O SONHO DO MEU CORAÇÃO

Um dia noite alta e espessa, escura como breu, após um período de chuva intensa, eu dormia pesado e tive um sonho!

Eu sonhei, que havia uma nova lei no país e que estava gerando muitas discussões entre as pessoas. Era uma lei uma pouco estranha, onde as pessoas deveriam ser enterradas sem o seu coração. Este, por ser o guardião das nossas emoções e símbolo de nossa humanidade e compaixão, deveria seguir na terra, devidamente embalsamado e guardado pela família, como uma lembrança, uma relíquia. Serviria, de acordo com o espírito da lei, para lembrar a todos que temos um coração e que precisamos usá-lo em nossas decisões, em nossas ações diárias.

Confesso que fiquei um pouco dividido sobre isso, mas como um escrevinhador de versos e um pobre cultivador de sentimentos, acabei achando a ideia legal. Nem todas as pessoas aderiram a este hábito, muitos eram contrários, visto como um ato, um pouco macabro ou sinistro ou ainda contrário às suas crenças.

Com o tempo, esperava-se que o ato fosse incorporado ao dia a dia, à cultura das famílias e todos os corações seriam, no futuro resgatados e cultuados como se faz, com as fotos do falecido, que se empoeiram sobre os criados mudos das casas, porém com mais força, por se tratar de um pedaço do corpo e da alma do indivíduo amado.

Neste início da vigência da lei, vi porém, que muitos corações, não eram recolhidos pelas famílias e ficavam guardados numa espécie de IML, à espera de serem resgatados por alguém da família ou um admirador, ou um amigo ou, então, eram, simplesmente, abandonados para sempre.

No meu sonho, o meu coração ficou nesta espécie de necrotério, por algum tempo. Isto me agoniava um pouco. Um dia, porém, ele foi resgatado por uma senhora sensível. Descobri, depois, que ela lia meus poemas e que, portanto, esta era a razão para ela ter levado meu coração para sua casa e o colocado numa pequena redoma de vidro dentro de uma velha estante.

Notei, que ela ficava, às vezes incomodada com as perguntas sobre seu gesto e do porquê guardava o coração de uma pessoa estranha. Mas ela, sempre respondia, que se tratava de um coração de um velho poeta, que ela gostava. Um dia uma amiga próxima e querida, a inquiriu com mais veemência realçando que aquilo soava meio mórbido e isto a constrangeu de verdade. Ela ficou pensativa, por uns segundos depois respondeu calmamente:

-Sabe, disse ela...eu o guardo, porque aqui, apontando para o meu velho coração, aqui, um dia, morou o amor! Então diante desta resposta, a pessoa se convenceu e concordou e não mais perguntou nada, meio que desmontada pela força do argumento.

Achei criativa a maneira, como ela construiu sua resposta. Me fez sentir amado!

Então, de repente, um galo meio rouco cantou, as luzes do dia que entravam pelas frestas da janela e davam na minha cara, fez-me abrir os olhos! Acordei assustado, pondo logo a mão no meu peito. Sim meu coração estava lá, porém, fiquei emocionado ao lembrar do sonho e com o destino feliz do meu coração e fiquei desejando que aquele sonho fosse de verdade e que os corações fossem mesmo uma forma de homenagearmos a todos aqueles entes queridos, que nos deixaram e como um símbolo do amor e da fraternidade das pessoas, então, ainda comovido, decidi dividir este sonho louco, com vocês.

Celio Govedice
Enviado por Celio Govedice em 22/03/2024
Reeditado em 22/03/2024
Código do texto: T8025296
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