REVOLTA NUM PLANETA MENOR (Segunda parte)

II

CONQUISTA

5

Quando lhe disseram que iria conhecer o Marechal, o chefe supremo da Nação do Planalto Central, Pedro hesitou…Sentiu-se dividido -Por um lado a sua personalidade actual intimidava-o, dizia-lhe para ser discreto, pois afinal ele nada era, por outro, as suas estranhas e mais antigas memórias diziam-lhe para agir, indicavam-lhe estar ali uma oportunidade única: revolucionar a absurda Arte da Guerra daquele planeta, onde, segundo o que ouviu aos seus camaradas e aquilo que se lembrava as 3 nações andavam em guerra perpétua, sem nenhuma vencer realmente as outras, sem haver um vencedor terminal, definitivo. Era a sua grande oportunidade, oportunidade para acabar com aquele jogo absurdo, oportunidade de vencer e, para de alguma maneira, voltar à sua antiga vida, voltar para a mulher e filhos que lhes tinham sido roubados pois ele que tudo era uma gigantesca artimanha, artifício, sentia raiva e ódio, pois algo nele lhe dizia que tudo aquilo era obra dos Senhores do Sistema, que por um qualquer erro não lhe tinham apagado as memórias antigas – como o tinham feito à maioria, senão à totalidade dos seus camaradas actuais – o que constituiu um erro fatal, que ele faria pagar muito caro. Bastava para isso que convencesse o Marechal a dar-lhe o que ele queria…

Sim, iria sem sombra de dúvida agir, jogar tudo, mas sem revelar, até chegada a altura o mistério da sua sapiência guerreira.

Dai a algumas horas o Marechal tinha finalmente à sua frente o prodígio.

Imaginava-o mais baixo e curvado, talvez por ter na sua cabeça a ideia fixa de que aquele homem não passava de “refugo da retaguarda” – nome com que tratava os soldados de segunda opção, como era o caso – Pelo contrário, tratava-se de um homem de trinta anos, invulgarmente alto e bem constituído, com um ar invulgarmente decidido, apesar da sua baixa condição social.

-Não sei se lhe devo dar os parabéns ou se o devo mandar prender…Você pura e simplesmente que faz a guerra de uma maneira…

-Inovadora! Atirou Pedro confiante

-Inovadora…Pois então, e o que pretende fazer dessa inovação?

-Conquistar todo o Planeta!

O Marechal ficou sem palavras…Pensou um pouco…Mas porque é que ele não conseguia pensar?! Mas, para não ficar em posição de inferioridade decidiu tentar acompanhar o raciocínio daquele estranho e perturbador soldado.

-Conquistar o planeta? Imaginemos que eu, num acesso de loucura dou a um soldado raso como é você, todos os nossos meios, que certamente saberá serem escassos, como se propõe a dominar o planeta? De todos nós somos o oponente mais fraco…Como se propõe então a tal?

-Para lhe explicar vou ter que fazer uma breve resenha daquilo que eu sei como se combate (mal) e como se deve combater: primeiro há uma fixação em destruir combatentes e não os seus recursos – Por exemplo, assisti um destes dias a um ataque da aviação inimiga sobre as nossas tropas; eram apenas dois insignificantes pelotões que estavam ao lado de um vagão de munições bem visíveis, ora o piloto atacante ignorou as munições e concentrou-se nos homens! É um perfeito absurdo! Aquelas munições serviram a muitos mais combatentes que ele teria inviabilizado se as tivesse destruído, mas não, foi aos homens! Outros dado-Não se fazem prisioneiros. Abatem-se pura e simplesmente quem cai na asneira de se render…Isto é péssimo, porque se por um lado constitui uma carnificina sem tamanho, por outro incentivamos o nosso inimigo a lutar quase até à morte, por saber que de qualquer das maneiras está condenado; ora se lhes dermos uma oportunidade de se renderem, eles ficam de tal maneira agradecidos que farão tudo o que quisermos, inclusive combater ao nosso lado, e com entusiasmo pelas novas chefias que pouparam as suas miseráveis vidinhas…

Sei que temos falta de gente, mas proponho-me a colmatar essa falha através da tomada da cidade fronteiriça – pelos meus cálculos se fizermos prisioneiros, teremos ai cerca de 30% da força combativa, desde que mos deixe fazer prisioneiros e depois convence-los a aderir à nossa causa –, através do uso de novas tácticas militares, nas quais se incluem a destruição de objectivos estratégicos que irão levar os nossos inimigos a implorar pela paz, e não a lutarem até ao fim.

-E como se propõe a tal “maravilha”?

-Ao invés de arrasarmos centros populacionais das cidades, destruiremos sim depósitos de munições, de comida, campos de aviação, quartéis, e as pontes que saibamos poder ser utilizadas por esses mesmos exércitos, de maneira a isolá-los, cercar e levar à rendição. O facto de fazermos prisioneiros e de os tratarmos bem vai-se espalhar entre os nossos inimigos, o que irá minar a moral deles…Depois, basta chegar com os nossos exércitos à beira das suas cidades esfomeadas, desmoralizadas e verá como elas nos cairão entre as mãos como frutos maduros…

-E a campanha vai durar…

-1 Ano, dois no máximo, mas entretanto é preciso treinar as tropas segundo as novas regras, e desmoralizar os nossos inimigos através do assassínio dos seus lideres mais populares, ficando no seu lugar gente nova, inexperiente, facto que nos facilitará ainda mais a vida…, e entretanto reforçar a segurança dos nossos, não vão eles ter a mesma ideia que nós – Disse com um sorriso maldoso Pedro.

Foi um Marechal perfeitamente baralhado que acabou de ouvir este soldado desconhecido. A sua razão dizia-lhe que o homem era um embuste, uma fraude que deveria mandar prender e executar logo de seguida por ser uma possível fonte de sarilhos, mas…A sua popularidade espalhara-se por toda a Nação do Planalto Central, os seus feitos eram a mais nova lenda num país desesperadamente necessitado delas, o seu nome era já o mito por que todos esperavam após anos de derrotas e impasses militares, e além do mais o sexto sentido bélico do militar avisava-o das potencialidades daquele estranho soldado…Havia uma pergunta que poderia decidir tudo, e por isso não a podia deixar de fazer:

-Temos centenas de milhares de homens neste planeta e nunca nenhum se lembrou de tudo quanto propõe…De onde lhe vêem as ideias? Quem é realmente você?

Pedro hesitou um pouco. Na sua cabeça a hipótese de contar a verdade existia, mas ainda era demasiado cedo, e ele ainda não tinha provas do que pensava estar a acontecer naquele planeta -Dispunha apenas das suas memórias e ideias que provinham dessas memórias, ora isto não era nada…Mas a certeza que tinha das suas teorias…Perfeitamente convicto achava que nada o poderia impedir…A menos que os Senhores do Sistema interviessem, ou pelo menos os seus algozes da Estação Lunar o fizessem no lugar deles, mas para isso era preciso fazer estragos, muitos estragos, dar nas vistas, conquistar o máximo de terreno possível, desequilibrar a balança tão bem equilibrada naquela guerra onde se matavam milhares mas onde nada de facto se ganhava. Dizer que era um elemento politicamente incómodo noutra vida e por isso ali metido seria a sua maior asneira…Pois é, faltava a tal prova…Até lá iria inventar uma desculpa…

-Sou um mero soldado-raso, como diz. Desde sempre que fui um elemento de retaguarda que nessa posição teve tempo e calma para me aperceber da forma irracional como se conduz a guerra neste planeta; esperei sempre uma oportunidade –tentei alistar-me mas na altura recusaram o meu pedido (mentiu descaradamente)- e eis que ela finalmente chegou. Chame-lhe um dom, pois é isso um dom, instinto de batalha, se quiser…

Aparentemente o Marechal ficou convencido, pelo que agora só faltava oficializar o plano. Podia bem pegar nas ideias de Pedro, aproveita-las em moto próprio e assim se transformar no salvador da Nação, mas sentiu que estas eram demasiado complexas, e que a elas se seguiriam outras, que só a cabeça daquele homem poderia dar seguimento.

-Pois bem, e que cargo lhe hei-de dar? Não passa de um simples soldado…

-Promova-me a Sargento numa primeira fase, depois e à medida que o plano for surtindo efeito, serei cada vez mais promovido até chegar a seu braço-direito oficial, ou seja, Coronel do Estado-Maior. Entretanto quero ficar com o cargo não oficial de Comandante dos Exércitos do Norte. Lá treinarei a nossa tropa de choque, que será essencialmente composta por prisioneiros convertidos à nossa causa; se eles já se mostram colaborantes por não os matarmos, imagine o que sucederá depois de algum tempo sujeitos à nossa propaganda – Lutarão como demónios para libertar a sua terra, os seus irmãos das “garras do opressor”. Esses homens e mulheres constituirão o aríete das nossas forças de ataque. Serão sempre os primeiros a avançar e os últimos a deixar o campo de batalha, porque depois da conquista há sempre a tarefa da pacificação, e quem melhor do que eles para desempenhar essa tarefa?

-Não faz a coisa por menos…-suspirou o Oficial Superior, já derrotado, mas querendo ainda negociar. Em vão, Pedro estava decidido.

-É pegar ou largar…

-Muito bem, seja como quiser…

O soldado riu-se de uma forma autónoma que o Marechal não percebeu. Para Pedro aquilo era apenas o início. Com o tempo e com o sucesso estrondoso que iria inevitavelmente surgir e que ele faria questão de toda a gente saber que Ele era o principal responsável, o próprio Marechal veria o seu posto em causa, logo o poder cairia maduro nas mãos de Pedro que assim se transformaria no homem mais poderoso da Nação do Planalto Central, primeiro passo para a conquista planetária.

Uma nova e devastadora forma de guerra ia pois começar, que iria surpreender toda a gente, inclusive os senhores da Estação, todos menos um…

6

O Comandante apreensivo olhava sozinho para a gigantesca sala de ecrãs onde se controlava todo o planeta Y2. Olhou para o relógio e resmungou – o seu ajudante estava atrasado, descuido lógico por ter sido acordado a meio de um turno de sono, mas indesculpável para um Comandante que mal tolerava descuidos.

Finalmente chegou, meio atrapalhado, e depois de cumprimentar o superior, e ante o silêncio deste, imitou-o na pose.

-Sabe que algo de muito grave se está a passar no planeta?

O outro, meio estupefacto pela surpresa só conseguiu um

-Ah…?

-Sim, e devia estar a par disso -Resmungou algo injustamente o oficial, dado as tarefas do jovem nunca terem sido esclarecidas -era um mero ajudante, que fazia um pouco de tudo, mas nada em concreto, e muito menos estar a par do rumo dos combates, dado ser esta uma incumbência exclusiva do seu Chefe Superior.

-A Nação mais fraca está a operar uma autêntica revolução na arte da guerra, e penso já termos um responsável por isso…Trata-se da Nação do Planalto Central. Até há alguns meses era inofensiva, inócua mesmo, só não sendo esmagada pelos seus vizinhos devido à inépcia militar destes e a alguma interferência nossa. Mas desde há alguns meses que a situação foi alterada -Para começar fazem prisioneiros, e, pior, transformaram-nos em combatentes fanáticos, cuja ferocidade é notável, pois completamente convertidos ao novo poder, agem sem hesitar, mas com o mesmo padrão de fazerem prisioneiros sempre que podem, dada esta ser uma ordem superior, que, quando violada é punida com a morte. E para acabar, esta Nação utiliza duma forma perfeitamente inovadora a estratégia militar – Neste momento estão a tentar conquistar os Países do Sul e com algum sucesso que me deixa apreensivo -Já não arrasam cidades, já não procuram matar civis ou militares, não, eles procuram a destruição de objectivos estratégicos tal como o são depósitos de munições (e conseguem saber a sua utilização através da inovação de agentes no terreno e de aviões espiões) campos de aviação, quartéis, pontes, estradas fundamentais para o movimento das tropas inimigas. Estando neste momento à beira de cercar a maior parte dos exércitos inimigos, depauperados que estão devido à falta de alimentos e munições. E o pior é que a seguir aos exércitos vão cair as cidades já esfomeadas, já revoltadas com o poder por este nada poderem fazer no na frente interna e no campo de batalha, ainda mais estranho é o facto de os líderes desta Nação terem sido assassinados, ficando no seu lugar novos pouco experientes, o que facilita o trabalho à Nação do Planalto central.

E quem é o responsável? Sim, após vários dias de trabalho consegui descobrir a verdade, uma verdade preocupante – Trata-se de um relativo recém-chegado de nome Maximus Pedro. É um antigo militar, relegado para Y2 por crime de injúria política. Até cair na asneira de abrir a boca era um dos “meninos bonitos” do Sistema, um militar brilhante, bom estratega, líder carismático, corajoso, extremamente inteligente.

-Que no entanto a operação devia ter tornado um “zombie”…-Atreveu-se a comentar o ajudante.

-Pois é, e ele era tão bom que se deu ao luxo de emitir um juízo crítico sobre o Sistema, de ter a ideia de o mudar…Pois é, foi de imediato preso e recambiado para aqui. Ao que parece em Y2 ele destacou-se em actos individuais de invulgar bravura, depois ascendeu de uma forma perfeitamente meteórica na carreira militar, até que por fim ele decidiu tomar o poder do seu país; os feitos de armas que a propaganda acertadamente lhe atribuiu fizeram dele um herói, pelo que a população não estranhou e até apoiou a mudança de poder, farta que estava de derrotas ou impasses militares anteriores. Era suposto de facto a operação tê-lo alterado, mas pela primeira vez essa operação falhou, pelo que o indivíduo possui duas memórias, a anterior e a actual que lhe inserimos, mas o tipo faz um uso notável da antiga e está a mudar a arte da guerra em Y2, e o que era suposto se passar em anos, está-se a passar em meses, uma situação vertiginosa que está prestes a escapar ao nosso controlo…Se nada fizermos o equilíbrio dos poderes está em causa! Pela primeira vez na história de Y2, uma facção ganha a guerra, e sabe o que isso representa?

-Uma rebelião, o cenário de há 30 anos, o maior dos fantasmas do Sistema! Então devemos intervir, devemos mandar os homens que temos e acabar com o problema!

-Já lhe tinha dito que eles são demasiado poucos para uma rebelião generalizada, e além do mais as regras do Sistema – que nunca previram um cenário destes – proíbem-nos de intervir livremente na guerra.

-Então temos de comunicar com o exterior!

-E assim dar uma prova da nossa fraqueza?! E assim dar cabo das nossas carreiras? Não, eu tenho ainda duas soluções, sendo que você vai participar na primeira.

Vou enviar ainda hoje para o planeta um grupo de assassinos -que estão de prontidão para qualquer emergência - para eliminar Maximus Pedro, sendo que você os irá acompanhar como observador, para lhe dar um pouco de acção…

-Eu, a acompanhar assassinos…?

-Você não é um soldado, não foi treinado para combate?

-Mas…Sou um oficial formado essencialmente para servir num Estado-Maior e isto não é uma missão de combate! -Confessou envergonhado

-No seu currículo assim vai constar…E sabe o peso de tal numa futura promoção? E além do mais fisicamente não correrá nenhum perigo. Os nossos homens vão-se infiltrar como guarda-costas do nosso alvo, ninguém vai desconfiar de nada, vai ser uma missão simples, acepticamente simples…Sabe, eu até simpatizo consigo…e sei perfeitamente que com as suas actuais incumbências nesta Estação a sua carreira quase que estagna…Dai ter tido a ideia de o enviar supostamente como líder deste grupo; claro que na prática você é um observador, mas o que vai constar na ficha de missão vai ser o seu papel de líder…

O outro concordou, de forma relutante, mas concordou, de olhos na futura promoção que de alguma forma o poderia tirar daquela maldita Estação e das suas odiadas e estúpidas atribuições.

Saudou o Comandante e dirigiu-se ao grupo de homens que iria matar Pedro

Mal este saiu, Leviathan passou de imediato para a sala ao lado, a sala de comunicações, para acrescentar mais uma peça ao seu plano.

7

O alvoroço na Nação do Planalto Central era enorme.

Pela primeira vez estavam à beira de vencer um dos inimigos, sendo agora público que Maximus Pedro era o principal responsável pela mais que previsível vitória, e foi essa a altura em que Pedro assumiu o poder total, afastando o inapto Marechal, numa hábil manobra de propaganda em que o acusou de falta de fé na vitória final. Entusiasmada, a população e o exército apoiaram-no incondicionalmente, pois sabiam que fora o seu aparecimento que alterou as suas vidas, que lhes dera a provar o sabor de uma vitória contínua e não temporária, como eram todas as vitórias em Y2.

Tendo agora todo o controlo, preparou-se para acabar de vez com os Países do Sul, tendo já começado a delinear a futura campanha, a que o levaria a conquistar os países do Norte, e assim tomar o controlo de todo o Planeta.

Por isso estranhou quando o chamaram com urgência ao edifício principal das comunicações.

-Senhor, recebemos uma comunicação do Espaço.

-Do espaço, mas lá não há nada! -Mentiu pois era ainda cedo para começar a revelar a verdade.

-Perdão, não é bem do Espaço, a comunicação parece vir… da lua e vem dirigida a si, como é pessoal ainda não a ouvi, limitei-me a guarda-la, para lha entregar.

-Muito bem, então saia enquanto a escuto.

O outro anuiu e Pedro ouviu então uma voz grave, dum homem de certa idade, que lhe soou como o derradeiro momento de vitória.

-“Maximus Pedro, daqui fala o seu “anjo da guarda”. De momento não lhe digo quem sou, digo apenas que sou o seu maior aliado, e como prova disso, comunico-lhe que dentro de algumas horas alguns dos seus novos guarda-costas o vão tentar matar. De imediato nomeie homens da sua mais alta confiança, e desconfie de quem se aproximar. Prenda toda a gente de quem desconfie e depois interrogue-os sempre com esta frase – “O que quer a Estação?”- Aconselho-o a usar no interrogatório todos os meios ao seu dispor, mesmo os mais brutais, pois quem lhe responder correctamente à pergunta dar-lhe-á a prova que falta para que convença os seus camaradas e o restante planeta que tudo não passa de um crime, que a vossa vida não passa do mais horrendo dos crimes do Sistema.”

Depois de ouvir esta mensagem Pedro isolou-se para a reflectir, mas rapidamente, porque o tempo era agora seu inimigo, não sem antes reforçar a sua guarda pessoal conforme o aviso da mensagem.

Apesar de estar absolutamente convicto de que aquele planeta não era mais do que uma forma do Sistema se livrar de alguns dos seus adversários, por vezes tinha dúvidas, pensava que tudo poderia ser fruto de um delírio seu, por tudo se lhe afigurar demasiado monstruoso, pela vertigem dos acontecimentos…Mas a mensagem…A mensagem vinha confirmar a ideia que tinha, vinha reforçar a tese do Sistema estar por detrás das batalhas sem fim, daquela forma de vida absurda onde a guerra era o único horizonte de todos os habitantes do astro. E além do mais…Se de facto o que ouviu fosse verdade ele começava a ter por fim provas…Claro que não eram provas irrefutáveis…Os seus camaradas certamente acreditariam na sua tese, ao passo que os adversários julgariam que tal não passaria de propaganda…Mas já era um princípio…Sim, iria seguir as indicações da mensagem, e depois…depois logo se veria e até podia ser que o seu misterioso aliado lhe fornecesse provas mais conclusivas para demover o mais céptico dos inimigos, para convencer os poderosos Países do Norte, já que os do Sul estavam ao alcance da sua mão…

E foi assim que os primeiros habitantes de Y2 começaram a saber a verdade.

Seguindo o conselho vindo da lua, e debaixo de uma terrível tensão que soube dominar com mestria, Pedro esperou, e ainda refinou a armadilha: sentado por detrás de uma secretária a ultimar os preparativos da ofensiva final daquela campanha, escondeu vários homens da sua máxima confiança para dar a impressão de estar só. Depois, depois as horas correram, até que cinco soldados desconhecidos vestidos de camuflado e com insígnias da sua guarda pessoal bateram à porta e entraram; inventando um motivo protocolar aproximaram-se, e foi então que Pedro deu uma ordem. Tudo foi decorreu tão rapidamente que só um dos assassinos teve tempo de puxar uma arma, sendo abatido de imediato, tendo os restantes quatro sido feito prisioneiros. Pedro levou-os então para uma sala de interrogatório e perguntou perante o ar espanto mal disfarçado destes: -“O que quer a Estação?” – No entanto eram tipos duros, assassinos frios que não falariam, Maximus sentiu tal quando os olhou nos olhos. Não havia nada a fazer a não ser proceder com uma brutalidade que detestava, mas que se revelaria necessária – Instalou cada um dos homens em salas diferentes e interrogou-os individualmente. Primeiro docemente, e usando a astúcia, dizendo que sabia muito bem que tinham vindo da Estação para impedir a sua vitória, passando depois para outra sala e usando o mesmo discurso; em vão, eles respondiam que eram agentes dos Países do Sul enviados para o matar, dando o seu número mecanográfico, o nome e nada mais: Decidiu então empregar métodos mais duros, sem a mínima esperança que falassem, até que, depois de alguns socos e de um simulacro de execução – pistola apontada à cabeça e premido o gatilho com o carregador vazio…- , o mais franzino dos homens cedeu.

Revelou ser um mero homem da retaguarda, o ajudante de um tal Comandante que da lua, instalado numa Estação comandava os destinos dos homens e mulheres de Y2 e calou-se aparentemente esgotado, física e psicologicamente, o que não convenceu Pedro. Como tal soasse a pouco, vieram mais socos e outro simulacro de execução, desta vez com pólvora seca, sendo então que as palavras que Pedro queria ouvir finalmente surgiram, e ele repetiu toda a conversa que se lembrava ter com o Comandante. Queriam provas? E ele revelou onde estava escondida a nave que os tinha trazido ali, bastando que eles viajassem nela e se aproximassem suficientemente da lua para comprovarem que ele dizia a verdade.

Satisfeito, Pedro teve uma ideia depois de ter gravado a confissão do ajudante. Depois de a revelar ao seu Estado-Maior estupefacto bem como as suas origens, dirigiu-se ao local onde estava a nave, instalou o prisioneiro e os seus homens nela pilotando-a ele próprio para espanto geral. A bordo levaram também uma equipa de televisão que filmou tudo seguindo as indicações do prisioneiro: filmou a lua, a Estação, as suas diferentes instalações, os paióis – alguns a céu aberto – onde armas, imensas, incontáveis armas esperavam pelo seu transporte até Y2. Filmou também a base aérea e algumas naves gigantescas de transporte, filmou tudo e recolheu assim as provas que faltavam. Mas enquanto pilotava a poucos metros da superfície, espantou-se por não o abaterem, revelando tal ao prisioneiro que lhe respondeu candidamente que uma prisão não dispunha normalmente de meios antiaéreo pois não era suposto esperarem inimigos vindos do espaço, e muito menos de Y2…

Com os seus fiéis convencido, faltava a Nação do Planalto Central.

Tarefa facilitada pela rede televisiva, sendo que foi o próprio Pedro que ajudou a montar uma reportagem no departamento de propaganda, que depois lançou.

As repercussões foram as esperadas, se bem que numa primeira fase os habitantes da Nação de Pedro estupefactos tivessem dificuldade em acreditar, mas depois deste lhes jurar a verdade e de ter feito uma demonstração pública de como pilotar esse estranho veiculo que era a nave – num rápido périplo visitou as principais cidades do país, sendo recebido por multidões organizadas pelos lideres dessas cidades - , todos os habitantes acreditaram, e até combateram com mais entusiasmo, pois já não se tratava de uma luta comum, de conquista, mas sim de libertação, de conquista pela liberdade global.

Como resultado deste novo espírito, a guerra com os Países do Sul foi liquidada em menos tempo do que o próprio Maximus e o Comandante pensavam. De seguida Pedro empreendeu uma gigantesca operação de reconstrução do novo território mas também de mentalização da população conquistada. Mostrou-lhes o documentário e demonstrou-lhes que na prática não tinham sido conquistados, tinham sido libertados, praticamente só fazendo prisioneiros entre as chefias, deixando o grosso dos exércitos encerrados em instalações de baixa segurança onde se procedeu à mentalização, à doutrinação destes, algo que durou longos meses, mas algo que foi conseguido com um notável sucesso.

Estava pois na altura de pensarem em planear e atacar o último bastião, os poderosos Países do Norte.

8

O assassínio falhara, como era de prever, ou talvez não…Neste complicado jogo, o Comandante lançava os dados uns atrás dos outros e depois esperava que estes girassem consoante a sua sorte…

Apesar de alterar as regras da Estação, ele ainda tinha que seguir algumas regras, para o caso da vitória de Pedro falhar…

1ºProtocolo-Em caso de problemas imprevistos envia-se ao Planeta Y2 uma tropa de choque para tentar resolver esses problemas.

Ou seja, ele tinha de enviar as 3 naves teoricamente para impedir Pedro de ter uma vitória total, ou talvez não…Quando vencesse os Países do Norte este iria precisar de veículos para alcançar a Lua; o problema é que esta tropa de 1500 homens e de equipamento praticamente invulnerável às armas do rebelde, era bem capaz de o deter se fosse bem comandada…Se fosse bem comandada…O Comandante sorriu de forma matreira…

Ordenou a saída da equipa, e novamente dirigiu-se à sala de comunicações, para deixar mais um recado.

9

Novamente Pedro foi chamado ao edifício principal das comunicações, onde ouviu outra mensagem decisiva, ainda mais decisiva do que a anterior.

““Maximus Pedro, daqui fala novamente o seu “anjo da guarda”, e novamente eu tenho informações que o vão levar à vitória final, ouça com atenção pois da sua atenção a esta mensagem vai depender a sorte desse planeta: Pelas 2 horas da manhã vão aterrar três enormes naves com cerca de 1500 homens num vale a oeste da sua cidade, o Vale de Thor, como vocês lhes chamam. A missão desses homens é encontra-lo e eliminá-lo. Não vale a pena enviarem exércitos ao encontro desses homens, pois com o equipamento avançado que possuem são virtualmente imunes às vossas armas, sendo que o que devem fazer é colocar tropas bem camufladas em redor do vale, cercar esse vale, depois, quando os “meus soldados” estiverem prestes a se porem em marcha dêem a ordem para eles se renderem deixando bem explícito que estão a fazer a mira nas naves, repito, eles têm que entender que as naves podem ser destruídas se não obedecerem. Eles vão hesitar, mas eles acabarão por se render, confie em mim. Depois, capture as naves – elas serão úteis se quiser vir até a Estação no final dos combates – e faça prisioneiros esses homens, tire-lhes o equipamento e confie esse equipamento aos seus melhores homens, treine-os e use-os como ponta de lança para o ataque aos Países do Norte. Devo também informá-lo que recentemente para “salvar algumas aparências” tive que rearmar os seus adversários, sendo que com as novas armas e novos combatentes eles superavam as vossas forças em 2 para 1. Aparentemente isso é um problema…aparentemente…Mas eles têm que dispersar essas forças por duas frentes – a do Norte e a do Sul, sendo que deverá simular um ataque ao sul, mas de facto atacar pela frente Norte onde estão concentrados os melhores exércitos do seu adversário. Ah! Um pormenor que o vai fazer ganhar rapidamente esta derradeira batalha: ataque pela Zona Interdita, e assim vai flanquear o adversário e também atacar pela retaguarda; não se preocupe com a Zona Interdita, tudo o que lhes disseram de mal sobre esse local foi para vos afastar de lá, pois trata-se apenas do local onde as naves da Estação aterram para despejar material e homens destinados à vossa guerra eterna, apenas isso. Siga os meus conselhos e em breve nos veremos”.

Apesar de não ter percebido aquilo de “salvar as aparências” Pedro desta vez nem sequer hesitou: posicionou de imediato as suas tropas no local indicado e novamente esperou…

Pelas 2 horas da manhã três pequenas luzes de sinalização surgiram no céu e lentamente desceram até que perante os visores nocturnos dos combatentes surgiram perfeitamente nítidas as naves.

Pedro ordenou então que algumas das suas unidades fizessem pontaria a elas, de maneira a que na altura adequada os seus tripulantes soubessem estarem a ser hipotéticos alvos. E ele esperou, esperou até que 1500 homens vestidos de negro, de aspecto sinistro saíram do bojo dos veículos espaciais e deu ordem de se renderem, deixando bem claro que estavam cercados

Nessa altura, foi a surpresa geral para os homens do Comandante, que baralhados contactaram a Estação, pois não era suposto encontrarem oposição tão cedo…

-Senhor, estamos cercados, e eles têm as naves sobre mira…Forçamos o cerco e combatemos?

-As naves estão sobre a mira?

-Sim.

-E não há maneira de saírem sem serem alvejadas?

-Não, é como eu lhe disse estamos cercados, e o mais estranho é que eles se mostram…diria duma forma ostentadora…

-Rendam-se então.

O chefe da tropa de assaltou ficou estupefacto pelo que ouviu.

-Importasse de repetir?!

-Rendam-se.

-Senhor nos somos invulneráveis! Podemos e devemos vencer esta súcia de campónios!

-Esta súcia de campónios, como lhe chama, fez e venceu a mais rápida guerra que há memória na história do Sistema! Esta súcia tem as naves sobre mira, e caso não saiba vocês podem ser invulneráveis, mas não as naves! As naves que são propriedade do Sistema que pagou uma pipa de maça por elas! Quer ser o responsável por esse prejuízo? Pela última vez renda-se ou quando voltar para a Estação vocês e os seus homens serão sujeitos a Tribunal Marcial, ou pior…

Consternado, o chefe anuiu. Sabia bem o que significava pior…Significava ir parar a um planeta daqueles como habitante…Ao menos como prisioneiro seria solto e, como obedeceu a ordens superiores quando regressasse voltaria à sua anterior posição

(Conto protegido pelos Direitos do Autor)

Miguel Patrício Gomes
Enviado por Miguel Patrício Gomes em 05/05/2006
Reeditado em 27/06/2008
Código do texto: T150647
Classificação de conteúdo: seguro
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