O Segredo dos Orixás

Era mais um dia ensolarado em Salvador quando decidi parar para tomar uma cerveja em um dos bares do Pelourinho. Eu estava na cidade a trabalho e ficava triste só de pensar que em poucos dias teria de retornar à cidade da garoa.

O que mais gosto daqui é o carisma e a hospitalidade do povo baiano. Eles parecem não gostar de ver ninguém desacompanhado, pois bastavam somente alguns minutos para alguém se juntar a mim toda vez que me acomodava numa mesa de bar. O que mais gostam de fazer é conversar, mesmo que com desconhecidos, e por sorte, é do que mais estou precisando hoje.

Tivera um sonho bastante intenso na noite anterior e ainda estava um tanto atordoada com a realeza dos acontecimentos. Aproveitei a deixa do seu Zé (como ele mesmo se chamava) sobre espiritualidade e compartilhei com ele o meu sonho.

— Você está com tempo? O sonho foi longo.

— O que mais temos de sobra aqui na Bahia é tempo, oxe! Vamos, me conte sobre esse sonho enquanto peço mais uma cerveja.

Seu Zé tinha um jeito engraçado, um jeito meio malandro, era um rapaz negro, alto, muito simpático e o melhor de tudo, era um ótimo ouvinte.

— Eu estava pronta para uma viagem em que não sabia qual era o destino, muito menos o que estava almejando, apenas sentia que precisava ir. O curioso é que não era eu quem decidia qual caminho tomar, mas “eles” eram quem faziam isso por mim....

Entrei num táxi e fui recepcionada por um homem jovem, afro e muito simpático que vestia uma cartola preta e miçangas vermelhas enquanto fumava seu charuto. A fumaça preenchia todo o interior do carro, mas não me incomodava. O cheiro era bem agradável e ele falava como se eu soubesse o porquê de estar fazendo aquilo.

— Está preparada? — perguntava ele soltando uma risada um tanto diabólica.

— Para onde vamos?

— A pergunta não é “onde”, mas “com quem”.

— Posso saber seu nome?

E ele apenas soltou uma forte gargalhada, ainda mais alta do que a primeira.

Passado algum tempo, o taxista misterioso me deixou na entrada de uma estradinha de terra.

— E agora? — perguntei.

— Apenas siga, filha, e saberá para onde ir. Leve isto. — disse me entregando um mini tridente de cores preta e vermelha.

— O que devo fazer com isso?

— Apenas cuide bem dele. É um presente. — sorriu. — Agora vá e boa sorte.

Segui como se soubesse o que estava fazendo. Andei uns oitocentos metros até que avistei uma singela casinha de pedras a alguns metros dali. Agradeci aos céus, pois o sol estava ardente e eu tinha somente alguns goles de água em meu cantil.

Ao me aproximar, pude sentir o calor vindo do interior da casinha que se dava por conta da fornalha acesa. Nela trabalhava um ferreiro, um senhor de meia idade, negro que com um martelo batia com força no material que estava moldando. As faíscas se espalhavam para todo lado. Era bonito de se ver e me perdi por um tempo observando-o até que me lembrei da sede.

— Desculpe incomodá-lo, senhor, mas será que eu poderia pegar um pouco d’ água?

— Eu estava esperando por você. — Sorriu simpaticamente deixando de lado seus instrumentos.

— Estava?

— Fique à vontade para beber e comer o que quiser. Eu já volto. — disse indo para os fundos da casa.

Passados alguns minutos, ele retornou.

— Tome, pegue isto. — disse entregando-me uma bela espada com detalhes azuis e vermelhos e uma sela. — Sabe montar?

— Ahn, não?

— Não se preocupe, ele vai guia-la. — retrucou e assoviou em seguida.

Bastou alguns segundos para começar a ouvir os trotes e um cavalo de pelagem amarronzada veio em nossa direção.

— Para que tudo isso?

— Apenas cuide bem deles. São presentes.

— Posso saber seu nome?

Ele apenas sorriu e fez um sinal com os dedos cruzados.

Cavalguei até a trilha que indicava a entrada para uma mata. O clima se tornou ameno graças à copa das árvores que cobriam quase todo o terreno. Foi quando me deparei com uma cesta farta com milho e mandioca. Mas antes que pudesse tocá-la, uma flecha findou o alimento. Afastei-me no mesmo instante. O arqueiro se tratava de um homem negro seminu que carregava uma bolsa transversalmente em seu corpo.

— Desculpe, estou com fome.

— Você pode saciar sua fome desde que agradeça pela fartura que lhe é oferecida.

— Obrigada.

— Pegue o que precisar e siga o som das cachoeiras.

— Quem é você?

Ele apenas sorriu e bateu forte duas vezes em seu peito fazendo uma saudação.

Apenas segui o seu conselho e tentei me guiar pelo som que ficava cada vez mais forte à medida que me aproximava. Em meio às arvores, uma grande cachoeira se apresentava e sobre uma grande pedra, uma linda mulher estava sentada. De uma beleza surreal, ela se encarava diante de um espelho que parecia ser totalmente revestido de ouro. Com seu corpo praticamente nu, ela se banhava com as águas cristalinas. Quando me viu, ouvi uma voz que ecoava ao redor:

— Permita que a água corrente leve embora tudo o que lhe aflige.

Coloquei então meus pés dentro do lago e fechei os olhos desejando o que ela tinha me sugerido. Senti um arrepio. Ao abrir os olhos deparei-me com meu próprio reflexo nas águas e pela primeira vez fiquei feliz com o que vi.

— Leve esse espelho para que nunca se esqueça de quem você é.

E magicamente o objeto apareceu em minha mochila.

— Mas e quem é você?

— Eu sou você. — Ela sorriu.

— O que isso quer dizer?

— Um dia você vai entender. Agora continue seguindo até a montanha.

Apenas segui o seu conselho e retornei a trilha. Quanto mais eu subia, mais a temperatura aumentava. Uma fumaça cinza começou a preencher a vista acompanhada de uma fuligem negra, mas eu prossegui. De repente, em meio a visão turva, surge um leão diante de mim. "Um leão nas montanhas?" pensei.

— Deixe-a passar, era quem estávamos esperando. — disse uma voz grave.

E ele rugiu tão fortemente que o eco fez estremecer até as grandes rochas.

Em seguida, um tremor sacudiu a terra debaixo de mim me fazendo perceber que estava próxima a um vulcão pronto para expelir sua lava.

— Está tensa demais para quem é regida pelo fogo.

O dono da voz finalmente se mostrara e lá estava ele sentado num grande trono de rochas: um homem negro que vestia uma coroa de ouro e segurava um machado em uma das mãos.

— Quem é você?

— Um amigo da realeza. Somos mais semelhantes do que imagina.

— Não estou entendendo.

— Quem vem até mim normalmente pede por justiça, mas você já carrega isso dentro de si há muito tempo. Sua luta é honrável. Receba esse presente como forma de meu agradecimento.

Então o jovem rei fez surgir uma pedra olho de tigre que instantaneamente pude sentir o seu calor assim que o mesmo me entregou em mãos.

— Ela lhe ajudará a encontrar o que está buscando.

O rei já iria se despedir quando o tempo limpo foi tomado por grandes nuvens cinzas e trovões que pareciam estremecer a montanha.

— Ela está aqui. - disse ele parecendo temer a força que se aproximava.

— Quem?

E o rei desapareceu com seu leão.

Os ventos ganharam força e eu corri para tentar me esconder da tempestade iminente. Uma sombra, então, apareceu acima de mim. Não conseguia enxergar muito bem devido a visão turva, mas à medida que ia se aproximando do chão, pude notar que se tratava de uma mulher com vestes vermelhas e amarelas. Seus olhos completamente brancos pareciam carregar eletricidade e em suas mãos carregava algo em formato de raio.

— Quem ousa adentrar em meus domínios?!

— Ahn... Estou perdida. Poderia me ajudar a encontrar o caminho da trilha? — disse enquanto tentava me proteger dos fortes ventos.

— Então é você quem estávamos esperando.

— Posso saber seu nome e por que estou aqui?

— Logo terá as respostas que procura. Desperte sua consciência, filha, e acredite na força destes braceletes para assim encontrar o seu caminho.

E então ela me entregou lindos braceletes dourados, mais um presente daqueles seres que eu mal sabia quem eram, mas estavam ali para me ajudar de alguma forma. O que será que ganhariam com isso?

Deixei para fazer mais perguntas depois. Naquele momento apenas me concentrei no que ela disse. Fechei os olhos e pedi aos céus para que me guiasse de volta para a trilha. Em poucos segundos pude sentir o céu iluminado novamente e a mulher responsável pela tempestade tinha desaparecido.

A paisagem nunca esteve tão linda e ao horizonte um belo arco íris havia se formado. Inspirei profundamente e agradeci, não sei exatamente pelo o quê, mas podia sentir que algo dentro de mim tinha mudado.

Desci a montanha sendo guiada pelo arco íris e adentrei novamente a floresta. Animei-me ao ver uma forte cachoeira alguns metros adiante, pois estava com sede. Chegando de lá, apoiei minha bolsa sobre a rocha e me refresquei na água cristalina.

Porém, estremeci ao me deparar com uma serpente que me encarava não muito longe dali. Fiquei completamente imóvel rezando para que ela não avançasse mais. Permaneci assim até observar um homem negro saindo em meio a fumaça causada pela forte queda d’ água, ele parecia não se importar muito com o perigo que aquele lugar proporcionava. Usava vestes douradas e enfeitadas de diversas cores, como as do arco íris. Ele estava indo em direção a serpente e eu sem entender nada, tentei impedi-lo.

— Cuidado! Pode ser venenosa!

Mas ele me ignorou e estendeu o braço em direção a ela. O mais surpreendente foi o que aconteceu em seguida: Era como se a serpente atendesse aos seus comandos e apenas deslizou até seu ombro. Fiquei admirada!

— Não se preocupe, ela é inofensiva. Pelo menos diante de quem está buscando o caminho da renovação.

— Por isso estou aqui?

— Não só por isso.

— Quem é você?

— Não vai querer que eu estrague a surpresa agora, não é? — sorriu ele.

— Aparentemente ninguém gosta de se identificar por aqui.

— É porque estamos mais próximos de você do que imagina. Você entenderá, algum dia... Está com fome?

— Um pouco. — eu sempre estou com fome, pensei.

— Leve isto. — disse ele me entregando um cesto com batatas doces.

— Posso segurá-la? — perguntei me referindo a serpente em seus ombros.

— Acha que está pronta?

— Vamos descobrir.

O jovem então me orientou a como segurá-la e eu a envolvi em meus ombros assim como ele. Senti uma grande força, como se ela estivesse me purificando ou algo parecido. De fato, me senti renovada. Agradeci ao “senhor do arco-íris” como decidi apelida-lo e parti.

As beiradas do rio ficavam cada vez mais largas à medida que caminhava e percebi que não muito distante dali as águas seguiam em direção ao mar. Era curioso como aquele lugar parecia se moldar sempre que decidia seguir em frente, como se nada daquilo diante de mim existisse antes e quando passou a existir, era como se sempre estivesse lá.

Entre o rio e o mar havia um mangue, e do que me recordo do colégio, é um dos ecossistemas mais importantes que existem devido a sua alta produção de matéria orgânica responsável por alimentar uma extensa cadeia alimentar. Sua vegetação é marcante definida por espécies de raízes aéreas, adaptações essas para o solo pobre em oxigênio. O mangue é definitivamente um lugar fascinante.

Pisava no solo lamacento com cuidado para não assustar a fauna presente e enquanto desviava das grandes raízes, aproveitava para observar e sentir um pouco a energia daquele lugar tão silencioso, mas ao mesmo tempo cheio de vida.

Estranhei o cheiro de ervas no ar e observei uma fumaça branca há alguns metros dali. Ao me aproximar, podia ouvir uma voz rouca que cantava:

— “Voa passarinho voa

Nas terras de mãe nanã

Voa passarinho voa

Sem pensar no amanhã

Voa passarinho voa

Buscando a água da chuva

Voa passarinho voa

Fazendo sua casa de lama...”

A dona da voz era uma senhora negra de cabelos brancos crespos bem rentes. Usava um xale lilás e em seu colo havia um objeto estranho feito de palha e decorado com búzios. Parecia um amuleto.

Ela estava acomodada num meio tronco enquanto mexia no fogo baixo com um pedaço de graveto. Pela curvatura de suas costas e diversas rugas em seu corpo, poderia arriscar que ela tinha mais que cem anos.

— Vai continuar tímida se escondendo aí atrás, fia? Ou vai vir cumprimentar a vó?

“Como ela sabia que eu estava aqui bisbilhotando?”, pensei.

— Desculpe, não quis atrapalhar. Estou só de passagem.

— Você não atrapalha, aliás, estava esperando que passasse por aqui. É bom ter com quem conversar. Vamos, sente-se.

Ela fumava um cachimbo e a fumaça se misturava com a das ervas que queimavam no solo. Tinha um cheiro de alecrim e me transmitia tranquilidade.

— Beba um pouco de água, fia. Precisa estar bem hidratada para continuar a viagem. É água da chuva, a mais pura que tem.

E ela me ofereceu a água numa pequena caneca branca. Estava fresca e era como se pudesse sentir a natureza dentro de mim.

— Sabe, fia, as águas paradas e lamacentas, à primeira vista parecem mortas, mas por debaixo dela existem diversos seres que buscam nas profundezas das lagoas, na lama, a vida e o sustento. A fia já deve ter sentido a força desse lugar assim que colocou o pé na lama.

— É incrível como ao mesmo tempo em que parece que não existe nada, existe tudo. É tudo tão silencioso...

— É como são nossos sentimentos às vezes, né fia? Tem gente que os aterra com tanta força que mal sabem eles a beleza que estão escondendo.

— É que parece que neste mundo ninguém está pronto para lidar com sentimentos. As pessoas tem medo.

— A vida é curta demais para não demonstrarmos vulnerabilidade, fia. Diga o que precisa ser dito a quem precisa ser dito. Se for de coração, não tem porque se preocupar. Deixe esse medo aqui antes de partir, a natureza dará um jeito nele.

Ao final dessas palavras senti uma vontade enorme de chorar e já que estamos falando de vulnerabilidade, não seria agora que eu esconderia minhas lágrimas. Assim eu o fiz e a doce senhora se ajeitou para que eu apoiasse minha cabeça em seu colo. Enquanto acariciava meu rosto e alisava meus cabelos, ela cantava:

— “Sobe desce

Sem parar

Voa em prece

passarinho a me guiar

Água doce pra curar

Trazendo alegria

Pro meu coração...”

Acordei na praia com uma bela ametista em uma das mãos. Não lembrava nem mesmo de ter adormecido, mas já percebi que não vale à pena buscar por explicações lógicas nesse lugar.

Ainda me questionava se estava viva ou se tudo não passava de mais um daqueles sonhos realísticos. Sentada na areia defronte ao mar aproveitei para reunir cada presente que havia ganhado pelo caminho. E ao me lembrar do inicio da jornada até aqui, deixei escapar um sorriso no rosto pensando que apesar do medo e da desconfiança, eu fui muito bem acolhida e só conseguia preencher meu coração de gratidão. Deixei meu lado cético de lado e decidi aproveitar, afinal, tudo aquilo não deveria ser por acaso.

— Parece bem feliz com seus presentes.

Disse uma mulher sentada sob uma rocha

não muito longe dali. De pele negra e cabelos bem cacheados e volumosos, vestia somente uma saia azul que brilhava tanto quanto sua coroa na testa quando o sol refletia. Longos colares de prata escorriam sobre seus seios nus. Comportava-se como uma rainha e parecia distraída olhando seu reflexo para um espelho, muito semelhante ao que eu havia ganhado. Ela simplesmente surgiu ali, do nada.

— Sim, eu estou mesmo. Adoro ganhar presentes.

— Eu também. — sorriu ela. — Está cansada?

— Um pouco, a viagem tem sido longa.

— Tome um banho de mar e relaxe, falta pouco.

Segui seu conselho e mergulhei em meio às ondas com roupa e tudo. Era como se estivesse precisando daquilo desde o inicio sem saber. Fiquei boiando por um bom tempo enquanto minha mente ia longe. Já descansada, voltei para o meu lugar na área ao lado da mulher de azul.

— Como se sente? — perguntou.

— Estranhamente leve.

Ela riu.

— É, o mar tem esse poder.

— Algum conselho sobre o que fazer com tantos presentes?

— Você é inteligente, vai saber o que fazer. Seja criativa. — ela sorriu. — Se esqueça das dimensões, do que é físico e se concentre no símbolo que cada um representa. É isso que realmente importa. Cada um deles permitirá que muitas coisas sejam geradas para você, então, faça bom uso.

— Eu não sei se sou essa pessoa que acreditam que eu seja. E se eu falhar?

— Você tenta de novo. Mas não se preocupe, pois estaremos com você. Jamais estará sozinha.

— Quem são vocês?

— Ainda tem mais alguém que quer falar com você antes. Está na hora. Antes, leve este espelho como meu símbolo.

— Obrigada.

Segui mais uma vez sem olhar para trás. Estava difícil segurar a ansiedade para saber sobre o que tudo aquilo se tratava, porém por alguma razão podia sentir que aquela missão estava chegando ao fim.

Andei alguns quilômetros pela beira da praia até que precisei adentrar novamente na floresta antes que ficasse desidratada. O clima ameno contribuiu para continuar a caminhada.

Dessa vez demorou mais para que outro ser misterioso aparecesse. Apoiei-me num tronco de árvore para descansar e foi quando observei um túmulo com meu nome grafado nele à distância. O desespero tomou conta. Será que de fato eu havia morrido?!

Corri em direção a ele para tentar entender melhor o que estava diante de mim. Eu não estava errada, era meu nome que estava ali naquele pedaço de cimento. Mas antes que pudesse me fazer mais perguntas, um homem negro coberto de palhas se mostrou presente. Ele parecia esconder feridas em seu corpo.

— Não há motivo para tamanho desespero, filha. Você não está morta.

— Graças a Deus! Ufa... — respirei aliviada.

— O que está enterrado aí foi apenas mais um ciclo da sua vida. Um morre para que outro possa iniciar. Assim é a natureza.

— Uau, isso foi profundo. Mas eu não sei se entendi bem.

— Já não dá mais para viver a mesma vida de antes se não quiser mais sofrer, filha. As ferramentas lhe foram dadas, agora tudo depende de como vai escolher utilizar cada uma delas. Espero ter sido claro.

— Tão claro que quase me cegou, pode ter certeza. Bom, imagino que esteja seja minha última parada.

— Quase. Siga por esse caminho de lírios brancos e chegará ao seu destino final. Mas antes, leve esta pequena cabaça como presente. Espero não tê-la assustado.

— Eu vou superar. — Sorri de nervoso. — Mas de qualquer forma, obrigada.

Segui então o caminho de lírios brancos que mais adiante se abriria num lindo campo preenchido por eles. O cheiro era divino. Eu parecia uma criança me divertindo num playground rolando sobre eles. Eu merecia aquilo, vai?!

— Será que vou me lembrar de tudo isso depois? — perguntei em voz alta.

— Assim não teria graça, não é?

Respondeu um senhor que aparentava ter idade bastante avançada vestindo roupas brancas e um tipo de turbante na cabeça. Ele também segurava um grande bastão de metal branco. Eu me recompus no mesmo instante.

— Se lembrará somente de alguns flashes até chegar o momento em que juntará cada fragmento e tudo fará sentido.

— Algo me diz que o caminho não vai ser fácil até lá.

— Você pode tornar menos difícil buscando a nossa ajuda. Estaremos sempre aqui para quando precisar. Tome, leve esta flor como um presente. — disse o senhor me entregando um belo lírio, diferente de todos os outros que havia visto.

— Então é isso? Você é o chefão que eu deveria encontrar no fim do jogo?

— Pode-se dizer que sim, a diferença é que eu como todos os outros quero ajuda-la a passar de fase. Venha, filha, me dê um abraço.

Acho que nunca tinha sido acolhida por braços tão aconchegantes como aquele. Nisso, uma redoma de luz se formou em volta de nós.

— Que nunca lhe falte fé. — disse o senhor por fim.

...

— O mais curioso de tudo é que quando acordei poderia jurar que senti o cheiro de lírios brancos no meu quarto. Nunca tinha tido um sonho tão realista como esse, na verdade desde então venho me perguntando se foi mesmo um sonho ou uma experiência no astral ou qualquer coisa do tipo.

— Algo me diz que você vai descobrir em breve. — disse seu Zé com confiança.

— Acredita nisso?

— Você se surpreenderia com as coisas que eu acredito. Agora eu preciso ir. Foi um prazer, conhecê-la. — disse ele dando-me um beijo na mão com todo cavalheirismo.

— Vai embora sem me dizer seu nome?

— E acabar com a graça? Não... Ainda tem muita gente precisando conversar com você. Muito axé para a senhorita, bendito seja nosso Senhor do Bonfim!

Seu Zé então vestiu seu chapéu e se foi. E daquele momento em diante, eu entendi tudo.

AXÉ!

Giulianna Loffredo
Enviado por Giulianna Loffredo em 28/02/2022
Reeditado em 01/03/2022
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