A Queda de Tsathoggua

Há muitos milênios, quando a humanidade ainda era jovem e não havia criado seus deuses, Tsathoggua veio das estrelas dos confins do universo. A entidade caiu em algum lugar do continente europeu, e se escondeu em túneis por ela cavados e depois em antigas galerias subterrâneas. Os anos se passaram e muitos povos da região serviram de refeição ao deus-sapo, como ficou conhecido nas lendas romanas e celtas.

Tsathoggua atraia suas vítimas através dos sonhos, chamando-as por meio de um convite irrecusável. Homens, mulheres e crianças ficavam entorpecidos e eram vistos cambaleando noite à dentro até a floresta de N’kai, morada do horrendo deus. Nos primeiros milênios, Tsathoggua parecia insaciável. Devorou vilarejos inteiros, espantou tribos nórdicas, forçando migrações. Até que um líder Viking teve a coragem de fazer um trato com o monstro. Todos os anos, três vítimas seriam oferecidas como sacrifício e cultos seriam prestados em homenagem a Tsathoggua. Uma grande escultura foi erguida no centro da aldeia de Astrid. Em troca, Tsathoggua deixaria de atrair os moradores locais por meio de sonhos.

O deus-sapo aceitou a adoração dos humanos, seres que enxergava como miseráveis e inferiores. No século X, o culto foi interrompido devido a guerras na região e Tsathoggua permaneceu hibernando em silêncio.

No alvorecer do século XX, algo ocorreu, talvez algum alinhamento das estrelas, pois o deus-sapo acordou de sua hibernação. E para a desgraça do vilarejo de Ibi, localizado alguns quilômetros da caverna da besta, Tsathoggua estava novamente faminto. Aldeões de Ibi passaram a ter sonhos horrendos com um sapo gigante, todo enrugado e nojento. E aos poucos, Tsathoggua os atraiu até sua caverna e os devorou.

Certo dia, três crianças do vilarejo sonharam e em seus sonhos viram o deus-sapo as convidando para a caverna e como um feitiço, deixaram suas casas e foram até a antiga floresta de N’kai. Chegando na entrada da caverna, o pequeno Leon despertou do transe e viu que seus vizinhos adentravam na escuridão. O menino gritou desesperado, tentou avisá-los, pois sabia das lendas sobre o monstro adormecido de N’kai. Mas foi em vão, os pequenos foram em direção ao covil da besta. Leon, criou coragem e adentrou a caverna, desceu o mais profundo naquela escuridão fria. Mas era tarde demais, seus amigos estavam diante do poderoso Tsathoggua, que naquele momento, lambia os lábios grossos preparando-se para se banquetear com a carne fresca a sua frente. Leon jamais esqueceu a horrível cena das pernas das crianças desaparecendo na boca nojenta do sapo gigante. Tsathoggua. Ainda por cima, o monstro, como que zombando dele, cuspiu os sapatos bem longe. Leon reuniu toda a coragem que restara, recolheu um dos sapatos e saiu correndo daquele inferno úmido enquanto a língua do deus-sapo tentava alcançá-lo ricocheteando pelas paredes.

A mente do jovem Leon se desfez de tal maneira que nos anos seguintes, caiu em delírios cada vez piores até que foi internado no hospital psiquiátrico de Volterra. Pelo resto da vida balbuciou a palavra N’kai enquanto segurava um sapatinho marrom, muito surrado. O povo de Ibi conhece a lenda e até hoje muitos moradores dormem apenas quatro horas, com medo de que Tsathoggua os visite em sonhos e os leve para abismos insondáveis na floresta de N’kai.

Alan Narcizo
Enviado por Alan Narcizo em 10/11/2024
Código do texto: T8194125
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