O canto de Sibelius II
Eana nutria seus sonhos secretos como uma forma de defender-se daqueles cujas existências feriram-lhe o corpo e a alma.
O inferno de sangue inundava o tempo e os espaços, como uma doença venérea a corromper os cômodos de dentro para fora. O passado minava em gotículas escarlates pela casa, escorria pelas paredes do colégio e floresciam na lanchonete em que trabalhava. Nesses momentos o chão que era sua única segurança, traía seus pés e a engolia, líquido e viscoso.
Retornava sempre com alguém chamando o seu nome, uma hora era Sibelius a quem ouvia, outra eram os irmãos, os colegas e o seu supervisor. Desde quase sempre tivera a alcunha de avoada etiquetada em suas características, para uns desatenção, para outros a lisergia era fruto dos medicamentos que tomava, para ela eram prelúdios das marés de angústias que banhavam seus litorais.
Certa vez, na tentativa de calar os gotejadores sanguinolentos, dobrou a quantidade de comprimidos, caiu num sono Aurórico, completamente lisérgico. E lá nos confins de seu jardim de memórias, frente ao grande espelho da estufa, sentiu a temperatura baixar e do aço laminado, sair em ritmada vibração, uma triste canção.
O feitiço de Sibelius.