Vimes, porque saí daí?

Era uma vez em tempos longínquos um rapaz cujos cabelos loiros resplandeciam como o Sol. Ele vivia numa aldeia cujo nome era Vimes, um canto afastado do mundo onde ainda subsistiam as velhas histórias de avastemas, lobisomens, almas penadas e mouras encantadas no fundo dos poços dos aldeões. A sua mãe já muito envelhecida, se pelas preocupações de todos os dias, se por alguma praga rogada, não tinha podido ter mais nenhum filho. Seria como a rainha, teria a madre seca? Não se sabe, nem vêm ao caso nesta história.

O rapaz cujos cabelos loiros e olhos azuis da cor do mar, vista rara nessas paragens, espantavam a população e todos os que por lá passavam, cresceu naqueles montes, ouvindo antiquíssimas cantilenas e sábios conselhos das comadres e compadres que por lá abundavam, faltando rebentos como ele. “Que será desta terra quando nos formos deste mundo senhor?”

Já jovem, ele foi para a corte do rei como cozinheiro e viu com esses olhos que a terra há-de comer as maravilhas trazidas do Brasil e da Índia, pimenta, sal, cacau, contudo também assistia aos recitais de poesia, aos duelos em honra de amadas distantes e se calhar idealizadas, aos sábios mostrando todo o seu intelecto, a esse admirável mundo novo. Os seus olhos brilhavam de cada vez que tinha a oportunidade de servir a mesa de el-rei. Se este conto fosse tradicional, ele veria num banquete desses de fazer inveja ao povo, uma bela princesa fria cujos amores nunca seriam retribuídos, mas para variar o género poremos um príncipe. Um conde espanhol, com “ojos” verdes e muito sangue latino a correr nas veias. Se nas Descobertas, apareceu ouro, porque não um romance entre um servente português e um nobre espanhol? Afinal, consta que muito treparam ás índias árvores os missionários fervorosos de espalhar a fé e aparentemente a semente.

Voltando á nossa história, assim que o nosso herói ariano pôs os olhos naquele garboso hispânico ruborizou imediatamente. Quem diria, que do outro lado da fronteira não vinham apenas princesas bexigosas mas também fidalgos elegantes? Com o serviço cumprido e o soldo recebido, dirigiu-se o loiro jovem para os seus modestos aposentos de criado, voltando sempre os seus pensamentos para aquele breve momento em que viu os belos verdes olhos do seu amado.

Entrou na nossa história um feiticeiro cujo talento para a dita feitiçaria era dúbio. O facto que salvava a sua carreira eram os testemunhos das burguesinhas que diziam que ele era o mágico mais potente e certeiro deste modesto Condado Portucalense. Diziam as más línguas que a magia deste era outra. Cruzando-se com o protagonista num determinado dia num dos vários corredores do palácio, ele dirigiu-se a este, perguntando o seu desejo. Os olhos azuis turvaram-se e a tímida frase “Quero que o meu amor retribua o meu desejo” surgiu.

Não foi preciso uma varinha de condão: pousando as mãos nos ombros do nosso cachopo, murmurou uns erróneos latinismos e ficou este a ser irresistível para o nobre cuja companhia ele cobiçava e a qual ele esperava conseguir. Com o que ele não contou foi com a atracção do mago por ele. Bem, isto já está a tomar contornos de uma novela mexicana.

O rapazito, após alguns meses, foi á terra ver os velhotes. Atravessando meio Alentejo, chegou á sua aldeia, que no futuro ia ser denominada de “aldeia histórica”. Ele chamava-a de atraso de vida e pensava para se confortar que em breve seria o regresso á corte. Quase que já se tinha esquecido que a água tinha ele de ir buscar ao poço e que esse era o poço da moura Safira que por acaso era ninfomaníaca mas que como os homens da aldeia já não tinham idade para essas coisas, não tinha importância se ela fosse casta ou atiradiça, o resultado era o mesmo: nickles. A colheita era mais fresca com a chegada do filho da terra e ela não perdeu tempo: assim que o pobre moçoilo atreveu-se a ir buscar água ao poço, ela agarra-se a ele mais depressa que um polvo. Este esperneia-se e tenta fugir, prometendo pagar-lhe as visitas ao psiquiatra por uma eternidade. Com o que ele não contava era com dois cavaleiros virei-lo salvar. Falamos do tal conde castelhano cujo nome, já agora é Juan e do mágico com o nome incompetente de Jacino.

Atordoado pelo ataque da moura ninfomaníaca (também que esperavam, deixá-la num poço para morrer ali? Nem uma santa aguentava tanto tempo de penitência por causa de um homem miserável, quer dizer ela também tem as suas necessidades) cujas futuras consultas no psicólogo estavam asseguradas, afastou-se dos dois homens, como se perguntando que diacho estavam ali a fazer e caiu no poço.

Devia acabar aqui a história mas vou dar-lhe um final: a moura retira a inocência e pureza do moço, o mágico com as suas palavras mágicas tira-o do poço e partilha-o com o conde: ás segundas, quartas, sextas e domingos fica ele e o resto dos dias são para o conde. Não se sabe se viveram felizes para sempre mas de falta de sexo não sofreram os três.