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Sobretudo marrom sobre um terno de tweed cinza, um vasto bigode branco na cara vermelha vincada de rugas, a cabeleira longa combinando com o bigode, e um cachimbo de espuma do mar pendendo do canto da boca. Ela conhecia aquele homem que a encarava com um sorriso discreto, do outro lado da porta de vidro. Mas de onde, questionou-se?
- Vai me deixar entrar? - Indagou ele calmamente.
Só então Adela lembrou-se de que trancara a porta da livraria, ao ir buscar exemplares de "Fadas entre nós" no depósito. Deu um tapa na testa e girou a chave na fechadura.
- Perdão, senhor, seja bem-vindo - cumprimentou-o. - Boa noite!
- Boa noite, senhorita - replicou ele, olhando ao redor ao entrar na loja. - Puxa, fazia tempo que não visitava uma dessas! Vocês funcionam 24 horas por dia, não é?
- Sim senhor - acedeu Adela. - Temos livrarias de plantão espalhadas pela cidade porque este é um serviço considerado essencial.
- Naturalmente - comentou pensativo o visitante, tirando o cachimbo do canto da boca. - Nunca se sabe quando vai aparecer alguém precisando de refúgio...
- O senhor... não vai acender isso aí, vai? - Questionou cautelosamente Adela, parada no meio do salão.
O homem lançou um olhar surpreso para ela.
- Eu? Não! - Exclamou, dando uma risadinha. - É um velho hábito, andar com esse cachimbo apagado. Depois que sair, vou acendê-lo lá fora.
- Ah, bom - suspirou Adela aliviada. - Mas o senhor veio apenas para conhecer a loja ou está procurando alguma obra específica?
O homem empunhou o cachimbo na direção dela, como se o estivesse oferecendo.
- Esta é a semana do lançamento de "Fadas entre nós", certo? - Inquiriu.
- Pré-lançamento, senhor - corrigiu-o Adela. - Vamos entregar os exemplares comprados em pré-venda.
- E sobrou algum volume desses, da pré-venda?
- Infelizmente não, senhor - lamentou Adela. - Fizemos até uma lista de espera, caso houvesse alguma desistência.
- E... ? - Ele recolocou o cachimbo apagado no canto da boca e encarou-a de modo arguto.
- Ninguém desistiu - informou a jovem.
- Ótimo! - Aplaudiu o homem, para surpresa de Adela.
- Mas... imaginei que o senhor quisesse um exemplar.
Ele fez um gesto negativo com o indicador.
- Não, eu não... já li esse livro tantas vezes que até decorei algumas passagens.
E foi só então que Adela reconheceu quem estava diante dela.
- O senhor... o senhor é Sir Arthur Darrington! - Exclamou extasiada.
- Acho que estou mais jovem na foto da orelha do livro - o homem riu baixinho. - Mas, verdade, sou eu mesmo.
- É uma grande honra tê-lo em nossa humilde livraria, Sir Arthur - disse Adela, flexionando ligeiramente os joelhos e curvando a cabeça em saudação.
- Igualmente encantado... Adela - disse ele, estreitando os olhos para ler o nome da jovem na plaqueta de identificação presa ao avental. - Vim para a cidade fazer marketing do livro e achei que seria uma boa ideia poder conhecer um dos lugares onde a magia acontece.
Adela sorriu.
- Não, Sir Arthur. Aqui é o lugar onde a magia NÃO acontece.
Ele deu uma risadinha, apreciando o comentário.
- E que assim permaneça - aquiesceu, olhando para a rua escura além da porta de vidro. - Que as fadas e sua magia fiquem lá do lado de fora.
- [19-09-2023]