A máquina
O Monitor entrou, encarou a todos com olhar frio e advertiu:
– Dentro de dez minutos.
Na sala, o silêncio fez-se absoluto; todos os internos apresentando diferentes expressões de apreensão, um temor mudo de quem já adquiriu a noção da inevitabilidade de um destino violento e inexorável. Alguns, na maior discrição que seu instinto de sobrevivência lhes permitia, chegavam mesmo a chorar. 8909, por sua vez, mantinha-se na expectativa costumeira que precedia cada vistoria-íntima-surpresa, o que se tornara uma ação muito comum naquela instituição. Ele, ao contrário da maioria dos colegas, tinha dificuldade de guardar na memória todos os cronogramas de atividades, fossem estas propostas ou impostas. Então, mais uma vez, optara pela submissão (como se houvesse alguma outra opção...). Ficou ajeitando seu uniforme, evitando olhar para as câmeras no alto da sala, na intenção de não demonstrar um medo suspeito.
Os grupos selecionados, atendendo ao chamado sintético dos alto-falantes, levantavam-se e seguiam em fila marcial rumo ao local indicado. Ou seja, a misteriosa sala 28, no último andar. Ninguém sabia dizer a qual setor operacional correspondiam tais dependências. Temiam até o mero comentário. 8909 nem sequer perguntara pelo propósito da corrente atividade, pois temia revelar a própria alienação. Estava completamente confuso; apenas ouvira alguém comentar a respeito de uma certa “tecnologia” que seria incluída entre os métodos pedagógicos, caso uma certa “experiência” atingisse resultados favoráveis a sua aplicação.
Pois bem, chegara a sua vez. Junto com ela, a angústia da incerteza que envolvia a todos. O grupo de cinco rapazes, monitorado pelos vigias eletrônicos, embrenhou-se no organismo gigantesco daquele prédio. Descobriu-se, por fim, que a referida sala 28 era, na verdade, todo um setor. Já no interior dele, foram distribuídas senhas para a apresentação em determinadas salas que a cada um deles estavam reservadas. Logo se verificou que o próprio ato de procurar pelas salas já era em si, uma espécie de teste. Sozinho, perdido entre longos corredores, escadas, guindastes, elevadores e câmeras, 8909 ansiava pela rápida concretização da “experiência”. Contudo, assim que pôde encontrar o caminho, fora novamente tomado pela apreensão, desta vez potencializada. Observou o aspecto de um interno que, já tendo participado da misteriosa atividade supostamente pedagógica, transitava por ali. Estava notoriamente exausto, em deploráveis condições físicas e psicológicas. Parecia estar gemendo ou soluçando...
y3y7y5/xl-88. Porta de ferro, paredes à prova de som... Um botão azul. Acionado, revelou-se uma campainha.
Sem muitas cerimônias, fora conduzido ao interior, após mostrar o talão com a senha. Homens trajados de branco o receberam e solicitaram que se deitasse numa espécie de divã elétrico que se destacava no centro do aposento, ligado a um aparelho imenso e morfologicamente indescritível. Nada de perguntas, nada de respostas. Apenas ordens claras e implacáveis. Tirou toda a roupa. As mãos e os pés foram atados ao divã, seu corpo ficou entrelaçado em fios e acessórios os mais inimagináveis. Encaixaram-lhe um hediondo capacete.
Silêncio total. O que estariam esperando?
De repente, a dor. Física, mental, interna, externa, absoluta. Física, mental, interna, externa, absoluta, incessante, sobretudo constante. A noção da constância era sem dúvida o pior aspecto. Mais. Mais. Mais. Mais. Ainda.
“Sua vida é devoção, rendição, submissão, aquiescência. Você agora faz parte do organismo universal que enaltece seu sangue, sua raça e sua pátria. Descanse sobre a maré de energia que consome toda consciência própria, lascívia e indolência que lhe corromperam. Reprograme sua viril juventude, transforme-a na força altiva que coroará sua descendência. Esteja apto a ser parte...
(um grito lancinante)
...da MÁQUINA.”