Eufrásio, o burro
Esta é uma história de amor, entre uma mulher e muitos animais, inspirada em alguns fatos existentes, porém, baseada em outros completamente diferentes, certamente imaginários. Num determinado lugar qualquer, num iluminado país, situado no hemisfério sul, abaixo da linha do equador, o amor fez-se presente, o egoísmo tornou-se ausente, a radiante luz divina expandiu-se completamente. E bem antes daquilo que eu conheço, muito antes do que sequer imagino, lá no princípio de tudo, num glorioso esplêndido ato de amor, tudo começou a ser formado, o infinito universo, os céus e a terra, a magnífica brilhante luz, o dia e a noite, as vegetações das mais variadas espécies, os dias, os meses, as quatro estações do ano, o incandescente sol, a prateada lua e as incontáveis estrelas, os seres vivos das águas doces e salgadas, os animais que viriam a povoar a fecunda terra e, todas aquelas espécies que voam nos ares, a raça humana, homem e mulher, assim desta maneira tudo foi se multiplicando, crescendo, evoluindo, se transformando durante inúmeras gerações, os desejáveis sonhos existentes, a vida e a morte caminhando juntas e, também naquele tempo foi formado um formoso, gigantesco, misterioso jardim, onde estavam todas as formas criadas, animais, vegetais, seres animados e inanimados, então, em mais um ato do sagrado, divino, infinito amor, o supremo jardineiro fiel, plantou duas diferentes sementes especiais, uma ao lado da outra, para que florissem juntas, logo surgiram duas magníficas flores, cada uma com sua extrema beleza, indescritível perfume, que Ele regava com a finíssima essência, com o mais puríssimo amor, porém, uma das flores sentindo-se inferior, acabou sufocando a outra flor, até que ela secou e morreu. Assim surgiu a humanidade, o bem e o mal, através de todos os conhecidos séculos, até os dias atuais. Numa noite qualquer nasceu um burro, um jegue, um asno, jumento ou jerico, simplesmente um burro, chamado Eufrásio, assim foi como um dia lhe chamariam, nasceu pobre, pacato, um simples burro, porém, inteligente e esperto. Poderia ter nascido como um humano, um gato, um pato, uma perigosa fera numa vasta floresta, uma ave livre voando no infinito céu azul, um peixe nadando num rio qualquer, ou uma das inúmeras gigantescas criaturas marinhas, mas nasceu como burro doméstico, assim quis o seu destino. Durante certo período de sua vida foi um filhote feliz, mamava, pulava, brincava, amava, sonhava. Quando atingiu certa idade, aos poucos, foi percebendo que a vida não era tão fácil quanto acreditava ser. Começou a ser montado, maltratado, golpeado, sendo aos poucos introduzido na vida agrícola, as árduas tarefas rurais do campo em que vivia, já separado de seus pais, começando logo a perceber que na verdade era um asno doméstico, um animal de carga e assim passaram os anos. Todos os animais existentes nesta fazenda não tinham nomes próprios, mas num determinado momento de suas vidas, eles seriam batizados carinhosamente, mas isto somente ocorreria em outro período na vida dos sofridos animais. No decorrer de sua jornada, ali na fazenda a qual vivia, conheceu outras espécies animais, dezenas de gados criados para abate, inúmeros bois reprodutores, uma vaca leiteira chamada Maricota e seu único bezerro, da sua primeira gestação, que antes mesmo de se formar adulto, foi separado de sua mãe, havia também o Godofredo, um belíssimo bode branco caprino, olhos azuis, totalmente albino, Hércules, um cavalo da raça crioulo, usado para montaria por certo período de sua vida, sendo posteriormente transformado num puxador de carroças e charretes, diversos porcos, porcas e seus leitões, entre eles havia o Juvêncio, um porco de raça, exímio reprodutor, que nunca foi enviado para o abate, as três ovelhas, a mãe de todas chamava Maia e suas duas crias gêmeas Clara e Branca, havia também um vasto galinheiro com seus galos, frangos e com diversas galinhas caipiras poedeiras, muitos perus que nos finais de cada ano, eram abatidos virando ceias para muitas pessoas e, lá naquele mundo rural haviam patos, gansos, marrecos, agrupados num pequeno lago, que ao mesmo tempo era um criadouro de peixes diversos, a sua água era utilizada para dar de beber aos animais, regando um modesto pomar com frutas, legumes, uma variedade de hortaliças e que também regava a terra, teu solo constantemente fértil, onde haviam diversas plantações de alimentos e produtos agrícolas, milho, feijão, algodão, entre outros. Havia também na casa de seus proprietários, alguns outros animais domesticados, como uma variedade de cães, entre eles Thor, um cão perdigueiro que fora treinado para caçar perdizes, mas como nada caçava, foi considerado um cão preguiçoso e, com o tempo foi deixado de lado, por não ser um exímio caçador, transformado desta maneira num simples cão de guarda, possuíam também diversos gatos, uma infinidade de pássaros aprisionados em pequenas gaiolas. Todas criaturas que lá viviam, tinham a plena consciência de que eram confinados, alguns eram criados para posteriormente serem abatidos, servindo de alimentos aos humanos, nos finais de cada ano, em algumas datas comemorativas e religiosas, ao final de alguma colheita, sendo que outros eram usados para trabalhos forçados, até o fim de seus exaustivos dias. As jornadas diárias eram incessantes, não importando se havia sol ou chuva, calor ou frio, dias normais ou feriados, sempre na mesma rotina. Viviam todas espécies de certa forma em silêncio, presos em seus próprios pensamentos, cada um pronunciando o som de suas próprias vozes. Assim entre relinchos, mugidos, grunhidos, cacarejos, latidos, berros, miados, constantemente ouvidos, o burro Eufrásio, cada vez mais soltava seu zurrar para que fosse entendido ou mesmo compreendido, mas toda esta tentativa era inútil perante os humanos que ali viviam, fazendo se compreender apenas com os mesmos da sua espécie ou por alguns outros, que mesmo sendo de raças diferentes, tinham a sensibilidade de entender os seus lamentos e murmúrios. Assim passaram os longos anos na vida de Eufrásio, com ele executando seu árduo trabalho diário nos campos de algodão, nas vastas plantações de milho, entre outras, sendo que os proprietários da antiga fazenda já estando com avançada idade e doentes, vieram a falecer num curto espaço de tempo. Os herdeiros mais jovens daquela família, retornaram aquela propriedade, começando a implementar máquinas agrícolas e os velhos animais que por tanto tempo serviram para o trabalho, aos poucos, começaram a ser abandonados, deixados de lado, sem interesse aos novos senhores daquela fazenda. O burro Eufrásio, viu ao longo de sua vida muitos animais serem abatidos, para tornarem-se alimentos aos humanos, sendo transformados cruelmente apenas em mercadorias, pela indústria animal, a qual tinha interesses comerciais e financeiros, fato que o deixava cada vez mais triste, pela falta de amor e compaixão naquilo tudo que havia presenciado. Ele possuía um sonho inadiável, sempre acreditando de que algo novo surgisse ainda em sua vida, nos anos que ainda lhe restavam e, junto a ele os poucos animais que sobraram sobrevivendo dos abates, estava a vaca Maricota, que nunca mais havia procriado, pois todos os bois haviam sido abatidos em matadouros, o bode albino Godofredo, o porco ex reprodutor Juvêncio, por não mais haver porcas na fazenda, Hércules, o cavalo que não mais servia para montaria, devido aos problemas em uma de suas patas, transformando-o num animal manco, considerado inútil pelos humanos, as três ovelhas Maia, Clara, Branca e, juntos estes animais que não haviam sidos transformados em alimentos, possuíam dentro de si um grandioso sonho de liberdade, mesmo com a esperança quase perdendo-se entre os mais otimistas dos animais. Certo dia, Eufrásio percebendo que ele e seus amigos terminariam a vida naquela fazenda, começou a elaborar um plano para que pudessem partir daquele sombrio lugar, mas haviam cercas, uma enorme porteira e alguns capatazes, entre outros empregados que circundavam toda a propriedade, vigiando para que nenhum intruso invadisse e, para que nenhum dos poucos animais que ainda viviam lá pudessem escapar. Acontece, porém, que nenhum sonho é impossível de ser realizado, mesmo que muito tempo demore para tornar-se realidade. Durante a última noite de inverno, houve uma atípica tempestade naquela região, com relâmpagos e trovões, caindo um raio sobre uma cerca de arame farpado, havendo uma descarga elétrica de grande intensidade, próximo a porteira de entrada daquela fazenda, incendiando-a, queimando vários mourões de eucalipto, destruindo grande parte da cerca. Numa belíssima manhã do primeiro dia de primavera, com o renovo de mais uma novíssima estação, onde as perfumadas flores brotavam nos extensos campos, os pássaros gorjeavam pelos ares voando sobre as copas das árvores, o dia da liberdade finalmente chegara. O burro Eufrásio, notou que no fundo da fazenda havia uma parte da cerca danificada e, que ficava bem ao lado de uma estrada de terra, usada para ir a outro vilarejo, não pensou duas vezes, reunindo os demais amigos animais, entre eles o cavalo, o bode, o porco, a vaca, as três ovelhas, o cachorro e assim todos juntos atravessaram aquela pequena abertura, rumo a liberdade tão esperada, caminhando em direção ao ainda desconhecido por várias exaustivas horas. Finalmente, a sombria noite chegou mais rápido do que esperavam, estando eles a uma certa distância daquela fazenda, onde tinham passado toda a sua vida, desde que haviam nascido, com o medo tomando conta de todos eles, pois havia o receio de que algum capataz, viesse a procura dos animais fugidos ainda naquela manhã. Passaram a noite toda numa apreensão que lhes tirou o sono, mas desta forma puderam finalmente olhar o escuro céu, sua imensidão de estrelas e constelações, a prateada lua nova, como nunca haviam observado, fortalecendo dentro de si o enorme desejo de encontrar um lar saudável, vivendo em liberdade, terminando os dias restantes de suas vidas completamente em paz, num ambiente onde fossem respeitados, não apenas como animais, mas como seres vivos criados a imagem e semelhança do todo poderoso, o mesmo que deu vida a todo o universo, aos seres vivos das mais variadas espécies, enfim, em tudo que há, que houve e que ainda haverá. Ao raiar de um novo dia, no surgir de uma novíssima esperançosa manhã, um renovado despertar, com o sol despontando no horizonte, recomeçaram a caminhar por um outro caminho, que os distanciava daquela estrada, durante várias horas, cruzando pequenos pastos, desviando de alguns ribeirões e riachos, contornando pela encosta de um pequeno morro, já bastante distante do lugar onde haviam passado toda a vida, com a esperança viva de que encontrassem a tão esperada liberdade. O tempo é o senhor de todas enigmáticas coisas e impossíveis causas, pois quando perceberam estavam defronte a uma diferente, um tanto perigosa estrada asfaltada, onde havia uma razoável movimentação de veículos nos dois sentidos, mas naquele momento veio a dúvida sobre qual direção seguir, sentindo mais uma vez o receio de que alguém estivesse os procurando, mas isto jamais aconteceu. Estavam todos eles bem distantes do antigo cativeiro que viveram, pois, mesmo sendo alimentados, também foram bastante maltratados, friamente criados sem nenhum gesto de amor. Todos eles pararam para descansar sobre a sombra de uma enorme árvore, tinham muita sede e intensa fome, daí começaram a vir pensamentos estranhos, se tudo aquilo estaria correto, se não deveriam tentar voltar a antiga moradia, ou se realmente aquela fuga estaria valendo a pena. Foi assim desta maneira, que a providência divina enviou um anjo humano no caminho daqueles exaustos animais. Passava ali um ônibus lotado com muitos passageiros, entre eles encontrava-se uma mulher, jovem, solteira, com seus pensamentos imersos nas preocupações diárias, voltando do seu trabalho no centro da cidade, rumo a um sítio onde morava, era uma filha única e, por não ter tido irmãos ou irmãs, desde a sua infância amava, sendo apegada com vários tipos de animais, pois havia tido vários de estimação. Deixando de se alimentar, num determinado período de sua vida de qualquer tipo de carne, branca ou vermelha, tornando-se adepta do veganismo, protetora de qualquer raça animal que cruzasse seu caminho. Possuía um coração generoso com o hábito de conversar com os animais, desde que era menina, falava com seus cães, gatos, coelhos, por alguns era considerada louca e, por outras pessoas que tinham a mesma percepção, era grandemente admirada, pois possuía uma delicada, extrema sensibilidade. Seu maior sonho, era que pudesse usar a sua propriedade para cuidar de animais perdidos, ou mesmo feridos e abandonados. Seu nome era Talya, formada em administração, com seus vinte e sete anos de idade, uma moça alta, cabelos castanhos escuros compridos, olhos levemente castanhos claros. Uma pessoa bastante mística, espiritualizada, meditava todos os dias, sendo praticante do infinito amor pela natureza e por tudo que a rodeava, respeitando o reino animal, vegetal, os seres humanos em geral, uma alma completamente elevada. Foi então que avistou o burro Eufrásio, deitado na sombra da árvore, na beira da estrada, junto com os demais animais, ao lado dele estava Hércules, o cavalo manco que possuía uma pequena ferida em uma de suas patas, a vaca Maricota, o cachorro, o bode, o porco e a três ovelhas, todos eles com sinais de abandono e maus tratos. Desesperadamente, sem muito pensar, suplicou ao motorista que parasse imediatamente a condução, mesmo estando a certa distância do lugar onde morava, saltando rapidamente, indo na direção daqueles ainda estranhos animais. Ela possuía o desejo em seu coração de transformar o sítio onde morava, num pequeno santuário, para que todos animais encontrados pudessem ser livres, cuidando de todos com imenso amor. Foi alegremente na direção deles, quando no mesmo instante que seus castanhos olhos, cruzaram com o olhar sofrido do burro Eufrásio, foi amor à primeira vista, começando a falar com eles, fitando os olhos de cada um carinhosamente e, neste momento mágico do primeiro encontro, sentiu uma conexão divina, pois tinha certa sensibilidade de perceber o pensamento de cada um deles, decidindo que deveria levá-los para sua casa, dando-lhes água, uma boa alimentação, prestando todos outros cuidados que fossem necessários. E como nada acontece por acaso, naquele mesmo instante, passava pelo local um rapaz, com seu caminhão que era usado para transporte de alimentos agrícolas, voltando de uma entrega de uma parte da colheita de milho, que ele e seus familiares haviam realizado no sítio onde moravam. Seu nome era Charles, tinha seus trinta anos, moreno, alto, com porte físico avantajado, ainda solteiro. No mesmo instante que avistou aquela jovem, ali parada na beira da estrada, falando com os animais, decidiu parar oferecendo gentilmente ajuda. Assim que seus olhares se cruzaram, houve imediatamente uma fortíssima atração entre ambos, como nunca haviam sentido anteriormente no decorrer de suas vidas. Eles então se apresentaram, com ela imediatamente aceitando aquela inesperada, improvável ajuda, seguindo fielmente juntos, puseram-se a colocar todos os animais no caminhão cuidadosamente, um a um, todos já chamados pelo nome que Talya havia acabado de batizar. O primeiro a subir pela rampa em direção a carroceria foi o burro Eufrásio, seguido por Hércules, o cavalo manco, a vaca Maricota, o bode Godofredo, o cachorro Thor, o porco Juvêncio, as três ovelhas Maia, Clara e Branca, totalizando os nove animais que haviam se libertado do antigo cativeiro, sendo todos acomodados com segurança e, assim foram encaminhados ao seu novo lar, posteriormente batizado de Santuário da Luz Animal. No trajeto entre o local, onde os animais foram encontrados, até chegar ao sitio de Talya, eles foram conversando muito, ela ainda meio tímida, contava para ele toda a sua experiência com os animais, desde a sua infância, todos os seus planos e projetos que tinha em mente há algum tempo. Falou sobre os direitos universais dos animais, que todos os animais nascem iguais, tendo os mesmos direitos à existência como os seres humanos, todos têm o direito de serem respeitados e, que o homem, como espécie animal, não pode exterminar os outros animais, explorá-los, violando esse direito, o homem tem o dever de protegê-los, que os animais tem o direito à atenção, que nenhum animal deverá ser submetido a maus tratos, nem a atos cruéis, não devendo ser explorados para divertimento do homem e, as exibições de animais e os espetáculos que os utilizem são incompatíveis com a dignidade do animal, considerando que a educação deve ensinar desde a infância a observar, a compreender, a respeitar e a amar os animais, que animais selvagens tem o direito à liberdade no seu ambiente natural, a se reproduzirem, que abandono de animal é algo degradante, pois os direitos de todos animais devem ser defendidos pela lei, igualmente como os direitos do homem, que animal não era comida, nem deveriam se transformar em alimentos, que cavalos não poderiam jamais serem montados, nem deveriam puxar charretes ou carroças. Todos seus profundos relatos deixavam Charles perplexo e impressionado, pois apreciava saborear todos tipos de carne bovina, suína e de aves. Ele havia adquirido o hábito de participar de montarias, romarias e cavalgadas, enfim um autêntico peão boiadeiro, vencedor de alguns rodeios, totalmente com um pensamento ao oposto dela. Ele ouvia tudo atentamente, mas sem dizer de fato sobre os costumes que tinha desde a sua infância, mesmo gostando de animais domésticos, preferindo assim não assustar a moça, que tinha ideias completamente diferentes do seu modo de pensar, também não quis causar má impressão na jovem que havia acabado de conhecer, pelo simples fato de ter ficado encantado com sua fascinante beleza, tanto fisicamente, mas também pode perceber que ela possuía um coração de ouro. Quando acomodaram os animais na carroceria do caminhão, tamanha era a expectativa de Talya, que nem pode perceber que o mesmo veículo que transportava alimentos agrícolas, também havia vestígios de transportar animais, para serem vendidos em outra cidade. Depois de certo tempo, chegaram finalmente ao sitio chamado de Boa Esperança, sendo proprietários os pais de Talya, desde que fora herdado de seus bisavôs, passando em seguida aos avós por várias gerações até chegar a eles, que moravam noutra casa no centro da cidade, mas diariamente vinham ao sitio, onde Talya vivia sozinha tornando-se independente, mas que futuramente viriam morar juntos para auxiliarem no santuário. Era um modesto sítio numa região bucólica, havia um grande verdejante pasto, anteriormente usado pelos antigos daquela família na criação de gado, mas que nos dias atuais não possuía mais nenhum animal, além de um gato e um coelho que eram os companheiros de Talya. Na parte de cima da propriedade tinha uma casa simples de alvenaria, porém, confortável com vários cômodos, fogão e forno a lenha, uma enorme varanda que rodeava todo imóvel, algumas árvores frutíferas nas proximidades da casa, várias plantações de milho, mandioca e outros alimentos, um pequeno riacho que desembocava num lago discreto, de tamanho médio, com uma fartura de peixes, diversas plantas aquáticas, situado na parte baixa do sítio. Naquele lugar reinava a perfeita paz absoluta, repleto da mais completa harmonia, uma energia positiva que era sentida por todas as pessoas que ali passavam. Foram assim descarregando todos animais cuidadosamente, sendo todos tratados gentilmente pelo nome que Talya havia colocado, deram água para eles beberem, depois alguns seguiram rumo ao pasto onde havia farta alimentação, exceto Juvêncio, o porco alimentado separadamente, também o cachorro Thor, que imediatamente recebeu uma vasilha com polenta feita com fubá de milho, pois não faziam uso de ração canina que continham produtos animais, entre outros aditivos químicos e, assim Charles conheceu os pais de Talya, um casal de meia idade, um gato chamado Astolfo, que possuía olhos de duas cores, azul e verde, que habitava naquela casa há pouco tempo e, também um grande coelho cinza e branco que vivia solto, com olhos de tonalidades vermelho e marrom chamado Polar, que possuía um hábito bastante estranho, totalmente misterioso, pois todas as vezes quando era semana de lua cheia, ele saia no entardecer em direção ao lago, que ficava no próprio santuário, desaparecia no meio da mata fechada, que ficava na margem oposta, não sendo mais visto, mas antes do amanhecer do dia seguinte, ele já estava de volta rodeando a casa, esperando receber uma cenoura, alface ou alguma fruta. Esta cena repetiu inúmeras vezes, sempre nos mesmos períodos até que Talya, acompanhada com o seu pai tentaram diversas vezes, descobrir o seu paradeiro, mas não conseguiam. Como a mata era um local de difícil acesso, fazendo divisa com o sítio de seu vizinho, não se aventuraram adentrar nela. Talya, porém, sempre foi uma pessoa bastante persistente, conseguindo um dia perceber o local em que o coelho Polar entrava na mata, indo sozinha, tentando encontrar alguma pista, mas depois de algum tempo procurando-o, encontrou uma pequena toca onde supostamente ele poderia ter entrado, permanecendo ali por pouco tempo, porque logo começaria a escurecer, retornando em seguida para a sua casa. Num certo dia, Talya resolveu levantar-se mais cedo do que era habituada, ainda de madrugada, indo nas proximidades do local onde sempre ela avistava o coelho Polar. Ficou ali por algumas horas, até que sem perceber adormeceu, mas despertou logo que os primeiros raios solares surgissem por detrás do morro que havia nas proximidades, percebendo que o coelho Polar saiu de um determinado ponto da mata, disparando em direção a casa. Como ela não havia conseguido descobrir nada, resolveu não insistir mais naquela busca. Numa outra vez, Talya estava sentada perto do lago, junto com o burro Eufrásio, quando estava começando a escurecer, notando que Polar havia adentrado novamente na mata, mas ela ficou algumas horas ali em silêncio, observando a lua cheia que surgia toda radiante, logo iluminando o lago e os arredores, formando um clarão sobre suas águas, como se fosse um espelho, foi então que viu o coelho Polar, sair da mata fechada rodeado de outros coelhos de vários tamanhos, percebendo que se tratava de sua numerosa família. Um dia, o coelho Polar saiu do santuário num outro entardecer, pois possuía hábitos diurnos e noturnos, indo na direção da mata, nunca mais retornando, mas Talya ficou triste por não o ver mais, entretanto, ficou feliz por saber que ele era um animal livre. Lá na casa dela não havia outro cão, porque há algum tempo atrás havia falecido um que possuíam, estando com a família por mais de doze anos e, que havia sido chamado carinhosamente por Pingo. Quando deram por si já era o entardecer, a noite lentamente chegava e, assim Charles despediu-se de toda família para retornar a sua casa, que ficava distante de lá muitos quilômetros. Talya, acompanhou-o até a porteira demonstrando muita gratidão, fez vários agradecimentos, com o convite para que ele voltasse quando quisesse para visitá-los. Assim que ele partiu, Talya retornou em direção a casa, estando em completo êxtase, com a presença de todos aqueles seres animais, todos alojados e acomodados em teu novíssimo santuário. Depois de um relaxante banho, lanchou deliciosamente um sanduíche natural, pois havia chegada à noite, estando uma temperatura suave e agradável, pegando umas folhas de papel em branco e uma caneta, chamou o cachorro Thor, com ambos indo juntos em direção ao local, onde estavam os demais animais, fez próximo dali uma fogueira com algumas lenhas espalhadas, encontradas pelo chão, sentando-se ao lado, agora rodeada pelos seus novos amigos animais, começando a cantar uma breve melodia que conhecia desde que era uma menina, ficando ali por horas e horas, até alta madrugada recordando o seu dia, o primeiro encontro com os perdidos animais, a aparição inesperada de Charles, enfim, tudo o que ocorrera. Talya estava naquele momento, começando a concretizar um sonho que possuía desde a sua infância, quando vinha visitar seus avós naquele sítio, quando ainda morava na cidade. Ela também gostava desde a sua juventude de escrever pequenos versos, em formas poéticas, anotando num papel várias frases, formando algumas rimas, relembrando o momento em que os conhecera e, ao terminar a escrita chamando de poema dos anjos animais, leu em voz alta aos amigos animais que ali estavam, sendo que todos eles atentamente ouviam, como se entendessem tudo o que ela dizia. Assim ela escreveu:
“ Deitados sobre a sombra da árvore, com medo e fome, assim os encontrei, os nove animais perdidos, totalmente aflitos, aos poucos me aproximei, tão logo que os vi, todos ali juntinhos, perdidamente me encantei, mirando seus olhos tão tristes, seus corpos feridos, calorosamente me apaixonei, numa forma de levá-los, todos eles para minha casa, rapidamente pensei, um novo sincero amigo, com o seu caminhão, cuidadosamente os transportei, chegando em meu sítio, num novíssimo santuário, com amor ali alojei, vivendo felizes, cuidados prestados, numa pessoa completa me transformei. ”
Quando o cansaço e o sono estavam mais acentuados, despediu-se de cada um deles, com singelos beijos, indo descansar totalmente exausta, mas completamente feliz. Assim que Talya havia dormido, com a fogueira transformada em brasas, o burro Eufrásio e os demais animais puderam novamente, contemplar aquele magnifico céu completamente estrelado, sentiram algo bem diferente daquela outra noite, a qual haviam se refugiado para descansar, após terem escapado da fazenda, onde haviam vivido, sentindo algo radiante como nunca haviam percebido, com a luz do Eterno criador fazendo-se presente em todos eles. Tudo parecia um sonho, tanto para eles quanto para Talya, que já dormia profundamente, sonhando com teu novo santuário, repleto das mais variadas raças animais, todos felizes e totalmente livres, como deveria ser desde que nasceram e, neste mesmo sonho estava Charles, vestido com chapéu e botas de boiadeiro, todo sorridente, o qual montava o cavalo Hércules, cavalgando num enorme pasto, diferente daquele onde vivia, com uma corda nas mãos feito laço, tentando laçar a vaca Maricota, com mais alguns bezerros, que fugiam desesperadamente. Acordou subitamente aos prantos, chorando, ficando em seguida aliviada, ao perceber que se tratava de um terrível pesadelo, tomou um copo de água, tornando a dormir logo em seguida, não sonhando mais naquela noite. No despertar de mais uma belíssima manhã, onde os raios solares surgiam por detrás de uma montanha próxima, num sábado onde ela não tinha que ir trabalhar, despertou totalmente eufórica, correndo em direção ao pasto, antes mesmo do seu tradicional café matinal, dando bom dia aos amigos animais, tratando todos delicadamente com alimentação adequada, capim, feno, alfafa, frutas, colocando água fresca para eles beberem, vendo assim a sua esperança renovada. Todos animais demonstravam uma felicidade extrema, com Talya sentindo-se completamente realizada. Ela era uma mulher independente, inteligente, persistente, exigente, emotiva, características de uma perfeita escorpiana, extremista em relação a sua ideologia animal, jamais pactuaria com maus tratos, praticava a religião do amor. Havia tido em sua vida adulta poucos relacionamentos amorosos, mas nenhum deles havendo tanta profundidade, tanto pelas ideias diferentes com as linhas de pensamento das quais praticava, mas seu círculo de amizades era vasto, repleto de pessoas com os mesmos ideais. Quando percebeu estava sentada junto ao lago, com os animais todos próximos a ela, ali permanecendo por várias horas, meditando, observando um bando de andorinhas azuis e cinzentas, que voavam em círculos se alimentando de insetos, ouvia o barulho do riacho que desembocava sobre o lago e alguns outros sons da natureza, que foram interrompidos com o badalar do velho sino de bronze, que ficava suspenso sobre a porteira, mas onde ela se encontrava, não conseguia avistar quem havia chegado. Rapidamente, começou a caminhar em direção a entrada do sítio e, mesmo de longe pode perceber Charles, com o seu caminhão cruzando a porteira, aberta pelo seu pai. Seu coração vibrou de intensa alegria, ficando mais excitada ainda, ao notar que sobre a carroceria havia um belíssimo touro, trazido pelo seu mais novo amigo. Após se cumprimentarem com um caloroso abraço, ele falou que o touro era um presente em forma de gratidão pela amizade, só que era um animal de meia idade, que fora ferido num rodeio, fato que a deixou muitíssima revoltada, mas ele disse que havia resgatado o pobre animal de um vizinho de sua família, o que não era verdade. Ela imediatamente o batizou de Vitório, colocando-o num estábulo junto ao burro Eufrásio, que ali descansava, após terem voltado das proximidades do lago, sendo que o calor era intenso por aproximar-se do meio dia. Talya, convidou-o para almoçar, com ele aceitando prontamente, sentando-se a mesa com ela e seus pais. Pela primeira em sua vida, viu uma mesa repleta de diversos tipos de alimentos, todos com uma ótima aparência, não havia nenhum tipo de carne animal ou derivados. Na mesa havia o tradicional feijão, arroz à grega, uma bandeja de inox com saladas de legumes variados, cenoura, beterraba, rabanetes, todos crus, salada de vagem refogada, guisado de carne de soja, com pimentões coloridos picados, milho verde cozido, batatas assadas no forno a lenha, um delicioso suco de acerola feito com água. Charles ficou fascinado com tudo aquilo, saboreando um pouco de cada alimento e, ao terminar a farta refeição, confessou nunca ter degustado algo tão maravilhoso e completo, com doce de banana com cravo e canela de sobremesa. Diante das circunstâncias, pouco falou de si e de suas atividades diárias, mesmo com as indagações dos pais de Talya, que ela os repreendia para não o deixar constrangido. Ele apenas mencionou o fato de que era formado em agronomia há pouco tempo, mas dedicava-se em ajudar os pais no sitio onde morava, por ser o filho mais velho, possuía uma irmã com vinte e dois anos de idade, cursando faculdade de direito, tinha também um irmão, ainda adolescente com seus treze anos de idade que apenas estudava. Ali permaneceram por algumas horas, todos conversando após o almoço, sentados na varanda, rodeados pelo cachorro Thor que repousava próximo a eles e, também por Astolfo, o gato que ronronava, esfregando-se numa das pernas de Charles, pedindo atenção e agrado. Quando Charles preparava-se para retornar a sua casa, ouviu de Talya um imenso agradecimento, pelo touro que havia ganhado de presente, com um pedido de que qualquer hora pudesse conhecer o sítio onde ele morava, mesmo concordando, ele disse um dia cumprir a promessa, mas sentindo um frio na espinha, sabendo que ela poderia descobrir as suas atividades de peão boiadeiro, pois jamais iria querer decepcioná-la. Assim que ele retornava pela estrada dirigindo seu caminhão, começaram a acontecer coisas estranhas em seu íntimo, ele passou a refletir insistentemente na possibilidade em deixar de se alimentar com produtos de origem animal. Algo tocou em seu coração, com a imagem do rosto de Talya e o som de sua suavíssima voz, constantemente presente em seu pensamento, sentindo por ela algo muito forte, diferente, além de apenas uma atração física e jamais poderia imaginar que ela também, naquele exato momento, pensava intensamente nele, estando ambos começando a se apaixonar. Ele continuou por algum tempo com aqueles pensamentos, aproximando-se de uma curva, onde tinha uma ponte estreita sobre o rio que cruzava aquela região, subitamente avistou um javali no meio da estrada, ferido em uma de suas patas traseiras, se arrastando para sair do lugar onde estava. Quando Charles percebeu que iria atropelar o animal, sem muito pensar, desviou bruscamente, perdendo o controle do veículo, saindo da estrada numa manobra alucinante, conseguindo evitar que o caminhão, praticamente desgovernado caísse no rio. Assim que seus sentidos se tornaram mais coerentes, aos poucos foi coordenando os seus pensamentos. Desceu do caminhão, indo na direção onde estava o animal ferido, percebendo que ele havia sido atropelado por outra pessoa que dirigia naquela estrada, tratando de resgatar o javali, acomodando-o no seu caminhão levando-o até uma clínica veterinária, onde após ser examinado, foi constatado que não havia nenhuma fratura, sendo o animal medicado, sendo feito uma pequena imobilização. O veterinário que atendeu o animal ficou grandemente admirado por estar prestando cuidados num animal não doméstico, confessando ser a primeira vez que fazia esta espécie de atendimento. Depois Charles levou o animal consigo, para depois no dia seguinte encaminhar para o santuário de Talya, tendo a certeza de que seria bem cuidado, até que pudesse ser reintegrado na natureza. Quando chegou na sua casa com o javali, tanto os empregados do sítio, quanto seus familiares ficaram perplexos com a estranha atitude dele, pois quando questionado, disse que o animal ficaria lá naquela noite sobre seus cuidados e, que no dia seguinte iria levá-lo ao seu novo lar. Naquele mesmo instante, fez um comunicado aos seus familiares, deixando-os completamente boquiabertos, dizendo convicto que a partir daquela data, ele não iria mais se alimentar de nenhum tipo de carne de origem animal, mas ninguém o levou muito a sério e, logo perceberiam que estavam todos enganados. Naquele instante sagrado, havia começado no seu íntimo, a primeira de muitas mudanças que ainda viriam acontecer e, desta maneira mais um ser humano havia se tornado adepto do veganismo, porém, infelizmente ele ainda iria participar de outro rodeio, mas não seria por muito tempo. Na manhã seguinte era domingo, Charles assim que despertou, foi banhar-se, vestiu-se com elegantes roupas de passeio, perfumou-se como muito tempo não fazia, encaminhando-se para o tradicional café matinal com seus familiares e, para surpresa de todos que ali estavam, ele não tomou leite de vaca, nem queijos diversos, preferindo um suco natural de laranja com acerola feito com água, saboreou um pão torrado com geleia de amora. Assim que terminou de se alimentar, todos curiosos indagavam aonde ele iria tão elegante e o porquê daquela mudança repentina, ele apenas respondeu que em breve todos iriam saber. Antes que ele passasse pela porta que o conduziria ao curral, ouviu seu pai lembrá-lo que na semana seguinte teria a festa do aniversário da cidade, com o tradicional rodeio, montarias, cavalgadas, perguntando se estava tudo certo, ele respondeu afirmativamente com a cabeça que sim, mas seus pensamentos estavam começando a mudar também em relação a tudo aquilo. Foi verificar as condições que se encontrava o javali, pois havia ficado alojado num pequeno cercado preparado por ele, colocando-o no caminhão, partindo até a cidade onde Talya morava. Enquanto isto, ela já havia alimentado com feno, alfafa, milhos, frutas, cada um com sua alimentação adequada, prestando todos cuidados matinais, escovando os pelos do burro Eufrásio, em seguida do cavalo Hércules, cuidando do bode Godofredo e agora também do touro Vitório, das três ovelhas e de todos os outros, conversando com eles, sempre cantarolando alguma canção, com a tua suavíssima voz, fato que deixava todos alegres, saltitantes e radiantes. Ela estava ao mesmo tempo, pensando muito em Charles, imaginando o que ele poderia estar fazendo. Neste mesmo instante, avistou o caminhão dele, que vinha pela estrada de terra levantando enorme poeira, seu coração disparou de extrema alegria, cheia de grandiosíssimo contentamento, correndo em direção da porteira. E mais uma vez chegou Charles, com uma nova surpresa, um javali ferido necessitando de cuidados. Alojaram-no num pequeno cercado, com Talya dando-lhe água, espigas de milho, batatas e mandiocas picadas. Aconteceram duas coisas surpreendentes, sendo que aquele animal silvestre ferido, mesmo estando assustado, veio com dificuldade mancando até ao cocho para alimentar-se, mas Talya pode passar a mão sobre o corpo dele carinhosamente, para a surpresa de todos que ali estavam e, por incrível que pareça, ela percebeu que se tratava de uma javalina, ou seja, uma espécie fêmea, fato que nem mesmo Charles ou o veterinário que havia prestado os cuidados dos ferimentos chegaram a observar. Desta maneira, Talya batizou a javalina de Jacinta, começando a fazer parte daquela família de amigos animais. Passaram a tarde juntos, colheram frutas, alimentaram os animais e, quando o sol se punha no horizonte ficaram sentados próximo do lago, ouvindo o barulho da água que vinha do ribeirão, desembocando por entre as pedras, os pássaros gorjeavam pelos ares, o ziziar das cigarras cantavam nos troncos das árvores, ficaram assim alguns minutos em silêncio, de olhos fechados um ao lado do outro e, quando abriram os olhos, quase que simultaneamente, seus olhares se cruzaram de uma maneira indescritível e, inevitavelmente sem dizerem uma só palavra, seus lábios tocaram-se automaticamente, primeiro um beijo suave, após uns beijos um pouco mais profundos, completamente intensos. Deitaram-se de frente sobre a relva, ficando lado a lado, algumas vezes se beijando, outras apenas se acariciando mutuamente, enquanto a noite caia lentamente, com as primeiras estrelas brilhantes ofuscando na imensidão do céu, quando de repente, perceberam que só estavam os dois ali, os animais já haviam voltado para o curral, só ouviam o piar da coruja solitária, que observava-os atentamente, o cricrilar de grilos do mato, o coaxar das rãs e pererecas, a bioluminescência das vaga-lumes fêmeas no seu incessante pisca pisca, atraindo os vaga-lumes machos para o acasalamento, a lua cheia que apontava por detrás da montanha, estando eles intensamente envolvidos, vivendo uma delirante noite de amor, sem terem planejado nada, permaneceram abraçados, sentindo o calor dos atraentes corpos, sentindo o pulsar acelerado dos corações, depois num ritmo lentíssimo, até que adormeceram um pequeno período de tempo, até despertarem um pouco assustados, porém, felizes estando completamente apaixonados. Perceberam que já era um pouco tarde, levantaram-se caminhando juntos, as mãos entrelaçadas palma com palma, rumo a porteira onde estava estacionado o caminhão de Charles, trocaram vários fortíssimos abraços e, olhando um nos olhos do outro, despediram-se com um suavíssimo beijo, ambos sentindo o desejo de em breve se reencontrarem, retornando ele para sua cidade. Na manhã seguinte, como estava de férias de seu trabalho, passou a dedicar-se integralmente, aos cuidados dos novos animais do teu santuário. O seu pai preparou uma enorme placa de madeira, mudando o nome do sitio da boa esperança, para Santuário da Luz Animal, colocando acima da porteira do sitio. Noutra belíssima manhã de inverno, onde o sol lentamente despertava, um dia simplesmente promissor, certamente encantador, completamente renovador, aconteceu algo totalmente estranho no Santuário da luz animal, deixando todos totalmente perplexos, ao ponto de gerar um certo desconforto entre Charles e Thalia, ocasionando vários tipos de sensações em pouquíssimo tempo, algumas boas, outras nem tanto, mas que surpreendentemente teve um arrojado final feliz. Muitas pessoas que presenciasse tal fato, poderiam achar absurdo um casal entrar em contenda, por tudo que haveria de ocorrer, mas os sentimentos de amor e respeito pelo reino animal, era algo constante na vida de Thalia e, Charles pela pouquíssima convivência já havia começado a mudar seu modo de pensar. Assim, ela que estava acordada desde a madrugada, prestava os cuidados aos amigos animais, quando percebeu que não havia água corrente, vindo pelo sistema de canos de um reservatório, próximo ao curral, que também abastecia o pomar ali existente. Seus pais haviam saído antes do amanhecer, assim ela resolveu ir até o pequeno lago, verificando a instalação elétrica lá existente, onde haviam disjuntores e, que quando acionados, movimentavam o motor bombando agua até o reservatório. Após verificar todas as instalações, notando que ali estava tudo perfeitamente normal, resolveu voltar por um trilho, acompanhando a tubulação de água para verificar algum possível vazamento, mas nada encontrou até retornar ao curral, quando lembrou que havia na parte de trás do celeiro, próximo a enorme caixa de água, um filtro para retirar pequenas folhas, dentro de uma caixa de cimento junto a um motor elétrico que bombeava a água. Quando ela ia verificar o disjuntor de outra caixa de energia elétrica que ali havia, viu Charles chegando, pois haviam combinado de tomar um café da manhã juntos e, posteriormente passariam aquele período juntos, aguardando os pais de Thalia, que retornariam no início da tarde. Logo, ela descreveu para ele tudo que estava acontecendo até aquele momento, durante um breve café matinal. Em seguida, ambos foram verificar a caixa de cimento, onde estava o motor e o filtro e, quando retiraram a tampa de madeira, já bem gasta pelo tempo, saltou de lá uma pequena rã de minúsculo porte, misturando-se as folhas úmidas no chão, proporcionando muitas risadas pelo susto que levaram. Notaram que o motor estava queimado, estando submerso em uma grande quantidade de água, que havia vazado pelo filtro onde haviam folhas presas, retiradas imediatamente por Charles, notando que quando colocava a mão na água, sentia um pequeno, quase imperceptível choque elétrico. Ele imediatamente desligou a chave geral da caixa de força, podendo assim retirar o motor para efetuar conserto ou troca-lo, quando observou Thalia, que retornava da direção da casa, trazendo um pequeno balde para drenarem a água, mas pediu a Charles para que pegasse a rã na intenção de protege-la, mas Charles assim que pegou o pequeno anfíbio, fechando delicadamente com suas duas mãos, colocou-a novamente na água, também com o pensamento de preserva-la, já que ali era seu habitat natural, tratando-se de um anfíbio, fato que deixou Thalia um tanto aborrecida. Perceberam então que a pequena rã, estava com uma de suas pernas esticadas, afundando lentamente, paralisada, imóvel. Charles, colocou seu braço inteiro até o fundo da caixa e, com as mãos em formato de concha resgatou a pequena rã colocando-a finalmente no balde, que estava ali ao lado deles, com uma pequena quantidade de água, mas a pequena rã não mais se mexia, estava sem respirar, inerte, morta. Thalia, ficou completamente transtornada pelo fato de Charles não ter dado ouvido, ou seja, por ele ter ignorado os incessantes pedidos feito por ela anteriormente. Ele ficou bastante triste, com bastante remorso, pois acreditava que estava ajudando a rã, mas quando ele a retirou da água, pode perceber que ainda era perceptível uma pequena descarga elétrica, mesmo com a chave desligada, vindo provavelmente de outra tomada que não fazia parte daquela outra instalação. Thalia, disse com voz alterada para Charles enterrar a pequena rã ali perto, estando completamente nervosa ainda, retirando-se em direção da casa. Eufrásio, o burro e os outros amigos animais que estavam nas proximidades, puderam observar o desespero de Charles que olhava dentro do balde, onde a pequena rã jazia boiando sobre a água. Ele pegou-a delicadamente na mão, ousando ainda fazer uma pequena massagem na barriga dela várias vezes, levemente com o dedo indicador, com a intenção de que ela revivesse, pois quando ele ainda era uma criança, ouvia de seus avós que algumas espécies de rã, conseguiam ficar bastante tempo sem respirar, mas naquele caso era inútil acreditar em tal fato, pois ela estava morta mesmo. Finalmente, ele dirigiu até próximo ao pomar e com uma das mãos abriu uma rasa cova, sentindo que não deveria enterra-la, pois por impossível que fosse continuava acreditando num milagre, chegando a soprar sobre ela quando estava em uma de suas mãos, como se fosse possível dar fôlego a ela, mesmo depois de ter passado mais de meia hora desde que tudo tinha acontecido. Charles, cobriu novamente a rasa cova, mas sem coloca-la, pondo-a esticada debaixo de um pequeno arbusto, cobrindo-a com folhas secas, retirando-se dali, quando encontrou Thalia que vinha em sua direção, um pouco menos nervosa do que anteriormente, abraçando-o gentilmente, pedindo desculpas por estar alterada emocionalmente, ao mesmo tempo olhando na direção na cova, onde ele afirmava ter enterrado a rã. Charles, ali abraçado a ela pediu desculpas por não ter agido conforme seu pedido. Teu sentimento era de tristeza absoluta, estando arrasado por tudo que estava acontecendo. Ele entrou para tomar um banho de chuveiro, pois depois levaria o motor com defeito para consertar. Aparentemente tudo estava bem entre eles, mas em cada intimo havia a dor individual de cada um, principalmente ele por não ter escutado desde o princípio. Enquanto banhava-se havia um sentimento frustrante, pois eles se conheciam há pouco tempo ainda, mas ele era do tipo que aparentava ser um tanto frio, mas na verdade era bastante sincero em relação aos sentimentos. Se pudesse voltar no tempo, pensava ele, com sentimento de culpa sabendo que foi sua mão que colocou a pequena rã na água da vida para a morte. Quando ele finalmente estava prestes a sair, resolveu ir até o local onde havia deixado a rã, completamente esticada sobre as folhas, pois já fazia quase uma hora que tudo havia acontecido, podendo assim finalmente enterra-la. Assim ele ergueu o pequeno arbusto com uma das mãos, verificando que a pequena rã não mais estava ali na posição que havia deixado, pois estava alguns centímetros adiante na posição de salto. Mesmo sem acreditar no que via tocou o dedo indicador sobre ela que saltou imediatamente para fora do arbusto. O impossível havia acontecido, pois a rã estava viva, totalmente sã como se nada tivesse ocorrido. Thalia, estava vindo em sua direção, quando Charles chamou pelo seu nome em alto tom, chegando inclusive a assusta-la, mas ao perceber a alegria e euforia que ele se encontrava, correu em sua direção percebendo que a rã estava ali, diante dos seus olhos, seu coração vibrou alegremente, não podendo conter as lágrimas, abraçaram-se mutuamente num êxtase total. Depois acomodaram-na num grande recipiente de vidro com um pouco de água, algumas pedras e pequenas plantas até que pudessem reintegra-la com segurança na natureza. Muitas vezes em nossas vidas acontecem coisas em que achamos impossível, mas ali diante deles perceberam a força da fé e do amor. Posteriormente, descobriram com uma amiga bióloga, que aquela rã se tratava de uma perereca de banheiro, nome o qual era conhecida popularmente e que possuía uma de suas características no qual fingia estar morta para evitar predadores. Acharam tudo que fora narrado interessante, mas sabiam que tudo havia acontecido de uma forma inusitada, totalmente inexplicável, pois se ele tivesse enterrada a rã o desfecho seria outro. Foi uma semana intensa, com novos acontecimentos que estariam por vir, alguns bons e outros decepcionantes. Durante aquela semana não mais viu Charles, mas seu pensamento estava a toda hora nele, no seu jeito especial, com a saudade invadindo seu coração e, assim que a javalina estava curada soltou-a no pasto, acreditando que ela iria embora, mas por incrível que pareça, permaneceu ali no pasto, juntando-se aos demais animais. Em um determinado momento, ela recebeu uma ligação de alguns amigos, todos ativistas de direitos dos animais e, que possuíam uma organização não governamental, pois havia uma égua abandonada na estrada de terra, que ficava próxima a fazenda que os animais resgatados por ela, haviam passado toda sua vida, ela e seu pai, foram imediatamente num pequeno caminhão que possuíam, no intuito de resgatar o pobre animal. O dia estava um pouco nublado, com o céu num tom acinzentado com algo estranho no ar, este era o pressentimento que Talya sentia, mas ao mesmo tempo procurava aquietar os seus pensamentos e coração. Passaram nas proximidades da cidade, onde ficava o sitio de Charles, mas tiveram que fazer um grande entorno, porque a estrada estava em obras, até chegarem finalmente onde os amigos estavam com a égua aguardando a chegada deles. Quando ela se aproximou do animal, visualizando o estado em que se encontrava, começou a apresentar um choro convulsivo, difícil de controlar as lágrimas e a dor, pois era quase impossível acreditar que um ser humano pudesse praticar tanta crueldade contra um indefeso animal. A égua de cor branca, apresentava vários ferimentos no dorso, também na região lombar provocado por agressões feitas por chicotes, havia também a presença de bicheiras em formas de bernes, totalmente emagrecida, enfim, maltratada e abandonada. Assim que conseguiu controlar as lágrimas, amparada por seu pai e os amigos que haviam encontrado a égua, puseram-na no pequeno caminhão de seu pai, começando a viagem de retorno ao teu santuário. Ambos, pai e filha, vinham conversando indignados com tamanha crueldade em relação a égua e, quando aproximavam-se da cidade, próxima ao sitio onde Charles residia, a estrada havia acabado de ter sido bloqueada totalmente, obrigando-os a fazerem um desvio maior daquele anteriormente previsto, tendo que passar por dentro do município. Talya, estava ansiosa para chegar logo no sitio, onde poderia começar o tratamento dos ferimentos da égua, já batizada de Esmeralda. O destino algumas vezes é cruel quando menos se espera, como se já não bastasse a tristeza que Talya sentia naquele momento, aconteceu algo que a deixou completamente destruída. Ao passarem numa enorme avenida que cruzava toda a cidade, aos arredores da igreja matriz, ela avistou um grande outdoor, anunciando o rodeio que viria a acontecer nos dias seguintes, no próximo final de semana e, para sua maior decepção, ali havia uma enorme foto de Charles, vestido de peão boiadeiro, montado sobre um cavalo alazão, o atual campeão desde o evento passado. Naquele exato trágico momento, soltou desesperadamente um grito de pavor, assustando seu pai, pois quase sofreram uma colisão com outro veículo. Seu Olavo, atônito, mesmo sem entender o que estava acontecendo, parou o caminhão no acostamento, consolando-a imediatamente, e ela mal conseguindo explicar o que teria acontecido. Ele abraçou-a, encostando-a em seu ombro, permaneceram ali por vários minutos, até que ela apontou o dedo indicando em direção ao cartaz. Foi então que seu pai pode compreender, o motivo daquele descontrole emocional, algo raríssimo de acontecer, desde que ela havia tornando-se adulta. Senhor Olavo, lembrou-se da adolescência dela, quando sua filha tinha uns treze anos, ele e a esposa viajavam de carro retornando da capital, chegando nos arredores da cidade onde moravam, havia um grande congestionamento de veículos, quando perceberam no acostamento da estrada, um ônibus escolar com a frente totalmente danificada, a presença de ambulâncias e carros de resgate, deixando-os totalmente transtornados, porque era a mesma condução que Talya com seus amigos voltavam do colégio, havia também no meio da pista um cavalo morto com as vísceras expostas, pois fora atropelado pelo ônibus. Pararam alguns metros adiante, mesmo com a ordem de policiais que controlavam o trânsito dizendo para não o fazer, depois foram informados e tranquilizados, que apenas o condutor do ônibus precisou de cuidados mais intensos, que apenas alguns jovens tiveram escoriações leves sendo encaminhados ao pronto socorro local. Quando acabavam de obter as informações com o policial, ouviram a voz de Talya que vinha correndo desesperada na direção deles, chorando muito e abraçando-os. Agradeceram assim ao Eterno sagrado Deus, por não ter acontecido nada pior com nenhum deles, mas infelizmente o cavalo não tinha tido a mesma sorte. Talya, havia ficado traumatizada ao extremo, porque estava sentada no primeiro banco, usando corretamente o cinto de segurança, sendo que percebeu o exato instante que o cavalo entrou a galope na pista e, antes mesmo de haver a colisão fatal, o animal olhou na direção do ônibus, fitando os olhos dela pela última vez, ficando gravada aquela trágica imagem em seu pensamento. Foi assim que a partir daquele dia, Talya nunca mais se alimentou de qualquer tipo de carne e de seus derivados, transformando-se numa praticante do veganismo, em seguida também seus pais se tornaram adeptos pela causa animal, retirando estes alimentos de sua rotina diária. Depois que a decepção da visualização do cartaz, anunciando o rodeio estava menos impactante, Talya pediu para que o pai retomasse a viagem de volta para casa, preferindo ficar a maior parte do tempo em silêncio, coordenando os pensamentos em tudo que havia acontecido nos últimos dias, desde que encontrara o burro Eufrásio, junto aos demais animais na beira da estrada. Relembrando o dia que Charles apareceu para presentear com o touro Vitório, depois com a javalina, também recordou os momentos que juntos ficaram na beira do lago, a intensidade daquele mágico, inesquecível momento e, assim chegaram na porteira do teu santuário, ainda com lágrimas nos olhos, com o coração ferido, dizendo para o seu pai que jamais gostaria de encontrar Charles novamente, ele respondeu afirmativamente que respeitava sua opinião. Assim que desceram com a égua ferida, Talya com auxílio de seu pai deram água, cenouras e milho para ela comer, pois estava completamente faminta, em seguida deram um banho completo nela, começaram a tratar os ferimentos com medicamentos, retiraram inúmeras bicheiras sobre todo seu corpo. A égua Esmeralda sentiu pela primeira vez, o verdadeiro amor vindo de seres humanos de luz, pai e filha unidos no mesmo ideal, enquanto isto sua mãe preparava carinhosamente a refeição para eles. O burro Eufrásio, tudo acompanhava de perto, toda vez que Talya estava no curral fazia carícias no seu ombro, tudo para chamar a atenção, pois ele era um animal diferenciado, sendo que Talya sempre dizia que ele possuía atitudes como um ser humano cheio de luz. Outro animal bastante carinhoso era o bode Godofredo, também carente de atenção como todos os outros e, percebendo que Talya estava triste, também vinha acaricia-la a todo instante, sendo que isto a confortava. Charles, por sua vez preparava-se para o rodeio, sempre incentivado pela sua família e alguns de seus amigos, mas algo estava diferente daquela vez, desde que ocorrera o último rodeio, com ele demonstrando tristeza e abatimento, desejando não fazer mais parte de tudo aquilo, mas seria criticado pela família caso não participasse. Enfim, chegou o final de semana e, já no sábado desde o período matutino, houveram diversas comemorações com fogos de artifícios, missa, procissão, uma quermesse usada para fins beneficentes, entre outras. Quando chegou a noite houve o tradicional show com músicas regionais, rifas e sorteios de brindes diversos, começaram as apresentações de vários cavaleiros, com a arquibancada repleta de pessoas que vieram prestigiar e se divertirem. A apresentação de Charles foi a última daquela primeira noite e, mesmo ele estando apático, tirou grandes aplausos do público, levando-os ao delírio por estar classificado para a grande final, que ocorreria na noite seguinte. Após o encerramento desta primeira apresentação, Charles foi descansar completamente exausto, recusando o convite de seus amigos e de algumas garotas, que queriam sair para comemorar após o encerramento. Quando já dormia profundamente, começou a sonhar com Talya muito triste, chorando bastante e, em seguida passou a ter uma série de pesadelos confusos. Nele havia uma vasta plantação de milho, mas no momento em que se preparavam para a farta colheita, um bando de corvos gigantescos, sobrevoavam todo milharal devorando inúmeras espigas, carregando-as nos bicos para longe, depois em seguida o céu anteriormente azul e ensolarado, tornou-se cinza em poucos instantes, até ficar totalmente escuro como se fosse noite, vindo um tremendo temporal com ventos impressionantes, destruindo totalmente o pouco que havia sobrado do milharal, arrancando árvores e outras plantações, destelhando a casa onde morava, levando os animais do campo as alturas, uma catástrofe geral aos olhos vistos. Depois formou-se um enorme redemoinho, com uma tempestade de areia, saindo a galope do interior dele, um belíssimo cavalo puro sangue inglês, como nunca havia visto e, montado sobre ele um bravíssimo cavaleiro bem trajado, todo imponente, só que Charles não conseguia visualizar o seu rosto, conseguindo apenas visualizar seus dois olhos, com duas lágrimas de sangue que escorriam levadas pelos ventos. Acordou totalmente assustado, demorando para conseguir dormir novamente, sendo uma noite de sono bastante agitada. Sentiu naquele instante bastante saudades de Talya, entretanto ao mesmo tempo, possuía um grande remorso que o remoía interiormente, por não ter contado suas atividades de peão para ela, tendo omitido algo que ele tinha consciência que iria desagrada-la. Ao despertar pela manhã, saiu apressadamente rumo ao sitio onde Talya morava, mas ao chegar encontrou a porteira trancada com cadeado, tocou o sino na esperança de que fosse atendido, porém, ela que prestava os cuidados diários aos amigos animais, percebendo de longe a sua notada presença, ignorou as insistentes batidas no sino, pedindo gentilmente ao seu pai que fosse atende-lo. O senhor Olavo, dirigiu-se calmante em direção a porteira, explicando a Charles o motivo dela não querer recebe-lo, explicando-lhe toda a sua mágoa, expondo a decepção que ela estava sentindo, chegando educadamente a dispensa-lo, pedindo que não mais retornasse ou procurasse por sua filha. Ele foi embora para a sua cidade muito triste, mas sabia em seu íntimo que não deveria ter enganado, pois, a mentira é algo certamente imperdoável, entre todos os seres humanos, desde o princípio de todos os tempos. Durante todo este dia, após Charles ter voltado para sua cidade, Talya mesmo estando magoada com tudo que havia acontecido, procurou ao máximo ocupar a sua mente dedicando nos cuidados de todos os animais do santuário. Tratou de todos intensamente, cuidou dos ferimentos de Esmeralda, alimentou-os, escovando os pelos e a crina de todos equinos, cantando, falando com eles, recebendo vários agrados do burro Eufrásio, do bode Godofredo, o qual ela tinha muita afeição, do cachorro Thor que ali perto brincava com um pedaço de galho e, assim ela amenizou um pouco a dor que sentia em relação a tudo aquilo. Sentiu a ausência do porco Juvêncio, mas tranquilizou-se quando avistou ele vindo correndo de longe, voltando com a javalina da direção do lago, passando ambos por entre as três ovelhas bastante felizes. Naquele mesmo instante na cidade vizinha, continuavam as comemorações com diversos eventos, muita queima de fogos de artificio, algo que Talya e seus ativistas amigos detestavam, por causar mal-estar aos queridos animais de todas as espécies. Charles, passou o dia todo inquieto, demostrando arrependimento por tudo que fizera, pensando numa maneira de desistir de tudo, mas lhe faltava coragem de enfrentar a sua família e amigos. Na verdade, estava em grande conflito com o seu eu interior, numa luta contra o próprio ego, pois não participava dos rodeios pensando apenas na questão financeira, mas pelo prazer que causava a si mesmo, por toda a bajulação que havia sobre ele. Naquela mesma noite, após as apresentações de outros concorrentes ao título de campeão regional, houve antes a prova do laço comprido, o qual um novilho deveria ser perseguido pelo peão, após soltarem do brete, atirando um laço sobre seu pescoço ou chifres, para posteriormente imobilizarem o pobre animal, conforme as regras do rodeio, mesmo causando dor e estresse ao animal. Assim, finalmente chegou a vez da participação de Charles, o qual montado em seu cavalo, aguardava o momento para realizar a prova, sendo solto o novilho na pista também conhecida como chancha, saindo ele em perseguição ao animal, atirando a laçada sobre seus chifres, mas assim que ele achou ter conseguido prende-lo ou domina-lo, o boi conseguiu livrar-se do laço, partindo na direção de Charles, derrubando-o do cavalo que montava, golpeando-o no seu tórax, lançando-o no ar, sendo depois pisoteado várias vezes pelo boi e seu próprio cavalo, ferindo-o gravemente, fazendo com que ele perdesse a consciência, mesmo com a rápida intervenção dos fiscais presentes na pista. E toda aquela multidão na arquibancada, que até aquele momento vibrava, calaram-se por alguns instantes em pânico, juntos estavam seus familiares, amigos de infância, muitos conhecidos que acreditavam que ele tivesse morrido. O corpo de bombeiros agindo rapidamente, com a eficiente equipe de resgate no atendimento dos primeiros socorros, encaminharam-no posteriormente, inconsciente, para o serviço médico local. A cena foi extremamente chocante, pois em todos os outros rodeios anteriores, jamais havia acontecido algo tão trágico, com nenhum dos peões participantes, somente os animais usados durante os rodeios que eram feridos gravemente, maltratados ao extremo, com a maioria deles encaminhados, posteriormente, para abates em matadouros, num estado lastimável e, jamais nenhum ser humano se importaram com isto. Com todos estes gravíssimos acontecimentos, ainda deram continuidade a outras atrações nos eventos do rodeio, até o encerramento naquela mesma noite. Enquanto isto no próprio hospital local, após realizarem exames de raio X, tomografias computadorizadas diversas, ele já havia sido encaminhado a uma unidade de cuidados intensivos, mantido desta forma em coma induzido por sedativos, apresentava ferimentos com hematomas em ambas as pernas, com múltiplas fraturas pelo corpo, uma no quadril, devido à queda do cavalo, fratura em duas costelas, constava também um traumatismo craniano grave que lhe causava aquela inconsciência. Na manhã seguinte, antes mesmo de clarear o dia, Talya como de costume prestava os cuidados diários aos amigos animais, estando o tempo nublado, o céu ligeiramente num tom cinza acentuado, quando começou uma intensa ventania, iniciando uma fortíssima tempestade, com raios, relâmpagos e trovões, havendo a precipitação de uma chuva torrencial. Ela rapidamente alojou os animais num abrigo seguro, dentro do enorme celeiro próximo ao curral, onde eram depositados alimentos agrícolas das colheitas, fenos de alfafa e outras plantas, diversas ferramentas usadas na lavoura, ficando ali junto aos seus amigos animais assustados, conversando com eles, enquanto não passava o temporal. Talya, acabou adormecendo ali mesmo deitada sobre o feno, por várias longas horas, voltando a despertar com a chegada do seu pai, vestido com capa de chuva, pois mesmo tendo diminuído a quantidade de volume da chuva, ainda não havia cessada totalmente. Ele avisou-a que a energia elétrica havia sido interrompida, por causa do intenso vendaval, principalmente com a queda de galhos de árvores, sobre os fios de alta tensão dos postes na estrada vicinal, que era usada para chegarem no sítio, assim estavam eles incomunicáveis naquele momento. Assim que a chuva se tornou fina, aos poucos foi parando a ventania, transformando-se numa suave brisa, com o sol surgindo por detrás das nuvens que eram ainda espalhadas, saíram juntos para verificarem as condições que se encontrava o santuário, abrindo o enorme portão do celeiro com os amigos animais saindo um a um, vagarosamente, em direção ao pasto. Ela percebeu que o curral, a casa onde morava, enfim todas as construções estavam em boas condições, haviam apenas muitos galhos espalhados pelo pasto, trazidos pela força dos ventos e das enxurradas, mas nenhum prejuízo material em relação as árvores frutíferas, as plantações de milho e mandioca, sentindo desta maneira uma enorme sensação de alívio com muita gratidão. Durante toda a manhã do período de chuvas, ventanias, com intensas tempestades assustadoras, atingiram várias cidades daquela região incessantemente, enquanto os familiares de Charles aguardavam no hospital por informações médicas recentes, sabiam somente que o estado de saúde dele era gravíssimo, correndo o risco de morte. Foram informados que fora realizado uma cirurgia em seu quadril, sendo colocada uma placa, porém, o quadro mais crítico era em relação a parte neurológica, pois dependia de respostas motoras para ser melhor avaliado, considerado altamente gravíssimo. Também a equipe médica estava cogitando transferi-lo para um hospital com mais recursos, situado na capital estadual, mas tudo dependeria de novas avaliações nas próximas quarenta e oito horas. Com toda esta correria e aflição pelo que passavam, sobre o estado de saúde de Charles, souberam que o temporal havia provocado grandes estragos por toda cidade, causando enchentes no rio que cruzava a cidade, alguns desabamentos em construções mais antigas, também o ginásio de esportes municipal havia sido destelhado totalmente, porém, sem nenhuma vítima fatal. Os piores estragos haviam sido na zona rural, na parte mais alta do município, onde ficava o sítio deles e, foram informados por alguns de seus empregados, que tinham vindo saber sobre a saúde de Charles. Contaram que a casa principal, onde eles residiam, tiveram suas telhas arrancadas com a força dos ventos, que todo milharal havia sido praticamente destruído por uma chuva de granizos e, antes mesmo de finalizarem os trágicos relatos, informaram também que o pequeno lago, onde toda água era represada havia se rompido, levando rio abaixo toda criação de peixes, um prejuízo financeiro incalculável. Todos familiares de Charles ficaram desolados, completamente abatidos, mas como a situação clínica dele inspirava cuidados, deixaram os problemas do sítio para resolverem em outra oportunidade. Finalmente, o médico neurologista especializado, veio até eles que aguardavam ansiosamente, atualizou todas as informações anteriormente passadas, confirmando que o quadro dele não havia tido nenhuma evolução naquele pouco tempo e, que deveriam aguardar o tempo previsto, onde as medicações poderiam surtir o efeito desejado e, novos exames seriam realizados para um melhor diagnóstico. A irmã de Charles ficou encarregada de permanecer no hospital, enquanto seus pais e seu irmão retornaram ao sítio para avaliar a real situação, após a tempestade de granizo, seguido posteriormente do vendaval. Ao chegarem na entrada do sítio, a visão foi aterrorizante, a destruição era quase total, pois a casa onde moravam estava sem telhado, completamente alagada, estragaram os móveis, roupas, eletrodomésticos e, no celeiro também inundado, quase foram destruídas completamente, as maquinas agrícolas para plantio e colheita de grãos em geral, entre outras que estavam danificadas. Verificaram o milharal que estava prestes a ser colhido, para depois ser comercializado, parcialmente destruído com o lago praticamente sem água, enfim, quase uma perda total de todos os bens que possuíam. O pai de Charles, solicitou aos poucos empregados que tinha, para que dessem início a reconstrução do telhado da casa, contratando mais alguns homens para auxiliarem na árdua tarefa e, sua esposa ficou lá com o filho caçula, avaliando os prejuízos dos bens que possuíam, enquanto isto ele voltou ao hospital, para obter novas informações sobre a saúde de Charles, passando o dia todo lá com a sua filha, mas nenhumas novas informações obtiveram até aquele momento. Naquela mesma noite, todos de sua família tiveram que se hospedar num hotel local, enquanto que a casa deles era reformada até que adquirissem novos bens materiais. Talya, continuava no santuário cuidando de tudo com muito amor, com ajuda de seus amáveis pais, não tinha notícias nenhuma sobre o que havia acontecido na região onde moravam. Durante aquela noite defronte ao curral, fez a tradicional fogueira, sentando-se ao lado dela junto com o burro Eufrásio, seu fiel companheiro, com o bode Godofredo acariciando-a todo momento, ficando ali por algumas horas com seus amigos animais, pensando em várias coisas, principalmente em Charles, sem sequer imaginar tudo que havia acontecido. Logo pela manhã seguinte, acordou bastante radiante, prestando os cuidados aos amigos animais, cantando para eles, totalmente feliz, como há tempos não fazia, procurando assim espairecer, repousando a sua mente. Seu pai havia saído para providenciar a manutenção no seu pequeno caminhão, que apresentava um pequeno vazamento de óleo, indo num mecânico no centro da cidade onde moravam. Enquanto estava sendo realizado o reparo, estando a televisão na oficina ligada num telejornal local, apresentando as notícias do vendaval que havia acontecido no dia anterior na cidade vizinha, com vários estragos, inundações, o repórter começou a falar sobre o fatal acidente, durante o rodeio do último domingo, envolvendo o peão boiadeiro, sobre seu real estado de saúde considerado gravíssimo, sendo exibida a cena de um helicóptero que faria em breve, a transferência dele para a capital do estado, mostrava também o sitio da família dele e de outros vizinhos, parcialmente destruído. O senhor Olavo, ficou completamente transtornado, imaginando a reação de sua filha Talya, quando soubesse de todo ocorrido, pois ele sabia do sentimento que havia se formado entre os dois, mesmo depois ter sido criada uma barreira, um enorme muro entre eles, pelas diferenças de opiniões ideológicas, mas de qualquer maneira, ele teria que dar a notícia a ela, assim que retornasse ao Santuário da Luz Animal. Durante todo aquele dia, a equipe médica chamou os pais de Charles, indicando uma transferência urgente para um hospital de grande porte na capital do estado, onde teriam mais recursos e novos exames poderiam ser realizados. Como o estado de saúde dele era gravíssimo, foi sugerido a transferência via aérea, feita por um helicóptero particular pago por seus pais, pois a remoção feita via terrestre demoraria muitas horas, havendo risco de morte. E assim, naquele mesmo dia, ele já estava aos cuidados de uma das melhores equipes de médicos neurologistas daquele renomado hospital, tendo a possibilidade de precisar de uma intervenção cirúrgica, após serem realizados os mais sofisticados exames de imagem. No início da noite, após ter feito o conserto do caminhão na oficina mecânica, o senhor Olavo chegou finalmente em casa, percebendo que a energia elétrica havia sido restabelecida, encontrando Talya no curral, prestando os últimos cuidados com os amigos animais, tratando os ferimentos da égua Esmeralda, o qual já estava apresentando os primeiros sinais de melhora, ela estava tranquila, cantando para eles totalmente despreocupada. O senhor Olavo chamou a esposa, pedindo que ela aguardasse na varanda da casa, chamando Talya calmamente para sentarem, dizendo que precisariam conversar naquele mesmo instante, ela mesmo estranhando aquela atitude inesperada, aceitou prontamente, indo com ele para a varanda que circundava a casa, mas percebeu pela sua expressão de aparência tensa, que havia alguma coisa estranha no ar, tratando-se de algo muito grave. Em pouquíssimas palavras, ele relatou o que havia acontecido com Charles e, que foi noticiado pela televisão na oficina mecânica. Por um brevíssimo instante, ela permaneceu emudecida, com os olhos arregalados, sem dizer nenhuma palavra, totalmente calada, em seguida começou a chorar copiosamente, amparada pelos seus pais. Ficaram ali os três, pai, mãe e filha, abraçados por alguns minutos, esperando que ela se recuperasse da triste notícia e, assim que se encontrava mais calma, comentou com os pais que no dia seguinte viajaria para a capital, com o intuito de visitá-lo no hospital, obtendo notícias concretas sobre seu estado geral, também ela já havia programado anteriormente a viagem para aquela semana, pois iria fazer compras de produtos veganos, difícil de encontrar na cidade onde residia. Pouco antes de amanhecer o dia, seu pai saiu para levá-la de carro até a rodoviária, onde ela embarcaria num ônibus fretado, com destino à capital estadual, distante quase uns centos e cinquenta quilômetros, incumbindo seus pais de cuidar dos animais do santuário, até que ela retornasse na noite daquele mesmo dia. Foi uma das viagens mais longas que Talya fez naquele dia, mesmo que a duração tenha sido um pouco mais de duas horas, ela estava tensa pelo que havia acontecido com Charles, pois não desejava jamais mal para ninguém, principalmente por alguém com que havia se relacionado, mesmo de uma maneira curta, porém, envolvendo um fortíssimo sentimento formado entre eles. Ela mentalizava somente coisas boas para ele, enviando ótimas vibrações de cura, muitas energias positivas para ele, também gostaria de ver sua recuperação em breve, para poderem conversar, acreditando que ele largaria a sua vida de peão boiadeiro, rodeios, se o sentimento dele fosse tão forte, o quanto ela sentia em relação a ele, poderiam até construir algo junto e, assim passaram as horas, chegando no terminal rodoviário, embarcou no metrô até chegar no hospital. Talya, nem imaginava que antes mesmo de poder vê-lo, teria que enfrentar algumas outras dificuldades, pois ao entrar no saguão dirigindo-se a recepção para se identificar, aguardando o horário permitido para a visita, já que havia um número limitado de pessoas permitidas pela administração. Assim que ela foi liberada para subir até o andar da unidade de terapia intensiva, entrando no elevador, lá estava o pai de Charles, o qual ela só conhecia pelo nome, acompanhado do primo de Charles, que já tinha ouvido falar de Talya, pois era muito próximo dele. Quando percebeu na etiqueta de identificação o nome dela, revelando quem ela iria visitar, cochichou no ouvido do tio, que começou a questionar o que ela fazia ali, dizendo que depois que Charles a conhecera havia ficado diferente, adquirindo hábitos de se tornar vegano, que não queria mais participar de rodeios, enfim, fazendo muitas críticas a ela, deixando-a totalmente constrangida, triste, mas ela preferiu o silêncio e nada respondeu. Ao chegarem no setor, onde ele estava internado, esperou um pouco para realizarem a troca de visitas, podendo permanecer por apenas trinta minutos, tempo mais que suficiente. Quando entrou na unidade, encontrando-o inconsciente, com o quadril imobilizado com gesso, várias escoriações com hematomas em ambas as pernas, cheio de aparelhos por todo o corpo, eletrodos para monitorização cardíaca, encontrava-se com respiração artificial por tubo endotraqueal, vários tipos de sondas, uma cena bastante chocante, controlando várias vezes seu choro, com algumas lágrimas rolando rosto abaixo. Permaneceu alguns minutos em profundo silêncio, para depois segurar carinhosamente na mão esquerda de Charles, abaixando-se um pouco, aproximando sua boca de teu rosto dando-lhe um leve beijo, sussurrando em seu ouvido palavras positivas, dizendo que logo ele estaria recuperado, que ela sentia por ele um sentimento de amor como nunca havia sentido. Naquele mesmo instante, ela o sentiu apertar suavemente a sua mão, que também segurava a dele, suspirando profundamente, começando a piscar os olhos algumas vezes, abrindo-os lentamente, deixando ela em lágrimas de alegria e contentamento, mesmo ele demonstrando estar confuso. Solicitou auxilio da equipe de enfermagem, vindo imediatamente o médico intensivista, acompanhado do neurologista que havia acabado de chegar, pois Charles encontrava-se agitado, tentando falar algo, querendo tirar os aparelhos de seu corpo. Talya, completamente emocionada, afastou-se um pouco do leito para poderem dar assistência necessária para ele, retiraram a cânula traqueal, aplicando um leve sedativo enquanto iriam observar sua evolução, assim ele adormeceu. Naquele momento, ela pode perceber a presença da mãe dele parada um pouco atrás dela, emocionada, também em lágrimas, abraçando Talya em forma de agradecimento, pois havia presenciado toda aquela cena com demonstração de afeto, dizendo que mesmo não a conhecendo, estava feliz pela presença dela, por ter percebido o quanto havia sido gratificante tudo que estava acontecendo. Saíram juntas, indo na direção da cantina social onde sentaram, almoçaram, conversando como se conhecessem há anos, tornando-se amigas a partir daquele feliz momento, permanecendo ali por várias horas. Foram interrompidas pelo marido dela, que adentrou completamente agitado, dizendo que Charles estava despertando, voltando a sua consciência, dizendo algumas palavras desconexas. Ambas foram juntas em direção da unidade de tratamento intensivo, encontrando-o acordado, porém ainda sob efeito de sedativos, reconheceu a sua mãe que o acariciava, olhou para Talya que também chorava emocionada, perguntando para a mãe dele, quem era aquela mulher que ali estava a visitá-lo. Ele apresentava amnésia temporária, perdendo parcialmente a memória, não se lembrando de fatos recentes, nem do acidente no rodeio e, de ter conhecido Talya há pouco tempo atrás. A mãe dele falou para ele sobre Talya, os animais resgatados, o santuário no sitio, mas ele não se recordava absolutamente de nada. Por mais que tentassem, não conseguiam fazê-lo lembrar de nada, de coisas recentes, somente de eventos mais antigos. Posteriormente, foi explicado pelo médico que lhe dava assistência, que se tratava de amnésia anterógrada, onde o indivíduo perde a memória para eventos recentes, só lembrando de outros eventos mais antigos. Este fato deixou-a totalmente perdida, desnorteada, sem chão completamente. Ela despediu-se da mãe de Charles, retornando a tua cidade triste e desiludida, mas com a esperança de que ele ficasse curado da falta de memória, o mais rápido possível. No silêncio daquela primeira noite, quando havia voltado de visitar Charles no hospital, completamente exausta, deitada em sua cama em companhia do seu gato Astolfo, que ronronava pedindo atenção, estava com os pensamentos voltado a tudo que estava acontecendo em sua vida, ainda encontrava-se abatida por Charles não se recordar dela, mas sempre acreditando em sua cura e, assim desta maneira ela enviava ótimas vibrações para ele. Acabou dormindo tão profundamente, que ao despertar ainda de madrugada, nem lembrava se havia sonhado ou não. Retomou assim as suas tarefas diárias, nos cuidados aos amigos animais e a todo momento o burro Eufrásio, vinha acariciá-la, junto com ele vinha também o bode Godofredo, pedindo muito carinho, todo enciumado. Ela passou toda a parte da manhã ocupada nas suas tarefas, que nem percebeu o tempo passando e, tão logo já estava sentada a mesa almoçando, relatando aos seus pais tudo o que havia acontecido durante a sua visita a Charles no hospital, sendo que eles ficaram felizes por ele ter saído do estado de coma, porém, ficaram entristecidos pelo fato dele estar com a memória afetada. Neste mesmo dia, ela percebeu o cavalo Hércules um tanto abatido, meio adoecido, levaram-no ao vizinho, que além de amigo da família, possuía bastante conhecimento no trato dos animais e, que depois de examina-lo foi diagnosticado pneumonia. Desta maneira, ele ficou internado para tratamento com soros, antibióticos e vitaminas, até que estivesse em condições de retornar ao santuário. Assim foram passando os dias, semanas, com Charles ainda internado no hospital da capital, estando agora num quarto particular, fora da unidade de terapia intensiva, recuperando-se da cirurgia feita no quadril, já melhorado de vários ferimentos, apenas a memória que continuava afetada, em relação aos acontecimentos recentes de uns dois meses aproximadamente, antes de conhecer Talya. Ela chegou a visitá-lo mais umas duas vezes, na tentativa de ajudá-lo a recuperar parte da memória perdida, mas sem conseguir obter algum êxito e, como ele as vezes apresentava um quadro de agitação psicomotora e certa irritabilidade, preferiu acompanhar a sua evolução a distância, através de contato com a mãe dele, pois ambas tinham tornando-se amigas. Passados quase três meses, depois do trágico acidente, a equipe médica autorizou ele a continuar o tratamento em sua cidade, mas foi transferido ao hospital, onde fazia diariamente fisioterapias respiratórias, era constantemente acompanhado de profissionais treinados para ajudá-lo a recuperar a memória e, tão logo apresentasse melhora poderia continuar o tratamento domiciliar, mas também Talya e todos os familiares dele, sabiam que jamais ele poderia voltar a montar um cavalo, cavalgar ou participar de rodeios, fato que deixou Talya aliviada, mas seu familiares não gostaram de receber esta notícia. Eles haviam conseguido completar a reforma em todo o sítio onde moravam, após o grande estrago que havia acontecido depois do vendaval, mas estavam profundamente endividados, quase à beira da falência, mesmo com o pai de Charles sendo um político influente, ocupando cargos públicos. Aconteceram algumas mudanças na vida profissional de Talya, após ela voltar das férias, a empresa que ela trabalhava mudou-se para a capital estadual, encerrando as atividades naquela cidade, sendo dispensados vários funcionários, inclusive ela, entretanto, ela conseguiu um novo trabalho indicada por um amigo, o qual realizava na sua própria casa e, assim esta mudança foi benéfica em sua vida, pois desta maneira, pode ficar mais tempo próxima aos amigos animais. Na vida das pessoas e animais acontecem coisas surpreendentes, muitas delas de forma totalmente inesperadas. Certo dia logo ao amanhecer, Talya estava tratando dos animais como de costume, quando observou o burro Eufrásio, todo saltitante a uma certa distância no pasto, próximo a égua Esmeralda, as três ovelhas e do bode Juvêncio. Ele soltava vários zurros como se estivesse recebido alguma notícia muito boa. Sua expressão era de felicidade total, num estado de excitação como ela nunca havia presenciado. Aproximou-se deles cautelosamente, sem nada entender naquele momento, mas ao notar algo diferente com a égua Esmeralda, descobriu após o vizinho examiná-la que ela estava prenha. O cavalo Hércules, seria pai pela primeira vez em sua vida, encontrava-se no sítio vizinho ainda em recuperação da pneumonia. Tudo começou a fazer sentido de como a natureza é sábia, principalmente também quando ela deu pela falta da javalina Jacinta, procurando-a por todo o sitio, não a encontrando em nenhum lugar, começando a se desesperar, temendo que algo pior tivesse acontecido, caso ela tivesse sido roubada ou morta. De repente, sentiu uma intuição de procurá-la próximo ao lago, onde havia um pequeno rancho de madeira, ali para sua surpresa encontrou-a deitada, amamentando três belíssimos filhotes, que haviam nascido a poucas horas durante a madrugada. Mesmo sem acreditar, começou a chorar emocionada, pois nem bem havia percebido a prenhes da égua Esmeralda, encontrou Jacinta, a javalina com quatro filhotes. Com toda aquela correria, juntando a intensa preocupação com Charles, nem havia percebido que ela estava prenha. O porco Juvêncio, considerado um ex reprodutor, não havia perdido tempo, pois ali estavam três novos herdeiros do mundo animal daquele sagrado santuário. De tanta emoção que sentiu naquele momento, onde a vida se renovava de uma forma completamente inesperada, Talya sentiu muitas náuseas, uma fortíssima tontura, sua vista ficou turva, seus olhos embaraçados, perdendo completamente os sentidos, vindo a desmaiar ali mesmo. Foi socorrida algum tempo depois, pelo próprio pai que também estava à procura da javalina, ao notar uma certa demora da filha, em retornar das proximidades do lago. Deram-lhe um pouco de água para beber, após ela recobrar completamente os sentidos, o senhor Olavo, junto com a esposa, encaminhou-a ao posto de atendimento médico. Após serem realizados alguns exames de rotina, foi medicada com aplicação de soro endovenoso, ficando algum tempo em observação, para depois de algumas exaustivas horas, o médico que a atendeu vir comunicar a ela e aos seus pais, o motivo dela ter passado mal, deixando-os todos atônitos, pois Talya estava grávida, esperando um bebê. Foi uma notícia que pegou todos de surpresa, um pouco menos Talya, que recordava da noite que havia passado ao lado de Charles, mas ao mesmo tempo se lembrava, que não tiveram naquele instante qualquer forma de prevenção. Após ser liberada para ir para casa, foi orientada a procurar um médico obstetra para fazer acompanhamento da gestação. Retornaram em silêncio para o santuário, durante um certo tempo, para depois solicitar para seus pais estacionarem o carro, um pouco antes de chegar ao sítio, desceram os três do veículo, sentando-se sobre um abrigo de parada de ônibus. Talya chorou, pediu desculpas pela forma como tudo aconteceu, mas o senhor Olavo e sua esposa, disseram lamentar que as coisas tivessem sido daquela maneira, ainda mais por ela estar esperando um bebê de uma pessoa sem memória e, também pelo fato deles não terem tido um relacionamento concreto. Antes mesmo deles retomarem ao caminho de casa, todos se abraçaram cheios de alegria e amor, pois eram uma família completa e, agora mais uma vida os envolvia afetivamente. Finalmente, Charles recebeu alta médica, podendo ser levado para a sua casa e, ali diariamente teria uma equipe de profissionais de enfermagem para auxiliá-lo fazendo revezamentos diários, um psicólogo para cuidar da parte relativa a perda de memória e dos episódios de irritabilidade, chegando algumas vezes a apresentar quadro de agitação psicomotora, mais uma fisioterapeuta chamada Alexia, que cuidava da parte respiratória e, posteriormente, na sua reabilitação em relação a fratura do quadril, algo que já havia sido feito durante toda internação hospitalar, para fortalecimento de seus músculos, evitando assim sequelas que poderiam complicar a sua marcha. Alexia, era uma lindíssima mulher, morena, de longos cabelos pretos encaracolados, possuía estatura média, traços firmes, estando com seus vinte e oito anos de idade. Um pouco antes de começar a cuidar de Charles no hospital, havia terminado um relacionamento de um pouco mais de dois anos, após descobrir que o namorado estava se relacionando com outra pessoa, deixando-a desiludida, com o pensamento de não mais querer se envolver com ninguém. Com a convivência diária nos cuidados com Charles, começou a sentir algo diferente por ele, mas respeitava-o por estar tratando profissionalmente, mas depois quando iniciou o tratamento domiciliar, aquele sentimento foi tornando-se cada vez mais intenso, foram ficando cada vez mais amigos. Talya, assim que soube que ele havia voltado para a casa, foi imediatamente visitá-lo, com aprovação de seus familiares, mas jamais passou pela sua cabeça contar sobre sua gravidez, já que ele não se recordava de nada no período em que se conheceram. Assim que adentrou no quarto de Charles, totalmente adaptado para a sua recuperação, a fisioterapeuta Alexia, vestida toda de branco, estava ajudando-o a dar uns passos em vários exercícios físicos, de coordenação motora, entre outros. Quando observou aquela lindíssima mulher, cuidando dele com toda dedicação e profissionalismo, sentiu fortíssimo ciúmes, mas procurou disfarçar de todas as maneiras. Ficou bastante constrangida também, quando Alexia cinicamente, perguntou para Charles, se ela era a namorada dele, mesmo sabendo de toda a história, que todos os mais próximos já tinham conhecimento, mas ele apenas respondeu que era a moça que havia conhecido, quando estava internado no hospital da capital. Talya, falou novamente sobre o momento em que se conheceram, sobre o resgate dos animais na beira da estrada, do transporte feito por eles até o santuário, sobre o presente que ele havia dado a ela quando trouxe-lhe o touro Vitório, falou sobre a javalina ferida na estrada, dos momentos que juntos ficaram próximos ao lago naquela noite tão especial, mas não obteve nenhum êxito, Charles, mostrou-se irritado por não se lembrar de nada, apresentando um princípio de agitação, achando que toda aquela história era algo inventado, assim ela despediu-se dele, pedindo-lhe desculpas por ter falado tudo aquilo, controlou as lágrimas, saindo prometendo não mais voltar para incomodá-lo. Ao chegar na saída da imensa propriedade, acompanhada pela mãe dele, foi consolada e abraçada com bastante ternura, antes de voltar para a sua cidade, completamente confusa e decepcionada. Assim que ela saiu do quarto, Charles foi medicado com um sedativo, já prescrito pelo seu médico, quando apresentasse alguma agitação, dormindo logo a seguir. Naquela mesma madrugada, ele despertou aos gritos, acordando a sua mãe que estava numa cama ao lado, pois todos da família dele revezavam durante o período noturno, dispensando os profissionais de enfermagem que vinham durante o dia para auxiliá-lo nos banhos, nos cuidados de higiene pessoal, até o momento em que Alexia chegava para prestar os cuidados diários de fisioterapia. Após ele recobrar um pouco mais os sentidos, contou que havia tido vários sonhos confusos, perguntando para sua mãe quem havia sido o campeão do rodeio passado e, assim gradativamente a sua memória, começava a dar indícios de estar começando a voltar, mas tudo era um tanto confuso ainda em sua mente. Quando Talya chegou no santuário, após retornar da visita que tinha feito a Charles, mesmo estando aborrecida, verificou como estavam todos os teus amigos animais, conversou com eles acariciando a todos, indo até o rancho na beira do lago, onde algumas capivaras estavam na outra margem a descansar naquele final de tarde, deu mais uma olhada na javalina Jacinta, que descansava juntos aos três filhotes, seguida a todo momento pelo seu amigo, o cachorro Thor. Voltou para sua casa, tomou um banho relaxante, massageando suavemente a sua barriga, falando pela primeira com o bebê que estava esperando, já imaginando qual seria o sexo da criança. Ali mesmo, veio-lhe a ideia de alguns nomes, se nascesse um menino iria se chamar Ygor, se fosse menina colocaria o nome de Liz. Depois disto, tomou seu habitual lanche natural, deitando-se em sua cama bastante exausta, sendo acariciada pelo seu gato Astolfo carinhosamente. Naquele instante, decidiu não mais procurar por Charles, resolvendo não mais visitá-lo. Logo na manhã seguinte, assim que acordou, despertando com o ronronar do seu gato Astolfo, levantou-se seguindo a sua rotina diária, tomou seu suco de acerola com laranja, com algumas bolachas adquiridas nas lojas de produtos de veganismo, indo em seguida dar o seu tradicional bom dia aos amigos animais, conversando com eles, dando um beijo carinhoso em cada um. O primeiro a ser contemplado com este gesto de carinho foi o burro Eufrásio, que soltou zurros de alegria, em seguida o ciumento bode Godofredo, a égua prenha Esmeralda que recebeu caricias em sua barriga, as três ovelhas que seriam tosquiadas naquele dia, Juvêncio, o porco que havia se tornado pai, Vitório, o grande touro e a vaca Maricota, que andava muito estranha, achando melhor observa-la atentamente, caso precisasse, iria falar com seu amigo vizinho, que já estava habituado na criação de animais. Pouco tempo depois, foram descobrir que a vaca Maricota também estava prenha, após ter cruzado com o touro Vitório e, assim mais uma vez a vida seria renovada naquele Santuário da Luz Animal. O dia foi intenso nos cuidados prestados a todos eles, aproveitou a tarde para tosquiar a lã das três ovelhas, começando por Maia, a mãe delas e em seguida as gêmeas Clara e Branca. No início da noite, quando todos animais já estavam sendo preparados no estábulo, Talya encheu-se de felicidade ao avistar a javalina Jacinta, vindo no pasto em direção a eles, acompanhada dos seus três filhotes que eram malhados, possuindo a cor marrom com listras castanho claro. Identificou todos filhotes, sendo um macho batizado de Otto, mais duas fêmeas Luna e Ayla. Assim foram passando os dias na vida dos animais e das pessoas. Charles foi conseguindo, aos poucos, ir lembrando algumas coisas recentes que se passaram em sua vida, a começar pelo acidente no rodeio, mas tudo era bastante confuso, com ele imaginando que tudo não passasse de um sonho. Certa manhã, assim que Charles acordou, sem ninguém esperar, perguntou a Alexia sobre a moça que cuidava dos animais, ela pretensiosamente disse que não se recordava de quem seria aquela pessoa. Ele tinha alguns momentos de lembranças, mas tinha também alguns estados de confusão mental e esquecimento. Numa outra vez, assim que ele acordou pela manhã, sendo o dia da folga de Alexia, perguntou para a mãe dele que lhe servia o café matinal, sobre a mulher com os animais que ele havia ajudado, mas não se lembrava do nome dela. Sua mãe, com lágrimas nos olhos, respondeu que se chamava Talya e sua memória começava a voltar gradativamente. Imediatamente, a sua mãe com o pedido de Charles, solicitou a filha que fosse de carro no sítio de Talya, para comunicar o ocorrido, convidando-a para que viesse o mais rápido possível visita-lo, com receio de que alguns minutos depois ele se esquecesse novamente aquelas lembranças. Assim que chegou no santuário, a irmã de Charles, encontrou Talya cuidando dos amigos animais, mas assim que recebeu aquela inesperada notícia, terminou o que estava fazendo, arrumou-se após um relaxante banho e, juntas foram até o sítio visita-lo. Quando lá chegaram, encontraram-no sentado, numa poltrona tomando um banho de sol, aguardando a chegada delas. Assim que avistou Talya, ele ficou bastante emocionado por sua presença, deram um abraço apertado, começaram a conversar sobre os mais variados assuntos, tudo com muita cautela para não o forçar a nada. Ele a chamou pelo seu nome, não por se lembrar totalmente, mas porque haviam citado o nome dela anteriormente. Ela narrou para ele todos os acontecimentos que ocorreram, desde que se conheceram, sendo que alguns fatos ele começava a lembrar-se com mais clareza, outros ele ficava meio em dúvida, como se fosse um sonho. Corretamente, ela poupou-o de muitos detalhes, contando aos poucos, deixando sua mente associar as coisas aos poucos e, também jamais falou, que ambos haviam ficado juntos, ou mesmo, trocado alguns beijos se envolvendo afetivamente. Toda esta conversa foi bastante produtiva, para que as lembranças retornassem em seu pensamento. Passaram algumas horas juntos, deram boas risadas com os relatos que Talya fazia sobre falar com animais, entre outras coisas. Neste mesmo dia, almoçaram todos juntos de uma forma que jamais imaginariam acontecer, sendo feito um cardápio especial, pois já sabiam que Talya era adepta do veganismo, mesmo assim todos apreciaram aquela mudança na alimentação. Quando chegou ao entardecer, Talya despediu-se de todos que a acolheram naquele dia especial, retornando ao santuário, antes prometendo que viria novamente para visita-lo. Na manhã seguinte, Charles acordou totalmente diferente, com um humor elevado, demonstrando um estado de felicidade como há muito tempo não presenciaram. A equipe de enfermagem já havia sido dispensada, pelo fato dele estar cada vez melhor, voltando a ser independente e, mesmo o atendimento com psicólogo agora era semanal, inclusive o tratamento com neurologista. A única profissional que vinha ainda para atende-lo era Alexia, que chegando logo pela manhã, surpreendeu-se ao ver Charles todo radiante, mas ficou levemente irritada, quando soube o motivo dele estar assim, após a visita de Talya no dia anterior. Ela executou seu trabalho normalmente, mas assim que terminaram os procedimentos, disse que precisava conversar com ele seriamente. Aproveitou um certo momento, quando estavam a sós no quarto, para dizer que aquela seria a última semana, em que ela viria prestar os cuidados a domicilio e, quando questionada sobre o motivo do inesperado afastamento, ela criou coragem dizendo estar apaixonada por ele, desde que o viu pela primeira vez, mesmo tratando-o com todo profissionalismo, disse que foi algo que aconteceu sem planejar, mas que não conseguia mais ficar perto dele. Ele ouvia tudo atentamente, pois também sentia uma certa afinidade por ela, que era bastante atraente. Assim que ela terminou de falar, sem mesmo esperar Charles responder alguma coisa, beijou-o inesperadamente a sua boca, deixando-o sem reação, mesmo porque ele havia tomado a medicação receitada pelo médico, que o deixava um pouco entorpecido. Para a surpresa de Alexia, após beija-lo, ele retribuiu beijando-a várias vezes, confessando que desde a primeira vez que ela havia aparecido em sua vida, também sentiu uma fortíssima atração. Naquela mesma semana, Charles chamou seus pais para conversar, anunciando que ele e Alexia haviam começado a namorar, deixando-os completamente surpresos e, de certa forma decepcionados por ele não ter escolhido ficar com Talya, a qual sentiam grande apreço. Sua mãe, fez alguns questionamentos na ausência de Alexia, sobre suas escolhas em relação ao envolvimento com a fisioterapeuta, falou sobre Talya, mas ele disse sentir por ela bastante carinho, pouco sabendo sobre sua vida pessoal e dos sentimentos para com ele, mas que gostaria de preservar muito a sua amizade. Infelizmente, a sua memória continuava afetada em partes sobre Talya, pois tudo que havia acontecido entre eles era algo vago em seu pensamento. Certo dia, após prestar os cuidados aos amigos animais, Talya resolveu ir visita-lo sem avisar antecipadamente, chegando ao sítio deles, ainda na parte da manhã. Assim que entrou na casa, sentiu uma enorme decepção ao encontrar Charles, reunido com a sua família, todos sentados à mesa, tomando um café matinal, junto estava Alexia ao lado dele, segurando em uma de suas mãos. Talya, procurou de todas as formas, não demonstrar qualquer sinal de indignação, mas ali ficou por pouco tempo, alegando ter outros compromissos. Ficou ainda mais triste quando Alexia, propositalmente, falava em voz alta sobre o fato deles estarem namorando, alegando que isto ajudaria ainda mais na recuperação de Charles. Como não havia mais clima para ali permanecer, pediu educadamente licença a todos os presentes, retornando rapidamente para a sua casa. Novamente, seu coração encheu-se de profunda tristeza, seguida de uma grande decepção, com aquele dia sendo considerado um dos piores em sua vida, em questões de relacionamentos afetivos. Ela acreditava, que quando voltasse a memória dele ao normal, eles pudessem ficar juntos, ainda mais agora que em seu ventre, havia um ser humano sendo gerado do envolvimento entre eles, mesmo que tenha acontecido sem estar nada planejado. Infelizmente, aconteceu dele estar namorando Alexia, com quem havia criado fortes laços, durante todo o período em que passaram juntos, após a sua internação hospitalar, até os cuidados prestados por ela em sua residência. No cair da noite, após realizar os cuidados aos amigos animais, fez carinho em todos eles, recebendo de volta um agrado do burro Eufrásio, do bode Godofredo, acariciou a barriga prenha da égua Esmeralda, do cavalo Hércules já recuperado da pneumonia, brincou com os filhotes da javalina, cantou algumas músicas, para depois finalmente entrar em sua casa, tomou um banho relaxante, indo dormir em seguida, sem se alimentar, pois estava se sentindo enjoada, completamente sem apetite. Passou várias horas com uma insônia constante, com os pensamentos em tudo que estava acontecendo, acariciou a sua barriga várias vezes, chorou silenciosamente por determinado tempo, foi até a cozinha preparando um suco de maracujá, bebeu dois copos cheios, até que sem perceber dormiu, voltando a despertar somente na madrugada seguinte. Antes mesmo de se levantar da sua cama, tomou a decisão de se dedicar integralmente no bebê que esperava e aos amigos animais que dependiam dela. Enquanto tomava seu café da manhã, junto com seus pais, relatou tudo que havia acontecido, escutando palavras de otimismo e ânimo, fazendo com que ela ficasse mais tranquila e segura. Assim foram passando os dias, as semanas, os meses na vida de Talya e dos seus queridos amigos animais, sempre realizando tudo como amor total, a gravidez deu novas formas no seu corpo, principalmente na sua barriga um tanto crescida, entrando no sétimo mês de gestação. Charles, por sua vez, estava bem mais recuperado fisicamente da fratura no quadril, mas sua memória não havia voltado ao normal completamente. Durante todo este tempo, algumas vezes, perguntou para sua mãe sobre notícias de Talya, tendo a resposta de que não haviam mais tido nenhum contato. Certo dia, Talya teve um pequeno mal-estar, tendo que ficar algumas horas hospitalizada, sendo medicada com soros e medicamentos no centro médico obstétrico de sua cidade, enquanto aguardava o fim do soro, para uma nova avaliação médica, desta maneira acabou cochilando e, neste momento nem pode perceber que Alexia, que tinha ido visitar uma prima também gestante, a viu deitada em seu leito. Naquele momento, sentiu um grande calafrio, chegando a imaginar que Charles poderia ser o pai do bebê que Talya esperava. No mesmo dia, um pouco antes do anoitecer, Alexia foi encontrar-se com ele, pois haviam combinado de saírem jantar. Durante várias conversas que tiveram naquela noite, ela comentou que havia visto Talya grávida, sendo atendida no hospital, no momento em que foi visitar a prima, causando grande espanto em Charles, mas em seguida ela mentiu para ele, dizendo que Talya estava acompanhada com o pai do bebê, sendo que ambos usavam uma aliança na mão esquerda, dando a entender que ela estava casada. Charles, ficou completamente desconcertado, um tanto confuso, com várias coisas vindo em seu pensamento, algumas lembranças fora da ordem, mas ele preferiu nada comentar com Alexia. Naquele mesmo dia, Talya teve alta hospitalar, sabendo que estava tudo bem com ela e o bebê, podendo assim retornar ao santuário, sendo recomendado que ela repousasse com mais frequência. No dia seguinte, como ela ainda estava um pouco indisposta, deixou que seu pai realizasse todos os cuidados com os seus amigos animais, acompanhado da sua esposa, podendo assim ela descansar até mais tarde, junto de seu fiel companheiro, o gato Astolfo. Levantou um pouco mais tarde, determinada a seguir a sua vida da melhor maneira possível, mesmo pelo sentimento que tinha por Charles, percebeu que não poderia jamais forçar uma situação, que estava fora do seu controle, pois além dele estar com a memória ainda prejudicada, agora estava namorando outra mulher. Talya, foi em direção ao curral, onde seus pais ainda cuidavam dos amigos animais e, ao se aproximar viu que o burro Eufrásio vinha rapidamente em sua direção, totalmente radiante, expressando uma felicidade total, acariciando-a gentilmente, com ela retribuindo aquele sincero carinho, distribuindo beijos e afagos em todos os amigos animais, pois ali estava a sua verdadeira família. Nos meses que se seguiram, ela não tornou a visitar Charles, seguiu seu rumo completamente em paz, com sua gestação quase chegando ao final. Nos meados do mês de junho, chegando ao final do outono, aproximava-se o dia de Talya dar à luz ao seu bebê, e exatamente no primeiro dia da nova estação de inverno, ela sentiu várias contrações uterinas durante todo o dia e, numa noite de lua cheia tornaram-se intensas, sendo levada ao hospital maternidade por seus pais, ficando internada em trabalho de parto, durante quase toda madrugada e boa parte manhã seguinte. Exatamente no dia vinte e dois de junho, um pouco depois das treze horas e trinta minutos, Talya finalmente deu à luz, num parto bastante difícil, realizado por fórceps, a uma lindíssima menina com cinquenta centímetros de comprimento, pesando três quilos, duzentos e vinte gramas. Os pais de Talya que a acompanhavam, ficaram extremamente felizes com o nascimento da sua neta. Assim que Talya a viu pela primeira vez, chorou emocionada de alegria e contentamento, dando-lhe o nome de Liz. Durante o tempo em que Charles perdera o contato com Talya, ele e Alexia ficaram noivos, com o casamento marcado para o final daquele mesmo ano. Sua memória estava praticamente restabelecida, lembrando inclusive de todas as vezes em que esteve com Talya, desde que a conhecera na beira da estrada, no dia do resgate dos animais perdidos, até aquele momento especial e único em que passaram juntos, na beira do lago, onde haviam ficado completamente apaixonados, mas ele não comentava este fato com ninguém ao seu redor, guardando para si aquele precioso segredo e, também pensava algumas vezes em procurar Talya, mesmo sabendo que ela estava grávida de outra pessoa, pois achava que ela havia se casado, conforme o relato dito pela sua noiva Alexia, que havia mentido para ele em outra ocasião. No dia seguinte, após o nascimento de Liz, ela teve alta hospitalar retornando ao santuário, ficando em seu quarto devidamente preparado para a chegada da bebê, com um lindíssimo berço que seus amigos ativistas haviam dado de presente. Como o seu quarto ficava na direção do curral, pediu para seu pai deixar aberto o portão que separava do pasto, para que os amigos animais pudessem aproximar-se de sua janela, chamando todos pelos seus nomes, vindo todos eles, aos poucos, na sua direção, onde ela esperava com Liz em seu colo. O primeiro a chegar foi o burro Eufrásio, que soltava zurros de alegria, seguido pelo bode Godofredo, da égua prenha Esmeralda, das três ovelhas, do porco Juvêncio e da javalina Jacinta com seus crescidos filhotes, do cavalo manco Hércules, do touro Vitório, acompanhado da vaca prenha Maricota, ficando todos ali nas proximidades da janela do quarto, por um certo período de tempo, cada um deles soltando o próprio som de suas vozes, num gesto de carinho como nunca se viu igual. Em poucos dias, houve uma grande agitação na madrugada dentro do curral, com o nascimento da cria de Maricota, sua segunda gestação, nascendo uma belíssima bezerra chamada posteriormente de Quinha. A menina Liz, veio para alegrar de vez, o coração de Talya e de seus avós, era uma menina tremendamente sorridente logo nos dois primeiros meses de vida. Numa outra noite, a égua Esmeralda entrou em trabalho de parto, nascendo um belíssimo potro, de cores marrom e branco, para alegria de todos moradores do santuário, animais e humanos. Talya, logo tratou de batizar o potro de Pirata, pois havia na sua cabeça, ao redor dos olhos, a cor marrom de um lado e a branca do outro. Assim, uma outra vez, a vida se renovava naquele especial santuário. Por sua vez, Talya dedicava-se integralmente nos cuidados de sua filha Liz, sem deixar de lado os amigos animais e seus filhotes. Certa vez, chegou ao conhecimento deles que Charles havia se casado com Alexia, mas aparentemente Talya não demonstrou nenhuma reação adversa, ou pelo menos, procurou disfarçar diante de sua família. O tempo é o senhor de todas as coisas e, assim desta maneira, Talya seguiu a sua vida, continuando a realizar tudo com o mais profundo amor. Quando Liz completou seu terceiro ano, estava cada vez mais radiante, seguindo os passos de sua mãe, aprendendo desde pequena, a tratar os amigos animais com infinito amor, sendo ensinada a respeita-los, como todos os seres vivos que habitam o nosso planeta. Nunca lhe foi dado para comer qualquer tipo de carne animal, sendo a sua alimentação saudável, rica em frutas, legumes, verduras, vegetais e grãos diversos. Talya, mostrava-lhe os cuidados na preparação da horta que possuíam e, sempre que iam plantar algo, lá estava Liz, observando tudo, aprendendo a cuidar da terra. O burro Eufrásio, que pela força da natureza não podia ser pai, tinha há um certo tempo adotado o Pirata, desde que era um pequeno potro, assim que foi desmamado da égua Esmeralda. Neste mesmo tempo, a fama de Talya e do teu santuário, foi espalhando-se pela cidade onde moravam, inclusive por algumas cidades daquela região. Muitas pessoas faziam contato, para que ela cuidasse de algum animal maltratado, ou mesmo abandonado. Algumas vezes, ela recolhia os animais abandonados, cuidando de seus ferimentos, sendo eles medicados, sempre contando com a ajuda de seus amigos ativistas da causa animal, que faziam arrecadações para ajudá-la a suprir qualquer dificuldade financeira, para depois arrumarem pessoas de bom coração que pudesse cuidar destes animais. Assim foi feito por vários anos seguidos, sendo que alguns animais eram trazidos ao santuário num estado de saúde lastimável, vítimas de maus tratos, vindo a falecerem, antes mesmo de serem curados. Tudo isto entristecia Talya, mas ela continuava na defesa daqueles seres indefesos, participando de debates com políticos de sua cidade, os quais a viam como um estorvo, principalmente quando ela e seu grupo de amigos ativistas, começaram a fazer protestos em frente a matadouros de bois, de porcos e frangos daquela localidade e arredores. Uma minoria da população estava a favor, de toda aquela onda de protestos pela vida animal, mas a maioria era totalmente contra. Talya, durante todo o tempo depois que se tornou mãe, teve apenas um namorado, mas foi algo rápido demais, pois seu pensamento era todo dedicado ao Santuário da Luz Animal e nos cuidados de sua filha Liz, que já havia completado nove anos, sendo constantemente perseguida, na escola em que estudava, por alguns meninos maiores que elas, com piadas e gozações, faziam desenhos de animais sendo abatidos, citavam o nome de sua mãe, devido ao fato dela ser defensora da causa animal. Algumas vezes, ela teve que fazer reclamações na diretoria escolar, mesmo com Liz sempre se mostrando forte e decidida, não se importando com aquela situação constrangedora. Charles, já estava casado há alguns anos com Alexia, mas não tiveram filhos por mais que tentassem, mesmo com os tratamentos que fizeram, pois foi constatado que ela não poderia engravidar de forma natural, sendo que chegaram algumas vezes, a pensar em adotar uma criança, mas toda vez que Charles tocava neste assunto, Alexia tinha várias crises nervosas, depressões, chegando inclusive a falar sobre se divorciar, dizendo também sentir vontade de morrer. A situação econômica da família dele não estava muito boa há algum tempo. Seu pai, não havia conseguido mais entrar na política, seus negócios iam de mal a pior, vivia entregue a diversos vícios de bebidas e jogos, havia adquirido várias dívidas bancárias. A irmã de Charles, que havia se formado em direito, casou-se rapidamente com um namorado que conhecia desde os tempos da faculdade, mudando-se com o marido para outra região do país. Seu irmão caçula continuava estudando, não tendo ainda nenhuma formação profissional convincente. Talya e seus amigos ativistas, estavam cada vez mais, engajados na luta pelos direitos dos animais, participando de vários movimentos em sua cidade, em algumas cidades da região e, desta forma conseguiram com o ministério público o fechamento de vários rodeios, inclusive na cidade onde Charles vivia, um fato inédito que causou muitos problemas com políticos locais e, também com os produtores interessados na indústria animal e, muitas vezes quando o grupo de ativistas participavam de alguns protestos em frente aos abatedouros, havia um contingente de seguranças armados, inclusive policiais intimidando-os, mesmo sabendo que todo o grupo promoviam os protestos de forma completamente pacifica. Charles, jamais voltou a montar um cavalo, ou mesmo participar de qualquer atividade deste tipo, depois que ele sofreu o acidente no rodeio, tendo ficado em coma por certo tempo, voltando ao hábito de se alimentar novamente com carnes de bois e outras diversas. Certo dia, assim que ele acordou, começou a recordar um sonho, mas não conseguia lembrar com exatidão, eis que de repente, veio em sua memória algo que nunca mais havia pensado, de quando ele havia decidido não se alimentar mais de qualquer tipo de carnes e derivados, lembrou também com tamanha exatidão, rico em detalhes, sobre o dia em que ele levou a javalina até o santuário para presentear Talya, inclusive de todos os momentos em que ficaram intimamente juntos, enamorados e apaixonados. Esta lembrança mexeu com todo seu interior, com ele pensando em procurar Talya, mas faltava-lhe coragem por estar casado com Alexia, achando também que ela estava casada com outra pessoa. No dia do aniversário de Liz, em que ela completava seus dez anos de idade, seus avós perguntaram qual seria o seu melhor presente, surpreendentemente, ela disse que queria conhecer quem era seu pai biológico, deixando todos os presentes perplexos, pois desde que ela tinha seus seis anos, sua mãe Talya, dizia que seu pai havia sido um antigo namorado e, assim que eles terminaram o relacionamento, perderam completamente o contato, pois moravam distantes, não o vendo mais. Assim, continuaram cada um seguindo o rumo de suas vidas, com Talya e teu santuário cada vez mais conhecidos em toda a região, como a mulher que defendia os direitos dos animais. Sempre que havia um animal abandonado ou vítima de maus tratos, as pessoas encaminhavam ao Santuário da Luz Animal, onde recebiam tratamento adequado, carinho e amor. Talya recebia daquela comunidade algumas ajudas financeiras, realizavam bazares beneficentes, rifas de produtos que eram doados, tudo investido nos cuidados dos amigos animais, pois as despesas eram altíssimas. Alguns animais encaminhados, eram depois de tratados, com a ajuda de seu vizinho, que possuía grandes conhecimentos na área animal, sempre de forma gratuita e voluntária e, assim que se encontravam curados, alguns deles eram adotados, por pessoas de bom coração, já cadastradas como defensores das causas animais. Talya e seus amigos ativistas ficavam bastante entristecidos, quando não conseguiam salvar a vida de algum destes animais resgatados, pois chegavam vários em estado de total abandono, feridos e doentes. Também sentiam uma enorme satisfação, quando em pouco tempo de tratamento viam eles curados, felizes como nunca haviam sido. O burro Eufrásio, e os demais amigos animais continuavam saudáveis, envelhecendo com dignidade, com os filhotes que haviam nascido no santuário terem se formados adultos também. Durante os anos que se passaram, a vaca Maricota, a javalina Jacinta e a égua Esmeralda haviam tido outras crias. Um dia, Talya foi convidada a realizar uma palestra, num simpósio internacional de defesa e direitos dos animais, que seria promovida por uma organização não governamental, numa grande cidade na região onde morava e, ali estariam reunidas pessoas de vários estados do país, com a presença de representantes de alguns países vizinhos, durante um final de semana. Ela aceitou prontamente participar indo com alguns amigos e, durante o seu discurso falou dos direitos universais dos animais, relatou a sua experiência que teve ao encontrar o burro Eufrásio e os demais animais perdidos na beira da estrada, falou de como foi fundado o Santuário da Luz Animal. Descreveu tudo de uma forma clara e objetiva, afirmando que todo animal possui um espírito, porque afinal de contas ele tem vida, que ele nasce, cresce, aprende, melhora, se modifica e, que tudo é evolução no mundo das criaturas de Deus. Disse também, que nenhum animal deveria ser alimento para os seres humanos, nem obrigados a realizar trabalhos forçados, enfim, que todo animal tem o direito à liberdade e a vida. Nem bem terminou a sua apresentação, estando completamente emocionada, percebendo várias pessoas com lágrimas nos olhos, muitas adeptas do veganismo, como muitas outras dispostas a engajar a luta em defesa dos animais, a partir daquele dia. Assim que terminaram as palestras daquele primeiro dia, apresentadas por ela e por outros convidados, foram todos para um outro salão, onde havia uma mesa repleta de alimentos preparados para degustarem, sem nada de origem animal. No dia seguinte, que seria um domingo, estava programado o último dia de apresentações. Após terminarem a recepção, Talya saiu com alguns amigos ativistas, que a acompanhavam em todos os momentos, foram todos caminhando em direção ao hotel onde estavam hospedados, junto a outros participantes. Assim que chegaram, alguns deles foram para seus quartos, outros ficaram sentados conversando na recepção do hotel, durante um bom tempo, sobre alguns assuntos que seriam discutidos no último dia do simpósio. Em um determinado momento, Talya sentindo-se exausta, resolveu ir para seu quarto para descansar, despediu-se dos seus amigos, caminhando em direção ao elevador que a levaria até o andar onde estava hospedada. O destino muitas vezes surpreende as pessoas, com algumas situações inusitadas, a qual jamais imaginamos que irá acontecer. Parou em frente a porta do elevador acionando o botão, aguardando enquanto ele vinha até o térreo, aguardando alguns minutos, esperando algumas pessoas saírem, entrando sozinha, apertando o botão do andar desejado, enquanto o elevador subia os andares, viu um pequeno monitor que mostrava várias notícias gerais e algumas informações internas. Para sua maior surpresa, descobriu que no salão daquele hotel, estava havendo outro evento, um Congresso Estadual de Engenheiros Agrônomos, de produtores agropecuários. Neste momento teve uma forte lembrança de Charles, sentindo bastante saudade e quando o elevador parou num andar anterior ao que ela iria descer, a porta se abriu e lá estava Charles na sua frente, parado de costas, observando distraidamente um quadro na parede. Sem conseguir raciocinar corretamente, ela imediatamente apertou o botão do elevador, dirigindo-se de volta ao térreo, sem que ele percebesse a sua presença. Ela ficou totalmente pálida, começando a suar frio, pois jamais imaginaria vê-lo depois de tantos anos, principalmente ali naquele lugar. Voltou a recepção, dirigindo-se a um funcionário que lhe deu um copo de água, por perceber que ela não estava nada bem, perguntando se precisava de algum atendimento médico. Diante de sua negativa, Talya agradeceu a boa intenção do recepcionista, respirando fundo, procurando controlar as batidas do seu coração, que até aquele momento ainda batia aceleradamente, mas assim que ela se virou para ir em direção aos alguns amigos, que ainda estavam sentados na poltrona conversando e, que não haviam notado o seu retorno, viu Charles caminhando em sua direção, com um sorriso bastante discreto, sendo aquele reencontro inevitável. Ela procurou disfarçar o seu sorriso, praticamente inexistente em seu rosto, cumprimentou-o educadamente, começaram a conversar, perguntando sobre a esposa dele, mas ele respondeu que estava sozinho a trabalho e, quando ele indagou sobre onde estava o marido dela, deixou-a perplexa, ouvindo como resposta que nunca havia se casado. Ficaram em silêncio alguns segundos, praticamente sem nenhuma ação, mas assim que uma de suas amigas a chamou para juntar-se ao grupo, ela pediu licença para sair de sua presença, mesmo com ele ainda querendo continuar aquela conversa, deixando-o ali parado sem muito entender aquela reação. Assim que ele se ausentou do saguão do hotel, acompanhado de um amigo que havia também cursado agronomia, ela novamente despediu-se de sua amiga, sem revelar o que de fato havia acontecido, indo finalmente para o seu quarto descansar. Naquela mesma noite, Talya fez uma ligação telefônica para sua casa, conversou bastante com seus pais, comentando com o encontro inesperado com Charles durante aquela convenção. Disse também que havia pensado em conversar com ele, revelando a verdade sobre a paternidade da filha dela, a qual se encontrava dormindo. Eles ouviram atentamente tudo que ela dizia, chegando a aconselhar que ela agisse conforme seu coração mandasse, mas antes de finalizarem a conversa, não perceberam que Liz havia acordado, vindo até a cozinha para beber água. Ela ouviu parte da conversa que seus avós tinham com a sua mãe, no qual falavam sobre o pai dela, relatando o encontro entre eles no hotel. Logo, perceberam que Liz vinha na direção deles, chorando completamente emocionada, perguntando aos avós se era sobre o pai dela que falavam. Não teve como negarem toda verdade, sendo que diante da insistência de Liz, deixaram-na falar ao telefone com sua mãe, que confirmou ser verdade tudo que haviam falado. Liz, pediu desesperadamente a sua mãe que fizesse de tudo para que seu pai viesse a conhece-la. Talya, concordou com o pedido de sua filha, dizendo que iria falar com ele, mas que tudo dependeria do bom senso, deixando-a um pouco mais calma e esperançosa. Sua filha Liz, finalmente, voltou a dormir toda radiante, transbordando uma felicidade como nunca haviam presenciado. Talya, passou a noite um tanto inquieta, com o sono demorando a vir, procurando relaxar seus agitados pensamentos, meditando bastante, procurando assim coordenar suas ideias, imaginando como seria a reação de Charles sabendo que tinha uma filha. Assim passaram as longas horas daquela noite, chegando a dormir profundamente e, quando despertou subitamente, tinha a sensação de que não havia dormido quase nada, apenas alguns poucos minutos. Após se levantar, tomou um banho rápido, descendo para tomar o seu café da manhã ali mesmo no hotel, com seus amigos ativistas que aguardavam sua chegada. Em todo o tempo que ali permaneceram, por cerca de uns trinta minutos, Talya a todo momento ficava olhando todas as pessoas que adentravam no restaurante, sempre com a esperança de que Charles viesse tomar o café da manhã, mas para sua decepção ele não apareceu. Assim, ela com seus amigos se dirigiu ao salão de eventos, que ficava nas proximidades do hotel, onde em breve começariam as palestras do dia, sendo que sua apresentação seria em seguida, logo após a abertura. Em todos aqueles dias, havia a cobertura feita por uma emissora de televisão, para canais abertos da região e, também no salão tinha um grande telão, onde eram mostradas imagens de animais, em formas de vídeo, sendo cruelmente abatidos para consumo humano, com várias cenas impressionantes, causando grande comoção, sensibilizando praticamente todos os participantes. Num determinado momento, em que Talya mostrava um vídeo de como eram feitas as rações destinadas a alimentação de outros animais, caninos e felinos, aves entre outros, pode observar Charles, sentado na última fileira junto a outros participantes, vestindo uma camiseta estampada sobre a causa animal, que era vendida na entrada do evento, sendo que todo dinheiro arrecadado era para ajudar nos gastos com o Santuário da Luz Animal. Por um instante, ela quase se perdeu nas palavras, tomou um copo de água continuando sua apresentação, percebendo que Charles não tirava o olho dela, deixando-a meio sem jeito, mas ela continuou a falar procurando disfarçar toda aquela situação. Ao terminarem as palestras daquele período da manhã, aproximava-se o horário do almoço, com um intervalo até o reinicio às quatorze horas, onde depois de outras apresentações haveria o encerramento, com entregas de brindes, com diversos folhetos explicativos sobre alimentação natural, sem produtos de origem animal, inclusive uma pequena cartilha, contendo receitas com inúmeros pratos saborosos, informando seu valor nutricional. Assim que as pessoas foram se retirando, Talya foi na direção onde Charles estava, aguardando ainda a saída de algumas pessoas, cumprimentou-o educadamente, dizendo que tinha um assunto muito importante para falar. Ele respondeu que também aguardava há anos, uma oportunidade de encontrá-la, para poderem finalmente conversar sobre vários assuntos, que havia lembrado, depois de um bom tempo após o acidente no rodeio, quando começou a recobrar a sua memória. Decidiram sair para almoçar, mas como o restaurante do local do evento estava completamente lotado, foram até um outro ali nas proximidades de uma enorme praça, onde também teriam mais liberdade para conversar longe de olhares curiosos. Ela de imediato, solicitou que Charles começasse falando, para falar depois em seguida. Ele contou para ela tudo que se recordava de sua queda do cavalo, quando laçava o touro no rodeio, falou da perda de sua memória, de sua lenta recuperação após as fraturas sofridas, até começar a falar do início de seu namoro com Alexia e, de quando ela veio dizer que havia visto Talya grávida, casada, acompanhada com o marido. Neste momento, ela imediatamente o interrompeu, dizendo que nunca havia se casado e, ambos perceberam toda aquela mentira. Ele continuou dizendo que nunca havia tido filhos com a esposa, relatando também estar passando por várias dificuldades conjugais, sendo que por diversas vezes estiveram prestes a se separarem. Comentou também que sua memória, começou a voltar gradativamente, que depois de um tempo se lembrara de quando a conheceu na beira da estrada, do resgate dos animais até o santuário e de todos os momentos em que estiveram juntos. Desta maneira, pediu que ela o perdoasse, por não ter contado que ele era um peão boiadeiro, sobre sua participação nos rodeios, enfim, ela ouvia tudo atentamente, sentindo sinceridade em suas palavras. Assim que ele terminou a sua extensa narrativa, Talya começou a contar tudo que havia passado em sua vida, desde que o conhecera, sobre todo o sentimento que havia sentido, falou da dor que sentiu, quando ele esteve hospitalizado após o acidente no rodeio, da visita que fez na unidade de terapia intensiva, de todo sofrimento por ele não se lembrar dela, descreveu tudo sobre o Santuário da Luz Animal, falou sobre o burro Eufrásio, das novas gerações de animais que nasceram lá, dos animais resgatados por maus tratos ou cruelmente abandonados, os quais a comunidade encaminhava para serem cuidados, relatou sobre as doações que recebia, enfim, de todas as dificuldades que ela com seus pais, seus amigos ativistas, passaram para manter o santuário funcionando adequadamente, mesmo com poucos recursos. Quando terminou de falar do Santuário da Luz Animal, começou a falar sobre sua filha Liz, descrevendo como ela era uma menina lindíssima, cheia de virtudes físicas e espirituais, do amor que ela tinha pelos animais, possuindo o mesmo dom da mãe de falar com eles, sentindo a vibração mágica do amor. Charles ouvia tudo atentamente, sempre fitando os olhos dela, sem ao menos disfarçar todo entusiasmo que sentia, por estar ali na sua presença. Eles já tinham terminado o almoço, ficaram sentados num banco de madeira num florido jardim, situado nos fundos do restaurante, sobre a sombra de uma árvore, pois o dia estava bastante ensolarado, mesmo ainda sendo inverno. Antes mesmo que Charles formulasse alguma outra pergunta, em relação a paternidade de sua filha, Talya encheu-se de coragem, falando que tinha algo especial para dizer-lhe, que seria uma revelação bastante importante, pois mudaria para sempre o rumo de suas vidas, sendo algo que ela guardava em segredo há muitos anos. Assim, Talya olhando fixamente no rosto dele, disse que ele era o pai biológico de Liz, vendo seus olhos encherem de lágrimas, deixando-o completamente atônito, porém, ele conteve aquela surpreendente emoção por alguns segundos e, sem ao menos dizer nenhuma palavra, abraçou-a calorosamente, sendo que ambos choraram emocionados. Em seguida, ele a questionou o porquê de ela nunca ter procurado, contando sobre a gravidez, mas ela respondeu que nunca lhe disse nada, por causa dele ter perdido parcialmente a memória, não se lembrando dela e, também pelo envolvimento que ele teve com a fisioterapeuta Alexia, com quem veio a casar-se um certo tempo depois. Aquela notícia teve proporções diferentes, pois para ela foi um alivio fazer uma revelação importante, tirando um grande peso de sua consciência, mas para ele o impacto foi bem mais assustador, por descobrir que tinha uma filha que ainda não conhecia. Antes de finalizarem aquela conversa, Talya disse-lhe que não queria jamais atrapalhar a vida sentimental dele, ou mesmo abalar a estrutura do seu casamento, perguntando se ele gostaria de ver uma fotografia da menina, ele respondeu afirmativamente mesmo estando perplexo, ela abriu a sua carteira mostrando uma foto recente de Liz, onde ela estava totalmente sorridente, vestindo um macacão azul, tipo jardineira, com uma blusa cheia de estampas floridas, sentada no pasto do santuário, abraçada ao burro Eufrásio, rodeada de outros amigos animais. Charles, ao ver o rosto de sua filha pela primeira vez, conteve-se novamente para não chorar, percebendo que Liz era bastante parecida com a mãe, mas possuía um sorriso que lembrava muito o dele, quando ele era ainda uma criança. Ela disse-lhe que, se por acaso, quisesse conhecer a filha pessoalmente, deveria avisa-la antes, passando o número do telefone do sitio, mas somente se este fato não interferisse em sua vida pessoal, algo que jamais ela gostaria de fazer, porque não fazia parte de sua índole e, Charles sabia muito bem disto. Perguntou se ele queria ficar com a foto da menina, fato que o deixou muitíssimo feliz. Naquele momento, perceberam que o horário para recomeçar as palestras, estavam próximas de acontecer, caminharam rapidamente, retornando ao local dos eventos, onde despediram-se com um singelo, caloroso abraço, com ele dirigindo-se a sua poltrona, aguardando o momento em que Talya faria uma nova apresentação. Foi uma tarde diferente, com tudo seguindo normalmente, mas Charles nem conseguia prestar muita atenção no que ela falava, pois não parava de pensar em Liz, olhando aquela fotografia a todo instante. Enfim, houve o encerramento do simpósio, sendo Talya aplaudida em pé com outros palestrantes, por toda a plateia que lotava o auditório, sendo constantemente fotografada para um jornal local, concedendo uma entrevista para um canal de televisão, daquela importantíssima cidade e de toda aquela região. Depois, houve uma festiva recepção com uma variedade de frutas, alimentos naturais todos produzidos sem agrotóxicos. Naquela mesma noite, ambos retornaram para sua cidade, com o sentimento de dever cumprido, com Talya eufórica para reencontrar seus pais e, principalmente sua amada filha Liz, a qual esperava com muita ansiedade. Era quase meia noite, quando Talya chegou a cidade com seus amigos ativistas, seu pai estava de carro aguardando o seu desembarque, e juntos seguiram rumo ao santuário, onde sua mãe e filha esperavam sua chegada assistindo televisão, que mostrava notícias ocorridas no domingo naquela cidade e região. Quando Talya entrou na sala da casa, recebeu carinhosamente abraços e beijos de boas-vindas e, neste exato momento aparecia na televisão, uma reportagem sobre o simpósio das causas animais, ocorrido naquele final de semana, mostrando imagens de Talya e suas palestras, deixando todos felizes. Liz, não demorou a perguntar sobre o pai dela, se eles haviam conversado e Talya, aos poucos, foi relatando a conversa que havia tido com ele, alertando a filha que não deveria se iludir, pois não tinha a certeza de que ele viria para conhece-la, já que estava casado e possuía uma família. Liz, toda cheia de esperança, disse que sentia que iria em breve conhece-lo e que não estava nem um pouco enganada. Nem haviam terminado a conversa, sendo que já passava da meia noite, o telefone tocou assustando a todos por causa do horário. Seu pai atendeu a ligação que era de Charles, que se desculpou pelo horário, pedindo para falar com Talya e, assim que ela começou a conversar com ele, ouviu Liz toda ansiosa perguntando se era seu pai. Sua mãe respondeu com gestos, que ela aguardasse terminar a conversa. Ele novamente pediu desculpas pelo horário, perguntando se ela havia chegado bem, comunicando que na manhã seguinte iria até o sitio para conhecer a filha, caso não tivesse nenhum problema, com ela aceitando imediatamente, mas com a condição de saírem juntos os três para um passeio, por ser a primeira vez que sua filha Liz iria conhece-lo, assim ele aceitou prontamente, ouvindo a suavíssima voz da menina a todo momento, pedindo para falar com ele. Assim que Talya deixou Liz falar ao telefone, Charles completamente emocionado, ouviu pela primeira vez a sua voz, prometendo na manhã seguinte ir lá para conhece-la. Terminada a ligação, todos foram descansar, porque já estavam exaustos, pois no dia seguinte seria um dia glorioso, esperado há anos. Naquela mesma noite, quando Charles chegou na casa de seus pais, que era na mesma propriedade onde ficava a casa dele no sitio, sentou-se na sala de estar para conversar com sua mãe, aproveitando que Alexia o esperava na casa deles. Ele começou a contar sobre a sua viagem, sobre o congresso que havia participado, até finalmente falar sobre o encontro inesperado com Talya. Sua mãe ouvia tudo atentamente, curiosa para saber o desfecho daquela história, quando Charles contou para ela que haviam almoçado juntos, até que acabou contando sobre a revelação que ela havia feito, em relação a paternidade da menina Liz. Sua mãe, completamente emocionada, conteve as lágrimas, respirando profundamente, perguntou a ele qual seria o próximo passo que ele iria tomar, ouvindo como resposta que ele pretendia, logo na manhã seguinte, dirigir-se ao santuário para finalmente conhecer a sua filha. Sua mãe respirou aliviada, admirando a atitude digna de seu filho, apoiando-o, incentivando-o a conversar com Alexia naquela mesma noite, explicando tudo, mesmo sabendo que iria causar um enorme mal-estar entre o casal. Charles, sentiu-se aliviado por ter conversado com sua mãe, despediram-se com um amoroso abraço, saindo de sua presença em direção a sua casa. Quando chegou, encontrou Alexia que aguardava a sua chegada, bastante ansiosa, aparentando estar um pouco inquieta, mas eles haviam tido uma briga antes dele ir viajar, porque ela queria a todo custo ter indo junto com ele, mas eles passavam por diversos problemas, inclusive financeiros, estando ela há algum tempo sem emprego, dizendo muitas vezes que gostaria de mudar daquela cidade, mas ele fazia alguns projetos relacionados a agronomia, conseguindo um razoável ganho mensal. Ele começou aos poucos, a contar sobre a sua viagem, procurou ser breve em suas palavras, quando falou do encontro que teve com Talya, percebendo neste momento a expressão facial dela mudar totalmente, principalmente quando ele contou que haviam almoçado juntos. Finalmente, ele contou para ela sobre a revelação que Talya havia feito em relação a filha, contando que ele era o pai biológico de Liz e, que gostaria de ir conhecer a menina. Alexia, nem bem terminou de ouvir todo aquele relato, começou a apresentar surtos, chorou, gritou, ficando completamente descontrolada, sendo que Charles teve que a segurar com força, porque temia que ela tentasse o suicídio, como já havia feito em outro momento de sua vida. Alexia, começou a ameaçar Charles, dizendo que iria deixa-lo, caso ele fosse conhecer a menina, confessando também que havia mentido, quando viu Talya gravida no hospital, mesmo sabendo que ela não estava acompanhada do suposto marido, alegando que tudo que fez foi por amor a ele, com receio de perde-lo. Na manhã seguinte, um pouco antes do café da manhã, Charles levantou-se enquanto Alexia ainda dormia, porque havia tomado alguns comprimidos calmantes, receitados pelo seu médico, na madrugada anterior, logo depois que eles discutiram verbalmente. Após tomar um banho de chuveiro, encontrou Alexia acordada no quarto, enquanto vestia as suas roupas, percebendo que ela se encontrava mais calma, demonstrando uma serenidade como há tempos não se via. Ela perguntou se ele realmente iria conhecer a menina, questionou-o como ele poderia ter certeza de que Talya, falava a verdade em relação a paternidade. Ele calmamente respondeu, que iria sim conhecer a menina e, que acreditava em tudo que Talya havia lhe dito. Despediram-se friamente, assim que ele terminou de se arrumar, indo até a casa de seus pais, onde sua mãe o aguardava para saber o resultado da conversa, que ele teve com Alexia na noite anterior. Tomaram café da manhã juntos, ele e sua mãe, pois seu pai ainda dormia e seu irmão caçula havia ido num acampamento com amigos no litoral. Contou para ela sobre todo o impacto que teve a conversa com sua esposa, sobre a discussão que tiveram, enfim falou tudo detalhadamente. Depois, ele despediu-se de sua mãe, indo rumo à cidade vizinha para finalmente conhecer a sua filha Liz. Era uma manhã de inverno, estando uma temperatura agradável. Liz, foi a primeira a acordar naquele especial, tão aguardado dia em sua vida, acordando a sua mãe com um delicioso café da manhã ainda na cama, havia colhido flores no campo, colocando num pequeno vaso de vidro transparente, enfim, Liz demonstrava uma felicidade total, quando o telefone tocou, com o avô de Liz atendendo a ligação de Charles, pedindo para avisar que em breve estaria de saída, para ir até o santuário. Elas cuidaram de todos os amigos animais, dando-lhes alimentação, água limpa, escovando seus pelos, sendo que Liz falava com eles, contando que estava prestes a conhecer o seu pai, beijando todos carinhosamente, principalmente o burro Eufrásio, que mesmo estando velhinho, era o que mais ela tinha simpatia. Por volta das dez horas daquela manhã, Charles chegou na porteira do santuário, tocando o sino que lá havia, esperando dentro do seu carro para ser atendido, foi quando avistou Talya vindo ao seu encontro com Liz, seu coração palpitava de emoção, principalmente quando Talya entrou no veículo, sentando no banco traseiro, deixando Liz sentar no banco da frente, ela deu um beijo no rosto de Charles, chamando-o de pai pela primeira vez em sua vida, dando a impressão que eles já se conheciam e, que aquele momento era apenas uma visita num final de semana qualquer. Assim, desta maneira, os três saíram para o primeiro passeio juntos, rumo a um parque natural numa outra cidade, onde havia um grande lago, com uma diversidade de aves e animais silvestres, aparelhos de ginastica ao ar livre, arvorismo, tirolesas, esportes aquáticos, entre outros. Passaram um dia completamente diferente de tantos outros já vividos, brincaram, cantaram, divertiram-se, como se aquela fosse uma rotina normal entre os três, como fossem uma família completa, pai, mãe e filha. Em um determinado momento, pararam para lancharem, sentados numa mesa feita de troncos de árvores, embaixo de uma enorme árvore chamada salgueiro-chorão, ao lado do enorme lago, com uma variedade de plantas aquáticas na superfície, inúmeros biguás, patos, marrecos, gansos, capivaras e, uma infinidade de maritacas. Naquele momento, Charles, começou a conversar com Liz, que a todo o momento lhe chamava de pai, sempre acompanhados de Talya. Ele começou a contar a sua vida para a menina desde a sua infância, descreveu toda a sua juventude, até o momento que conheceu a mãe dela, auxiliando no resgate dos primeiros animais até o santuário, contou como procurou de todas as formas aproximar-se de Talya, no dia em que levou o touro Vitório de presente para ela, mentindo que havia comprado de um vizinho, mas na verdade aquele era seu animal preferido em teu sítio, usado como reprodutor de novos rebanhos, descreveu com detalhes sobre o resgate da javalina Jacinta, que a princípio acreditavam que fosse um javali macho, nisto todos os três riram bastante daquela situação, também falou de quando escondeu que era um peão boiadeiro, porque havia se apaixonado por sua mãe, não querendo magoa-la, enfim, terminou contando do acidente que sofreu no rodeio, das fraturas que teve e da perda parcial de sua memória. Liz, ouviu tudo com grande interesse, sempre anotando em um pequeno caderno de notas que havia trazido, algumas coisas que julgava ser mais importante, sobre os gostos de seu pai em relação a bichos, sobre o trabalho dele nas áreas agrícolas, quis saber sua alimentação atual, perguntando também sobre o seu casamento e o fato de nunca ter tido filhos com a esposa, mas este assunto ele preferiu pouco falar. Em seguida, pediu que ela falasse sobre os gostos que possuía, de como estavam seus estudos e, o que ela gostaria de se formar quando atingisse a fase adulta. Liz, toda sorridente disse que com sua mãe e avós, aprendeu a amar os animais como seus próprios semelhantes, que não concordava com animais presos em zoológicos, nem aqueles adestrados para uso em espetáculos de circos, rodeios, que jamais havia se alimentado de qualquer tipo de carne animal e, que era feliz por ser desta maneira. Contou que amava todos os amigos animais do Santuário da Luz Animal, que conversava com todos eles, principalmente com o burro Eufrásio, que respondia às perguntas dela com vários zurros, contou que quando fosse adulta, gostaria de ser tornar médica veterinária, para cuidar dos animais do santuário e de todos outros que surgissem em seu caminho. Antes de finalizar o seu relato, disse que sempre sentiu falta de um pai ao seu lado, perguntando se ele viria visita-la outras vezes. Charles, mirando os seus pequenos olhos, respondeu que faria todo o possível para estar sempre próximo e, que nunca mais ficaria distante dela, disse isto olhando para Talya, percebendo que ela estava completamente emocionada. Liz, perguntou também se haveria problemas ele vir passear com ela, pelo fato de estar casado, mas ele respondeu que este era um assunto que logo seria resolvido. Ficaram ali mais alguns instantes, observando o voo das aves, a imensidão do céu outrora azul, num tom acinzentado, onde haviam formado muitas nuvens, começando a vir ventos fortíssimos, resolveram retornar à cidade onde elas moravam, antes que começasse a chover. Quando estavam aproximadamente na metade do caminho, a chuva chegou lentamente, mas com grande intensidade, fazendo com que eles diminuíssem a velocidade do veículo, aumentando o tempo da viagem, deixando Liz extremamente feliz por estar vivendo aquele momento especial ao lado do seu pai. Quando Charles, deixando-as no santuário, percebeu o quanto havia sido gratificante aquele dia, tanto para ele, quanto para a sua filha Liz, despediram-se com um fortíssimo abraço, trocando vários beijos no rosto. Assim que ele chegou na sua casa, foi recebido logo na entrada pela sua mãe, a qual queria saber todos os detalhes daquele dia especial, mas tiveram que adiar a conversa, porque Alexia vinha na direção deles, aparentando uma expressão de mau humor, difícil de disfarçar. Enquanto caminhavam em direção a casa deles, começaram um príncipio de discussão verbal, mesmo com Charles tentando a todo o custo evitar fazê-lo perto de sua mãe. Tiveram naquele final do dia uma das piores brigas, em todo o tempo de casamento, tornando o relacionamento cada vez mais insuportável e, naquela mesma noite não dormiram juntos, pois Charles diante de todas as circunstâncias, foi dormir na sala de estar, já que no dia seguinte teria que acordar muito cedo. Aquela semana foi um tanto decisiva na vida conjugal de Charles, pois não havia mais entendimento entre eles, com novas mudanças acontecendo também para Talya e sua filha Liz. Alexia, decidiu por conta própria ir passar uns dias na casa de sua mãe, que ficava em outra cidade distante dali, até que a situação deles fosse resolvida, comunicando que não voltaria mais para casa, dando início ao pedido de separação judicial. A semana de Liz foi extremamente radiante no santuário, pois ela estava de férias escolares, podendo ficar mais tempo com sua mãe, nos cuidados diários aos amigos animais. Infelizmente, naquela mesma semana, o bode Godofredo adoeceu vindo a falecer, causando imensa tristeza em toda a família e os amigos ativistas. Até Charles apareceu no santuário, bastante triste, após avisarem da morte do bode, ficando totalmente impressionado, com o respeito que Talya teve quanto ao falecimento de Godofredo, velando o corpo dele com pétalas de flores espalhadas, rodeado de velas coloridas acesas, depois Charles auxiliou um dos amigos que lá estavam, na abertura de uma cova no próprio santuário, embalaram o corpo dele num enorme lençol colorido, todos choravam com muita tristeza, acompanhados do burro Eufrásio e de alguns outros animais. Ao enterra-lo, foram jogadas mais pétalas de flores sobre a cova funda, estando Talya completamente emocionada, disse que a alma dele agora estava livre. Toda aquela cerimonia de respeito, amor e gratidão por uma alma animal que partia, todos os presentes vibraram amor, Talya, sentia dele nunca ter tido uma companheira e, desta maneira não havia ficado nenhum herdeiro, mas deixava infinita saudade, lembrando de quando o encontrou na beira da estrada, juntos aos outros amigos animais, recordou aos risos, como ele tinha um cheiro insuportável, que ela mal conseguia ficar perto dele, achando que jamais conseguiria beija-lo, mas depois de alguns banhos, notou como ele era um animal super carinhoso, um ser cheio de luz, enchendo-o de beijos todos os dias. Liz, estava inconsolada com a morte de Godofredo, pois era o primeiro animal que ela via falecer, daqueles resgatados pela sua mãe na beira da estrada, quando foi fundado o Santuário da Luz Animal. Ela já havia ficado demasiadamente triste em outras ocasiões, quando chegavam alguns animais resgatados por maus tratos, feridos, doentes em estado terminal, que também acabavam falecendo em poucos dias, mas o bode Godofredo havia uma conexão diferente, pois ela o conhecia desde que era pequena. Terminada a cerimônia fúnebre, todos os presentes começaram a ir embora, iniciando pelos amigos ativistas que ali estavam, com Talya os acompanhando até a porteira, onde estavam estacionados os carros deles, permanecendo Charles, abraçado a sua filha que ainda chorava muito. Nos próximos dias que se seguiram, ele esteve mais vezes presente na vida de sua filha Liz e, consequentemente, na presença de Talya, participando das reuniões entre ela e seus amigos ativistas, enquanto a sua situação conjugal não era resolvida. Certo dia, um pouco depois do meio dia, Charles recebeu uma ligação do centro médico de sua cidade, comunicando que seu pai havia dado entrada, pelo pronto atendimento de emergência em estado grave, pois fora encontrado caído na estrada de terra em direção ao sitio, apresentando sinais de embriaguez. Charles, saiu de carro às pressas do sitio, acompanhado de sua mãe, mas ao chegarem no hospital local, receberam o comunicado médico que seu pai havia acabado de falecer, vítima de um acidente vascular cerebral isquêmico, sendo uma grande fatalidade do destino, deixando-os completamente tristes e transtornados, depois logo em seguida, Talya chegou no hospital, acompanhada de seu pai, percebendo o desespero deles. Ela ajudou-o a cuidar de alguns papéis referente ao óbito, para em seguida irem até a funerária local, para providenciarem toda documentação do velório, enquanto o corpo não fosse liberado pelo instituto médico legal, onde seria realizada a autópsia. Charles, telefonou para sua irmã informando o ocorrido, para que fizesse o comunicado aos demais parentes, pedindo que sua irmã ligasse na casa da mãe de Alexia para avisa-la da morte do sogro. Em pouquíssimas horas, praticamente toda a população já sabia do falecimento do pai de Charles, por ele ter sido um político influente, já tendo ocupado alguns cargos públicos. O prefeito decretou luto oficial por três dias, com a câmara municipal cedendo o salão nobre, para que o corpo fosse velado. Naquela mesma noite, começaram a chegar os familiares do falecido, inúmeros amigos e conhecidos da cidade e sitiantes da região, também chegaram a irmã de Charles, seu irmão caçula, em seguida Alexia acompanhada de sua mãe. O corpo só foi liberado durante aquela madrugada, quando chegaram Charles acompanhado de Talya, que ficou com ele durante todo aquele período de dor que todos passavam. Na primeira oportunidade em que Alexia esteve próxima de Charles, dando os pêsames pelo falecimento, aproveitou para comunicar que já havia procurado um advogado para cuidar do divórcio de ambos. Charles, preferiu ficar em silêncio, pois ali naquela hora não era o lugar adequado para este tipo de assunto, mesmo assim concordou com ela para que aquela conversa não se prolongasse ainda mais. Passaram o restante da noite no velório, os parentes mais próximos, alguns pouquíssimos amigos, num clima de bastante tristeza, até as quinze horas do dia seguinte, quando teve o cortejo fúnebre até o único cemitério da cidade, sendo feito o sepultamento num túmulo, com uma lápide gravada os nomes de outros familiares. Em seguida, as pessoas começaram a se dispensar, cada uma delas voltando apressadamente as suas atividades diárias, pois estava chovendo moderadamente naquele momento. Alexia, por várias vezes insistia em querer conversar com Charles, demonstrando uma certa irritabilidade, diante da negativa dele não querer tratar nenhum assunto desagradável, respondendo apenas que eles conversariam em juízo, afastando-se dali em direção ao seu carro, onde levaria sua mãe para sua casa no sítio, pois sua irmã, seu cunhado e o irmão caçula, aguardavam para conversarem sobre o rumo que tomariam nos próximos dias. Talya, já havia se despedido dele, retornando ao santuário com seus pais, juntamente com sua filha Liz, que estava demasiadamente triste, pelo fato de não ter tido a oportunidade de conhecer o avô, mas tinha conhecido a sua avó paterna que, mesmo diante das circunstâncias a tratou muito bem, prometendo ir conhecer o sítio em que ela vivia. A irmã de Charles, juntamente com seu irmão caçula, havia tratado Liz com uma certa indiferença, pois acreditavam que Talya havia inventado toda aquela história de paternidade, para fazer com que o irmão viesse a separar-se de Alexia, mesmo sabendo que há anos, o casal já não tinha um bom relacionamento conjugal. Nos dias que se seguiram, todos voltaram as suas rotinas diárias, com Charles realizando seu trabalho como de costume, apoiando a sua mãe que estava muito abalada com a perda do marido, a sua irmã com o marido já haviam retornado a cidade onde moravam, somente seu irmão ainda morava no sítio, mas ele era uma pessoa fria em questões de sentimentos, que não dava muito valor a família, passando a maior parte de seu tempo fora de casa na companhia de amigos, nunca havia trabalhado em sua vida, mesmo com o grau de escolaridade que possuía. Talya, por sua vez continuava nos cuidados aos amigos animais do teu santuário, prestando atendimento, sempre que possível socorrendo animais abandonados ou mesmo maltratados, feridos e doentes. Num certo dia, ela convocou os seus amigos ativistas para uma reunião no próprio santuário, pois havia chegado ao seu conhecimento, sobre um matadouro de animais numa cidade próxima e, que receberia em poucos dias, um caminhão cheio de porcos para serem abatidos. Ela convidou Charles para participar da reunião também, porque havia notado nele um princípio de interesse, procurando desta forma mantê-lo mais próximo de sua filha Liz. Numa noite daquela semana, todos eles reuniram-se no galpão do sitio, próximo ao estábulo no santuário. Estavam presentes aproximadamente trinta e seis pessoas, cerca de vinte e cinco amigos ativistas, que tinham conseguido trazer mais algumas pessoas, para juntarem-se a ela, seus pais e Charles completavam o grupo. Ficou combinado nesta secreta reunião, que todos eles se encontrariam nas proximidades do matadouro, às vinte e duas horas do dia seguinte, todos trajando calças pretas, vestindo uma camiseta também preta, com um emblema na parte da frente, estampada a foto de um pequeno porco, com os dizeres de defesa da causa animal, repetindo a frase de que animal não era comida. Todos ali reunidos fizeram um pacto, um juramento de que guardariam absoluto segredo, do protesto que iriam realizar em breve. Era de conhecimento de todo o grupo dos ativistas, a crueldade de como os animais eram abatidos naquele matadouro, uma verdadeira carnificina, um holocausto animal. Havia entre eles uma ex funcionária daquele matadouro, contratada para embalar peças de carne dos animais mortos, que descreveu para todo o grupo com lágrimas nos olhos, todos os sofríveis horrores, todo o martírio que os animais passavam, até serem abatidos cruelmente, contou que muitos bois eram mutilados ainda conscientes e, que presenciou diversas vezes, algumas vacas sendo abatidas durante a sua gestação, cenas dignas de um filme de terror. Antes de terminar aquele terrível relato, disse que a maioria dos animais percebem que vão morrer, que ficam apavorados ao extremo, mas que não tem como eles fugirem daquele lugar. Disse que trabalhou lá por apenas dois meses, porque tudo aquilo estava fazendo mal a sua saúde mental, causando distúrbios no teu sono, uma inquietação na sua alma, decidindo em seguida ser adepta do veganismo, nunca mais se alimentando de qualquer tipo de carne, ou mesmo de quaisquer derivados de produtos animais. Todos que estavam ali reunidos, tiveram choros convulsivos, alguns começaram a sentir náuseas, outros chegaram a apresentar vômitos e, com muita dificuldade conseguiram encerrar aquele encontro. Na noite combinada, praticamente todo o grupo de ativistas da causa animal estavam reunidos, no horário combinado, alguns quarteirões antes de chegarem no matadouro, para não chamarem a atenção, enquanto aguardaram a chegada do caminhão, repleto de porcos para serem abatidos. Perceberam que um participante presente na reunião não estava entre eles, estranharam a demora, mesmo assim ele não apareceu conforme haviam combinado. Resolveram caminhar até uma rua próxima a entrada da abatedouro, por onde o caminhão iria passar e, desta forma eles permaneceriam deitados no chão impedindo a sua passagem, todos eles segurando cartazes com dizeres dos direitos dos animais, mas para a decepção de todo o grupo, a rua estava bloqueada com uma barreira humana, com cerca de uns vinte seguranças totalmente armados, entre eles estava o participante da reunião no santuário, um verdadeiro traidor que havia se infiltrado no grupo de ativistas, apenas para obter informações sobre o protesto, um verdadeiro delator. Quando Talya e outros membros perceberam a presença dele junto aos seguranças, todos mal-encarados, começaram a gritar que ele era um traidor, por inúmeras vezes. Naquele exato momento, o caminhão carregando dezenas de suínos, virou uma esquina que ficava no final da rua, vindo lentamente na direção deles, sendo que imediatamente vários integrantes deitaram-se no chão, impedindo a sua passagem, obrigando-o a parar no meio da rua, enquanto os demais puderam observar uma quantidade enorme de animais sujos de fezes, um odor fétido de urina, com ferimentos no seu couro, com sangramentos, alguns com as patas fraturadas, uma cena lamentável com todos porcos soltando seus grunhidos, muito deles com lágrimas nos olhos. Os ativistas carregavam várias garrafas de plástico cheias de água, começaram a dar de beber aos sofridos animais que estavam sendo levados para a morte. Eles choravam de tristeza, tanto as pessoas como também os animais ali confinados, sempre sendo observados pelos seguranças que faziam tudo com a maior frieza, mesmo com as palavras ditas por eles, implorando por um pouco de amor, para que não matassem os animais, pois eles tinham direito a vida e nenhum deles queria morrer, mas tudo isto não os comovia de maneira nenhuma. Nem mesmo o motorista com dois ajudantes dentro da cabine do caminhão se comoveram, permanecendo durante todo o tempo sem sair de lá. Os ativistas choravam, pediam perdão aos porcos por não conseguirem salva-los e, passado um bom tempo sem conseguirem êxito, deixaram o caminhão seguir na direção no portão de entrada do matadouro. Quando o caminhão estava no interior daquele matadouro, os seguranças armados seguiram para dentro da empresa e, desta forma todos os ativistas puderam aproximar-se, ouvindo os grunhidos desesperados dos animais sendo retirados do caminhão com extrema violência, sem nenhuma compaixão. Durante todo o tempo que lá permaneceram, vieram alguns vizinhos das proximidades, se juntando a eles em defesa dos animais, porém, alguns outros das redondezas queixavam-se do tumulto, mesmo que pacifico, ameaçando chamar a polícia, que não apareceu. Somente uma equipe de jornalistas de uma televisão local vieram para dar cobertura, sendo que entrevistaram Talya que estava completamente arrasada, pedindo as pessoas para que parassem de comer carne animal, que deixassem estes hábitos liberando todos animais dos cativeiros em que viviam, dizendo durante toda a transmissão da televisão, para que a humanidade tomasse consciência do mal que estavam fazendo, despertando o amor de dentro de todos os corações desavisados. Encerrou assim toda a sua fala, com todos os presentes gritando a palavra liberdade por vários minutos. Assim começaram a retornar aos seus lares, porque já passava da meia noite, mas deixaram os cartazes colocados na calçada em frente a portaria de entrada de funcionários. Juntos, todos eles participariam ainda de vários outros protestos em diferentes localidades, tudo em defesa dos inocentes animais. Finalmente, passado algum tempo, chegou o dia da audiência de conciliação do divórcio de Charles e Alexia, sendo que ambos chegaram a um acordo comum, concordando com a separação de uma forma amigável, com o juiz assinando declarando-os divorciados, fazendo a partilha de alguns bens que haviam adquiridos juntos. Alexia, retornou para a cidade onde estava morando com a sua mãe, tendo conseguido novamente entrar no mercado de trabalho, após fazer tratamento médico contra a depressão que a incomodava, pela frustração de um casamento que havia terminado, também pelo fato de nunca conseguir ter filhos. Depois de ter saído toda a documentação referente a separação, Charles pouco teve notícias de Alexia, mesmo ela telefonando algumas vezes, querendo conversar para tentar restabelecer o relacionamento entre eles, sem conseguir obter êxito. Passaram alguns meses, soube pela própria Alexia que lhe telefonou, anunciando que estava namorando um médico do hospital, que havia conhecido onde ela trabalhava, dizendo estar bastante feliz e apaixonada. Depois disto, não teve mais notícias dela, perdendo totalmente qualquer tipo de contato. Durante todo este tempo, Charles esteve mais presente na vida de sua filha Liz, participando das atividades no santuário, com campanhas para arrecadarem alimentos aos animais resgatados, sendo as despesas altíssimas, pois os amigos animais tinham alimentos suficientes comprados por eles mesmos. Um certo dia, Charles ficou auxiliando Talya nos cuidados de um cavalo encontrado, com um ferimento em uma de suas patas, caminhando com muitas dificuldade, emagrecido, com sinais de abandono, por uma avenida na cidade onde ela morava e, quando percebeu já havia anoitecido, com Charles se preparando para ir embora, quando a sua filha Liz perguntando para sua mãe, se o seu pai poderia dormir aquela noite na casa deles, já que se aproximava o final de semana, Talya hesitou por um instante, depois consentiu que ele dormisse na sala de visitas. Os três ficaram um tempo assistindo um filme juntos, até que Liz adormeceu ali mesmo. Charles carregou-a carinhosamente no colo, levando-a até o quarto colocando-a na cama, voltando em seguida para a sala de estar já preparada para ele dormir. Talya, tomou um banho relaxante, preparando-se para dormir também, mas perguntou se poderia conversar um pouco com ele que atendeu prontamente. Abriram uma garrafa de um vinho tinto de boa qualidade, guardado há anos, cortaram algumas fatias de um queijo feito com leite de soja, falando sobre vários assuntos, desde o resgate dos animais abandonados, dos protestos que participavam juntos com os amigos ativistas, uma infinidade de assuntos variados, até o momento em que começaram a falar de si próprios, sobre a possibilidade de ficarem juntos, já que os dois eram pessoas livres, não possuindo nenhum deles outro relacionamento. De repente, a energia elétrica foi interrompida, deixando-os completamente no escuro, mesmo antes de continuarem a conversar. Talya, levantou-se indo com dificuldade até a cozinha, encontrando uma vela, acendendo-a em seguida, colocando-a sobre uma mesa de centro, que estava num canto da sala, para dar espaço ao colchão onde Charles dormiria. Acordaram abraçados, os aquecidos corpos entrelaçados, a garrafa de vinho vazia, com o coração transbordante de alegria, cheios da mais finíssima esperança, nem se lembrando do momento em que haviam dormido, percebendo que a vela havia sido queimada completamente, apenas recordando dos mais variados beijos ardentes. Quando Liz acordou, percebendo que seus pais estavam juntos, vibrou de imensa felicidade, abraçando-os, distribuindo dezenas de beijos em seus rostos, correndo em seguida para contar aos avós, algo que eles já haviam percebido antecipadamente. Depois daquela noite especial, em que tinham tomado a decisão de ficarem juntos, construíram uma casa toda feita de material reciclável, no próprio santuário no lado do lago, com um quarto para eles, outro para a menina Liz, uma sala aconchegante com uma belíssima lareira. O burro Eufrásio, envelhecia com dignidade, assim como os outros amigos animais, todos seguiam a vida felizes, sempre tratados com maior respeito, um puríssimo amor. Numa certa tarde de sexta feira, aproximando-se o horário das treze horas, todos os moradores do Santuário da Luz Animal almoçavam tranquilamente, Talya acompanhada de Charles, sua filha Liz e seus pais, quando terminaram a refeição, sentaram-se na varanda da casa da casa deles, conversando animadamente, exceto o senhor Olavo, que preferiu ficar deitado no sofá da sala de estar, para assistir os noticiários esportivos na televisão. Quando passava uma reportagem sobre o seu time preferido de futebol, foi interrompida a transmissão para noticiar, que num estado vizinho ao que eles moravam, numa pequena cidade do interior, havia acontecido um desastre ambiental, com o rompimento de uma barragem com rejeitos de mineração, resultando numa tragédia de grandes proporções, ceifando a vida de pessoas, de criações de gados e outros animais, que viviam nos arredores da barragem, de funcionários da mineradora, contaminando o solo, toda extensão do rio com ondas de lama, destruindo a fauna, a flora, afetando todo o meio ambiente e vários municípios daquele região, prejudicando-os com a falta de água potável em algumas cidades, interferindo na vida de pescadores que tinham o rio como uma fonte de renda. Foi um acidente causado por falha humana e não uma catástrofe da natureza. O senhor Olavo, levantou-se rapidamente do sofá, contando para sua família sobre a tragédia, deixando-os transtornados pela vida das pessoas, pela natureza destruída, pelos animais mortos e que foram afetados totalmente, pois muitos que sobreviveram dependiam da água do rio para beber. Os dias foram passando, com vários noticiários informando o andamento do resgate dos corpos encontrados sobre a lama, sobre a ajuda humanitária que vinha de várias regiões do país, causando uma comoção nacional e até a nível mundial. Talya e Charles, convocaram o grupo de amigos ativistas, para que pudessem elaborar um jeito de todos irem até a cidade afetada, levando água, medicamentos, roupas e, para auxiliar também no resgate de animais feridos. Por alguns dias, fizeram algumas campanhas com moradores de sua cidade que estavam solidários, sensibilizados pela ganância de seres humanos que só visavam bens e lucros, não se importando com a vida das pessoas e dos animais, enfim, por toda a destruição causada. Infelizmente, a raça humana falha em muitos aspectos, mas negligenciar o erro é o pior de todos eles. Em vários lugares do país, organizações não governamentais, grupos religiosos e cidadãos comuns também arrecadaram alimentos, medicamentos, água, faziam vigílias e orações pela vida dos mortos e desabrigados, havendo inclusive ajuda humanitária de outros países. Vários grupos protestaram, exigindo uma posição sólida, cobrando do governo federal mais rigor nas fiscalizações destas mineradoras, considerando esta tragédia como um crime ambiental, já que foi causada por falha humana. Charles, conseguiu arrumar em sua cidade, com uma empresa de transporte local, um micro-ônibus para leva-los até a cidade, onde havia acontecido o rompimento da barragem. Reuniram todos os amigos ativistas, na praça central na cidade onde Talya morava, logo de madrugada no quinto dia após acontecer a tragédia, cerca de trinta integrantes do grupo levando mantimentos, medicamentos, materiais de primeiros socorros, de higiene e galões de água. Juntaram-se a um grupo de uma cidade vizinha, que estavam com um caminhão repleto dos mesmos produtos arrecadados por eles, um verdadeiro ato de amor e solidariedade. Depois de longas horas de uma viagem exaustiva, com um calor escaldante que se aproximava de quarenta graus celsius, finalmente chegaram ao seu destino, unindo a outros grupos que já prestavam atendimentos as vítimas, auxiliando o corpo de bombeiros local e outros vindo de cidades vizinhas, na busca por sobreviventes, auxiliando desabrigados, resgatando animais presos na lama. A cena era de horror total, um odor fétido de podridão no ar, devido a decomposição dos corpos de pessoas e animais. Talya, Charles e seu grupo de amigos choraram de imensa tristeza por toda aquela perda e destruição, tendo consciência que aquele desastre poderia ter sido evitado, já que não era o primeiro ocorrido no país há várias décadas. Na primeira noite em que lá chegaram, eles dormiram no ônibus, pois haviam chegado na parte da tarde, alguns em barracas de camping que haviam levado e, também em alguns galpões improvisados como depósito de mantimentos e dormitórios, com as demais pessoas de outras regiões do país. No segundo dia, logo de madrugada todos despertaram, receberam orientações dos bombeiros, sobre os cuidados que deveriam ter, sobre os riscos que estariam sujeitos, fizeram um cadastro com um funcionário da administração municipal, pois haviam pessoas mal-intencionadas praticando saques em algumas propriedades semi destruídas, carregando objetos pessoais dos moradores, eletrodomésticos, enfim praticando furtos, demonstrando uma falta de amor em seus corações. Talya e seus amigos, conseguiram realizar o resgate de vários animais perdidos, de alguns ainda vivos presos na lama, que eram encaminhados para um grande cercado construído para abriga-los, sendo que foram lá pessoalmente para observar as reais condições que eram tratados estes animais, percebendo que estavam tendo um tratamento digno pelos cuidadores. Estiveram também numa aldeia indígena, situada na região próxima onde a barragem havia se rompido e, muitos deles haviam perdido familiares depois do desastre, lamentavam a morte do rio de águas doces, mas que haviam se transformadas em águas amargas, um rio de lama, destruindo toda a vida aquática, com uma mortandade de milhares de peixes. Presenciaram uma cena que os comoveu de tamanha tristeza, totalmente desoladora, quando estavam conversando com uma índia daquela aldeia, próximo à beira do rio de lama, observam um pássaro que sobrevoava o rio, deu um voo rasante até perto da água na intenção de bebe-la, mas não chegou a tocar na água contaminada por rejeitos de minérios, dando meia volta, pousando sobre uma árvore. Uma cena digna de um filme de terror, algo que jamais esqueceriam, mas nos dias que se seguiram ajudaram muitas famílias, levaram palavras de ânimo e fé, já que todos praticavam a religião do amor. Ficaram ali por cinco dias, fazendo todo o possível para cooperar com o bem-estar das pessoas, que haviam perdido bens materiais e familiares, prestando todo tipo de apoio, salvaram as vidas de inúmeros animais, lamentando de não puderem fazer mais do que gostariam. Esta viagem tornou o relacionamento com Charles mais sólido, com Talya percebendo como estavam mais unidos e apaixonados, provando que tudo é possível quando se tem fé e amor verdadeiro. O tempo e a distância, todos os obstáculos que enfrentaram quando estavam distantes, não foi o suficiente para destruir algo que havia os aproximados, desde que fizeram juntos o resgate dos animais perdidos, até o momento em que eles completamente apaixonados, tinham algo mais forte que os envolviam, a belíssima menina Liz. Retornaram para a cidade deles, com o sentimento de dever cumprido, mesmo desejando ter feito muito mais, mas tinham em sua consciência, terem realizado tudo de uma maneira simplesmente completa. E assim é a vida, nascemos, crescemos, vivemos, morremos. É uma partida e uma chegada, um vai e vem, um ir, um voltar. Estamos sempre indo, constantemente voltando. Estamos sempre chegando, sempre partindo, até alcançar a liberdade total, onde não haverá mais chegada e nem partida, onde ninguém mais, seres humanos ou animais, sentirá dor, ninguém mais chorará. Numa certa noite de primavera, com um céu totalmente estrelado, todos no Santuário da Luz Animal dormiam profundamente, totalmente exaustos, após um dia bastante cansativo, quando haviam retornado daquela viagem humanitária. Charles, dormia abraçado a Talya em sua cama de casal, Liz encontrava-se deitada no seu quarto rodeada com o gato Astolfo, os pais de Talya dormiam na casa deles, com o cachorro Thor deitado na varanda, com todos os amigos animais deitados no enorme curral, o velho cavalo Hércules, a égua Esmeralda, o cavalo Pirata, a vaca Maricota junto do touro Vitório, a vaca Quinha, as três ovelhas Maia, Clara e Branca, o porco Juvêncio com a javalina Jacinta e sua prole, Otto, Luna e Ayla e, alguns outros amigos animais nascidos no santuário, ou resgatados para tratamento, somente o burro Eufrásio, estava deitado sobre o pasto, pois ficou contemplando as estrelas, recordando da primeira vez em que haviam chegado no santuário, após serem resgatados por Talya e Charles. Quando estava prestes a dormir, com seus olhos estando quase fechados, pode observar uma incandescente estrela cadente na imensidão daquele céu, sentindo uma enorme felicidade por todos os anos vividos, após chegar no Santuário da Luz Animal. Logo, também adormeceu profundamente como os outros e, todos já sonhavam a algum tempo. O burro Eufrásio, finalmente sonhou. Ele sonhou que estava deitado no pasto junto a relva, completamente verde, cheio de árvores frutíferas, algumas plantações de algodão, um extenso milharal, num belíssimo entardecer de primavera. Neste teu profundo sonho, ele sonhava que estava dormindo, ainda filhote, ao lado de seus pais, mamava, brincava, pulava, corria por um campo vasto e florido, haviam dois arco íris num céu totalmente azul, próximo a uma enorme montanha, mesmo não tendo chovido, onde aos poucos, o sol se escondia lentamente. Neste lugar não haviam cercas, nem porteiras, apenas um extenso ribeirão de águas cristalinas, que desembocavam num lindíssimo lago cheio de patos, marrecos, um bando de andorinhas azuis, dando voos rasantes sobre a água, ouvindo o palrar de inúmeras maritacas a voar, depois pousadas sobre a copa das gigantescas árvores, centenas de borboletas multicoloridas voavam na beira do lago, pousando em seguida sobre o solo úmido, havia um belíssimo beija flor sobrevoando, uma variedade de flores das mais diversas formas e cores, foi então que ele avistou a alma do bode Godofredo, saltando sobre algumas nuvens brancas, até desaparecer atrás da linha do horizonte. Seu coração palpitava de extrema felicidade, uma sensação indescritível como nunca havia sentido anteriormente, um êxtase totalmente delirante, foi quando ele viu a menina Liz, completamente emocionada, que vinha correndo em sua direção e, conforme ela ia aproximando-se dele, estava crescendo de tamanho, crescendo cada vez mais, já não era mais uma criança, havia se tornado uma linda mulher, com o seu rosto idêntico ao de Talya, seus olhos estavam brilhantes, sua suavíssima voz soprava uma canção que vibrava amor, sendo que ela beijou-o carinhosamente e, por detrás dela haviam centenas de animais caminhando, vindo todos em sua direção, cada um deles soltando o som da sua característica voz, cavalos, bois, carneiros, porcos, gatos e cachorros, uma variedade de animais silvestres, todos sadios, livres, cheios de vida. De repente, o burro Eufrásio despertou deste sonho, percebendo que ainda dormia, estando deitado num extenso campo escuro, pois naquele momento era uma noite fria, sem nenhuma estrela a brilhar no céu. Aquela estranha noite, foi uma das mais longas na vida do burro Eufrásio, um silêncio total, cessaram os ventos, qualquer tipo de som naquele momento era inaudível, o cricrilar dos grilos, o chirriar das corujas, o coachar dos sapos, rãs e pererecas. De repente, o burro Eufrásio sentiu algo o aquecendo, aquela interminável noite fria foi tornando-se cada vez mais quente, conseguindo perceber um raio de luz bastante distante, mesmo estando ainda de olhos fechados, algumas vozes humanas começaram a chegar aos seus ouvidos, mesmo que ainda imperceptíveis. Sentindo seu minúsculo corpo começando a tremer, tentando a todo o custo acordar daquele misterioso sonho, mas por mais que tentasse não conseguia despertar, sentindo um medo incomum, incontrolável, beirando ao total desespero, perdendo a noção do tempo e das irreais horas. Quando tudo parecia estar perdido, sentindo seu corpo ficando cada vez mais solto, percebendo um grande clarão que ofuscava seus olhos, obrigando-o a fecha-los novamente, sentiu duas mãos femininas segurando-o, acariciando-o suavemente e, quando finalmente conseguiu abrir novamente seus olhos, estava no estábulo do Santuário da Luz Animal, contemplando o rosto adulto de Liz, que estava ao lado de sua mãe Talya, felizes, emocionadas, sendo que a filha olhou para a sua mãe, em seguida olhando para o seu pai Charles, que estava ali próximo delas, todos deram um singelo sorriso, com a jovem Liz batizando-o carinhosamente de Eufrásio.