CONTO DE FADAS
 
Era uma vez um reino muito rico, situado num lugar muito distante dos povos civilizados, o qual era habitado por humanos e seres fantásticos dotados de hábitos e compromissos diários muito estranhos.

Nesse reino o seu rei não usava coroa, não ficava o tempo todo mandando na vida das pessoas sob o seu comando e nem permanecia inativo, pensando apenas em ganhar dinheiro, ali, sentado no seu trono.

Ele era um homem que trabalhava muito e que além da preocupação constante que tinha para com os compromissos do reino, mantinha sob controle na sua agenda diária uma série de afazeres domésticos. Os mais preferidos por ele eram cozinhar, lavar a louça, cuidar da limpeza da casa e da manutenção dos jardins.

A rainha, por sua vez, adorava essa atitude eminentemente solidária e pouco machista do esposo dela. Por vezes, ela comentava, de forma bem discreta, no convívio social feminista do seu reino, que ele era o único homem do seu mundo conhecido que procedia daquela maneira e que ela, em vez de ficar mandando no pequeno efetivo de criados, incumbido da realização diária dos inúmeros afazeres do lar, saía de casa, constantemente, para cuidar de atividades sociais e filantrópicas do reino.

A princesa, que era muito bonita e uma filha muito dedicada à sua família, não gostava de ser constantemente admirada pelos jovens do seu reino e nem paparicada pelos seus criados, como o procedem, até hoje, as pessoas que detêm esses atributos.

Ela preferia ocupar todo o seu tempo estudando, a ficar diante de um espelho contemplando a própria beleza, procurando, assim, uma maneira a mais para chamar a atenção de si mesma ou atrair a atenção das demais pessoas, ocupadas ou não, de seu relacionamento.

O irmão dela não gostava que o chamasse de príncipe e nem de filho do rei. Ele era, realmente, uma pessoa desprendida da utilização e/ou abuso das benesses oferecidas pela fartura e riqueza disponíveis para uso dos demais membros da família real. Muitas vezes ele dispensava o rico conforto das charretes que estavam a serviço do reino e preferia andar a pé ou montado a cavalo.

Por essas e outras, chamavam-no, às escondidas, de pobre cavaleiro errante. Talvez isso se devesse ao fato de ser ele o único membro da família real que cuidava pessoalmente dos seus animais de estimação. Era comum vê-lo sair de casa, sozinho, para pegar os cavalos na cocheira, banhá-los, escová-los, colocar a sela num deles e sair cavalgando pela extensa propriedade rural da família.

Nesse reino, além dos membros da família real, do corpo de segurança, da criadagem e dos conselheiros, havia um número considerável de fadas. Elas eram seres que se incumbiam de cuidar do bem-estar, da saúde e da beleza estética das pessoas da família real, sobretudo daquelas que viviam exclusivamente do fruto do seu trabalho e/ou do uso e exploração diários da sua boa aparência; quando sobrava um tempinho, elas cuidavam um pouco da própria saúde.

Naquele reino quase todo mundo gostava de trabalhar. Fazia parte da tradição educacional do lugar, ensinar desde cedo no ambiente familiar e nas escolas, a todas as crianças e jovens, a enxergar o trabalho como a melhor terapia ocupacional e promissora utilizada, até então, pelo homem, em todos os tempos.

As fadas que viviam naquele reino que, por incrível que pareça, não era encantado, eram todas elas seres mágicos. Apesar de terem formas e atitudes semelhantes às dos mortais, elas não eram vistas, andando à toa, nas cercanias do reino durante o dia e/ou noite, como o fazia uma boa parte dos humanos ali existentes.

Conta a lenda, que elas eram muitas solícitas e uma vez requisitadas, atuavam diuturnamente no desempenho de suas missões, que consistia em inspecionar a saúde, o bem-estar e a beleza estética das pessoas sob sua guarda e, geralmente, eram vistas em forma de visagens, de verdadeiros “ghosts”, vagando na escuridão da noite, pelos quartos e demais aposentos das casas do reino.

Diz ainda a lenda, que quem as visse de verdade, fatalmente se transformaria em pessoa trabalhadora e muito comprometida com a saúde, bem-estar e beleza estética das outras pessoas, mas com um detalhe não muito comum no mundo capitalista que ora vivemos: teria de fazer tudo por amor à sua missão e sem ganhar nada por isso.

Afirmam os mais antigos que, com o passar dos anos, várias pessoas que viviam no âmbito daquele reino, ao virem, de verdade, muitas daquelas fadas circulando nos seus aposentos, como se seres mortais o fossem e, em seguida, acabaram virando fadas.

Como uma forma de recompensa por terem recebido esse privilégio entre os mortais, tiveram de aprender a gostar de trabalhar, a se comprometer com a saúde, bem-estar e beleza estética das outras pessoas sob sua guarda ou não, sem auferirem nada por isso e, desta forma, viveram felizes para sempre.
Germano Correia da Silva
Enviado por Germano Correia da Silva em 06/03/2008
Reeditado em 05/09/2020
Código do texto: T890186
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