Alevliam, o protetor do reino
Alevliam, o protetor do reino
Em terras além mar, em um lugar muito, muito distante havia um reino próspero e feliz. Era também um reino muito seguro, pois era protegido por Alevliam, o último descendente dos dragões. Em sua torre, nas muralhas, ele mantinha guarda há dois séculos, nenhum mal conseguia atravessar as muralhas, pois qualquer um que tentasse era queimado ou devorado vivo.
Antes de ser consumido por seu sangue e tornar-se de fato um imponente e belo dragão dourado, Alevliam foi, antes de mais nada, um jovem guerreiro muito valente que já lutava pela defesa de seu povo. Com cabelos e olhos castanhos e quase dois metros de altura, ele foi o mais forte e valente guerreiro que já existiu naquelas terras. Mas sua descendência carregava a iminente certeza de que em breve teria sua forma transmutada em um poderoso dragão. Desde sua transformação, Alevliam vinha sendo o guarda da muralha, um posto muito respeitado, ficando abaixo apenas do próprio rei quanto à nobreza e respeito de seu povo. Como pagamento por seus serviços, Alevliam recebia anualmente ouro e joias que eram guardadas em sua torre. Isso o tornava mais rico até que o próprio rei, entretanto, de nada lhe servia toda essa riqueza, afinal ele não podia sair de lá e nem tinha com quem compartilhar sua fortuna. Até que um dia o dragão se cansou de receber sempre os mesmos pagamentos. Ele queria uma recompensa diferente, uma que o alegrasse verdadeiramente. Ele queria uma companhia.
Foi assim que uma certa tarde ele exigiu uma audiência com o rei em sua torre. Alevliam disse que só continuaria protegendo o reino se o seu pedido fosse atendido, ele queria alguém para não se sentir mais sozinho. Mas ele não queria uma pessoa qualquer, ele queria a princesa. Ela seria o tesouro mais valioso de sua torre.
Sabendo da importância de manter Alevliam em seu posto, devido as constantes ameaças de povos bárbaros, o rei não teve outra alternativa a não ser concordar. Ele pensaria em uma forma de reverter essa situação em breve, mas por enquanto sua filha teria que ir morar na torre do dragão.
Quando soube da notícia, a princesa Lazúli ficou horrorizada, seu pai a entregaria a um monstro e não fazia ideia para qual finalidade o dragão a queria. Mas o rei a confortou e disse que Alevliam jamais iria lhe fazer mal, pois antes de se tornar um dragão ele foi um guerreiro muito honrado e queria apenas uma companhia para se sentir menos sozinho, e que logo essa vontade de ter alguém por perto passaria.
Lazúli era uma jovem princesa de cabelos negros e ondulados. Seus olhos eram da cor de mel e sua boca era pequena e avermelhada como uma framboesa. Além de sua beleza, a princesa também era conhecida por sua inteligência e por seu impecável talento em criar e contar histórias, eis uma das razões pelas quais Alevliam a escolheu para ser sua companhia. Havia séculos que ele não ouvia uma história.
No início, Lazúli teve medo do imponente dragão, mas após alguns dias, percebeu que ele era muito gentil e que também tinha muitas histórias para contar. Ele contou sobre várias batalhas em que lutou antes de se tornar um dragão e, depois de um mês em sua companhia, também revelou um segredo a ela:
— Todos os anos no dia do meu aniversário eu tenho direito a ter um pedido atendido, é um poder que nós com sangue de dragões temos. Todos os anos eu peço a mesma coisa: Tornar-me humano novamente. Assim todos os anos eu volto a ser homem por um dia. Amanhã é meu aniversário, estou te contando isso para você não se assustar. Tornei-me dragão aos trinta anos de idade e sempre que me transformo, eu volto a ter a mesma aparência, pois nós dragões não envelhecemos. Amanhã você verá que eu nem sempre fui esse ser aterrorizante.
No dia seguinte, Lazúli acordou com uma surpresa, no canto de sua cama havia uma bandeja com frutas e com seus bolinhos preferidos. Ao lado da bandeja havia um lindo buquê de rosas coloridas. Ao sair do quarto ela viu no corredor um homem debruçado em uma das janelas.
— Alevliam?
O homem se virou e deu um sorriso triste. Era muito alto e muito belo e, mesmo que aquele sorriso demonstrasse certa tristeza, ainda assim foi o sorriso mais lindo que a princesa já viu na vida. Depois de tantos dias naquela torre, Lazúli já havia aprendido a gostar do imponente dragão, mas vê-lo em sua forma humana fez com que ela sentisse algo diferente.
— Eu tentei fazer uma surpresa para você. Com minha forma de dragão é um pouco difícil fazer coisas que humanos normais fazem. Então me levantei hoje bem cedo e providenciei algo pra te alegrar um pouco quando acordasse. Sei que aqui não é o melhor lugar para uma princesa viver e hoje refleti sobre isso. Se você desejar, poderá ir embora amanhã. Você é boa demais para essa torre.
Lazúli ficou estranhamente triste ao ouvir isso. Alevliam no fundo era apenas um homem bondoso, triste e sozinho.
— Eu até posso ir embora amanhã, mas quero poder fazer algo para te alegrar hoje.
— Nada me alegra mais do que sua companhia, princesa.
Assim, Lazúli se empenhou mais do que nunca em fazê-lo sorrir. Ela contou as mais belas e divertidas histórias que conhecia, cantou e convenceu o homem a dançar com ela. E também o ouviu contar suas melhores lembranças de infância. Mas conforme a tarde foi chegando, a princesa notou a tristeza voltar aos olhos de Alevliam.
— Não existe alguma maneira? — Questionou a princesa. — Algum jeito de você voltar a ser humano para sempre?
— Na verdade existe, mas eu não posso contar.
— Por que?
— Por que não seria justo com você.
— Não seria justo comigo? Você quer dizer que tem algo que eu poderia fazer?
— Não precisa se preocupar comigo, minha princesa. Você já fez muito em passar esse tempo comigo.
No fim da tarde a princesa teve uma ideia. Ela dispunha de vários livros em seu quarto, talvez algum revelasse algo sobre a linhagem dos dragões. Depois de meia hora procurando, ela encontrou. Ao folhear um livro pequeno e muito antigo ela descobriu que um dragão poderia voltar a ser humano no dia em que ele desse seu coração a alguém e que esse alguém lhe desse em troca o seu próprio coração. Essa foi a melhor revelação que Lazúli já teve na vida, pois sabia que naquele dia ela enfim deu seu coração a Alevliam, mesmo que ele ainda não soubesse, e sabia também que o coração do dragão já era dela há muito mais tempo. Seu pai teria que encontrar outro meio de proteger o reino, pois Alevliam não precisaria mais viver os seus dias infeliz e sozinho.
A princesa saiu do quarto e foi atrás do belo guerreiro e, ao encontra-lo, o surpreendeu com um beijo. Ele a abraçou forte e sorriu contra seus lábios.
— Você está me dando seu coração? — Perguntou esperançoso.
— Ele já é seu. Meu coração é todo seu.
Naquela noite os dois dormiram no mesmo quarto e nos dias seguintes também. Alevliam nunca mais se transformou em dragão novamente. Aos poucos ele formou um exército e voltou a lutar ao lado de outros guerreiros para continuar defendendo seu povo e sua amada. Assim termina a história de um guerreiro com sangue de dragão que recebeu como seu maior presente o coração de uma princesa.