A Verdadeira Máquina do Tempo - parte 6
-Como chegou até aqui? - A criatura caminhou alguns passos, aproximando-se da mesa. Peter ajeitara-se no banco, compondo-se do choque inicial.
-Isto não deve ser novidade para você. Todavia, para os que me virem, se é que conseguirão, pode dar uma de suas explicações cientificas - Ao dizer isto, olhou para o balão e o entorno que prosseguia, agora de forma um pouco mais lenta. Peter fez um movimento para se levantar, mas foi impedido pelo humanoide.
-Não se preocupe - disse ele, esticando um dos braços na direção do outro. Após este gesto, fez, o que deixou a mais amatutada expressão na fisionomia do cientista: virou-se na direção da substância que já se alastrava e, com os lábios em forma de pua, sugou todo o líquido com indisfarçável voracidade. Em seguida, devolveu-o integralmente ao recipiente, assentando-o à posição original. Como se nada tivesse executado de anormal, prosseguiu.
-Utilizei-me do próprio gás ionizado que criou em seu experimento, em outras palavras, das propriedades do plasma. Não sei como conseguiu, mas ocorreu um desequilíbrio entre as densidades de cargas. Foi só aproveitar-me da força eletrostática e da alta condutividade elétrica para conseguir minha materialização. Você conhece isto melhor do que ninguém.
Peter imediatamente compreendeu. As últimas horas, gastou-as encasquetando ideias relativas a um conhecimento mais profundo dos seres ultra dimensionais. Como tinha purificado a tal ponto os pensamentos com um propósito definido, acabou, após uma concentração prolongada e dirigida, por visualizar o objetivo principal do seu foco mental. Ali estava ele: um ser trazido a sua presença tal como ele supunha. O sono e o relaxamento favoreceram-lhe tal estado. A voz da criatura contagiava o ambiente; retumbava assustadoramente como se vindo das profundezas de algum abismo. Peter ouvia-o assombrado, mas sem perder sua postura. Ainda na mesma posição, sentado, erguia levemente a cabeça para alcançar os olhos do outro; havia pouca distância entre o ser e o teto do porão.
-Vejo que é um homem estudioso. Os seres do mundo tridimensional necessitam desses aparatos na busca do conhecimento; faz parte da evolução. Todavia, estão ainda muito atrasados.
-Por que diz isto? -perguntou Peter.
-Porque ainda destroem uns aos outros. Fiz um estudo do seu mundo e de seus costumes. Ainda passam por guerras; há fome e doenças que acometem os habitantes. Mesmo precisando do corpo material para se locomover e evoluírem, não era para estarem passando por essas tragédias. Há algo errado; preciso descobrir.
-Se diz que, mesmo como somos, teríamos que ser perfeitos é porque conhece seres como nós que são muito mais evoluídos. Se existem, onde vivem e como são?
-Ouça, esta matéria que carregam chamada corpo carnal é um suplício para mim. Quando ando por outras esferas, mesmo tendo que utilizar-me de um corpo para me fazer ver e poder comunicar não passo pelo que estou sentido aqui. Vejo porque tanto sofrimento no seu mundo; é este o termo: sofrimento?
O semblante de Peter brilhava com uma luz de esperança. Seus estudos e suas convicções sobre a existência de outras dimensões no universo pareciam estar sendo finalmente corroborados.
-Outras pessoas poderão ver e falar com você como eu estou fazendo? -perguntou, levantando-se e aproximando-se da criatura, quase tocando-a.
-Não! Não se aproxime - disse o ser, saltando para trás. Na verdade não foi um salto. Ele desapareceu de um lado e surgiu em outro com diferença de alguns metros. Peter pensou que tinha evaporado e ficou atônito por alguns segundos.
-A diferença entre sua aura e a de um ser humano comum é algo extraordinário. Não vejo nela qualquer resquício de mal, ignorância nem outros sentimentos mesquinhos que podem acabar por destruir sua civilização. Ainda assim me é tremendamente perniciosa. Seu contato mina as minhas energias astrais por estar carregado de vibrações inferiores.
Peter entendeu ali que suas ideias e convicções ainda iriam precisar de outras espécies de provas. Por mais sérias e convincentes que fossem suas pesquisas e seus estudos, o meio científico não lhe daria ouvidos. As palavras do Dr. Babenco deixaram isto bem claro.
-Tenho por objetivo mostrar a ciência de minha época não apenas a existência de outras dimensões e formas de vida, como também provar que é mais do que possível um contato; da forma como estamos fazendo aqui, quem sabe. A aproximação não é bom para você, mas e quanto a olhar a distância; isso causa algum transtorno?
-Não creio que isto me traria problema; simplesmente não é possível a ninguém enxergar-me. Antes que me pergunte, o seu caso é diferente, como já disse; sua aura é especial.
Peter, embora entusiasmado ao extremo com o andamento de suas pesquisas, sentia os efeitos de uma noite adormida. Os olhos vermelhos e a concentração já um pouco falha eram evidentes. O ser continuou falando, naquele tom lento e ritmado, e o outro, como hipnotizado ia, aos poucos, entrando no sono, até que, deixando pender a cabeça, adormeceu de verdade. O humanoide então cessou o que vinha dizendo e olhou ao redor de um jeito longo e concentrado como a querer absorver cada milímetro do espaço a sua frente. Fixou o olhar especialmente sobre a mesa de estudos de Peter e seus instrumentos. Havia ali, além do balão cujo conteúdo ele recuperara, mais dois, também com substâncias reagentes. Mais uma passada de sua visão enigmática por sobre a mesa e todos os produtos que ali estavam. Então, mais uma vez sua ação sobrenatural aos humanos se fez presente. O olhos, girando nas órbitas, com uma rapidez impressionante fez efervescer os químicos dentro de seus balões também numa velocidade espantosa.
Com incrível precisão soube o humanoide a intenção primordial que levou o cientista a iniciar aquelas pesquisas de laboratório: criar material de densidade negativa a fim de construir uma máquina do tempo. Para isso teria que alterar ou criar novas leis para a física. Conforme tentou provar em vários estudos e teses apresentadas, o espaço não é somente plano, mas pode ser curvado em várias configurações. Usando a teoria da relatividade, Peter definiu como o espaço se curva e como essa estrutura se desenvolve ao longo do tempo. Seguindo esse princípio, sua intenção seria construir uma máquina do tempo que manipule essa estrutura e tire proveito dela. Essa questão da máquina era um segredo entre Peter e Janet, apenas. Nem mesmo a seus colaboradores mais próximos dissera uma palavra sobre tal empreitada. “Ainda não é o momento” dizia à esposa, “deixe-me obter sucesso na criação de algum material de densidade negativa.”
Portanto, sem saber, entregue ao sono, Peter iria tomar contato com esta descoberta tida como praticamente impossível pela ciência de seu tempo. Manipulando seus instrumentos e suas misturas, deu-lhe o humanoide esta capacidade. O primeiro passo dado, a primeira pedra tirada do caminho, um salto para a ciência da terra.
Após o feito, pressentiu o humanoide que alguém em instantes iria aparecer no laboratório de Peter. Mais do que ligeiro, o ser se volta para Peter, que ainda dormia e, com duas batidas de palmas, o desperta.
-Sua esposa estará aqui em exatamente três minutos e meio. O que queria com suas experiências já o conseguiu. Não precisará mais deste laboratório; pode destruí-lo; será melhor para a sua saúde física. Visite-me o quanto antes em viagem astral. -Dizendo isto desapareceu. Após o despertar, ainda obnubilado de sono, confirmou Peter as palavras do outro. Atrás de si os passos na escada denunciaram a chegada de Janet.
Esfregou os olhos; sorriu ao ver a esposa. Não via o momento de contar a ela o que se passara. Seu estado, no entanto, deu a Janet a certeza de que ele não estava bem. Após breves instantes de ponderação, compreendeu Peter que, se falasse naquele momento, ela não acreditaria; julgaria como resultante de longas horas insones qualquer coisa sobrenatural que alegasse ter vivenciado.