MONÓLOGO
Era apenas mais um dia comum, em certos aspectos, pois neste dia, minha vida viria a mudar totalmente, novos conceitos, nova óptica, enfim, nova vida.
Triste, melancólico, apenas observando velhos rascunhos de poemas de amor, rascunhos estes que jamais serão recitados, ouvindo as mesmas músicas tristes e deprimentes que outrora me inspiraram tanto e fizeram florescer algumas belas palavras, recheadas de sentimento, de amor. Hoje estão apenas junto a um amontoado de papéis, prontos para serrem descartados, jogados ao lixo, lá estarão lado a lado para onde meu coração havia sido jogado.
Desta vez, era imenso o penhasco que havia pulado, não havia fim, cada vez mais escuro e profundo. Sentia-me vazio, desolado, sozinho, desamparado e porque não, desacreditado.
Foi neste instante que tudo pareceu parar no tempo e ao meu lado, sentara uma pessoa bem elegante, trajada de uma bela vestimenta preta, olhos bem delineados, unhas bem feitas. Mas sua face ainda permanecia obscura aos meus olhos. Quem seria esta ilustre personagem, me perguntava neste momento?
Neste instante, esta pessoa sorriu, com um sorriso irônico, tão afiado quando a lâmina de uma espada, um sorriso que feria antes mesmo de ser completo. E foi ai que de um modo uníssono, este ser falou:
- Problemas com amor, meu querido?
Afoito, abalado e encantado, permaneci no silêncio, meu rosto,ah! Meu rosto transfigurou uma neutralidade mórbida, gélida e passível de reação alguma. Permaneci imóvel, observando-o imóvel.
Novamente ele voltou a sorrir e afirmou:
- Claro que é.. você, ah! Suspirou profundamente - Você nunca vai aprender seu estúpido – Cruzou as penas de um modo bem formal e voltou-se para frente e sem ao menos esperar uma resposta minha, novamente falou:
- Todos os que são como você, são patéticos, poetas, românticos.. Nada mais que dependentes, completos idiotas.. Ah! Suspirou meu companheiro de um modo triste.. Até quando você vai insistir nisso, não aprendeu nada com os dois anos e meio de relacionamento desastroso, ou com os seis meses de depressão, choro, lamúrias e tristezas infindas? Tive eu que cuidar de você, EU..Recorda-se? Exaltou-se na entonação.
Voltou os olhares para mim, mas a sua imagem ainda era turva, conseguia distinguir pouca coisa de sua face, apenas olhos e boca e de maneira ainda bem vaga. Algo nele me era semelhante, esta sensação, esta presença não me era estranha. Mas permanecia guardada em meu inconsciente. Foi neste momento que esta criatura passou a mexer no amontoado de papéis que havia separado para levar ao lixo e ao lê-los, veio à expressão de tristeza, como se alguma coisa tivesse o ferido tão forte, que isso lhe causava a sensação de tristeza e dor.
Levantou-se e caminhou em círculos, parou a minha frente e gritou, bradou tão alto, que chegou a ressoar em minha mente com tamanha intensidade que chegou a me causar náuseas:
- Como você é idiota, como pode deixar-se envolver, como? Você me causa nojo! Neste instante, os seus olhos se encheram de lágrimas.. Logo percebi que minha face estava toda molhada, vi que estava afundado num mar de tristeza e que esta criatura aflorava este sentimento em mim, sentia-me como um invólucro vazio, sozinho, nada e ninguém poderia me ajudar, um ser noctívago que vaga pela eternidade a reclamar o amor que nunca teve.
Coloquei minhas mãos em minha face, gritava, chorava, soluçava..
- Por quê? O que fiz para merecer tudo isso? Afastei-me das bênçãos de Deus e estou sendo castigado? Não mereço ser amado?Não mereço ser feliz? – Cada vez mais apertava as unhas em minha face, sentia a dor das feridas que sangravam lentamente, sentia a dor ainda mais latente de minha alma.. POR QUÊ? Gritei inconsolável.
Com olhos cristalizados pelas lágrimas, voltei os olhos ao meu obscuro algoz..E justamente enquanto meus olhos estavam cheios de lágrimas é que pude ver nitidamente quem era este ser..
- Você sou eu? – Intrigado perguntei.. Mas como pode?
A sua face também estava molhada, seus olhos eram um mar de prantos, tais como os meus. E de um modo choroso, lúgubre, veio a resposta:
- Somos um a parte do outro, sei de tudo que sente e sinceramente.. quero o seu bem e mais que isso, quero que seja feliz, mas para que fique bem, precisa se desvencilhar de tudo, precisa se encontrar, não agüento vê-lo tão mal, tão destruído por dentro, tão vazio. Sem cessar, continuou a falar - Fui por muito tempo, o que você sempre quis ser, fiz tudo o que você no fundo queria fazer, mas veja, a indiferença esta o matando pouco - a- pouco, esta te consumindo... Neste momento, sentou-se e continuou a falar: - Nenhum amor vale todo este sofrimento.. Eduardo, você que já beijou tantas mulheres, dormiu com tantas outras, sofrendo assim?Por que insistir em algo que esta lhe fazendo mal?
- Eu a amo..Quero fazê-la feliz, tê-la ao meu lado.. Respondi as indagações.
- Ela te ama? Você sequer imagina se conseguiu comovê-la com todo o seu empenho.. Não é verdade?E talvez nunca chegue a saber se conseguiu. Poemas meu querido, são meros aglomerados de palavras se não existe amor para sentir o que está nelas.. Talvez ela queira algo.. talvez não.. Tenho minhas dúvidas quanto a isso...Mas você não acha que ela é indiferente demais? Perguntou ele com ar de inquisidor.
Não conseguia pensar, tampouco elaborar uma resposta para tantas perguntas que meu outro eu fazia.. Apenas permaneci imóvel, marmorizado. Uma estátua com os olhos cristalizados pelas lágrimas intermináveis que molhavam minha face.
Ao fundo.. “ in joy in sorrow, my home is in your arms..”esta música penetrava em minha mente “ na alegria e na tristeza, minha casa é em seus braços” .. Palpitante, talvez acelerado demais, neste momento perdia todo o meu controle, já não sabia o que era real, não tinha certeza de mais nada.. Apenas esta música ressoando em minha mente, aludindo a tantas coisas, trazendo-me lembranças.. que por sua vez tornavam-se imagens.. Deixando ainda mais vívida estas lembranças. Fechei meus olhos, queria que sumissem, queria não senti-las... Minha face cada vez mais molhada, o choro incessante..interminável.
Gritei o mais alto que pude, esbravejei..amaldiçoei o amor, chegando a cair de exaustão.
Havia caído inconsciente, somente uma frase jazia em minha mente neste momento.. “ Doce amor vazio”
Momentos após levantei e não mais me vi, porém um bilhete escrito com minha letra.. e que dizia..
“Nenhum amor no mundo.. vale todo o seu sofrimento”.