O Mistério de Arghtar - Prólogo
No começo era o caos. Um negro manto de trevas cobria toda a existência por uma quase eternidade. E se fez a luz. Um repente explosivo de proporções inimagináveis espalhou calor e tempo em todas as direções. Somente milhões de anos depois do Big Bang, as primeiras estrelas começaram a aparecer no espaço e muitos milhões de anos mais tarde iniciou-se a aglomeração e surgiram as galáxias. Era chegado o fim da era das trevas. Estrelas gigantes, maciças e luminosas interagiam e alteravam para sempre os rumos da evolução do univderso, liberando matéria como fonte de criação de sistemas solares. Gases quentes e ionizados por todos os lados envolviam a semente de uma existência que não parava de evoluir. Buracos negros extremamente densos e gigantes, que teimavam em engolir com sua força de atração descomunal quase tudo a sua volta, e quasares explodindo de energia ajudavam a moldar um universo em expansão.
Para Peter Cast, o marco inicial da existência do universo ocorreu duas vezes: em primeiro lugar, aquela explosão inicial que fez surgir tudo e espalhou a matéria e o tempo; o segundo início se deu quando o homem começou a se interessar pelas coisas do céu.
Formado em astronomia e física, Cast tinha a personalidade inquieta de eterno menino e, mesmo com toda a formação acadêmica e formal, procurava fugir do convencional e olhar para o cosmos e para a Terra de um modo maroto e desconfiado. Muito do que já tinha estudado, principalmente em relação a evolução do universo, sua grande paixão, ele tinha que aceitar, inicialmente. O Big Bang, a emissão de radiação cósmica de fundo, a idade das trevas seguida pelo surgimento das primeiras estrelas, o aparecimento de super novas e buracos escuros chegando até as protogaláxias e, finalmente, as galáxias modernas que conhecemos, era base para seus estudos, suas desconfianças e sua fascinação.
Era enormemente multiplicada a capacidade de criação naquela existência que se espalhava em todas as direções. Inúmeros aglomerados de estrelas davam suporte ao aparecimento de incontáveis sistemas solares e milhões de planetas que poderiam sustentar vida e até civilizações.
A evolução da ciência e os rumos do conhecimento humano eram muito dinâmicos, Peter sabia, e assim, sua grande inquietação não era diferente da dos demais cientistas: a busca pela Teoria Unificada.
Desde o começo da humanidade, o homem olha para o céu e tenta desvendar seus mistérios. Os corpos celestes, elevados a condição de divindade em função da falta de conhecimento e de medo, e o geocentrismo religioso foram etapas naturais na escalada do interesse do homem pelas coisas do cosmos, que teve como marco fundamental a primeira visão humana dos astros através da luneta de Galileu, em 1609. Após este início lento do conhecimento, que custou milhares de anos, a ciência também explodiu e se espalhou causando uma revolução no modo de ver o universo, a natureza e o homem. Mas quanto mais cortinas eram afastadas pelas mãos do homem que que manipulava seus instrumentos maravilhosos e de alta tecnologia em busca da verdade, mais horizontes novos, desconhecidos e desafiadores se apresentavam trazendo uma profusão de perguntas e incertezas. A Teoria Geral da Relatividade de Einstein já não era capaz de explicar as coisas do espaço e do universo como um todo. Descobriu-se que as constantes universais não eram assim tão perenes, diante das informações que os potentes radiotelescópios que investigavam os confins do espaço nos traziam de distâncias inimagináveis. A descoberta de novos atores nesta enorme sopa cósmica, como a matéria escura, que influencia grandemente o ritmo de expansão, a energia escura e a quintessência, ou quinto elemento que completaria os elementos terra, água, fogo e ar, conforme a filosofia grega antiga como formadores do mundo, forçou os físicos e astrônomos a reformularem seus modos de ver o universo. A unificação da Teoria da Relatividade com a Teoria Quântica se apresentou como uma possibilidade. Surgiu, também, a Teoria da Cordas, mas, como as demais, apresentava pontos de dificuldade e só parecia possível na hipótese de uma multiplicidade de universos. Novas dimensões, formas impensáveis de espaço e de tempo teriam que ser consideradas. Nascia mais um horizonte a ser explorado. O homem, que investigava a realidade do infinitamente grande, no cosmos, se aplicava igualmente no deslinde dos mistérios do infinitamente pequeno, no átomo. Os pontos de contato se mostravam a cada dia mais evidentes.
Chamado com urgência para participar de uma equipe de trabalho do GES, projeto altamente secreto e prioritário da NASA e do governo dos Estados Unidos, Peter Cast teve a oportunidade de conhecer Niaang Agner, físico de partículas formado pela universidade de Yale, mestre em História Antiga e monge. Agner nasceu no Nepal na década de 50 do século passado e teve uma formação altamente espiritualizada, seguindo a tradição familiar e se tornando monge ainda muito cedo. Assim que terminou a escola regular, mudou-se para a América do Norte a fim de dar sequência a seus estudos e saciar sua sede de conhecimento que, com seu aprofundamento nas doutrinas espirituais de seu povo e de resto, as demais filosofias orientais que pesquisava com afinco, o empurravam cada vez mais fundo num vazio que ele procurava preencher com a realidade fundamental que buscava. Desde menino nada escapava a curiosidade daquele pequeno nepalês que adorava ler livros sobre os grandes mistérios da humanidade e de possíveis existências fora daqui. Na universidade, dedicou-se principalmente ao estudo da física de partículas e conheceu as forças descomunais que atuavam no incrivelmente pequeno e o equilíbrio tênue que as regiam. Aquilo tudo era como uma nova casa, um novo mosteiro. Niaang se sentia à vontade. O ambiente quântico de interações eternas das partículas subatômicas o remetia à realidade espiritual da maioria das doutrinas filosóficas orientais que estudara por toda a vida e que apontavam o equilíbrio e a interligação como fatos fundamentais da teia da existência. Os pontos de encontro eram evidentes e o jovem monge se sentia impelido a continuar sua busca.
O encontro de Peter e Niaang dentro do projeto GES foi altamente impactante para ambos. Duas personalidades com pontos muito fortes de convergência e dois arsenais de conhecimento de campos aparentemente diversos, contudo, ligados por uma única busca, foram colocadas frente a frente para trabalhar em um projeto que mudaria suas vidas.
Os fenômenos que levaram um grupo enorme de cientistas de várias partes do mundo a se mudarem para o hemisfério sul repentinamente, incluindo Cast e Agner, não tinham precedentes na história do conhecimento humano e poderiam determinar um salto de dezenas de anos em desenvolvimento científico.
A história que envolveu pessoas comuns do sul do Brasil, determinou aquele chamado urgente da cúpula do projeto GES e unia o aparentemente inverossímil, acontecimentos quase que totalmente inacreditáveis e, ao mesmo tempo, respostas a muitas das questões que os estudiosos e filósofos buscavam desde tempos imemoriais.