A Verdadeira Máquina do Tempo - parte 5
Peter tinha em mente um objetivo específico: reorganizar e desenvolver moléculas e células inteligentes e construir novas estruturas e materiais. Uma de suas finalidades era entender as transformações da matéria. Porque passou por experiências em estado astral, adquirira a convicção de que, se pesquisasse e estudasse a fundo, seria capaz de aplicar este seu tirocínio em sua vida de vigília. Compreendendo as alterações drásticas que as propriedades dos materiais e elementos químicos apresentam em escala nanométrica, teria então uma chance de trazer ou tele transportar algum daqueles seres com quem teve contato em suas viagens astrais. Compreendendo e controlando a matéria em escala nanométrica, passou a organizá-la átomo por átomo, molécula por molécula. Conseguiu com isto um efeito surpreendente e ao mesmo tempo, estarrecedor.
Estudou concentradamente, ao mesmo tempo em que fazia experimentações, os sistemas de transições de fases. Passou praticamente por todos eles, o que lhe exigiu trabalho e dedicação incomuns. Criou ramificações de um numero extremamente grande de partículas num só sistema. No ponto de ebulição da água, liquido e vapor são igualmente estáveis e acima do ponto de ebulição o vapor é mais estável do que o estado liquido da água. Mas, Peter conseguiu a mudança de estado de um sistema de tal forma a levá-lo de um ponto de transição de fase sem passar por uma fase de transição. Foi aí que veio o resultado, mas não da forma que ele esperava. Ao manipular átomos e moléculas, um elétron foi excitado, caindo num nível muito inferior de energia.
Em uma de suas noites insones; envolvido até a medula em suas buscas, adormeceu sobre um dos livros de pesquisa. Tentava nele esquadrinhar, entre as equações e os diagramas apresentados no compêndio, as propriedades de alguns elementos químicos que vinha utilizando nas últimas experiências. A quietude era total no ambiente. O silêncio era tal que se poderia ouvir o movimento de uma formiga ou o bater das asas de um mosquito. A temperatura caíra abaixo do habitual; as frestas das duas janelas fechadas eram os únicos orifícios à passagem do ar frio da madrugada. Peter Já há algum tempo ressonava. A cabeça descansava sobre um dos braços, o direito, fazendo-o de travesseiro. Ao lado, o livro aberto e suas ilustrações tão ricas quanto indiferentes. Um pouco distante, na comprida mesa, o enorme balão de vidro, preso a anteparos metálicos, continha um líquido escurecido que já, há horas, produzia ligeira exalação gasosa e um odor tênue, quase imperceptível, de cálcio açucarado. Peter nele vinha trabalhando desde as primeiras horas da tarde até o momento em que se sentou para estudar o livro.
O cansaço tornou pesado o sono do cientista e, nem a posição encurvada do corpo, tampouco a dureza do banco impediam-lhe de dormir e ainda roncar, um ronco leve e ritmado. E as horas corriam soltas e, nesse correr, um efeito precipitou-se, gerando uma virada na vida do jovem Peter, colocando a sua frente a prova que tanto buscava, coroando de êxito os estudos lucubrados e os esforços frenéticos dos últimos anos; ainda não totalmente, mas que representavam uma vitória em direção aos seus objetivos finais. O miasma prosseguia ininterrupto. Quem quer que por ali estivesse naquele momento certamente desmaiaria de susto ao ver a reação que se operava no líquido esquecido por Peter. Vesículas começaram a se formar de um jeito incomum, toldando por completo a visão interior do recipiente. Um esguicho abrumado verteu para o exterior uma sombra, à princípio, disforme, mas que foi, pouco a pouco se adensando até se tornar massa corpórea.
Foi quando Peter, em função de um baque surdo sobre o piso, despertou. Ainda tonto de sono, desatinou por completo ao que viu a sua frente. Tratou de esfregar os olhos e beliscar a si mesmo para se certificar de que não era sonho o que presenciava. Um dos seres que encontrara quando em viagem astral ali estava, de pé, olhando fixamente para o cientista a espera do recobramento de sua total lucidez. Humanoide, em tudo se assemelhando, com exceção da altura descomunal – bem mais de dois metros – e a cor da pele, de um branco quase assustador.
- Não se assuste - disse, com voz macia, porém firme - certamente já nos conhecemos.
O balão havia se inclinado e, anteparado, ainda pendia, mas parte do seu conteúdo agora se espalhava por sobre a mesa, estilando-se até o chão do recinto. Este movimento, porém, fora feito de forma proposital pela criatura. Não teria precisado usar deste recurso a fim de consumar sua aparição. Por conhecer de antemão o funcionamento da crença humana baseado no estudo que fizera de Peter, preferiu agir assim. Eram confusos os sentimentos e, como por instinto, a primeira pergunta do rapaz não poderia ser outra. Como já conhecia a criatura, absteve-se de perguntar quem era para indagar sobre sua aparição.