O Conto do Mentor
A Viajante teve um Mentor. Era um homem de mil facetas. Às vezes aparecia como um jovem cínico, às vezes, como um senhor sábio.
A verdade era que o Mentor gostava dela. Um carinho paternal, como se soubesse do potencial da jovem garota e quisesse ajudá-la a seguir os passos corretos.
A Viajante não se lembrava da primeira vez que havia encontrado com ele. Não sabia desde quando o Mentor lhe observava. Só se recordava de um dia ter feito uma aposta com aquele senhor e, eventualmente, perdido. Algo bobo, mas que foi um marco em sua vida.
Outras pessoas tinham medo do Mentor. Os boatos que surgiam na cidade era de que ele não era um homem de muita confiança. Poucos sabiam seu verdadeiro nome, quase ninguém conhecia seu passado. Sua fama era de um "jogador nato", aquele que levaria qualquer um a cair na tentação de uma aposta perigosa. Mas não para a Viajante. Para ela, o Mentor era um mártir e, talvez por isso, ela respeitava-o.
Esse respeito, junto de outros pequenos favores, levou o Mentor a ser o melhor conselheiro que a Viajante poderia ter na vida. Ela apreciava toda a ajuda que ele poderia lhe oferecer. Mesmo sabendo que nada durava para sempre.
Tanto, que eventualmente, um dia o Mentor sumiu. A Viajante sabia que não precisava mais dele, que daquele ponto em diante teria que seguir sozinha. Houveram momentos difíceis, momentos onde ela se perdeu e precisou se encontrar. Momentos em que parecia não ter saída e que seu coração sentiu dores que jamais ela pensaria que sentiria. Mas a Viajante sobreviveu. E agora ela seguia seu caminho.
Anos se passaram e seu rosto não era mais nada além de uma vaga lembrança em sua mente. Tudo o que parecia certo se desmanchou em um simples sopro, quando o Mentor voltou.
Dessa vez, ele era um homem jovem, alto, magro e elegante. Seus cabelos rebeldes caiam sobre seus olhos e seu sorriso largo escondia a malícia de quem sabe muito bem o que se quer.
A Viajante ficou genuinamente feliz em vê-lo. Era como reencontrar um velho amigo. E o Mentor, mesmo sentindo a culpa de ter partido, não demonstrava, para ela, nenhum arrependimento. O orgulho era sua marca registrada mesmo depois de tanto tempo.
A princípio ele não queria saber das novidades. Era como se já soubesse de tudo, mesmo isso sendo mentira. Também não revelou para a Viajante o motivo de nunca mais ter aparecido para lhe dar conselhos ou lhe estender uma mão amiga. Naquele instante, o Mentor só queria falar de uma coisa: amor.
A ficha da Viajante não demorou muito para cair. Os boatos provavelmente haviam chegado nos ouvidos do seu velho Mentor. Ela andava distraída e esperançosa nos últimos dias. Estava escrevendo poesias românticas e se declarando para uma certa pessoa em especial. Alguém novo, alguém que o Mentor não conhecia.
E esse era o motivo de sua volta. Ele queria saber quem era a Nova Musa da Viajante. Mas, para aquela pergunta, não havia uma resposta ainda. O coração confuso e medroso da Viajante deixou isso bem claro.
A verdade era que, apesar de todos aqueles anos, seu velho amigo ainda se preocupava e queria seu bem. Ele nunca diria aquilo em palavras diretas, se expressar era algo que lhe tomava tempo e ele não dava isso facilmente para ninguém.
Então, o que o Mentor fez, foi dizer que ela não deveria apostar em possibilidades de corações quebrados.
E a Viajante pode confirmar, naquele exato momento, sobre o que se tratava aquele reencontro.
Ele, então, lhe fez uma última proposta. Uma aposta boba, como a primeira que haviam feito a muito tempo atrás.
Ele queria que ela provasse que não entregaria seu coração à alguém que não merecesse. Que não deixaria ninguém quebrar o que ela levou tanto tempo para consertar.
A Viajante, confiante, respondeu que ele não precisava se preocupar com isso. Que ela havia aprendido a lidar com situações como aquela e que ela não se iludiria com situações falsas.
O Mentor ficou orgulhoso de ver onde sua aprendiz havia chegado sozinha, do amadurecimento daquela jovem sonhadora.
Mas ele sabia que, no fundo, ela ainda era uma romântica incurável que, se não tomasse cuidado, entregaria seu coração pra pessoa errada e não perceberia isso a tempo suficiente para se prevenir de uma decepção.
Esse era seu maior receio, mas o Mentor sabia que não deveria lhe dizer mais nada. Daquele momento em diante, caberia apenas a ela saber lidar com suas próprias batalhas.
Depois daquela aposta, a Viajante seguiu seu caminho, novamente sozinha, se questionando como conseguiria ganhar aquela aposta. Se questionando quanto tempo levaria para provar para seu Mentor que ela era uma pessoa diferente do que um dia havia sido e, com certeza, um diria iria ser.