KOVURO E ARUEN - Sexta Parte

Se conseguisse chegar aos tanques de peixe, poderia lavar-se e esconder-se.

Ela já os tinha visto ao chegar, mas na hora não pensara servir-se deles. Por fim achou o caminho aos tanques e correu com renovada esperança.

–Pare ai! – gritou o tenente Moorham quando a viu.

Tules Dotir Reggihag, encurralada a meio caminho; não sabia se corria ao tanque de peixes ou se retornava ao monte de mercadorias. De todos lados surgiam soldados da guarda de elite da Mama.

Seria um suicídio ficar parada. Decidiu pular no profundo tanque de peixe, onde para pegá-la teriam que entrar e molhar-se. E haveria a possibilidade de tentar outra saída encima da hora.

Como um raio Tules mergulhou no tanque, no meio dos peixes que deslizavam por seu corpo.

Moorham, vermelho de raiva não sabia o que fazer; se pular dentro ou mandar alguém. Seus homens mostravam-se incapazes de pegar uma criança; porque a esta altura percebera que se tratava de uma menina de não mais de doze anos.

–Agora não escapa – disse um dos soldados.

–Então vá buscá-la – disse Moorham irritado.

–Sim senhor – respondeu o soldado tirando suas roupas.

O guarda de elite pulou no tanque e mergulhou na tentativa de achar a pequena intrusa. Dentro estava muito escuro; não achou nada e logo necessitou respirar.

–Pegou?-disse Moorham.

–Não senhor. Não enxergo nada lá embaixo.

–Incompetente!

O infeliz soldado engoliu mais aquele sapo e voltou a mergulhar, na esperança de ter mais sorte.

Nesse meio tempo a moça assomara pela outra ponta do tanque e respirava devagar para não ser ouvida. Estava com frio, a água estava gelada por estar num local fechado e o azeite não a isolara o suficiente.

Mas logo vislumbrou um buraco na pilha de sacos de cereal de inchu, próxima à borda do tanque, onde poderia esconder-se. Se fosse suficientemente rápida, poderia deslizar ao chão e subir na pilha.

–É agora! – disse para si mesma.

Pulou ao chão e daí à pilha de sacos onde trepou pela beirada até o topo onde se meteu, desaparecendo da vista dos soldados.

Ninguém percebera a manobra e para todos os efeitos a menina estava ainda no tanque. Ficou quieta. Com um pouco de sorte, os soldados se cansariam de procurar e iriam embora. Mas eles não cansaram.

Permaneceram horas e horas na procura, vasculhando os tanques de peixe com varas e todos os cantos onde poderia esconder-se uma menina pequena como aquela. Tarde ou cedo ela seria encontrada, e aí...

*******.

Kovuro tentou seu salto derradeiro.

Com a mão esquerda segurou-se na barra de ferro ainda firme e com a direita começou um trabalho de desgaste da parede com a barra frouxa ainda presa na ponta.

Pó e entulho batiam-lhe no rosto, mas ele fechou os olhos e continuou, até que a barra se soltasse. Em seguida usou a barra solta a modo de alavanca para forçar a segunda barra.

Segurou-se com as duas mãos, carregando o seu enorme peso nela, até que a força da gravidade, unida à força do mercenário de Purana, foi mais forte que a pedra. Kovuro caiu ao chão com as duas barras e pedaços de pedra, ficando agora o caminho livre para a fuga.

Agora deveria dar um pulo tão alto que lhe permitisse agarrar-se na borda externa da ventarola. O mercenário juntou toda sua raiva desse lugar, toda sua indignação e todo seu ódio e descarregou aquilo num salto tão violento que conseguiu seu objetivo, embora machucasse as mãos.

Seus poderosos músculos ergueram seu corpo através da ventarola e passou para dentro de um túnel de ventilação, totalmente de pedra. Arrastou-se por ele até chegar à fonte de luz. Estava amanhecendo. Ainda havia uma janela gradeada que dava num pátio. Pôde ver do outro lado uma porta grande de um depósito, onde uma carroça descarregava grandes pedaços de carne e da qual uma garota nua, coberta de óleo de lâmpada, pulou e desapareceu dentro.

Reconheceu-a em seguida. Logo depois assistiu à chegada da guarda e do suboficial Moorham. Kovuro devia sair daí o mais rapidamente possível. Testou as barras de ferro da janela. Agora não estava pendurado e dispunha das duas mãos. Afirmou os pés em duas grades e firmou as mãos em outra, puxando com força. A dureza do ferro era a fraqueza da pedra, que logo rachou.

Agora o mercenário de Purana estava livre... Livre para vingar-se...

*******.

Tules Dotir Reggihag tremia como vara de inchu verde, com frio e medo. Em questão de minutos seria encontrada porque o cerco apertara-se ao seu redor. Os guardas rodearam a pilha de sacos onde estava escondida e um deles tentava escalar.

Se olhasse para cima veria a garota. E também pelo cheiro de azeite.

Moorham tomava parte pessoalmente da caçada, desgostoso com os seus homens. O depósito fora vasculhado até o cansaço e era iminente o desfecho trágico para Tules.

Já faltava pouco, um dos guardas subira na pilha de sacos.

–Aqui está...! – começou dizendo, mas não completou a frase, porque duas mãos de aço fecharam-se como grilhões nos seus pés e puxaram com violência seu corpo para baixo. Seu rosto bateu no chão com força e um pé enorme esmagou sua cabeça. A morte chegara, na pessoa do mercenário de Purana...!

Quando os soldados recuperaram-se da surpresa o gigante armara-se com a espada do morto. O guarda mais próximo desabou com meia cabeça decepada. O segundo não teve tanta sorte, porque o mercenário abriu o ventre do infeliz, que ficou atirado no chão, morrendo aos poucos...

Kovuro pegou o lançador de dardos e apontou ao primeiro guarda que viu assomar por trás de uma pilha de sacos de grão. A seta entrou no olho do infeliz, e assomou pela nuca. Kovuro carregou velozmente e esquivou um dardo do seguinte guarda. Apontou e disparou, acertando no pescoço do sujeito que ficou no chão morrendo entre golfadas de sangue espumoso.

Kovuro apoderou-se do segundo lançador de dardos e mais um amarrado dos mesmos. Subiu na pilha de sacos onde a jovem se encontrava.

Na semipenumbra percebia as armaduras dos restantes guardas. Foi disparando dardos até derrubar meia dúzia de homens. Depois pegou Tules embaixo do braço esquerdo e segurou com a mesma mão o lança-dardo.

Pegou a espada com a direita e pulou para o chão. Correu velozmente até chegar a saída, aproveitando a confusão e os gritos de dor dos feridos.

Uma vez no pátio, Kovuro passou a vista pelas portas abertas. Rapidamente decidiu entrar no único lugar grande e cheio de gente, onde poderia causar pânico suficiente. O palácio da Mama.

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(continua)

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O conto KOVURO E ARUEN forma parte integrante da saga inédita

Mundos Paralelos ® – Fase 2 - Volume V, cujo inicio pode ser encontrado no Blog Sarracênico - Ficção Científica e Relacionados,

sarracena.blogspot.com

Gabriel Solís
Enviado por Gabriel Solís em 03/04/2011
Reeditado em 17/06/2017
Código do texto: T2888146
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