O dia em que o VERÃO aqueceu o inverno.

"A cada 138 anos um evento único ocorre, com a passagem do cometa "Leporem"

próxima à Terra, magia recobre o planeta e a terra ganha vida, em forma

de uma estação que por um dia se torna um ser humano..."

A cada passada dada o gelo derretia com o calor emanado pelos pés descalços.

O frio mal chegava a tocar seu rosto, se transformando numa fina névoa de vapor.

Usando apenas um short de malha fina e uma regata, aquele estranho ser não parecia se intimidar diante do ar gélido.

Mais a frente, rompendo arbustos cobertos de neve, dava para avistar casas simples com suas janelas alaranjadas pelas lâmpadas incandescentes.

O estranho se aproxima de uma casa, desprezando a existência das outras, ele olha o interior.

Sentado em uma mesa de madeira com espaço para quatro cadeiras, um homem tomava uma taça de vinho tinto, e degustava uma ponta de queijo coalho. Ele parecia satisfeito com sua vida.

Olhava para um ponto fixo como se conversasse com outra pessoa que não dava para ver daquele ângulo.

Aquele homem de aparência simples já tinha trinta anos. Fred para os mais próximos. Tinha uma vida simples.

Do lado de fora o vento frio continuava a lutar contra aquele estranho ser que não se abalava com a geada.

Ele dá a volta na casa pelo sentido leste, parando em frente a porta, ele dá duas pancadas secas nela.

— Quem é? - Fred grita do interior.

O estranho apenas continuava parado esperando.

— Quem é que bate? - Fred mais uma vez se faz ouvir.

— Pode me dar abrigo? - o estranho fala pela primeira vez.

Fred fica parado na dúvida se abre ou não.

A porta se abre e o dono da casa olha desconfiado para o outro à sua frente.

— Posso entrar?

O homem de aparência imponente o encara, ele não parece suspeito, e nem seria um marginal qualquer. Aquele estranho parecia ser importante.

— Entre, e venha tomar um chimarrão bem quente.

— Obrigado, Fred.

Um arrepio tomou seu corpo por inteiro, como ele saberia seu nome.

— Já nos conhecemos, eu creio?

— Digamos que eu te conheço desde o dia em que você deu seus primeiros passos correndo nos Pampas ensolarados.

— O senhor não parece ser mais velho do que eu.

— Posso não parecer, mas sou muito mais antigo do que você possa imaginar.

Para Fred aquele estranho se mostrava enigmático, o que o deixou receoso, achando que poderia ter deixado um lunático entrar em sua casa.

— Você me conhece de onde?

— Digamos que é um pressentimento, não sei exicari.

— E como é seu nome?

— Precisa mesmo?

— Você sabe o meu nome, então é certo eu saber o seu?

— É justo. Em cada língua tenho um nome diferente, mas aqui vocês me conhecem por Verão.

Fred o encara, suga e bebe um longo gole do mate quente, sorri e depois fala.

— Seus pais foram bem criativos. Melhor que outono.

— Não me compare com aquele indeciso.

— Por que o Outono seria indeciso?

— Porque não sabe ficar em um estado fixo, ora está frio, ora está quente.

— E você, sempre está quente?

— Claro. Sou o Verão.

Uma afirmação nada modesta.

Alguns minutos depois que o Verão entrou na sua casa. Fred pode observar e sentir sua sala aquecida, e quanto mais próximo, ele ficava, mais calor sentia.

— Estou preparando um capeletti, o senhor aceita?

— Isso é o que vocês humanos chamam de comida?

— Sim, isso mesmo - Fred por sinal achou aquela pergunta bem incomum.

— Então eu vou aceitar sim.

Enquanto comiam, Fred se sentiu encorajado e resolveu fazer uma pergunta que o estava incomodando desde que o Verão pediu-lhe abrigo.

— Ainda bem que o senhor encontrou minha casa, se não iria morrer nesse frio. Suas roupas estão fora de estação.

— O que é frio afinal? Eu só escuto falar dele, mas nunca o senti.

— O ar gelado que está em todo lugar quando chega o inverno.

— Nunca o senti realmente. Na verdade nunca me encontrei com o Inverno, somos separados pela Primavera, e pelo Outono.

— Então é por isso que usa essa roupa…Mas então se você é a estação verão, e nunca se encontrou com o inverno… Você está na estação do inverno. Por isso tudo lá fora está branco, coberto de neve, estamos na época mais fria do ano. Não está sentindo o frio?

— Não sinto nada frio, apenas calor. Você está sentindo frio agora?

Fred olhou em volta, sua sala parecia aquecida por completo, parecia uma manhã de verão.

— Na verdade, desde que você chegou, sinto um calor agradável.

O estranho sorriu.

— Você gosta do inverno?

— Gosto da comida, é mais quente e mais temperada.

O visitante olha para o prato.

— Obrigado por sua comida, estava deliciosa. É assim que vocês falam, não é?

— Sim. Isso mesmo. Obrigado.

Já estava ficando tarde.

Fred olhou para o relógio, ambos conversaram bastante, o visitante fazia muitas perguntas sobre a vida dos homens. Fred apenas se deixou levar pelo momento, não queria contrariar, pois não sabia como aquele homem iria reagir se ele mostrasse que o achava um completo lunático.

— Eu já vou dormir, o senhor pode usar o sofá. Acredito que queira passar a noite aqui.

— Sim, quero ficar aqui. Mas onde você vai dormir?

— Vou ficar no meu quarto.

Fred fechou a porta logo que entrou, e passou a chave, ele estava temeroso, mesmo o seu hóspede parecendo uma pessoa de bem, não poderia relaxar ao ponto de dormir com a porta destrancada.

O quarto não era grande, tinha uma cama de casal, com cobertores confortáveis e grandes suficientes para cobrir duas pessoas.

Contudo, Fred não parecia confortável, mesmo estando bem acomodado sob as cobertas. Seus pensamentos estampavam momentos engraçados daquela noite. Aquele homem jovem deveria ter no máximo trinta anos como ele, e mesmo parecendo totalmente fora do contexto, ele trouxe ao seu lar, calor, luz e uma felicidade incompreendida.

O Verão, ficou sentado no sofá, ele olhava de lado, procurava algo para explorar. Então ele se levanta e caminha até a mesa e se senta onde Fred estava mais cedo, ele olha novamente para os lados, depois repete o olhar de Fred, procurando a mesma direção. Parando seus olhos numa moldura com uma fotografia pendurada na parede.

Com poucos passos ele estava de frente a pequena imagem emoldurada, e olhava fixamente para dois garotos com os braços nos ombros um do outro, ambos apenas de short, seus sorrisos largos e felizes eram o ponto máximo naquela fotografia. Naquele dia da foto o sol estava quente, ao fundo uma azul se confundia com o céu, nada frio. Próximo aos pés dos garotos tinha uma bola. Por que eles pareciam alegres? Esse pensamento interrogativo permaneceu no seu olhar.

Um dos garotos tinha feições parecidas com as do Fred, mas e o outro, quem era? O Verão instintivamente fechou os olhos, tentando retroceder até aquele dia, e então ele os viu.

Fred corria dando gargalhadas, um garoto de 14 anos, corria solto tentando chutar a bola entre duas sandálias enquanto o outro garoto com idade parecida tentava roubar a posse da bola.

— Você pode até tentar André, mas eu sou melhor jogador do que você.

— Só em seus sonhos Fred.

A areia da praia ofusca sua visão com a refração do sol.

O homem retorna seu olhar para a sala aquecida por sua presença, olha cada parte, ele não vê outras fotos.

Onde ele guardaria as fotos de família, as fotos das férias, dos amigos, da época do colégio?

Ele caminhou até a porta do quarto e ficou em pé como se esperasse o ocupante abrir a porta e sair.

Fred estava sentado na cama, ele olhava na direção da porta, a claridade que passava por baixo da porta mostrava a sombra do homem caminhando de um lado para o outro, antes dele parar em frente a porta.

No quarto fazia muito frio.

Fred se deitou e se cobriu com seus três cobertores e mesmo assim o frio não o deixava dormir. Ele lembra que na sala onde o Verão estava, o calor era agradável e aconchegante.

Ele tremia. Voltou a olhar na direção da porta e a sombra do visitante continuava parada. E o frio no quarto incomodar.

Nunca tinha sentido tanto frio em sua vida. Por que estava tão frio no quarto, se quando estava na sala estava tão quente?

Será que o visitante estaria também com muito frio e por isso ele não conseguia dormir?

Fred continuava a pensar e imaginar situações que espantam o sono.

A porta se abre, e o homem observa Fred surgindo pela porta.

— O senhor está com frio?

— Não sinto frio. Já te falei.

— Verdade. Não consegue dormir?

— Estava esperando você me convidar para seu quarto.

Um estranho dormindo na mesma cama, não era algo certo a se fazer.

Os pensamentos de Fred pareciam confusos, afinal por que ele convidaria aquele homem a dividir sua cama, se pelo menos fosse um parente, ou um amigo muito próximo… Fred se lembra que faz muito tempo que ninguém divide a cama com ele.

— O senhor não se importaria em dividir a cama comigo?

— Qual o problema, não é normal duas pessoas dormirem na mesma cama?

— Na verdade não, a não ser que estas pessoas sejam íntimas.

— Não compreendo. Então não posso dormir na mesma cama com você?

O olhar de Fred foi do homem até seu lugar de descanso, e mais uma vez seus pensamentos pareciam perturbar.

Deitados na cama, ficaram um de frente para o outro, foi posto apenas um cobertor. Fred não sentiu frio, ele ficou olhando o outro adormecer.

Que sentimentos eram aqueles que ele sentia? Não poderiam ser os mesmos que ele sentiu pelo seu amigo. Ele se viu preso no passado. Naquela noite, ele sonhou com André.

Quando Fred acorda, se vê sozinho na cama. Ele se levanta e caminha até a sala onde o encontra olhando a fotografia na parede.

— Não entendo porque vocês têm um rosto diferente dessa foto.

— Faz muitos anos. A gente amadurece, sabia.

— Eu sei que é a lei da natureza, o corpo físico envelhecer. Mas eu falo do seu rosto. veja, vocês tem a boca diferente, ela parece esticada.

— Isso? Estávamos muito felizes nesse dia. Então a gente saiu na foto assim, sorrindo.

Fred pareceu reflexivo, e se perdeu mais uma vez em seus pensamentos.

— Então você não está feliz hoje?

— Não me sinto assim há muito tempo. Essa felicidade junto com alegria, não é fácil de se sentir tudo junto. Temos que ter o momento e a pessoa certa, entende?

— Então você estava feliz e alegre porque estava brincando com esse outro garoto?

Aquela pergunta mostrava um entendimento confuso mas objetivo. Fred pareceu perdido olhando a foto.

— Fred, vamos brincar de bola. Eu quero sentir esse sentimento de alegria. Quero saber como é deixar meu rosto dessa mesma forma.

— Não temos bola aqui… E também lá fora tem uma fina camada de neve…

— Então o que pode ser feito para a gente ter um momento de felicidade?

— Não sei… As vezes a gente depende apenas de uma pessoa, e ela só precisa estar ao seu lado… Às vezes a felicidade se mostra presente só em está conversando com ela, e nada mais.

— Você não parece feliz só em conversar comigo. Precisamos brincar. Vamos brincar Fred.

— Somos adultos.

— Adultos não brincam?

— Não. Adultos apenas vivem.

— Que chato. Da próxima vez que eu vim ao mundo em forma de humano, vou querer ser criança…

— Mas afinal de onde você veio mesmo?

— É complicado. Eu apenas cheguei aqui… Mas eu não quero voltar sem ter feito esse sorriso, e você precisa me ajudar.

— E quando você vai embora… Desculpe minha falta de educação, não é que eu queira que você vá. Entende?

— Devo partir hoje a noite no mesmo horário que cheguei.

— Por que?

— É assim que deve ser.

Fred sentiu sinceridade nas palavras do visitante, e se sentiu triste pelo outro. Era um homem bonito, de rosto másculo e olhos claros, mesmo com aquelas roupas inadequadas para a estação fria, ele parecia inocente de tudo. Então por que não mostrar a ele como brincar, se divertir, quem sabe ele nunca teve uma infância normal em que aproveita o tempo livre para correr, saltar, e viver o máximo com... Seu melhor amigo, até que um dia eles se separem e nunca mais se veem.

Mais uma vez Fred ficou preso no passado.

— Escute, você nunca esteve no inverno antes, não é verdade?

— Isso mesmo.

— Então você nunca jogou balas de neve em uma pessoa.

— Nunca estive com outra pessoa antes de você.

— Certo… - Fred respira fundo e prefere não retrucar aquela afirmação - Vamos lá para fora.

Os olhos do Verão pareceram se iluminar com o convite.

O sol naquela manhã parecia preguiçoso, não aqueceu a neve suficiente para derreter e o frio continuava intenso.

Fred preparou dúzias de pequenas bolas brancas, de um lado e depois na outra extremidade do espaço em frente a sua casa, ele fez outra pilha.

— Você fica ali daquele lado e eu aqui.

— E agora, o que fazemos?

— Jogamos balas de neve um no outro e a gente tenta evitar ser acertado.

Sem perda de tempo, Fred arremessa uma bala branca no outro, pegando em cheio no peito. Ele sorri espontaneamente.

— Viu só como se faz.

O Verão ver o sorriso em Fred, aquele sentimento é contagiante. Ele segura uma bola e percebe que ela começa a derreter em suas mãos, então sem perder tempo ele arremessa pegando no rosto de Fred.

— É melhor você desviar, senão vai comer bola.

Fred olha para seu novo amigo e o vê sorrindo quase liberando uma gargalhada.

— Você já está sorrindo.

— Estou…

Ele é interrompido por um balaço no rosto.

Ambos começam a correr de um lado para o outro tentando desviar das bolas. Eles gritam. Dão gargalhadas. Eles correm em direção um do outro tentando chegar mais perto e assim acertar mais bolas. Eles estão tão próximos que se abraçam e caem sobre a neve dando gargalhadas. Seus rostos estão vermelhos, e a respiração ofegante.

— Então isso é felicidade?

— Sim. Isso é vida.

Fred se vira de lado, e seus olhos encontram o do Verão, ele também está de lado, um de frente para o outro.

— Você me fez lembrar de um tempo em que eu era feliz.

— E esse tempo não pode voltar mais?

— Sabe, tem hora que eu penso que você é apenas um garotinho perdido no mundo.

— Por quê?

— Você parece não compreender a lógica da vida. O passado não volta, a vida apenas continua.

— Essa lei da vida eu conheço Fred. Eu quis dizer que você poderia procurar ser feliz como era antes.

— Não sei se isso é possível.

— Você não está feliz, hoje?

— Mas é porque você está aqui…

— Mas eu não sou aquele garoto, a gente não se conhece, lembra? Quem era aquele que te fazia sorrir

— Ele se foi. A família dele foi embora para outro estado e a gente nunca mais se viu.

— Vocês eram amigos. Amizade é para a vida toda, não é?

— É sim, mas… A família dele descobriu sobre nós…

Fred se fechou e uma sombra cobriu seu rosto.

— Escute Fred, eu só tenho o dia de hoje para ser feliz, por favor seja meu amigo.

— Depois você vai embora, e eu ficarei sozinho novamente.

— Amigos não são egoístas, certo?

— É verdade. Mas e eu…

— Venha, vamos brincar.

Aquele homem que por um momento parecia inocente, pareceu sábio, ao se levantar ele estendeu a mão direita para o outro ainda caído no chão.

— Vamos aproveitar cada minuto. Vamos ser felizes pelo menos hoje… Quero criar essas lembranças e lembrar que um dia eu tive um amigo.

Fred olhou para cima e viu aquele estranho homem sorrindo para ele.

— Você continua sorrindo - Fred respira e providencia um sorriso.

E o Verão sorrir mostrando seus dentes brancos.

— Sim. Acho que estou realmente feliz.

— Então você nunca mais voltará?

— Em pessoa, talvez não nesta era, mas na forma de estação, e todos os anos você poderá me sentir à sua volta.

Fred se levantou, e eles brincaram e tiveram um dia cheio de alegria.

Fred mostrou coisas do mundo humano, como a TV, o rádio, e então a máquina de fotografia.

— Eu queria tirar uma foto nossa. Você permite tirar uma?

— Você vai por em uma moldura e por na parede?

Fred se lembrou da outra que estava na parede, sorriu e falou.

— Mas é justamente para isso que eu quero.

— Então eu deixo.

Minutos depois, Fred agita a pequena fotografia na mão. Na foto aparecem dois homens sorrindo, ambos estavam alegres, cabelos desarrumados, suados, e olhos brilhantes.

— Ficou muito boa nossa fotografia.

— Sim Fred, ficou sim, o André ficaria com ciúmes se ele pudesse nos ver assim.

— Eu não disse o nome dele, como você sabe?

— De alguma forma eu consegui lembrar. Como foi num dia ensolarado de verão eu pude resgatar aquele momento, eu não sei como te explicar, nunca tinha feito isso antes.

— Foi um dia muito especial, foi no meu aniversário.

— Então você nasceu num dia de verão. Fico feliz em saber disso.

— Você agora aprendeu o que é felicidade, vai viver sentindo ela, né?

— Acho que nunca vou deixar de sentir.

— Eu queria que fosse fácil assim. Quando você se for, eu ficarei sozinho novamente.

— Você não precisa viver sozinho.

Fred parecia olhar para dentro de si. Olhou para a foto da polaroid, e viu ele e o Verão sorrindo. Depois olhou para a foto na moldura e se viu sorrindo ao lado do André.

— Nem sempre a gente encontra um bom amigo numa noite de inverno, sabia?

— Mas pode procurar um, numa tarde quente de verão, sabia?

Fred o olhou, sábias palavras o outro profetizou.

— Obrigado Verão, por ter procurado minha casa como abrigo.

— Obrigado Fred por ter deixado um estranho entrar na sua vida.

Eles se abraçaram.

Fred sentiu um grande calor. Um desejo tomou conta do seu ser, era algo mais antigo, algo que ele não conseguiu definir naquele momento, apenas foi por instinto.

— Posso te dar um beijo? Você sabe o que é um beijo, né?

— É algo que se possa comer?

— Não. É algo que se possa sentir junto com outra pessoa.

Ainda abraçados. Fred junta seus lábios no outro.

O estranho que não é mais estranho parece brilhar. Uma onda de calor espanta todo o frio à sua volta.

Algum tempo depois eles estão deitados na cama, juntos por baixo de um cobertor.

— Então é assim que os humanos conseguem deixar sua felicidade ainda mais forte?

— Sim. É assim que a gente consegue se tornar dois em um. Se você fosse realmente humano, se casaria comigo e viveremos juntos para sempre.

— Isso não seria possível. E seu coração pertence a outro.

— Mas é você que está aqui, comigo.

— Não deixe seu coração duvidar nunca mais. Ele agora está quente. Você será feliz.

— Mas… Eu não entendo. Você me fez sorrir também.

— Mas não sei se sou eu ou apenas algo em mim que te faz lembrar do André.

— Então ficamos assim, apenas como uma lembrança?

— Eu estou com medo Fred.

— Medo de que?

— Medo de partir e eu não lembrar mais de você. As horas estão se aproximando da partida. Não quero te deixar assim.

— Também não quero que você vá. Mas não é uma coisa que dependa de nossa vontade, não é?

Fred esperava com aquela pergunta que aquele homem não fosse um lunático, ou um ser mágico, e falasse a verdade de que ele era apenas um humano perdido em busca de um porto seguro.

— Não. Infelizmente minha partida é inevitável. Mas antes, você poderia me preparar o mesmo prato de ontem a noite.

— Claro.

Enquanto Fred preparava o jantar, Verão ficava ao seu lado olhando cada passo e cada movimento que o outro fazia com as mãos.

— Você é bem habilidoso.

— Sou, não sou?

Eles sorriram.

Terminando o jantar, eles caminharam até a porta.

— Verão, como é que você vai embora?

— Não sei. Mas deve ser algo mágico e da mesma forma que eu cheguei aqui.

— Posso te dar mais um beijo?

— Eu ia perguntar a mesma coisa.

Eles se abraçam e seus lábios tocam mais uma vez.

— Adeus Verão.

— Não será necessário. Logo a Primavera chega, e depois vem sua estação preferida.

— E como você sabe que é a minha preferida.

— Por que se não for, agora será.

Eles sorriem, e lágrimas começam a escorrer sobre a face de Fred.

A noite está tão escura quanto a anterior.

Fred já não consegue mais ver o seu amigo. Ele fecha a porta enquanto olha a escuridão.

Na casa de Fred, o Verão deixou um calor em seu coração que nunca cessará.

Distante das casas, ele olha para trás e vê a janela alaranjada da casa de Fred, ele não consegue mais ver se alguém está lá, mas ele sabe quem estar.

— Obrigado Fred por esse dia mágico e único.

E assim, ele se desfaz como uma nuvem de vapor e depois em nada mais.

Fim.

Epílogo

No verão seguinte, Fred está num ônibus, ele olha pela janela, e em sua mão um cartão postal de uma praia ensolarada, e nele vem escrito.

“Se ainda lembra de mim, venha me procurar no próximo verão.

Estarei na mesma praia daquele aniversário, e no mesmo dia, te esperando.

Nunca te esqueci.

Do seu André.”

Ele olhava a paisagem verde e ensolarada.

— Obrigado Verão.

Fred sorriu e sua felicidade refletiu na janela do ônibus.

Pareceu que aquele céu azul sorria de volta.