Lembrança de Morte
Consegui abrir os olhos, ainda está um pouco escuro e uma fresta de luz vinda da janela entreaberta corta o meu quarto infeliz. Sinto-me só. Todos que por mim passaram já morreram, ou se encontram pior do que eu. Minha casa é grande e inabitável, Manuel, meu único e fiel escudeiro cuida de mim, dos meus remédios incontáveis e limpa meus vômitos quase constantes. Ele é o empregado desde o final do meu segundo casamento. Fui viúva por três vezes e conheço a morte bem de perto. Ela é faceira e as vezes melancólica, é irônica e bela. Não sou tão velha, mas o bastante para ter herdado o cheiro de tanta doença que destruiu meus três maridos e familiares. Jamais tive filhos, aliás, não posso, a natureza me impossibilitou desse feito. Manuel acaba de entrar em meu quarto!
__ Com licença senhora, já acordou? Está se sentindo melhor?
__ Um pouco. Esta sempre é minha resposta, não gosto de ficar respondendo sobre minha saúde lastimável. Ele trouxe-me um chá e uns biscoitos light’s que insistem em me enojar o estômago. A dor de cabeça que trucida meu crânio (acho que não consigo mais... estou morrendo...) me traz notícias e lembranças de morte.
Sinto o cheiro vazio de desvanecer e melancólico de perecer, quão dor me aflinge o corpo! (não vou conseguir, estou, estou, mor... morren...). A vida na qual me dispus a viver, nem sempre foi prazerosa ou temida. Não temo o meu próximo momento, eu já estava aguardando, meu amanhã, meu leito, não posso mais... meu último suspiro.
S7