- IX -
Comunhão
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Capítulo VII: Bruno e Artemísia conversam sobre o mundo espiritual. Algo muda em Bruno.
Capítulo VIII: Mike e Charles salvam Bruno de um ataque misterioso.
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Após alguns dias desde o último incidente que quase pôs meu apartamento abaixo, recebo uma mensagem de Mike no meu celular:
“Precisamos conversar. Todos do time. No mesmo local e sempre. Amanhã às18h”
Olhei a minha agenda, e não havia nada marcado. Apenas respondi: “Ok”.
Às vezes eu só queria ter a minha vida normal de volta. A parte boa de tudo isso é Mônica, se não fosse por ela, não sei se isso tudo valeria a pena.
Por falar em normal, estava dando uma olhada nas minhas redes sociais e acabei me deparando com umas manchetes estranhas:
30 anos desde o fechamento da mina de Santa Bárbara – entenda o caso.
Turista diz ter sobrevivido ao verdadeiro terror após cair no golpe ‘boa noite cinderela’.
Criminalidade aumenta Serra dos Cristais: disputa de poder entre as gangues seria a razão.
Animais mutilados são encontrado em fazenda – lobos e onças são suspeitos.
Relatos de avistamentos de seres sobrenaturais aumenta em Serra dos Cristais – Folclore peculiar
Por um instante pensei sobre o que Mike me falou naquela noite: “O que é realidade para você? ”. Às vezes a realidade é tão macabra e sem sentido que até mesmo o nosso senso de normalidade é desafiado.
Meus pensamentos foram interrompidos quando me lembrei da primeira aparição de Uriel, quando ele disse: “Domingo, ao anoitecer, voltem a essa sala e haverá algo para vocês. Vocês são os meus escolhidos, aqueles que ouviram ao meu chamado. Seu fardo será pesado, mas sua honra e glória serão ainda maiores.”
Tentei não pensar muito no assunto até o dia derradeiro. Mônica me buscou e juntos fomos a “Sala Branca”, como apelidamos o local das reuniões.
Seguimos em direção ao prédio comercial. Em dia de domingo, a movimentação é mínima. Contudo, percebemos que havia muito mais gente do que o de costume. Algumas pessoas vestidas de branco, como se fossem alguma espécie de médicos ou cientistas e umas três câmeras focada no centro da sala, onde havia um enorme sigilo mágico desenhado no chão.
Assim que vi Mike me aproximei e perguntei a ele o que era tudo aquilo. Ele olhou ao redor e falou:
- Aproveitando que você fez essa pergunta, vejo que estão todos aqui. – com um pausa, chamou ou outros participantes um a um para o lugar específico na borda do sigilo. Cada um ocupando seu devido lugar.
Após isso, ele continuou:
- Fico feliz que tenham aceitado o convite! É um prazer revê-los aqui: Mônica, Bruno, Charles e Artemísia. Por favor, não fiquem acanhados com a presença dos meus amigos pesquisadores, Dr. Stevenson e sua equipe. Eles estão aqui a meu pedido e estarão monitorando a situação.
Um senhor com jaleco branco acenou a todos com um sorriso breve e voltou seus olhos ao equipamento.
- Infelizmente, a situação em que nos encontramos é extrema. Os fenômenos espirituais e os materiais estão ficando cada vez mais interligados e intensos. As interferências externas e internas são inegáveis. Alguns de vocês podem ter experimentado eventos negativos e até mesmo agressão de entidades e indivíduos que é difícil da mente racional processar.
Eu pensava que ele estava falando aquilo diretamente para mim, mas percebi que os outros também concordavam com o que fora dito, o que me deixou ainda mais preocupado. Afinal, não tinha noção do que eles teriam passado também.
- Contudo. Hoje é o dia da nossa comunhão com a energia de Uriel. Com esse ritual, teremos o nosso corpo fechado para esses ataques. Além disso, compartilharemos nossas habilidades uns com os outros, uma vez que El é o caminho.
Aquele papo todo estava ficando estranho para mim. Lembrei daquilo que já tinha levantando antes. Afinal, se esse Uriel era considerado um dos anjos mais próximo de Deus, Regente do Sol, Anjo da Morte e guardião da chave do inferno, não seria ele o próprio Lúcifer, travestido de luz e bondade para nos enganar?
Lembrei-me de outra frase que ouvi quando estava com Artemísia: “Nem tudo é aquilo que parece. Tome cuidado, certas coisas só você pode fazer. As decisões são suas e somente suas. ”
Mike olhou sério para cada um de nós e falou:
- Aqueles que estão aqui, estão porque assim o querem de livre e espontânea escolha. Se alguém quiser sair, desistir ou simplesmente não se sentir à vontade de continuar, por favor, saia.
Todos ficaram se olhando por alguns segundos.
Minha mente gritava: “Vai, sai! A hora é agora! ”. Por outro lado, depois da surra que levei daquele ser trevoso, pensava: “ Se acontecer aquilo comigo novamente, ou pior, será que ainda poderei contar com a ajuda do grupo? ” “Como será a minha vida depois disso? ”
Olhei para os lados e minhas pernas bombearam. Mas fiquei no meu lugar.
- Muito bem. Dr. Stevenson, pode desligar a luz, por favor? - comandou Mike.
Logo depois, o breu se instalou e Mike instruiu:
- Apenas repitam o que eu disser e repitam os gestos que vou fazer.
Então ele começou a falar, bradar, quase que gritar algo em uma língua desconhecida. Repetíamos de forma a tentar imitar, sem muito jeito.
Eu tentava olhar para Mike para repetir os gestos, mas a escuridão era muito grande. Mas, após algum tempo, meus olhos se acostumaram à negrume e passei a imitá-lo. Estávamos todos ajoelhados em posição de suplica.
Um fogo sem forma surgiu flutuando no meio da sala. De dentro dele saiu o homem que tinha visto no primeiro dia, Uriel. Ele ardia em chamas sem se queimar e dele brotaram seis asas cheias de olhos que cobriam o seu corpo.
Uma voz de trovão ecoou:
- Eu sou e vocês são parte de mim. Juntos, nós somos um.
Fios dourados partiam de nós até aquele ser e entre os participantes que estavam naquela espécie de círculo mágico. Aqueles elos envolviam nossos corpos como fios cruzando um tecido a ser fechado, protegido, suturado. Ao mesmo tempo, uma batida rítmica como um tamborilar rápido atravessava meu corpo, sentia que aquilo não era só comigo, estávamos ali vibrando, literalmente em um mesmo ritmo. Minha cabeça e minhas mãos formigaram, parecia que tinham se expandido.
Ao final, observei ao redor e vi uma marca dourada nas testas dos demais e em suas mãos. Olhei-me para ver se também tinha tais marcas, e pude confirmá-las.
Ao acender das luzes, não havia mais nada ao centro da sala. As marcas em nossos corpos sumiram.
Mike perguntou ao Dr. Stevenson se deu tudo certo, ao passo que ele apenas levantou o dedo polegar, sorrindo e começou a juntar os materiais para sair.
Procurei Mike para saber o que fora aquilo tudo, ao passo ele me respondeu:
- Leigamente, isso foi uma sessão de “fechamento de corpo”. Todavia, em termos mais exatos, fomos retificados energeticamente e sincronizados com a energia de Uriel. Os seres mais trevos de baixa potência nos evitarão. Contudo, aqueles de maior potência poderão se sentir tentados a nos confrontar.
- Isso é bom ou ruim?
- Imagine que antes havia uma casa com muro baixo e sem grades nas portas e janelas. Agora imagine a mesma casa com muros de três metros de altura, alarme, cerca elétrica e grossos portões, grades e um aviso de 'cuidado, cão bravo'. Qualquer ladrão de ocasião será afastado, mas levantará a curiosidade de grupos mais preparados. Antes, éramos as casas desprotegidas. Agora, somos como as casas aparamentadas. Entende? De qualquer forma, basta pensar e se concentrar para entrar em contato. Durante o processo, foi criada uma linha direta telepática entre nós.
Ao final, todos foram se despedindo amigavelmente, como se nada de anormal tivesse acontecido. Será que eles não sentiram nada, ou já estavam acostumados àquilo?
Quando Mônica me deixou em casa ela me fez uma pergunta, pouco antes de eu sair do carro que me deixou pensativo:
- E aí, como é a sensação de estar com o corpo fechado? – perguntou em tom de brincadeira.
Eu sinceramente não sabia como responder. Tudo aquilo era muito novo para mim. Dei um sorriso amarelo e respondi, antes de entrar:
- Não sei. Na verdade, nem sei como deveria me sentir. - Apenas fechei a porta e segui para o meu apartamento.