Marionete do Destino
Luiz era um jovem solitário, de olhar pensativo e cabelo bagunçado, típico estudante de psicologia. Ele se sentia mais à vontade nas páginas dos livros do que na companhia de outras pessoas. O curso, que ele amava, consumia grande parte do seu tempo, mas era o trabalho de garçom em um hotel cinco estrelas que pagava as contas e ajudava sua mãe, uma mulher forte que criava Luiz sozinha, com o coração sempre cheio de amor e cansaço. Eles viviam modestamente, e Luiz sentia que tudo o que fazia era por ela.
A rotina de Luiz era sempre a mesma. Durante o dia, ele atendia às aulas e estudava, e à noite, vestia o uniforme de garçom, servindo os clientes exigentes do hotel. Era um trabalho cansativo, mas ele nunca reclamou, pois sabia que a estabilidade de sua mãe dependia disso. O hotel, um luxuoso edifício à beira-mar, estava acostumado a hospedar pessoas ricas e influentes, e a maioria delas nunca dava muita atenção a um simples garçom. No entanto, um hóspede recente, que se hospedava constantemente em uma das suítes mais caras, chamou a atenção de Luiz.
O homem era alto, de pele pálida e olhar enigmático. Seu nome, como Luiz soubera através do registro, era Victor von Arles. O sobrenome soava aristocrático, distante e antigo, assim como o próprio homem. Victor era reservado e sempre aparecia à noite. A princípio, Luiz achou isso estranho, mas logo passou a se acostumar. Afinal, ele também trabalhava noite adentro e, em uma cidade turística, a rotina dos hóspedes era imprevisível.
Certa noite, Luiz foi chamado para realizar um serviço de quarto. Era algo simples: levar uma garrafa de vinho tinto e uma tábua de queijos para a suíte. Quando chegou lá, Victor estava sentado em uma poltrona, com os olhos fixos na janela. A luz suave da lua iluminava o rosto pálido e anguloso dele. Luiz sentiu um arrepio, mas atribuiu a sensação à frieza da noite.
"Boa noite, senhor Victor", disse Luiz, tentando manter a compostura. "Seu pedido."
Victor o olhou e, pela primeira vez, um sorriso sutil surgiu em seus lábios. Era um sorriso enigmático, quase imperceptível, mas que fez Luiz sentir algo estranho dentro de si.
"Você... tem algo especial", disse Victor, sua voz suave como seda. "Eu vejo algo em você, Luiz."
A forma como ele disse seu nome fez Luiz estremecer. Era como se aquele homem o conhecesse muito mais do que deveria.
Nos dias seguintes, Luiz começou a ser atraído pela presença de Victor. O hóspede raramente deixava seu quarto durante o dia, e suas visitas ao restaurante do hotel eram sempre feitas à noite, quando a maioria dos clientes já havia ido embora. Luiz se via ansioso para ver o hóspede, seus olhos se encontrando no corredor, onde os dois trocavam olhares carregados de uma tensão indescritível. Aos poucos, a curiosidade deu lugar ao desejo, e logo os dois começaram a se encontrar à noite, após os turnos de trabalho de Luiz.
Victor era diferente de tudo o que Luiz já experimentara. O homem tinha uma aura de mistério e poder, e suas conversas, embora profundas, eram sempre cheias de enigmas. Luiz se apaixonou perdidamente, completamente cativado. Sentia-se especial por estar ao lado dele, como se tivesse sido escolhido, algo que sempre buscara em sua vida solitária.
Mas algo estava errado. Luiz começou a perceber que havia algo de errado nos hábitos de Victor. Ele nunca saía durante o dia, e sempre que o tocava, sua pele parecia fria, mais fria do que o normal. Seus olhos, antes suaves, se tornaram intensamente penetrantes, como se quisessem ler sua alma. A cada noite, Luiz sentia que estava se afundando mais e mais naquele relacionamento, mas algo em sua mente gritava que ele deveria estar atento.
Em uma noite, após um beijo ardente, Luiz decidiu confrontá-lo. Ele entrou no quarto de Victor, sentindo uma estranha ansiedade no peito.
"Victor, o que está acontecendo? Você... você nunca sai durante o dia. E sua pele... ela é tão fria. O que você é, afinal?"
Victor ficou em silêncio por um momento, os olhos brilhando de uma maneira quase sobrenatural. Então, com um sorriso triste, ele se levantou lentamente, como se estivesse hesitando, e disse:
"Eu sabia que isso aconteceria eventualmente, Luiz. Você é mais inteligente do que imagina."
Antes que Luiz pudesse reagir, Victor se aproximou rapidamente, seus olhos vermelhos como fogo. Ele agarrou Luiz com uma força sobre-humana, e, antes que o jovem pudesse protestar, o mordeu profundamente no pescoço.
A dor foi intensa, quase insuportável. Luiz tentou se afastar, mas o poder de Victor era irresistível. Sentiu a vida escorrendo de seu corpo, e então, em um segundo, o mundo ao seu redor começou a desvanecer. Seu corpo se tornava frio e pesado, como se a própria essência da vida estivesse sendo retirada dele.
Victor o observava, seus olhos brilhando com um prazer sombrio. "Você é meu agora, Luiz", disse ele, com uma voz cheia de possessão. "Você será meu igual. O que ofereci a você é a imortalidade."
Nos dias que se seguiram, Luiz acordou em um lugar que não reconhecia: um castelo medieval, imenso e imponente, cercado por neblina. O aroma da terra úmida e o som distante de corvos ecoavam pelas paredes antigas. Quando olhou para si mesmo, ele sabia que algo havia mudado. Seus sentidos estavam mais aguçados, sua visão mais clara, e, acima de tudo, a sede... a sede por sangue era insuportável.
Victor o levou para esse lugar distante, longe de sua terra natal, onde ninguém o procuraria. O Brasil, sua vida anterior, agora parecia um sonho distante. Lá, ele foi apresentado a uma nova realidade, onde se tornou parte da aristocracia vampírica. Ele havia sido transformado, e sua existência como humano era coisa do passado.
Victor se aproximou de Luiz, que agora se via refletido em um espelho de cristal, seu olhar penetrante e frio. "Agora você é como eu. Agora você é eterno."
Luiz olhou para ele, sentindo o vazio da sua nova existência. O amor que ele pensara ter encontrado, agora parecia uma maldição que o havia aprisionado para sempre. Ele fora transformado, não em um ser livre, mas em uma marionete do destino, conduzido por um vampiro aristocrático que o dominava, agora e para sempre. E, na escuridão daquele castelo sombrio, Luiz se deu conta de que nunca mais veria a luz do dia novamente.
Ele havia desaparecido.