa amarela, calça roxa e chinelo de dedo. Sabia que se saísse assim, as pessoas ririam e então o dia delas seria melhor. Respirou fundo, abriu a porta, tremeu um pouco, em instantes, se via uma senhora de quarenta e quatro anos correndo cidade a fora, fantasiada. No caminho, viu uma mulher que punha o lixo para fora. Esperou que tal voltasse para dentro. Abriu a sacola de lixo, onde despejou tudo que tinha dentro no chão e pôs o saquinho na cabeça.

Crianças, jovens e adultos paravam para ver a cena. Antonieta, não satisfeita com todo o barraco armado, começou a cantar e dançar, estava fazendo os outros felizes e sendo feliz também. Torceu pra que Deus estivesse o tão bom que era seu coração.

Enquanto cometia sua loucura, a policia já estava acionada para ir atrás dela. Os guardas desceram do carro e começaram a persegui-la a pé. Lembrando da tática de fazer os outros correrem, abriu um portão, de onde saiu um enorme cachorro, mas ao invés do bicho perseguir a policia, a seguia também. Lá ia Antonieta, e lá estava a multidão vendo tudo. Não parecia ter a idade que tinha, mas que pique! Tanto é que subiu em muro e pulou, vendo a porta aberta, entrou na casa de João que se encontrava totalmente nu em sua sala. Ficou vermelha, mas implorou por ajuda. O velho sem saber o que fazer, ficou alguns segundo de olhos arregalados. Ela dizia que não tinha tempo, já se ouviam as batidas no portão.

João mandou que se escondesse e se vestiu com a cortina mesmo, ao lembrar que havia deixado o portão aberto e que logo estariam ali.

Entraram, ali viram só João encortinado vendo a novela. Revistaram toda a casa, e dentro do baú, estava a doida que se dizia agora, ser jóia rara. Fizeram que os dois se vestissem adequadamente, levaram-nos para uma delegacia. A delegada ao ver a mulher, começou a falar com a velha, Antonieta vez ou outra olhava pra cima e começava a tremer. A delegada que olhava junto, sem nada ver, já estava começando a ficar com medo. Mas Antonieta não tinha mais esperanças de salvar o mundo, já perdera as esperanças e voltava ser a mesma mulher de antes. A cabeça batida já estava bem melhor, ela voltava a crer que fora o gato quem arruinara a vida. Não sabia como ia ser agora, mesmo vestida normal, ririam dela, mas lúcida, já não mais ia gostar. Com certeza perderia o emprego e que pensaria seus familiares? Sentiu muita vergonha, foi quando olhou para o chão e viu um trevo de quatro folhas. Começou a sorrir, as coisas assim melhorariam, mas não melhoraram, Antonieta foi presa e só enquanto dormia, descobriu que no momento que machucara a cabeça, havia morrido, estava agora em outra dimensão, mas por pensar em salvar o mundo e fracassar com isso, além de fazer os familiares sofrerem, implorou para voltar.

+ mas mortos não voltam- São Pedro a dizia. - E não esta gostando daqui? Reviu João, seu ex-marido, fez muita gente feliz.

- É! – Argumentou Antonieta- Mas não cumpri minha missão na terra, é bom voltar o quanto antes, que já estou atrasada pro trabalho, tenho medo até do sujeito diminuir o meu salário.

- Esses vivos! – comentou São Pedro.

- Sou testemunha – continuar Antonieta – de que continuam iguais, mesmo depois de mortos.

- Posso dar uma chance a senhora, mas tem que prometer que se voltar vai parar com essa bobagem de sorte ou azar – pediu São Pedro.

- Sim, claro, nunca mais vou crer nisso – respondia Antonieta com trevo no bolso e os dedos cruzados.

Taty Sbrugnara
Enviado por Taty Sbrugnara em 17/08/2011
Código do texto: T3166315
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