Café completo
Na manhã cinzenta de outono, com pessoas e automóveis emergindo da neblina como elementos de um sonho, a vitrina da padaria era uma promessa dourada de calor e conforto.
- Pra mim, isso já é mágico o bastante - avaliou Lucilla, ao descer do táxi acompanhando Elspeth, a mochila com Ami pendendo do ombro esquerdo.
- É um belo efeito, sem dúvida, mas de mágico não tem nada - replicou Elspeth, olhando para o interior do estabelecimento com o nariz quase colado no vidro. Havia um balcão em "L" onde eram atendidos os clientes, não mais de meia dúzia no momento, e mesinhas redondas onde se sentavam alguns bem-aventurados que desejavam fazer um lanche. E por trás do balcão, prateleiras e mais prateleiras com pães de todos os tipos e jarros de vidro com frutas em conserva e outras guloseimas.
- Vamos entrar, por favor - pediu Lucilla, esfregando as mãos enluvadas e sentindo a barriga roncar.
Elspeth tomou a dianteira e empurrou a grande porta envidraçada, fazendo tilintar uma campainha. Provavelmente, o efeito era desativado nas horas de maior movimento...
Já dentro do salão de paredes cor de creme, sobre o piso de tábuas corridas e enceradas, Lucilla sentiu um calor agradável subir-lhe pelo corpo enquanto o aroma de pão fresco, verdadeiramente inebriante, parecia querer tomar-lhe o corpo. Às suas costas, Ami ronronou.
- Pela Deusa... mas o que é isso - murmurou para Elspeth.
- Eu também senti - admitiu a outra, enquanto examinava os cartazes por trás do balcão, anunciando as especialidades da casa e os preços. - Devem estar trabalhando com ingredientes de uma realidade superior.
- O que vai pedir? - Indagou Lucilla, enquanto se aproximavam do caixa.
- O café da manhã completo - decidiu-se Elspeth.
- Bom dia - cumprimentou-as uma gnoma rechonchuda por trás da registradora.
- Bom dia - redarguiu Elspeth, abrindo a bolsa. - Dois cafés completos, por favor.
- Você trouxe um gato? - A gnoma encarou Ami dentro da mochila de Lucilla, com curiosidade.
- Desculpe, não sabia se aceitavam a entrada de animais - Lucilla abriu um sorriso acanhado.
- Ele parece muito bem educado - deu de ombros a gnoma, enquanto registrava a venda e dava o troco à Elspeth. - Só me faça o favor de não o deixar circulando por aí.
- Farei isso - prometeu Lucilla.
Foram orientadas a sentarem-se e aguardar, pois uma garçonete iria servi-las em seguida.
- E então? - Indagou baixinho Lucilla para Elspeth, quando se sentaram à uma mesa próxima da grande vidraça que dava para a rua.
- E então que vamos comer bem - prognosticou Elspeth, juntando as mãos. - Não vou ficar surpreendida se daqui a pouco abrirem uma pizzaria na cidade.
- O forno é o segredo dessa padaria? - Lucilla ergueu as sobrancelhas.
- E começo a desconfiar que não é um tradicional forno à lenha - sentenciou Elspeth.
A garçonete, uma gnoma com o cabelo louro preso numa touca, aproximou-se empurrando um carrinho com duas bandejas: era o tal café da manhã completo.
- É completo porque vocês podem repetir até fartar - anunciou alegremente.
Elspeth olhou para o bóton que a garçonete trazia preso ao uniforme.
- Faz tempo que vocês abriram essa padaria... Nykiha?
- Seis meses. E já é a melhor do bairro - declarou Nykiha orgulhosamente.
- Isso nós vamos ver - replicou Elspeth, enquanto a garçonete organizava o conteúdo das bandejas sobre a toalha branca da mesa, sob o olhar atento de Lucilla.
- Vocês fazem entregas? - Indagou, enquanto descalçava as luvas.
- Por enquanto não - redarguiu a garçonete, já de saída. - Mas é uma boa ideia!
Já às voltas com croissants recheados de geleia, Lucilla e Elspeth balançaram a cabeça em concordância.
- [Continua]
- [13-05-2022]