A Magia da Vida - um conto de fadas para adultos IV

Entre o real, o virtual e a magia

Sabemos que o nosso mundo real não é mais tão real como era antigamente. Isso percebemos cada vez mais no nosso dia a dia, onde pessoas se conhecem sem nunca ter se visto, pessoas se vêem se nunca ter se tocado ou cruzado um olhar. Esta é a magia da tecnologia invadindo a vida. Como dizem, trazendo solução para problemas que não tínhamos.

Essa irrealidade está tão verídica e com tanto corpo que já não imaginamos isso como um mundo à parte, mas como uma realidade que tem transcendido a qualquer razão de algum tempo atrás.

Criamos então o termo realidade virtual. Podemos nos perguntar: – realidade virtual, se é virtual como pode ser real? O que é virtual existe e se existe, em que plano se encontra, no real ou no imaginário?

Essas são questões complicadas para encontrarmos respostas hoje em dia. Existe uma fronteira entre o que é real e o que é virtual, mas não sabemos onde uma começa e a outra termina. Já há pessoas que dedicam a sua vida à realidade virtual e tudo vive através dela. Fazem amigos, namoram, compram, conversam, se vêem, se entendem... fazem coisas que até podemos duvidar que possa existir.

A nossa realidade esqueceu de algo fundamental e que é insubstituível, o olhar nos olhos, o toque, o prazer da presença, de sentir o calor do outro. Esqueceu da afetividade que tanto estimula o outro a crescer e se desenvolver de forma integral como cidadão e homem movido à paixão.

Precisamos admitir, porém, que essa realidade tem lá seus encantamentos, como aproximar duas pessoas que estão a milhas de quilômetros distantes; como dar acesso a outras culturas e adquirir novos conhecimentos, produtos e serviços; como facilitar e poupar o tempo de que não tem muito tempo e inúmeras outras coisas.

Olha que engraçado, poupar o tempo de quem não tem tempo. Se ele não tem tempo, então não há o que poupar. Já viu alguém poupar dinheiro se não o tem? O tempo é algo mais curioso, é uma das poucas coisas que todos os seres humanos possuem igual, ou seja, todos possuem vinte e quatro horas por dia em todo lugar do mundo e isso não muda de acordo com a cultura, é uma igualdade mundial. O tempo é o mesmo para todos, diferenciado apenas pelo dia marcado pela morte. Mas quem sabe que dia é esse? Se não há resposta para essa pergunta, então não vale a pena preocupar-se com ela.

Todas as perguntas sem respostas merecem total atenção e preocupação, no entanto devemos sempre estar atentos para as possibilidades de respostas e desperdícios de energia em vão. Precisamos ser sábios para diferenciarmos entre o que podemos encontrar respostas e os mistérios divinos, que nem toda a ciência do mundo conseguirá explicar. Neste caso, não há porque concentrar energia.

Bia ia se encantando ao lado de Ana, conhecendo um pouco mais do mundo real e agora do tal mundo virtual. Por um momento chegou a achar que a vida dos seres humanos era mais mágica do que a dos seres encantados como ela, enquanto Ana questionava a vida e o porquê de estar ali, naquele momento, fazendo todos aqueles questionamentos.

Ana conectou-se na web para saber das notícias do dia e para ver mais um pouco sobre a realidade do mundo virtual. Tratava-se de uma pesquisa sobre o comportamento das pessoas neste mundo tão novo e ao mesmo tempo tão vasto que surgira.

Chat era sempre uma boa opção. Lá conseguia trocar idéias e ver como as pessoas se comportavam.

Os comportamentos eram diversos, uns tentavam ser o que não eram, outros tentavam expor de alguma forma seus desejos mais inconfessáveis, outros, ainda, entravam por pura má fé.

No geral a internet era lugar de pessoas que por algum motivo fugiam da realidade. É fácil encontrar-se num lugar onde você pode ser a idealização que quiser e ainda tomar isso para si como vida.

Haviam dados interessantes, como a forma com que as conversas transcorriam, as curiosidades que as pessoas tinham sobre alguém que nunca iriam ver e também como a sexualidade estava expressa na maioria dos casos.

Existem perguntas que são clássicas nesse meio. Podemos citar alguns exemplos: – Quantos anos vc tem? – essa indica se vale a pena perguntar como vc é (?), que é a próxima pergunta.

Outra não menos importante é: – De onde vc tc? – nesta avaliamos qual a possibilidade de acontecer algum encontro.

Há fatos bem interessantes nesses casos. Um grupo vai desejar que a pessoa seja de uma localidade próxima, para que possa conhecer e chegar aos finalmente, digo sexo em si. Há outro grupo que só tem segurança diante de um teclado e um monitor, por isso prefere o relacionamento à distância, pois sua insegurança seria tamanha que mal conseguiria falar uma só palavra.

Há até os que têm boa intenção, que não desejam sexo puramente, mas que querem encontrar o príncipe encantado em todos os sentidos, logo, quando partem para o mundo real ,o físico torna-se crucial para o relacionamento ir adiante.

Podemos dizer que o grupo mais interessante é aquele que menos freqüenta essas salas de chat. São os que entram com objetivos bem traçados ou então simplesmente por curiosidade.

Lá se foi Ana para mais um dia e pesquisa. Precisava escolher um nick e essa escolha precisava ser acertada, pois diante dele ela estaria escolhendo os tipos de pessoas com quem iria teclar.

Se escolhesse um nick com apelo sexual, provavelmente iria bater papo com alguém que procurava sexo na internet ou pelo menos que quisesse sexo virtual (este também existe), se escolhesse um nick muito comum, passaria desapercebida e não conseguiria contato com ninguém. Precisava escolher o nick certo. Mas qual seria?

– Magia. – exclamou Bia como se Ana pudesse ouvi-la.

Ana entrou no site e se identificou como Magia.

– Estranho, de onde fui tirar esse nick? nunca ouvi falar nele e não tenho o porquê utilizá-lo, mas como estou sentindo magia no dia de hoje, esse cai bem.

E lá se foi ela em sua pesquisa.

Como o nick era um tanto meigo, meio que de menina, então teria que se comportar como tal. Era a oportunidade para um papo mais cabeça, embora muitos procuram nicks angelicais a procura de meninas indefesas. É claro que neste caso a intenção nunca é boa, mas pelo contrário, é a chance de muitos encontrarem meninas imaculadas ou semi-imaculadas. Estas eram vítimas fáceis para um bom jogo.

No momento não era o que ela procurava. Na verdade ela estava afim de ser ela mesma, com toda aquela sensação mágica que estava sentindo. O difícil seria encontrar alguém com quem valesse a pena conversar.

O mundo virtual era um tanto desprovido de pudores. Mas como tudo existia exceção...

Entrou em uma sala, saiu. Entrou em outra e saiu e foi fazendo isso sem ao menos observar por muito tempo o que acontecia, mas não havia nada que lhe chamasse a atenção o bastante para prendê-la. O objetivo pesquisa havia se esvaído de sua intenção, até porque se, de repente, ela fosse uma usuária comum, sua pesquisa seria mais verídica.

No fim, cansou-se e não encontrou nada que queria. Trabalhou mais um pouco, mudou o nick e foi de um estilo ao outro como um piscar de olhos.

No fim do dia estava cansada. Passar o dia todo sentada em frente a um computador também é cansativo, por isso resolveu sair e relaxar algumas horas do dia antes de voltar para casa.

Resolveu, de novo, ir ao parque. Precisava sentir aquela energia de novo, embora a sentisse em si desde que retornara de manhã.

Sentou-se em um banco e ficou observando. O sol já começava a se por em cores reluzentes e alaranjadas. Estava sublime e ela extasiada com aquele acontecimento.

Um homem tirou a sua concentração do por do sol e pediu licença:

– Com licença, posso sentar-me ao seu lado?

– Claro, fique à vontade. Desculpas se demorei a responder. Estava distraída. – continuou ela.

– Pude perceber. Mas não é para menos, o por do sol hoje está divino.

– Realmente está. – falou ela, deixando a voz sumir em sua garganta e perdendo-se de novo naquela visão do por do sol.

Ele ficou ao lado dela sem dizer nem mais uma palavra. Ambos estavam com o olhar perdido na dimensão e na magia de uma cena tão simples e tão corriqueira.

Mais uma vez um beija-flor assaltou o momento naquele dia e roubou o tão sublime espetáculo.

Ficou voando e se exibindo, enquanto suas penas refletiam os raios do sol. Era magnífico.

– O beija-flor de novo. – disse ela para o desconhecido ao seu lado.

– Sim, é um beija-flor. Ele é magnífico.

– É uma perfeição sem igual. Um ser tão pequeno e ao mesmo tempo tão complexo, tão... tão...

– Inebriante. – completou ele a frase dela de súbito.

– Não sei se o vejo como inebriante, mas com uma certa magia, com certeza.

– Não há como eu vê-lo de maneira diferente. Cada vez que estou trabalhando me embalo na idéia de um beija-flor e deixo me levar e vou sonhando pelo caminho, tornando a minha labuta mais doce.

Bia não podia acreditar no que estava ouvindo. Seria ele um piloto que sonhava ser como um beija-flor?

Ana não resiste à pergunta:

– Desculpas, mas o que você faz para se embalar na idéia de um beija-flor?

– Sou piloto de helicópteros. – disse ele com um certo misto de orgulho e paixão.

– Gostei do jeito que falou. É difícil alguém manter essa paixão por seu trabalho. Às vezes me parece que é como um relacionamento, aos poucos a paixão vai se esvaindo e fica apenas a obrigação e toda a magia da vida se esgota. O simples torna-se peso.

– O trabalho me mantém vivo e consciente. Já os relacionamentos são mais complicados, embora eu ainda acredite neles.

– Não estou dizendo que não acredito, mas digo o quanto é difícil. No entanto, tenho que manter minha paixão pelo ser humano e essa loucura de sentimentos e de vida. Este é o meu trabalho.

– Psicóloga?

– Não, pedagoga!

– Tudo na área humana.

– Tem lá as suas diferenças, mas o “material” é o mesmo.

Aquela conversa aconteceu despreocupada da vida por um longo espaço de tempo. Não havia preocupação com o horário, na verdade este voava e nenhum dos dois percebiam.

Conseguiram falar de sociedade a magia sem nenhum problema ou constrangimento.

– Essa sua tatuagem... muita bonita.

– É uma fada. Tenho que acreditar que a vida tem a sua porção mágica. Tem que ser mais que uma simples vida onde se nasce e se morre.

– Há uma magia...

– É isso. Uma magia que nos move e que nos sustenta. Às vezes imagino um mundo no qual não há mazelas, onde tudo em que acreditamos se torna verdade. Com seres encantados, fadas, bruxas, cavalos alados...

Ela perdeu-se em seus pensamentos e falou sem parar até que se deu conta. Aquele homem a olhava. Ela sentiu-se um tanto louca e desculpou-se pelo ocorrido.

– Não posso desculpá-la por parar. Eu estava viajando em suas fantasias e te garanto que era uma viajem mais gostosa do que o vôo de helicóptero.

– Pode ser, mas há magia também no seu vôo.

– Há, realmente tenho que concordar, mas a magia que reveste a nossa imaginação é muito mais valiosa do que qualquer outra, do que voar, pois lá preciso de um monte de parafernálias, enquanto que na imaginação, preciso apenas ousar e sonhar.

– Realmente ousar e sonhar é muito bom, no entanto é muito mais difícil de fazê-lo do que voar movido por parafernálias, suponho eu.

– Você tem razão. Deixar-se levar pelas mãos da magia não é para qualquer um e não se aprende na escola e nem no meio em que vivemos.

– Acredito que seja justamente o contrário. A escola e o meio que vivemos só nos faz desaprender essa magia que nasce conosco. São anos de repressão, dizendo-nos o que é certo e o que é errado, dizendo o que devemos pensar e como devemos agir... faça isso, não faça aquilo...

– Quantas vezes somos repreendidos por determinadas atitudes, só porque não pertencem ao mundo da sanidade dos adultos?

– Hoje foi engraçado, estava aqui no parque quando senti um vento gostoso me tocar. Num ato involuntário levantei-me e abri os braços como se quisesse voar, do jeitinho que fazem as crianças, e quando me dei conta, havia um monte de gente me olhando como se eu fosse uma louca.

– Eu sei que isso acontece, no meu meio mesmo, se eu disser que vôo embriagado na idéia de um beija-flor, logo me dirão que estou literalmente embriagado.

O mundo de Bia ia ganhando força cada vez mais durante aquela conversa e ela estava completamente feliz. Ainda não sabia como terminaria a história, mas ela sabia que já havia começado e que a resposta para o que procurava estava ali, naqueles dois “seres humanos encantados”. Sim, eles eram humanos encantados. Ficou repetindo Bia para si mesma. Para ver se não estava sonhando com todos os acontecimentos.

O tempo passou e a noite já reinava no parque. Eles tinham que partir, mas não sabiam como. Precisava haver uma despedida. Seria a última?

Ele disse:

– Preciso ir...

– Imaginei. Já é tarde e eu também preciso ir. – falou ela em tom tristonho.

– Como posso manter contato com você? – Ele revestiu-se de coragem e perguntou.

Um sorriso surgiu nos lábios dela. Não era apenas ela que estava com aquela sensação de perda e com a necessidade de manter contato com aquele homem.

– Você pode me ligar.

– Para onde vou não há telefone. Nos comunicamos através de rádio e internet. Você tem e-mail?

Ela anotou num pedaço de papel o seu e-mail e eles partiram.

Não houve um toque físico sequer, mas ela havia sentido a alma dele e sabia que ele seria digno de sua confiança. Na verdade ela não encontrava explicação, mas confiou nele desde o primeiro minuto.

Quando ele virou as costas, Bia notou que um beija-flor o seguia e virava-se para olhar para ela. Teve dúvida se aquele pássaro era um ser real ou encantado, como ela que estava com Ana.

– Se ele estiver com ele da próxima vez, tentarei manter contato e então descobrirei. Ele pode ser real, pode ser magia, mas ele existe.

Aqui a história começa a se complicar, como explicar o que Ana estava sentindo? Como explicar o que aconteceu? Dois seres humanos, adultos, cheios de paradigmas e com modelo mental já formado encontram-se num parque e começam a conversar sobre sonhos e fantasias. Aquilo não era uma cena nada comum. Encontrar um adulto que sonhe até vai, mas encontrar dois adultos que sonhe e ainda por cima que viagem juntos nesses sonhos... aí não é realidade, é magia.

Bia sabia que havia encontrado o seu beija-flor, o homem que tinha como labuta o dom de voar e que acreditava na magia da vida. A questão agora era saber como fundir a magia com a realidade, embora havia percebido que essa parte não seria difícil. A vida já estava se encarregando disso e não falharia dessa vez.

Ana foi para casa pensando no que havia acontecido. Tinha que continuar trabalhando. Sua pesquisa tinha que ser fundamentada e tinha que abordar todas as nuanças do meio. Isso incluiria horários diferentes, visto que cada horário encontrava-se um perfil diferente de navegadores.

Sentou-se em frente ao PC e se conectou. Precisava trabalhar, mas não conseguia se concentrar, pensava o tempo todo naquele homem que a encantou e não tinha como entrar em contato. Ela deu o e-mail para ele, mas não pegou o dele. Agora o futuro daquela relação estava na responsabilidade de um só.

– Será que ele vai me mandar um e-mail? – perguntava-se o tempo todo. Não tinha respostas e também não conseguia se concentrar no trabalho. Todos os detalhes de que precisava fugia-lhe a percepção.

Desistiu da pesquisa e resolveu relaxar um pouco. Tomou um banho bem demorado, deixando a água banhar-lhe todo o corpo até senti-lo bastante relaxado. Depois foi para o seu quarto onde tentou ler um pouco.

Ela gostava muito de leitura, mas naquele momento também não estava conseguido se concentrar. Resolveu ver um filme. Nada na TV lhe interessou. Apagou todas as lâmpadas, desligou a TV e ajeitou-se para dormir.

Por alguns minutos relembrou de cada momento vivido naquele dia, cada sensação, desde o vento no parque até a despedida. Enfim adormeceu, em seus lábios havia um sorriso discreto, em sua alma havia um calor que nunca havia sentido, era uma aura de paz e aconchego. Parecia uma menina que adormeceu após um dia de muitas traquinagens.

O dia amanheceu e estava sublime, os raios de sol invadiam o quarto de Ana saudando-lhe com um bom dia. Ela espreguiçou-se e abriu um sorriso gostoso, como se desejasse ao sol o seu bom dia também.

Levantou-se e foi para cozinha, preparou rapidamente o seu café da manhã e executou todas as rotinas matinais.

Naquele dia resolveu trabalhar em casa. Seria mais sossegado e teria tempo para si.

Com um telefonema resolveu o problema de sua ausência na empresa e preparou-se para um longo dia de trabalho. Estava inspirada e queria aproveitar o máximo para fazer tudo que estava pendente até o momento.

Hoje o dia será bom, havia levantado com muita disposição, distraindo-se apenas com uma lembrança de homem que havia conhecido no dia anterior e que nem sequer sabia o nome.

Pela primeira vez ela percebeu que conversou com ele o tempo todo sem perguntar o seu nome. – Mas e daí, o que importa o nome? Afinal desde quando magia e encantamento precisam de denominações?

Decidiu caminhar um pouco antes de começar a trabalhar. Saiu pela rua e foi em rumo ao não sabia o que. Na verdade precisava gastar um pouco daquela energia que sentia.

Uma das primeiras visões que lhe chamou a atenção foi a de um beija-flor. Ele estava em seu meio natural, mas para ela aquele pássaro tomou uma dimensão que ele nunca poderia imaginar. O dia ficou um pouco mais doce e seguiu o seu caminho.

Quando já estava totalmente molhada de suor decidiu voltar e começar a trabalhar.

Já eram mais ou menos 08:00 horas e sentia-se eufórica com o dia que muito faltava para findar.

Após um banho para aliviar o calor e trocar as roupas que estavam molhadas ligou o PC. Como de hábito abriu sua caixa de mensagens e leu alguns e-mails de trabalho, outros de amigos e tinha um desconhecido. O nome do remetente era Zoe.

– Zoe, quem será? Não me lembro de ninguém com este nome. – apesar de não reconhecer o nome, como a curiosidade dela era sempre muito aflorada, lógico que abriu a mensagem.

Para a sua surpresa, a mensagem era, nada mais nada menos que do piloto. Isso mesmo, do beija-flor, o homem que voava na magia de um beija-flor.

Ao perceber seu coração se descompassou e não pode deixar de sentir uma sensação de alívio imensa, afinal ela agora teria como manter contato com ele e, além de tudo, se ele havia enviado um e-mail é porque também deve ter sentido algo especial no dia de ontem.

O e-mail não era muito extenso, apenas dizia um oi e apresentava-se como Zoe.

Ela não resistiu e respondeu ao e-mail:

“Bom dia Zoe (é esse o seu nome?)!

Como foi sua viagem de volta? Eu continuo aqui, trabalhando.

Muito prazer, meu nome é Ana.

Como sou muito curiosa, gostei do seu nome. Você sabe o que significa?

Ana”

Voltou ao trabalho e navegou o dia inteiro. Fez diversas anotações, salvou algumas conversas para que pudesse analisá-las melhor depois e conseguir traçar o perfil de vários internautas.

Bia estava feliz com o resultado das suas investidas. Ela sabia que havia encontrado a resposta para os seus problemas e também para os problemas do seu mundo.

Por falar em seu mundo, ela já estava afastada há algum tempo e sentia falta.

Resolveu deixar Ana trabalhar sem tantas interferências suas e ir ao Mundo Encantado ver o que estava acontecendo.

O mundo não havia mudado muito. Embora ela tivesse encontrando a resposta, sabia que a reconstrução do que se perdeu era muito mais difícil do que construir do zero.

O vôo ainda não havia voltado para a sua terra e isso a entristecia. Voar era como um vinho feito por deuses e cedido aos pobres mortais, que em sua visão, de pobre não tinham nada. Pelo contrário, eles eram repletos de magia e fascinações. Valia a pena ser um deles.

Decidiu ver Magia mais uma vez. Precisava saber se havia alguma novidade.

– Magia, eu estava na Terra, mundo real e aconteceram tantas coisas...

– Eu estive acompanhado sua jornada daqui minha menina.

– E o que a senhora acha, estou no caminho certo?

– Só quem pode saber qual o caminho certo e decidir por ele é você mesma. Ninguém tem esse poder de decisão sobre o caminho de ninguém. Nos momentos de dúvida, devemos ouvir nosso coração, nossa intuição e ouvir a voz que existe dentro de nós, a voz que nos norteia o tempo todo.

– Foi isso que eu fiz, ouvi a voz que não saia de dentro de mim.

– Eu também sei disso. Há momentos em que precisamos silenciar um pouco para ouvirmos essa voz. Às vezes fazemos tanto barulho que não conseguimos ouvir mais nada e perdemos o rumo. São nesses momentos que temos dificuldades em decidirmos o caminho.

– Eu queria vir aqui, saber como estavam as coisas, mas parece que nada mudou.

– Minha menina, as coisas nunca são tão rápidas e se o são, há algum erro no percurso. Devemos tomar medidas emergenciais em horas de emergência, mas no geral devemos tomar medidas com resultados a longo prazo. São esses os mais acertados e produtivos. A calma sempre foi amiga da perfeição.

– Eu achei o piloto, o dom perdido; vi nele o beija-flor e a magia fundida entre a realidade e a fantasia num diálogo entre um homem e uma mulher. Além de tudo essa mulher tinha a minha imagem tatuada em seu ombro. O que significa isso?

– Com o tempo e dentro de você mesma essas respostas irão se revelando. Tenha calma e deixa a vida seguir seu curso. Apenas saiba diferenciar onde é preciso esperar e onde é preciso atuar. Se souber reconhecer esses dois pontos, tudo fluirá como deve ser.

Assim terminou o diálogo entre Magia e Bia, que voltou para a companhia de Ana.

A complexidade do mundo virtual começava a ganhar um toque de magia. Pela primeira vez Ana entrava ali sem ser para estudar, mas porque queria e tinha algo para ver que era de seu imenso interesse.

Na manhã seguinte, lá estava mais um e-mail dele, dessa vez desejando bom dia.

Os e-mails começaram a ficar mais freqüentes e mais extensos. A necessidade daquela comunicação era cada dia maior. Ela precisava, ele precisava.

Ambos ansiavam o momento do retorno da resposta do outro e aos poucos aquilo passou a ser uma rotina com uma periodicidade cada vez maior. Já não eram mais e-mails só de bom dia, mas também de boa tarde, de bom fim de tarde, de necessidade de escrever e de saber do outro, de sentir o outro.

Um dia, ela estava mandando um e-mail para ele e de repente chega a mensagem de que ele estava on-line. Isso mesmo, Zoe estava on-line.

– Oi minha fadinha. _Dizia ele.

– Oi. – respondeu ela.

– Que bom encontrá-la aqui. Ler seus e-mails todos os dias se tornou condição primordial para eu ter um bom dia.

– Você já deve ter percebido que uma das primeiras coisas que faço todos os dias e enviar-lhe o meu bom dia...

– Quanto a mim, é ver se há o seu bom dia e, claro, enviar o meu.

– Seu nome, é diferente e o significado é fascinante.

– Também gosto. Zoe significa vida, mas Ana também é um bonito nome, possui a beleza da simplicidade e do significado.

– Eu também gosto do meu. Cheia de graça é um bom sentindo. Gosto de nomes que revelam alguma coisa.

– Nosso nome junto ficaria bem interessante. – riu ele. – Vida cheia de graça. – completou.

– É, concordo que não há dádiva melhor do que a vida e como toda vida deve ser cheia de graça, fazemos uma combinação perfeita.

Bia estava de volta ao lado de Ana, quando percebeu que poderia se transportar para perto de Zoe e lá se foi ela para perceber cada expressão dele, cada sentimento.

No momento em que ela chegou perto dele ele sentiu uma presença muito forte de Ana ao seu lado.

– Engraçado, estou há mais ou menos 4.000 km de distância e posso te sentir aqui do meu lado! – exclamou ele.

– Eu acredito em você, porque também o sinto aqui.

– Consigo ter o seu cheiro em minha memória, mesmo tendo a visto apenas uma única vez.

Continuou ele: – Não me leve a mal, apenas estou falando o que estou sentindo e cada vez mais sinto vontade de ter notícias suas.

Bia que estava perto dele podia sentir toda a sua emoção e percebia quão eram puros os sentimentos daquele homem, também pode perceber que o beija-flor não estava com ele. Lamentou não poder vê-lo novamente. Ela desejava tanto saber sobre aquele pássaro que tinha visto tanto quanto Ana e Zoe tinham necessidade de conversarem.

Ana sentia a presença dele tão fortemente que sentia como se ele tocasse em sua pele. Fechou os olhos e assim pode aguçar cada um dos outros sentidos que tinha.

Ela sabia que não podia ter a visão dele, mas todo o resto era tão real quanto estar sentada em frente a um PC conversando com alguém do outro lado do país.

Eles ficaram horas conversando sobre a vida, sobre os sonhos e a magia. Sobre a dinâmica de tudo que cerca a vida.

– Ele é um homem encantador. – pensava ela.

– Ela é uma mulher extraordinária. – dizia ele a si mesmo.

Bia trazia consigo a presença de Zoe mais forte para Ana que trazia um sentimento cheio de certezas. Ela sabia o que Ana sentia e gostava de nutrir aquilo. Na verdade ela não sabia de que forma nutria, mas sabia que Ana, por muitas das vezes conseguia perceber o que ela sentia e pensava, dessa forma ela sabia que podia ajudar.

O que Bia não sabia como fazer era esquecer a imagem daquele beija-flor, que não saia da sua mente. Sentiu-se até um pouco egoísta quando pensou que se transportou para junto de Zoe mais pela vontade de ver o beija-flor do que para ver as expressões de Zoe. Apenas se decepcionou, ele não estava lá.

Porém, no momento em que ela foi para perto de Zoe, levou consigo a presença de Ana e que no mesmo instante em que ela foi, o beija-flor veio e trouxe com ele a presença de Zoe. Por isso ambos sentiram de forma tão forte a presença um do outro.

Ela e ele eram o elo entre Ana e Zoe. É claro que tinha que ser assim, era um relacionamento mágico. Não podia ser comum e se Bia estava no mundo real, acabava doando sua magia para a realidade e tomando para si a realidade.

Enquanto isso, Ana não sabia no que daria aquele contato, aquela necessidade que sentia, mas de uma coisa ela tinha certeza. Ele fazia bem a ela e por isso ela continuaria a viver cada minuto que lhe fosse permitido, viajando nos braços da imaginação, ou melhor dizendo, nas asas de um beija-flor.

Enquanto pensava isso um sorriso nascia em seus lábios e vivia a sensação dos adolescentes, que viviam e se entregavam aos sentimentos com muito mais paixão e afinco que os adultos.

Os adultos sempre estavam rodeados de um certo medo, de uma certa amargura, um certo receio e uma certa desconfiança, quando na verdade nada era certo. No meio de tantos certos incertos, eles deixavam de viver e deixavam de curtir a magia da vida.

– Do meu futuro eu não sei, mas e daí, quem o sabe? Eu vou viver e ver o que vai acontecer. – disse ela para si mesma se enchendo de coragem para não frear a história que sabia estar apenas começando.

Alguns dias se passaram entre a troca de e-mails, enquanto Bia e o beija-flor ficavam vindo e indo cada vez que um ia ler mensagem do outro e principalmente nos momentos em que ficavam no chat.

Era uma situação engraçada, pois a fadinha sempre tinha a esperança de poder ver o beija-flor, embora ficasse encantado com a presença e os sentimentos de Ana. Ela sabia a extrema importância que era para Zoe sentir a presença dela em sua vida e de alguma forma, aquele encontro salvaria o mundo encantado e as vidas nele existentes.

Fazia de bom grado e estava apaixonada por seus últimos dias, todos muito cheios de aventura e sentimentos que nunca ousou sentir.