Manto Infinito de Estrelas (Parte 1 de 2)

Johann olhava fixamente o céu acima de sua cabeça. Os pés descalços sentindo a grama macia.

Contemplava um manto infinito de estrelas. Um ritual repetido sempre que podia visitar seu lar.

Nascera em uma região humilde de Hillian, uma área quase rural. Foi com estranhamento então que a vizinhança recebeu a notícia de que ele fora aceito entre os Cavaleiros Espaciais, a ordem de combatentes de elite da galáxia.

As provas de admissão da cavalaria eram severas e sobretudo caras, por isso os menos abastados muitas vezes sequer tentavam. Ser desclassificado em uma prova dessas significaria amargar anos de prejuízos financeiros. Muitos, inclusive, acreditavam ser mais seguro apostar na loteria do que tentar entrar para a cavalaria.

Nada disso importava para Johann. Ele fora aprovado com louvor na prova e o dinheiro que seu pai acumulara desde que se entendia por gente fora bem investido e recuperado com o seu primeiro soldo como Cavaleiro.

Aqueles raros momentos em Hillian com sua família haviam se tornado especiais, pois apesar do glamour da vida de cavaleiro em grandes festividades nas megalópoles galáxia afora havia também a guerra.

Diversos pontos de conflito se espalhavam pela galáxia e os Cavaleiros do Espaço eram a maior arma para assegurar o avanço da humanidade em sua conquista de outros planetas. O Sistema Solar já havia sido conquistado há tempos, mas haviam ainda muitos sistemas a serem colonizados pelos humanos.

A guerra havia mudado Johann. Ele sabia que os motivos eram justos, mas ainda assim, pouco restava do jovem brincalhão e bem humorado. Apenas uma coisa não mudara desde então. Ele ainda ficava horas contemplando as estrelas e se antes ele apenas sonhava em estar entre elas, agora ele apenas apreciava sua beleza fulgurante.

- Filho! - a voz da mãe de Johann - O jantar está servido!

*****

A nave estava repleta de soldados, todos jovens esperando a oportunidade de servirem na guerra. O clima dentro do grande veículo espacial era de descontração e cordialidade, com muitas piadas entre os jovens. Não parecia que eles iriam tirar vidas.

Apenas uma pessoa permanecia sentada imovel sem esboçar nenhuma reação. A figura em uma grande couraça metálica reluzente, com um estranho domo repleto de líquido na cabeça chamava atenção. Era um traje de Cavaleiro Espacial.

- Ei, Johann - dizia um dos soldados - relaxa! A missão de hoje é moleza!

Silêncio. O traje dos Cavaleiros Espaciais era a coisa mais impressionante já inventada pelo homem. Dentro dele qualquer um seria invencível. O corpo era protejido por uma grande couraça metálica, lembrando de longe as antigas armaduras dos cavaleiros medievais, enquanto a cabeça era protejida por um domo de vidro transparente extremamente resistente.

Dentro do domo, um líquido respirável envolvia a cabeça dos Cavaleiros, tornando difícil de se ver o que se passava do lado de dentro. Contudo, os Cavaleiros não permaneciam cegos, pois a parte interna do vidro funcionava como uma espécie de monitor, com informações sobre o ambiente ao redor, além de eficazes radares de combate que indicavam o melhor lugar de se atingir os inimigos.

A arma principal dos Cavaleiros também era a coisa mais impressionante já vista. A um simples comando, um feixe laser era emitido a partir da mão direita dos Cavaleiros, formando uma lâmina larga, capaz de fatiar aço como se fosse manteiga.

- Ora, cara - insistiu o soldado - Ainda falta muito pra chegarmos. Vamos ali, os caras tão jogando uma partida de pôquer!

- Estou aqui em missão - a voz de Johann soava metálica através de uma pequena saída no peitoral da couraça - não vim aqui para brincar.

Percebendo que sua tentativa de quebrar o gelo não traria resultados o jovem soldado, cuja placa de identificação exibia o nome Roderick se afastou de Johann e sua imponente armadura.

Sempre que estava em serviço Johann desligava-se do mundo. Nada mais importava no mundo a não ser cumprir a missão. O que poucos sabiam é que isso não era simples efeito de disciplina e condicionamento mental. O líquido presente no "elmo" das armaduras dos Cavaleiros Espaciais os ajudava a limpar suas mentes.

Quando com a cabeça imersa naquele líquido de propriedades misteriosas, o Cavaleiro parecia estar coberto por um redenho que o cegava para o mundo exterior, exceto para sua missão, cujos objetivos eram constantemente exibidos no monitor interno do capacete.

O segredo para a produção deste misterioso líquido, chamado entre os Cavaleiros Espaciais de Água Benta, é um dos mais bem guardados segredos da ordem. Os poucos radicais contra os Cavaleiros diziam que aquele material tirava toda a autonomia de pensamento dos Cavaleiros, tornando-os máquinas vivas de combate, o que não estava tão distante assim da verdade.

*****

O planeta C-52 já era visivel a olho nu de dentro da nave. A missão não tomaria mais do que uma tarde pela contagem terrestre, apenas um trabalho de rotina.

A política expansionista da Confederação Terrestre aumentou a quantidade de conflitos armados galáxia afora, mas ainda assim era estranho recrutar um Cavaleiro Espacial para uma missão daquelas.

A missão em si consistia apenas em remover alguns invasores rebeldes de uma usina de minérios no planeta C-52, há dezenas de anos-luz do nosso Sistema Solar. Apesar dos humanos terem se expandido por diversos planetas praticamente eliminando diversas raças alienígenas, ainda haviam alguns rebeldes contra o regime da Confederação que, segundo eles, era opressor e belicista.

Os assim chamados Anarquistas vinham dando trabalho nos últimos anos, mas eram pouco mais que um mero incômodo para as forças militares da Confederação. Portanto, era de se espantar que junto com a tropa militar fosse enviado um Cavaleiro Espacial. Tanto os soldados quanto o Cavaleiro isoldamente eram mais do que suficientes para recuperar a usina. Usar ambos era um disperdício de forças, diriam os especialistas na TV.

- Preparando para aterrisar - disse a voz do piloto, falando de sua cabine através do rádio da nave - segurem suas saias, moças!

Já do lado de fora da nave os jovens soldados pareciam ter mudado a atitude e as brincadeiras deram lugar ao tom sério esperado de militares. Johann dava as ordens com o ar de um deus. Típico de um Cavaleiro.

- Muito bem, homens. Estamos aqui para evitar o máximo de dano às instalações, por isso vocês só atirarão quando eu mandar.

- E quanto aos Anarquistas, senhor? - perguntou um soldado um tanto incerto de como se dirigir a um Cavaleiro.

- Eles são dispensáveis.