TSUNAMI

Três dias em alto mar e chegamos à altura da cordilheira meso oceânica.

Quatro mil metros abaixo de nós, semelhante a um zíper, a cadeia de montanhas indicava o local exato da ruptura de Gondwana, para a formação da África e América do Sul e que ainda hoje se afastam à razão de dois centímetros e meio por ano, ininterruptamente.

Esperávamos encher a traineira com as cavalas que aproveitando a correnteza, vêem da costa sul africana até a América Central para desovar.

Nosso sonar detectava pequenos cardumes, mas em grandes profundidades.

Não podíamos lançar o espinhel, pois só iríamos perder boas iscas com maus pescados.

De repente todos nós sentimos o abalo na água e o som de trovões distantes...

O sonar parecia ter enlouquecido...

Manchas escuras e largas apareciam e desapareciam na tela, denunciando que algo terrível estava acontecendo lá em baixo.

Ficamos quietos por algum tempo até que, o patrão, mandou que vestíssemos os coletes salva vidas e ligamos o motor em velocidade mínima, apenas por precaução.

As águas tremiam sob o casco e bolhas, muitas bolhas, chegavam à superfície, espalhando cheiro forte de enxofre.

Sem dúvida uma tremenda erupção vulcânica...

Os roncos que ouvimos e que julgávamos serem trovões eram na realidade tremores de terra na cordilheira que estava se movimentando mais uma vez.

Alguém lembrou que deveríamos avisar ao continente da iminência de um tsunami.

Conseguimos conexão com a Capitania dos Portos de Natal, mas a pessoa que nos atendeu, riu da nossa preocupação e desligou logo em seguida.

O proeiro chamou a atenção para o cardume de atuns e soltamos as linhas com iscas artificiais, brilhantes como sardinha.

Pegamos muitos peixes que eram eviscerados e sacudidos para dentro do porão abarrotado de gelo.

Se tivéssemos a sorte de encontrar outro cardume daquele, encheríamos os porões do barco e poderíamos voltar para casa...

Com a voz quase sufocada pelo medo, o proeiro deu o aviso de tsunami.

O patrão mandou recolher as linhas e com o motor a toda força à vante, embicamos na direção da onda gigante para enfrentá-la com a quilha a fim de minimizar o impacto.

Nosso encontro com a parede d’água de uns dez metros de altura se deu em pouco tempo, mas como o barco ainda estava leve e com pouco calado, conseguimos saltar para cima da crista da onda.

Na sequência, várias outras ondas de menor volume, sacudiram o barco como se estivéssemos numa coqueteleira.

As bolhas tinham aumentado de volume denotando intensa atividade tectônica...

Embicamos para leste, aproados na direção de Angola a fim de sairmos do epicentro do fenômeno.

Meia hora depois, diminuímos a força do motor...

O mar estava calmo...

Era como se estivéssemos navegando no mar morto, tal a calmaria das águas.

Nem o lixo que os “civilizados” jogam no oceano, era avistado.

Voltamos para ao ponto em que estávamos quando tudo começou.

As bolhas cheirosas a enxofre agora pareciam bolhas de champanhe.

Novo cardume de atuns apareceu e logo em seguida outro de cavalas.

Com os porões abarrotados, aproamos para o Recife.

Na medida em que nos aproximávamos da costa, os outeiros de Olinda foram saindo de dentro d’água, mas o Recife havia sumido...

Fôra varrido do mapa pelo tsunami que atingiu a costa com quarenta metros de altura, numa velocidade perto dos novecentos quilômetros por hora.