Ensaio da Nudez (revisto) I, e II
O Nu Vermelho e Quente (I)
Na manhã de todas as manhãs, a moça meio fuga, meio busca, deslumbre, e receio, olhou seus arredores de mundo, e seus relatórios pessoais, sentindo-os impróprios do vazio que a tomava agora.
Pela janela do quarto, um frio - em ventos estranhos-adentrava este seu espaço anacrônico, e nos lençóis da cama, no leito repleto dela que já não era ela, afugentou-se.
Foi tirando a roupa, que já não lhe correspondia nem queria, e por nada possuir de si, apenas o frio, enfrentou sua nudez admirável, e na cor vermelho de terra, de medo, e paixão, aninhou-se dentro do frio que deixou entrar, numa expectativa devota a si mesma, ao toque trêmulo na terra-pele desconhecida.
Sentiu, então, um rio emanar do corpo, e eram quentes as águas. E assim, de forma natural, o convite caloroso do rio a fez mergulhar um pouco mais - sem dor - na confortável doçura das águas, um prazer aquecido em vislumbres só seus e do rio.
O Céu Alaranjado (II)
E um dia brincava com palavras jogadas ao papel. Lembrou-se da pedra que jogava, ainda criança, na brincadeira de “amarelinha”, quando o objetivo era chegar primeiro ao céu. Amar seria um elo para o céu? Em volta dela, e dentro, nuvens de pensamentos efêmeros, cenas de filmes, sons do sol na chegada da lua, lembranças das cólicas mensais, e-mails impressos espalhados sob a escrivaninha do quarto, com smiles, corações, códigos de linguagem próprios do seu grupo, cuja idade era só descoberta de fronteiras a desvendar.
Quantos degraus para chegar ao céu? Seria um lugar proibido, seria apenas para ser visto, pressentido, sonhado? Cairia muitas vezes? Ia assim, ao sabor de brinquedos em construção, querendo ser algo mais.
O céu era aquele garoto, em diárias doses de vista ao longe, em chegadas esquematizadas numa balada, ou na saída da escola. Era um som de cordilheira atravessada com skate, no limite daquilo que nunca era tudo, mas assim mesmo trágico na formação.
Na des-corrente do pensamento, dormiu em nuvens poderosas, e dentro da camisola cor laranja salpicada de símbolos chineses, dançou ao som da festa passada, ritmo de beijo non-sense, indo, indo, até não mais verem retorno, não antes de ao céu desconhecido e inusitado chegarem.
Mas ambos caíram em flagelo, sim, flagelo daquele salto para o céu, que nem tanto agora importava, que nem se sabia de fato existir além do vôo bom entre as cordilheiras, ambas virgens, em degelo.
O despertador tocou. Ela desperta, caindo fora dos limites do jogo. Olhou ao redor – viu o papel traçado na noite anterior caído ao lado da cama. Agora ele contava a história de palavras, conceitos, e brinquedos, perdidos entre a infância passada e o futuro abrindo-se em leves toques de primeiro amor, margaridas, cadernos, fotos, boletins, suco de laranja, acerola, e saltos um pouco mais altos.