Luna Bella – O Dom precioso
Era uma vez um reino distante, onde os animais tinham a capacidade de entender os humanos através do pensamento. Porém, nem todos os humanos podiam entendê-los. Poucos receberam esse dom sobrenatural. Uma dessas pessoas chama-se Luna Bella, que em um certo dia, foi agraciada com o dom de se comunicar com os animais. Filha única de pais agricultores, cultivadores de tulipas silvestres do Vilarejo Alegrete. Era uma criança normal, até que um dia ela foi envolvida por esse dom. Só conseguiam adquiri-lo aqueles que passassem por alguma situação extrema na vida e tenha um coração puro e verdadeiro. Foi em uma situação difícil que Luna Bella mudou definitivamente.
Tudo começou quando Luna tinha oito anos, por volta das 10 horas da manhã de um sábado, escorregou e caiu em um poço profundo, porém, com pouca água, próximo ao Lago das Sereias no bosque dos sonhos, local pelo qual brincava sempre. Milagrosamente, não se machucou na queda, ficou apenas toda molhada. Passou horas chamando por alguém, e ninguém apareceu. Até que cansou de chamar. Já desfalecida, sentiu que estava sendo observada e resolveu olhar para cima, havia um cervo olhando-a lá de cima. Depois outra cabeça apareceu, tratava-se de um macaquinho. Luna estranhou a plateia. Queria que eles trouxessem ajuda, mas não passavam de meros animais da floresta, sem entendimento. Chorou compulsivamente chamando pelos pais.
- É uma menininha? – Perguntou o macaco curioso ao cervo.
- Parece que sim. Vamos pedir ajuda. – O cervo saiu correndo em busca de ajuda para aquela menininha tão indefesa.
Ele e o macaco foram para um Ipê roxo frondoso que ficava as margens do lago. Imediatamente uma luz forte apareceu, trazendo consigo a silhueta de uma mulher cuja voz bradou fortemente.
- O que os trazem aqui a esta hora, tirando-me do meu repouso? – A voz forte e melosa perguntou e reclamou ao mesmo tempo aos visitantes.
- Querida mestra da Luz, viemos pedir ajuda para uma criança que está caída no poço perto daqui. Ela chora alto, deve estar assustada e com fome.
- O que os fazem pensar que irei ajudá-los? Afinal de contas, vocês dois têm sido um pouco desobedientes com as regras do bosque.
- Por favor mestra, senão fizermos nada, ela não irá aguentar. – suplicou o cervo – A menina é do vilarejo Alegrete, sempre vem perto do Lago brincar. Descobrimos que ela e sua família não nos entende, eles não têm o dom.
- Os habitantes daquele vilarejo não são de bom coração. – Encerrou a conversa e afastando-se, a luz foi ficando mais fraca. Antes de desaparecer por completo, alguém falou:
- Ela é diferente. O coração daquela menina é frágil, bondoso e verdadeiro. – De repente, intrometendo-se na conversa, o Águia real, intercedeu a favor da criança. – Mestra da Luz, abra uma exceção e faça alguma coisa. Eu estive lá agora, ela não tem muito tempo. – Alçou voo sem esperar resposta e foi embora.
Alguns animais do bosque começavam a aglomerar-se em torno da árvore. Todos eles curiosos para saberem qual decisão a Mestra da Luz iria tomar.
- Se eu resolver salvá-la, saibam que o dom do entendimento será repassado para ela por toda sua vida. – Falou amargamente. – E saibam que se eu o fizer, sua vida será posta em risco para sempre. Muitos irão atrás dela para tentar lhe roubar o dom. – Desapareceu em seguida deixando todos os animais aflitos e sem saber o que viria depois.
Uma hora após o acidente, a mãe da Luna sentiu a falta dela. Procurou por todo o sítio, incluindo o estábulo, o celeiro e até na estufa das tulipas. Desesperada, foi ao encontro do marido e avisou-o sobre o desaparecimento da filha. Os dois não sabiam mais onde procurar, ela simplesmente desapareceu.
- Minha filhinha, onde será que ela está? – Perguntava a mãe aflita ao marido.
- Calma, vai dar tudo certo, nossa filha aparecerá. Tenha fé vamos encontrá-la.
Juntos mobilizaram as pessoas do vilarejo para ajudar nas buscas. Mas, nem todas quiseram ajudá-los por pura inveja e maldade. Ninguém se atrevia chegar perto do Lago das sereias, tinha fama de ser enfeitiçado.
***
Luna tremia de frio, quatro horas após a queda no poço, ninguém apareceu para socorrê-la. Sentia os animais observando-a sem forças para lutar. Mas, em meio ao caos, uma luz muito brilhante entrou no poço e uma mulher muito bonita apareceu flutuando, vestida de vários tons de rosa, bradou com uma voz meiga e forte:
- Luna, acorde! Você precisa reagir, os animais da floresta a esperam animados para serem seus amigos. A partir de agora poderás entendê-los e eles a você. – Determinou a Mestra da Luz – Mas, lembre-se de nunca, mais nunca, revelar o seu Dom a ninguém. Ele não deverá ser usado para fazer mal. Seu coração é bondoso, guarde-o em segurança. A águia real tirará você daqui, não tenha medo. – Dito isso, a luz apagou-se, a mulher misteriosa desapareceu e um silêncio habitou o lugar.
Imediatamente, a menina recuperou suas forças e olhou para cima viu uma águia sobrevoando dentro do poço e pousou em seus ombros levando-a para fora. Alguns animais a olhavam, e como quem sonha, passou a entender o que eles pensavam. Luna perguntou quem teria sido aquela linda mulher que a salvara da morte.
-Menina, acalme-se, somos amigos do bem. – Pensou o macaco.
- É verdade! – O cervo também pensou.
- Não tenha medo criança, não irei fazer-lhe mal. Sou a Águia Real do Bosque dos sonhos. – Bradou em tom de autoridade. – Irei levá-la a um lugar seguro. Não tenha medo, segure-se. – A ave de rapina segurou-lhe com as garras afiadas nos ombros da frágil criança e seguiram em direção ao vilarejo.
- Você fala? Que feitiço é esse? Você é uma bruxa disfarçada? – Lua tentava entender.
- Você recebeu o Dom do entendimento dos animais. Quando a Mestra da Luz entrou no poço, imediatamente, foi repassado a ti esse dom. – Enquanto voavam, águia explicava para a menina o que havia acontecido com ela. – És uma das poucas meninas que recebeu o dom do entendimento. A partir de agora serei seu protetor. Sempre estarei ao seu lado quando precisares. – Fez uma pausa, continuou. – Coisas estranhas passarão a acontecer a sua volta. Não se assuste, apenas creia que tudo ficará bem.
- Como assim, coisas estranhas? – Seu coração de criança espantou-se.
- Quando ficares mais velha, entenderás o que falo agora. Por enquanto, creio eu que nada de mais acontecerá contigo, pois és ainda uma criança inexperiente. Deverás preocupar-se mais tarde. Eles virão, de alguma forma, atrás do seu dom. – Por fim, a Águia Real pousou próximo ao sítio onde Luna morava. Despediram-se amigavelmente. A garotinha correu em direção a sua casa chamando pelos pais. Eles não estavam em casa, tinham ido a procura dela pelos arredores do vilarejo.
- Luna, meu Deus! Você apareceu, graças a Deus! – Inácia, cozinheira do sítio, abraçou a criança para certificar-se de que ela estava bem. – Seus pais saíram atrás de você.
- Atrás de mim? Foram ao vilarejo?
- O que houve com você? Deixou todos nós desesperados a sua procura.
Dando de ombros, Luna resolveu calar-se e esperar os pais voltarem para contar sua versão dos fatos. Meia hora depois estava nos braços dos pais. A mãe não parava de chorar de emoção. Viu tristemente que eles não deram muita importância aos verdadeiros acontecimentos. Tentou contar, mas acharam que ela delirou de fome. Ficaram chateados por ela ter ido ao Lago das seiras sem o consentimento deles, por coisas estranhas ocorrerem por lá.
Os dias de Luna Bella seguiram tranquilos, percebeu que agora alguns animais do bosque apareciam com frequência em seu quintal, e sempre dava uma fugidinha para o Lago brincar com seus novos amigos pelos quais entendia os pensamentos: os animais do bosque dos Sonhos.
Débora Oriente