A velha francesa
Ela costuma andar por aí carregando seu lixo
No começo pensávamos ser algo ecológico ou coisa assim
Mas o que não sabíamos é que ela distribuía seu lixo
Andava pelas calçadas, entrava nos comércios, tentava entregar um pouco para cada um que encontrava
Dentes podres
Eu pensava, "coitada! Por que tem dentes tão podres?"
Até o dia que a encontrei.
Disse "bom dia", e entendi tudo.
Não eram os dentes que tinham apodrecido
Era ela.
Coitada
Dentes podres
Imagino que não tenha muita paz em sua vida
Insistiu muito para que eu pegasse seu lixo
Acabei pegando
Era tão pesado, foi demais pra mim
Meus olhos arderam a tarde toda
E minha vizinha disse que haveria de existir um anjo ou até mesmo uma oração
E a ardência iria passar
É cansativo ter um coração leve
É preciso trabalhar muito, até não existir rancor algum
Geralmente acabo fumando cigarros no fim da noite
Um teatro perfeito na sala da minha casa
" Está tudo legal" eu digo
Enquanto o lixo espalhado, bom, continua espalhado
Há de ser soterrado algum dia
Já que prefeituras resistem em reciclar
Acabam fazendo buracos e enterrando seu lixo lá
Terra podre
Como seus dentes
Tenho um pouco de pena do que irá sentir
Quando a pressão em cima do seu peito começar
E o gosto que irá sentir em sua boca
Às vezes pode fazer um pouco de bem
Remoer
Moer
Morrer
11/03/22